Então ela teve a ideia de esperar pelo amor,
e o tempo veio sem asas de beija-flor mas
derramando-se vermelho de cheiro de
chuva de verão e azul sussurrante em
gosto de silencio e alguns verdes para
dançar nas bordas da consciência.
Os minutos escorriam pelo chão, subiam
pelas paredes enquanto ela caminhava
sobre eles como quem desliza em nuvens,
enquanto o mundo inteiro vibrava na palma
da mão.
Quando notas musicais chegavam em
"ondulância" ela abria os olhos, quem
sabe não seria o amor num convite
para dança? Mas eram apenas chamas azuis
tocando-lhe a pele, murmurando memórias
que nunca existiram, dentro de melodias
que somente o coração podia decifrar.
Refletia-se no espelho e a infinidade de si
era simultaneamente dança e oração e o
tempo, sem asas, curvava-se curioso,
como quem descobre um segredo antigo
do universo.
Ela aprendeu a sorrir para sombras que
flutuavam, a abraçar pássaros diluídos em luz.
Ao ouvir o que o vento contava em corpo
com cheiro de laranja e tempestade,
percebeu que esperar pelo amor não era
sofrer, mas mergulhar em sonhos onde
tudo podia ser sentido, onde tudo podia ser amado...
Mesmo aquilo que nunca chegaria.
É meu corpo que escreve os meus poemas.
Minha alma é a sucursal da minha mão.
As palavras me buscam no silêncio.
Palavras são estrelas que reclamam
o papel branco: céu, constelação.
(Os Poemas - Lêdo Ivo)