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Manifesto do Sonhador Pós-Éden

 
I
Tenho pesadelos imponentes.
Eles não me perseguem — governam-me.
São tronos feitos de névoa, coroas de silêncio,
E nelas habita o império das minhas sombras.
Cada noite é um reinado de visões e feridas,
Onde a insônia é o anjo da guarda que perdeu as asas.

II
Sou a lama do Éden, o resto do milagre.
Não herdei o paraíso — herdei o erro.
Minha matéria é feita de queda e de lembrança,
E é por isso que sei:
A criação não terminou, apenas adoeceu.
Deus expirou em mim um hálito antigo,
E dele nasceram as palavras que não têm perdão.

III
Vivo em tempos utópicos e pós-enciclopédicos,
Onde a sabedoria se tornou pó digital,
E a ignorância, um luxo quase místico.
Os livros sabem tudo,
Mas ninguém sabe o que fazer com tanto saber.
O homem moderno lê o abismo em HD
E chama isso de progresso.

IV
Caminho sobre a lama dos significados.
Entre cada sílaba perdida, floresce um espelho,
Nele vejo o reflexo de um anjo faminto,
Devorando o próprio verbo.
Falar é um ato arqueológico:
Desenterrar o que já foi dito
E, ainda assim, sangra.

V
Eu, sonhador pós-Éden,
Reclamo o direito de delirar.
De erguer catedrais com restos de utopias,
De inventar fé na ausência de deuses,
De plantar jardins onde só há códigos e ruínas.
Que a minha loucura seja o último abrigo
Daquilo que ainda pulsa sob o esquecimento.

Poema: Odair José, Poeta Cacerense

www.odairpoetacacerense.blogspot.com

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Autor
Odairjsilva
 
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