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OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)

 
 
OS PÍNCAROS DO ABISMO




Ao sucumbir ao sono,
Perco-me na viagem
Á espiral de dimensões intoleradas, insones:


Lá,
Digladio-me com antigos demônios
Que, até então,
Pensava pairar sobre o céu
Do crepúsculo dos íntimos infortúnios hediondos.


No entanto,
Pungentemente,
Descubro que,
Em mim,
Eles jazem,
Latentes, silente
E continuamente diurnos:


Esperando pachorrentamente
O átimo conciso
Para que me induzam
A ir á sua arena do sodômico
Feitiço.



Porém,
Para meu próprio espanto,
Suplanto-os a todos os meus endógenos inimigos indômitos:







Contemplo-lhes impávida e destrutivamente
O fundo dos olhos que destilam
O veneno pérfido da naja
--- Mortífera! Mortífera! ---



E com o êxito,
Uma sucessão
De vagalhões de êxtase
Acomete-me e me transmuda
Em altaneiro arvoredo,
Tsunami de néons, orvalhos
E perpétuas neves do nirvana
Fazendo aflorar-me
Na soturna face
A quietude, a fleuma,
O saber caminhar e atravessar a difícil embocadura
Que não me deixa cair no abismo do ermo
E me leva direto ao lendário reino
Onde mora a benfazeja sabedoria de Buda.



Ah, não mais que subitamente,
Acordo deitado no chão da varanda
E debruço meu olhar sobre o sol
Além das nuvens guarnecendo o céu,
Além da cadente chuva:
Aí, deslindo o segredo
Para me manter imune
Ao inexorável poder
Da sua chama voraz
A arder frações opulentas da vida
Em molde de onipotentes rochedos
Á natureza da indissoluta sílica.









Posso drapejar sem comedimento,
Mas sinto ânsias de remorso
Por estar sobre o senhor dos píncaros
Da infinita felicidade insubmissa, arredia;
Enquanto a maciça maioria
Fica ao jugo do malsão sabor
Do interminável oceano de esquizofrenia,
Tornando pensantes vidas
Em miserandos chapados, cativos da larica
Da mortuária alegria.



Embora tente contumazmente
Alertá-los, fazê-los,
De todas as maneiras
filhas da poção da dinâmica
Da dialética lógica, sempre perfeita,
Enxergar a emancipadora centelha,
Eles, enleados nas malhas
Do engenhoso sortilégio maléfico,
Confinam a sua visão em lentes
Herméticas do desdém.


Afinal,
Sob o efeito desta tétrica epifania,
Decido voltar á arena
Do malévolo feitiço
A fim de me entregar,
Espontaneamente,
A meus dianhos,
Eternamente famintos:
Loucos para devorar-me
A suculenta ruína do idealismo.

jessé barbosa de oliveira




SOU NATURAL DA CIDADE DO SALVADOR, BAHIA. NASCI EM JUNHO DE 1982.
NA VERDADE, SOU UM MENTECAPTO QUE TROPEGA PELAS
ALAMEDAS DA POESIA.
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jessébarbosadeolivei
 
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Enviado por Tópico
António MR Martins
Publicado: 05/10/2008 12:09  Atualizado: 05/10/2008 12:10
Colaborador
Usuário desde: 22/09/2008
Localidade: Ansião
Mensagens: 5058
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Não encontro palavras que definam o quanto gostei do seu soberbo poema.
É paradigmática a sua escrita e, certamente, assaz crítica, mas, muitas vezes, realista (nada de fantasmagórica, como à primeira vista poderia parecer).
Mas, amigo, eles andam aí... o destino é tentar sobreviver. Será que conseguiremos?...

Um forte abraço.

Enviado por Tópico
LuciaConstantino
Publicado: 05/10/2008 12:11  Atualizado: 05/10/2008 12:11
Participativo
Usuário desde: 08/01/2007
Localidade: Curitiba, Paraná, Brasil
Mensagens: 21
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Nesse abismo interior (de todos nós) o poeta transita entre os píncaros do que classificamos no nosso humano mundo como bem e mal -- o inferno e o nirvana -- deixando-nos uma profunda reflexão sobre o caminhar da própria existência em si mesma, a qual nos pede atingir os seus píncaros em abismos e o ascender continuamente por nossa própria vontade em busca de luz. Muito bom, muito profundo. Grande abraço, poeta.

Enviado por Tópico
RoqueSilveira
Publicado: 05/10/2008 12:17  Atualizado: 05/10/2008 12:17
Membro de honra
Usuário desde: 31/03/2008
Localidade: Braga
Mensagens: 8104
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Embora tente contumazmente
Alertá-los, fazê-los,
De todas as maneiras
filhas da poção da dinâmica
Da dialética lógica, sempre perfeita,
Enxergar a emancipadora centelha,
Eles, enleados nas malhas
Do engenhoso sortilégio maléfico,
Confinam a sua visão em lentes
Herméticas do desdém.

Como sempre genial! Mas concluindo: quem quer acordar e enxergar? As pessoas, no geral são mesmo assim, já sabem e desdenham...é a triste realidade! Abraço grande Jessé...

Enviado por Tópico
Nanda
Publicado: 05/10/2008 12:31  Atualizado: 05/10/2008 12:31
Membro de honra
Usuário desde: 14/08/2007
Localidade: Setúbal
Mensagens: 11076
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Jessé,
Os nossos fantasmas, ou demónios que nos atormentam quer nos sonhos, quer durante a vigília.
Sim, a filosofia de Buda, eu diria a leitura de Sidartha é muito relaxante e um grande ensinamento para que aceitemos a vida como ela é, simples.
Muito apreço por você e sua dialéctica, amigo
Beijinho
Nanda

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 05/10/2008 13:22  Atualizado: 05/10/2008 13:22
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Um poema dos tais que é difícil (e doloroso) comentar em duas linhas.Jessé é um lídimo pensador/poeta do "eu" que, embora muito novo,induz ideias da maior maturidade e profundidade.Este espaço fica muitíssimo enriquecido com os seus poemas. Abraço.

Enviado por Tópico
VónyFerreira
Publicado: 05/10/2008 15:12  Atualizado: 05/10/2008 15:12
Membro de honra
Usuário desde: 14/05/2008
Localidade: Leiria
Mensagens: 10301
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
"Afinal,
Sob o efeito desta tétrica epifania,
Decido voltar á arena
Do malévolo feitiço
A fim de me entregar,
Espontaneamente,
A meus dianhos,
Eternamente famintos:
Loucos para devorar-me
A suculenta ruína do idealismo."

Soberbo!
É o que me ocorre dizer, sempre que o leio.
Vóny Ferreira

Enviado por Tópico
Tânia Mara Camargo
Publicado: 05/10/2008 15:41  Atualizado: 05/10/2008 15:41
Colaborador
Usuário desde: 11/09/2007
Localidade:
Mensagens: 4246
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Jessé fico pasma a cada leitura,
tens uma visão de realidade e
utopia. O inferno por vezes manifesta-se
pela nossa impotência ante a tantas
injustiças. Um banho de cultura amigo!
Beijos!

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 06/10/2008 11:47  Atualizado: 06/10/2008 11:47
 Re: OS PÍNCAROS DO ABISMO(inédito)
Mais do que uma epifania, uma quase hierofania de deuses e demónios «loucos para devorar-me/A suculenta ruína do idealismo.»

Gostei,

DM