Crónicas : 

A CURVA DA HISTÓRIA

 
A CURVA DA HISTORIA


Penso com alguma frequência que, seja por acaso ou porque assim esteja escrito, me cabe e aos do meu tempo viver numa curva da história. Mas acentuada curva. Apetece-me pensar que vivemos o fim de uma era e o começo de outra e penso no que isso possa significar, nas probabilidades de não ser pacífica a feitura dessa acentuada curva. E digo isto com a capacidade que a minha vida que já vai sendo um tanto longa me dá de olhar para trás e observar o cenário do tempo que passou. Ajuda-me o bom registo que tenho das coisas e factos que decorreram desde a minha infância até à hora presente. Digamos que um período de sessenta anos. Debruçar-me sobre esta questão não me apavora nem me trás expectativas de optimismos exacerbados. Direi antes que o tema me apaixona. Gosto de de quando em vez olhar para trás e, salvaguardados segmentos de tempo demasiado sofridos, atentar na história humana que entretanto decorreu.
Normalmente a convicção que acorda em mim é a de que o que aconteceu neste lapso de tempo foi um passo em frente. Mas muitas vezes fico a interrogar-me se não foi um mero passo ao lado, já que um passo à retaguarda comportaria um pessimismo que francamente quero rejeitar. Absolutamente foi um gigantesco passo em frente em termos de evolução técnica/cientifica. Basta-me pensar nos meios que me passaram pelas mãos desde a anacrónica máquina de escrever até ao fantástico da internet. Quero dizer que num instante (e cinquenta anos são um instante), saltou-se do medieval e ronceiro manuscrito, para a quase misteriosa mensagem que no próprio instante está no outro lado do mundo. Os transportes, a saúde, são apenas alguns exemplos do fantástico que de imediato nos salta aos olhos. Mas é sem dúvida no mundo da comunicação que reside o mais impensável da evolução. De tal forma é a mudança a que me é dado assistir, que se me põe o problema: há trezentos anos, qualquer comum mortal que se desse ao trabalho de pensar, concluiria nas suas contas que daí a cem anos pouco significaria o progresso realizado; há duzentos anos, pressentir-se-ia que daí a cem talvez o homem tivesse dado passos importantes; há cem anos não havia dúvidas de que estavam na forja resoluções até ai não sonhadas pelo homem; hoje será um atrevimento pretendermos afirmar o que será a vida do homem daqui por cinquenta anos. Para a minha geração é simplesmente uma pergunta sem resposta.
Uma questão que se me coloca é do progresso em termos de humanidade, daquilo que somos ou significamos uns para os outros. Do que sou capaz de observar, ai o passo é o de uma formiga em confronto com o do elefante. Esse é o espectáculo que acho se me depara. Para além disso resta-me a reconfortante esperança de que a esse nível esteja iminente também a grande viragem que terá por base a eficácia dos processos educativos. Sim, seja por que preço seja, estou convencido que a minha geração é testemunha de uma rotunda curva da história.

Antonius

 
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luciusantonius
 
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