Poemas : 

O enterro do anónimo

 
Arrumou-se o esqueleto
Numa caixa toda feita de pau preto
E pôs-se-lhe um tecto
Capaz de tapar curvado e recto.

Encaixotaram-se os ossos numa urna,
De tez carregada e noturna,
Feita de comer a palidez soturna
E deitaram-na na mais funda furna.

Nunca ficaria reza que se contasse
Por tal carne quando finasse
Por falta de boca que cantasse
Grandes feitos ou coerente traço de face.

Anónimo, anónimo,
Tremendo desconhecido homónimo
De um apanhado de bocados, acrónimo,
Que morto, é de elogio, antónimo.

Valdevinoxis


A boa convivência não é uma questão de tolerância.


 
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Valdevinoxis
 
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Enviado por Tópico
RoqueSilveira
Publicado: 16/07/2009 22:55  Atualizado: 16/07/2009 22:55
Membro de honra
Usuário desde: 31/03/2008
Localidade: Braga
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 Re: O enterro do anónimo
P....que nunca vi um morto anónimo tão bem escrito que parece vivo...Abraço

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 16/07/2009 23:03  Atualizado: 16/07/2009 23:04
 Re: O enterro do anónimo
Fizeste aqui o enterro público de um anónimo, que posso ser eu ou tu até.
Vislumbrei os meus ossinhos na funda...
E quantos não descem anónimos à terra da escrita, tremendamente desconhecidos?
Tu não sei Manel, mas eu digo-te uma coisa, gostava de depois de morto ser reciclado e reaproveitado para sabão.
Acho romãntica a ideia de aqueles que lavaram antes as mãos, as lavassem depois comigo. Ou contigo, ou com todos os que nos são homónimos.
Reconheço-te talento neste texto, Saiote.

Enviado por Tópico
eduardas
Publicado: 17/07/2009 08:12  Atualizado: 17/07/2009 08:12
Colaborador
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Localidade: Lisboa
Mensagens: 3731
 Re: O enterro do anónimo
Anónimos somos todos na derradeira morte.

O funeral será diferente no elogio.

Eduarda