NON-SENSE
Manhã vinha
Brasil inteiro chovia
Meu corpo, meu grito zunia
Carne e osso na flôr da folia
A rudeza da raça, da força
Da garra, da era das máquinas
Na cama
Flagelo de noites
Que foram intactas
Castelos afora
Poesias de porre
De certos apuros
Paixão e surpresa
O cristal dos seus dentes
Seus olhos ardentes
De mel de pureza
Tão àvido brilho
De grande beleza
Do branco mais firme
Dos cisnes do filme
Suave, perfeito
Fiel realeza
Manhã é seu nome
Ou sexo, ou mistério,
Ou silêncio polido de brio
Um rosto inocente
Um jeito "non-sense"
Que a vida poliu
Possuir-te é sonho
Há algo por vir inesgotavelmente
Ansiosamente há algo beirando
Os porões da loucura
Espécie atenta
De certeza e agrura
Amar-te é um dom
É descobrir que a chuva
O mêdo e a vida
Tem sabor de folia
De paixão, de carnaval, de sol
Tempo inteiro.
CAMINHOS À VIDA
Vê' ... corceis
Pontos na relva
Reconhece-os?
Brincalhões, singelas lanças
Que fazes se não danças
Se não foges. Cansa-te?
Intima tua alma
Ao convívio da vida. Custa-te?
O revoar das flores
Embebece as cigarras
Percebe-as?
Feitias, longas, trigantes
Dê "Vivas" como antes
Um sonho adiante
É um ponto, um sinal de espera
Há coração que desespera
Se há vida nos trigais?
Andes'
Onde quer que fores
Alguém te acompanha
E onde quer que estiveres
Não estarás a sós
Haverá vida'
Pois sempre e em qualquer lugar
As àrvores florescem
Ah' E não te esqueces'.
ABSURDO
O absurdo que voce diz
É gostarmo-nos tolamente
O segredo em nossos olhos
Está na magia contida ao nos vêrmos
E não é segredo
É um misterio profundo
Um almíscar de paixão e medo
Um desejo, um ensejo, um grande amor
O absurdo que voce diz
É gostarmo-nos loucamente
O segredo de nossa loucura
É bebermos da mesma essência
E não é segredo
É um sonho profundo
Um medo inesperado do mundo
Um amar matematicamente calculado
Um absurdo quase preciso.
E não é segredo.
SINÓPSE
SINÓPSE
Enganar-me-ei
Sempre que possível
Presumo.
Pois toda solidão é pura
Todo estravazar é lívido
Toda imensidão é bela
Pois todo belo
É decalque do feio
Pois todo aquele que cultua a verdade
Contemplará só a realidade
Invocará e contará a todos
A essência simples do saber amar
Buscará na plenitude da vida
O saber de si e materializar
E espiritualizar-se
É tentar,
Presumo, enquanto vida
O eterno sentido do saber viver
Buscando e rebuscando o amor
No amor perdido
No amor defeito
Sofreguidão insana
No amor direito
No amor respeito
Da fúria, da alma, da justiça
Calmo, explosivo
Enganar-me-ei
Sempre que possível
Presumo.
VELHO MESTRE ANDARILHO
Nos chãos onde seus pés pisaram
A terra logo então tremeu
A planta que adormeceu seu sono
Viveu, depois morreu
Não existiu no canto do acauã
Algo que o fez tremer, ceder, fugir
Em seus braços fez jungir o grito
Do animal feroz, fugaz, viril
Dos mistérios de rios profundos
As pedras que o fez sonhar
Seus sonhos em doces segundos
Brilhando para o seu olhar
A desbancar todos segrêdos
D'um dia, d'um mês, d'um ano
Marchando sem sentir o mêdo
De parir o viver do morrer
Sonhando.
SEDUTOR AMIGO
(Para Leila Pinheiro)
Sedutor amigo
Dessa bandeira empunhada
Pelas mãos tão calejadas
A paixão
Sedutor amigo
Minha canção ecoa solta
Como um avião pousa na volta
Encanto livre da gaivota
Tenho na esperança
O seu furor
Marcas no corpo
Do seu amor
Tenso e febril
Marcas de choro
Desesperado anseio
No decorrer do tempo
Tornei-me sua
Raíz de planta
Solta na rua
Frágil e simples
Fases da lua
No meu sofrer
Não mudam
Nunca.
RE-CANTO
A vida de fato existe lá fora
Após o horizontal
O sol nasce quente ou frio
Acordando a cria do meu curral
O corpo gordo da moça dói
Aproxima-se a hora do parto
Se a chuva cair bem forte
Veremos frutos nascer no mato
Pego a viola ranjenta
E só toco coisas de fazer doer
Encravo no seio dela meus dentes
E a faço se derreter
A água molha seu corpo
Me ascende a concupiscência
Remédio nasce no mato
Da folha bonita de qualquer essência.
O OLHAR DO HOMEM
O olhar do homem
Quando olha o longe
É o olhar da fome é o desejo de voltar
Ao seu lugar onde nasceu
O olhar do homem
Quando olha o longe
É o olhar da sêde
Que guarda um segrêdo, no modo de olhar
E não revela nem por Deus
O homem enquanto é cego
Seu olhar é o bater do martelo
Sobre a sua verdade
Com a intensidade do branco da lua
O homem não se observa
O que ele é já vem do berço
Ele é o jeito que a vida situa
O olhar do homem
Quando vê o longe
É sua maior inquietação
É o rumo da estrada, é o coração
Querendo saltar do peito
Em cada jeito que o homem olhar
O olhar do homem
Não é o olhar da espera
É o olhar da fera querendo saltar
Do curso de um rio profundo
Pros céus, pros limites do mundo
É o olhar de quem quer desertar.
SENTINELA
Nessas ruas e vielas
Entre prisões e labirintos
Andando sinto
Que jamais encontrarei
O sentimento
Que eu sempre procurei
Tanto sonho e fantasia
Dia após dia de insussesso
Confesso a cidade te escondeu
Numa barreira a dividir voce e eu
Nessas praças, frias telas
A sentinela em que me encontro
É um ponto a mais de saudade
Rondando sem fé
Neste resto de cidade.
I N R I
Não é aí que eu te pus
Sob a minha cruz
Debruços sobre as mãos
Morrendo ou não
Sofrendo entre lástimas
Espinhos de pecados
Sentindo cruelmente
Tudo o que fez de errado
Não é assim que eu te fiz
Tão sem matiz
Triste fruto da emoção
Vivente ou não
A luz da sua alma
Não nega a sua mente
Fugir dessa escuridão
E viver urgente
Ah' Há frutos no pomar
Nascendo tão maduros
Pra te alimentar
Ah' Há aves a voar
Em torno da cidade
Querendo te salvar
Querendo te dizer
Não deixe de viver.