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A espantosa realidade das cousas
em 03/06/2008 23:40:00 (9551 leituras)
Fernando Pessoa

Alberto Caeiro

A Espantosa Realidade das Cousas


A espantosa realidade das cousas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada cousa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.
Basta existir para se ser completo.

Tenho escrito bastantes poemas.
Hei de escrever muitos mais. naturalmente.

Cada poema meu diz isto,
E todos os meus poemas são diferentes,
Porque cada cousa que há é uma maneira de dizer isto.

Às vezes ponho-me a olhar para uma pedra.
Não me ponho a pensar se ela sente.
Não me perco a chamar-lhe minha irmã.
Mas gosto dela por ela ser uma pedra,
Gosto dela porque ela não sente nada.
Gosto dela porque ela não tem parentesco nenhum comigo.

Outras vezes oiço passar o vento,
E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido.

Eu não sei o que é que os outros pensarão lendo isto;
Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem estorvo,
Nem idéia de outras pessoas a ouvir-me pensar;
Porque o penso sem pensamentos
Porque o digo como as minhas palavras o dizem.

Uma vez chamaram-me poeta materialista,
E eu admirei-me, porque não julgava
Que se me pudesse chamar qualquer cousa.
Eu nem sequer sou poeta: vejo.
Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho:
O valor está ali, nos meus versos.
Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade.




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Amor é fogo que arde sem se ver
em 30/05/2008 19:01:16 (103903 leituras)
Luís de Camões

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Luís de Camões

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Somos o sonho do Sol, do Ser que é: Deus
em 28/05/2008 16:12:38 (4692 leituras)
Fernando Pessoa

A outra
face da lua
não está oculta,
está aqui.
O que não vemos,
é o que agora
vivemos:
o que o homem ignora
é aquele que o sonha.
No lado escuro da lua
está o menino que dorme
e deseja que o mundo
brinque ao amor: acorde!


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Vida e Obra
em 22/05/2008 20:19:41 (9617 leituras)
Ary dos Santos

José Carlos Ary dos Santos (Lisboa, 7 de Dezembro de 1937 — 18 de Janeiro de 1984) foi um poeta e diseur de poesia português.

Oriundo de uma família da alta burguesia, José Carlos Ary dos Santos, conhecido no meio social e literário por Ary dos Santos, vê publicados aos 14 anos, através de familiares, alguns dos seus poemas, considerados maus pelo autor. No entanto, Ary dos Santos revelaria verdadeiramente as suas qualidades poéticas em 1954, com dezasseis anos de idade. É nessa altura que vê os seus poemas serem seleccionados para a Antologia do Prémio Almeida Garrett.

É então que Ary dos Santos abandona a casa da família, exercendo as mais variadas actividades para seu sustento económico, que passariam desde a venda de máquinas para pastilhas até à publicidade. Contudo, paralelamente, o poeta não cessa jamais de escrever e em 1963 dar-se-ia a sua estreia efectiva com a publicação do livro de poemas A Liturgia do Sangue (1963).

Em 1969 inicia-se na actividade política ao filiar-se no PCP, participando de forma activa nas sessões de poesia do então intitulado "canto livre perseguido".

Entretanto, concorre, sob pseudónimo, ao Festival RTP da Canção com os poemas Desfolhada (1969) e Tourada (1973), obtendo os primeiros prémios. É aliás através deste campo – o da música - que o poeta se tornaria conhecido entre o grande público.

Autor de mais de seiscentos poemas para canções, Ary dos Santos fez no meio muitos amigos. Gravou, ele próprio, textos ou poemas de e com muitos outros autores e intérpretes e ainda um duplo álbum contendo O Sermão de Santo António aos Peixes do Padre António Vieira.

À data da sua morte tinha em preparação um livro de poemas intitulado As Palavras das Cantigas, onde era seu propósito reunir os melhores poemas dos últimos quinze anos, e um outro intitulado Estrada da Luz - Rua da Saudade, que pretendia fosse uma autobiografia romanceada.

O poeta morre a 18 de Janeiro de 1984. Postumamente, o seu nome foi dado a um largo do Bairro de Alfama, descerrando-se uma lápide evocativa na casa da Rua da Saudade, onde viveu praticamente toda a sua vida.

Ainda em 1984, foi lançada a obra VIII Sonetos de Ary dos Santos, com um estudo sobre o autor de Manuel Gusmão e planeamento gráfico de Rogério Ribeiro, no decorrer de uma sessão na Sociedade Portuguesa de Autores, da qual o autor era membro.

Em 1988, Fernando Tordo editou o disco "O Menino Ary dos Santos" com os poemas escritos por Ary dos Santos na sua infância.



Bibliografia

1953 - Asas
1963 - A Liturgia do Sangue
1964 - Tempo da Lenda das Amendoeiras
1965 - Adereços, Endereços
1968 - Insofrimento In Sofrimento
1970 - Fotos-grafias
1970 - Ary por Si Próprio
1973 - Resumo
1974 - Poesia Política
1975 - Lllanto para Alfonso Sastre y Todos
1975 - As Portas que Abril Abriu
1977 - Bandeira Comunista
1979 - Ary por Ary
1979 - O Sangue das Palavras
1980 - Ary 80
1983 - Vinte Anos de Poesia
1984 - As Palavras das Cantigas
1984 - Estrada da Luz
1984 - Rua da Saudade


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Vida e Obra
em 20/05/2008 15:20:00 (4785 leituras)
António Ramos Rosa

Poeta e ensaísta português, nasceu em 17 de outubro de 1924 em Faro.

Quando a Segunda Guerra Mundial terminou, Ramos Rosa tomou o rumo para Lisboa, depois de ter passado a juventude em Faro. Na capital, vivendo intensamente a vitória dos Aliados, trabalhou no comércio, actividade que logo abandonou para se dedicar à poesia.

Nos anos cinquenta, um dos directores das revistas Árvore, Cassiopeia e Cadernos do Meio-Dia. Colaborou ainda com textos de crítica literária na Seara Nova e na Colóquio Letras, entre outras publicações periódicas.

Como poeta, estreou-se na colectânea O Grito Claro (1958). Estava criado o movimento da moderna poesia portuguesa.

Ramos Rosa era o poeta do presente absoluto, da «liberdade livre» e sobe todos os degraus da admiração europeia. Em Portugal é comparado com os grandes escritores nacionais. Urbano Tavares Rodrigues considerou-o como o empolgante poeta da coisas primordiais, da luz, da pedra e da água.

Em meados dos anos sessenta, Ramos Rosa radicou-se em Lisboa, onde publicou Viagem Através Duma Nebulosa (1960). Um dos mais fecundos poetas portugueses da contemporaneidade, a sua produção reflecte uma evolução do subjectivismo, em relação à objectividade. Reflectem-se nela variadas tendências, desde certas formas experimentais até a um neobarroquismo.

A sua escrita, caracterizada por uma grande originalidade e riqueza de imagens tácteis e visuais, testemunha muitas vezes uma fusão com a natureza, uma busca de unidade universal em que o humano participa e se integra no mundo, estabelecendo uma linha de continuidade entre si e os objectos materiais, numa afirmação de vida e sensualidade.

Nos seus textos, está frequentemente presente uma reflexão sobre o próprio acto da escrita e a natureza da criação poética, a questão do dizível e do indizível.

Ramos Rosa, também tradutor, escreveu dezenas de volumes de poesia, entre os quais Voz Inicial (1960), Sobre o Rosto da Terra (1961), Terrear (1964), A Constituição do Corpo (1969), A Pedra Nua (1972), Ciclo do Cavalo (1975), Incêndio dos Aspectos (1980), Volante Verde (1986, Grande Prémio de Poesia Inasset), Acordes (1989, Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores), Clamores (1992), Dezassete Poemas (1992), Lâmpadas Com Alguns Insectos (1993), O Teu Rosto (1994), O Navio da Matéria (1994), Três (1995), As Armas Imprecisas (1992, Delta, Pela Primeira Vez (1996) e A Mesa do Vento (1997, primeiramente editado em França), Pátria Soberana e Nova Ficção (2000).
Entre os seus ensaios, contam-se Poesia, Liberdade Livre (1962), A Poesia Moderna e a Interrogação do Real (1979), Incisões Oblíquas (1987), A Parede Azul (1991) e As Palavras (2001).

Tem recebido numerosos prémios nacionais e estrangeiros, entre os quais o Prémio Pessoa, em 1988. É geralmente tido como um dos grandes poetas portugueses contemporâneos.
Para Ramos Rosa, escrever é, sempre, a necessidade de respirar as palavras e de às palavras fornecer o frémito do ser, os pulmões do sonho, e, com elas, criar a dádiva do poeta.

Em 2001, o poeta lançou Antologia Poética, com prefácio e selecção de Ana Paula Coutinho Mendes

Prêmios:

Como escritor

-Prémio da Bienal de Poesia de Liége, 1991
-Prémio Jean Malrieu para o melhor livro de poesia traduzido em França, 1992

Obra

-Prémio Fernando Pessoa, da Editora Ática (Segundo Lugar ex-aequo), 1958 (Viagem através duma nebulosa)
-Prémio Nacional de Poesia, da Secretaria de Estado de Informação e Turismo (recusado pelo autor), 1971 (Nos seus olhos de silêncio)
-Prémio Literário da Casa da Imprensa (Prémio Literário), 1972 (A pedra nua)
-Prémio da Fundação de Hautevilliers para o Diálogo de Culturas (Prémio de Tradução), 1976 (Algumas das Palavras: antologia de poesia de Paul Éluard)
-Prémio P.E.N. Clube Português de Poesia, 1980 (O incêndio dos aspectos)
-Prémio Nicola de Poesia, 1986 (Volante verde)
-Prémio Jacinto do Prado Coelho, do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários, 1987 (Incisões oblíquas)
-Grande Prémio de Poesia APE/CTT, 1989 (Acordes)
-Prémio Municipal Eça de Queiroz, da Câmara Municipal de Lisboa (Prémio de Poesia), 1992 (As armas imprecisas)
-Grande Prémio Sophia de Mello Breyner Andresen (Prémio de Poesia), São João da Madeira, 2005 (O poeta na rua. Antologia portátil)

-Obra

1958 - O Grito Claro
1960 - Viagem Através duma Nebulosa
1961 - Voz Inicial
1961 - Sobre o Rosto da Terra
1963 - Ocupação do Espaço
1964 - Terrear
1966 - Estou Vivo e Escrevo Sol
1969 - A Construção do Corpo
1970 - Nos Seus Olhos de Silêncio
1972 - A Pedra Nua
1974 - Não Posso Adiar o Coração (vol.I, da Obra Poética)
1975 - Animal Olhar (vol.II, da Obra Poética)
1975 - Respirar a Sombra (vol.III, da Obra Poética)
1975 - Ciclo do Cavalo
1977 - Boca Incompleta
1977 - A Imagem
1978 - As Marcas no Deserto
1978 - A Nuvem Sobre a Página
1979 - Figurações
1979 - Círculo Aberto
1980 - O Incêndio dos Aspectos
1980 - Declives
1980 - Le Domaine Enchanté
1980 - Figura: Fragmentos
1980 - As Marcas do Deserto
1981 - O Centro na Distância
1982 - O Incerto Exacto
1983 - Quando o Inexorável
1983 - Gravitações
1984 - Dinâmica Subtil
1985 - Ficção
1985 - Mediadoras
1986 - Volante Verde
1986 - Vinte Poemas para Albano Martins
1986 - Clareiras
1987 - No Calcanhar do Vento
1988 - O Livro da Ignorância
1988 - O Deus Nu(lo)
1989 - Três Lições Materiais
1989 - Acordes
1989 - Duas Águas, Um Rio (colaboração com Casimiro de Brito)
1990 - O Não e o Sim
1990 - Facilidade do Ar
1990 - Estrias
1991 - A Rosa Esquerda
1991 - Oásis Branco
1992 - Pólen- Silêncio
1992 - As Armas Imprecisas
1992 - Clamores
1992 - Dezassete Poemas
1993 - Lâmpadas Com Alguns Insectos
1994 - O Teu Rosto
1994 - O Navio da Matéria
1995 - Três
1996 - Delta
1996 - Figuras Solares

-Revistas em que colaborou

1952 -1954 - Árvore
1956 - Cassiopeia
1958 -1960 - Cadernos do Meio-dia
Esprit
Europa Letteraria
Colóquio-Letras
Ler
O Tempo e o Modo
Raiz & Utopia
Seara Nova
Silex
Revista Vértice

-Jornais em que colaborou

A Capital
Artes & Letras
Comércio do Porto
Diário de Lisboa
Diário de Notícias
Diário Popular
O Tempo



*pesquisa realizada em sites da internet.

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Vida e Obra
em 12/05/2008 14:50:00 (13126 leituras)
Clarice Lispector

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..." Clarice Lispector.

1920

- Clarice Lispector nasce em Tchetchelnik, na Ucrânia, no dia 10 de dezembro, tendo recebido o nome de Haia Lispector, terceira filha de Pinkouss e de Mania Lispector. Seu nascimento ocorre durante a viagem de emigração da família em direção à América.

1922

- Seu pai consegue, em Bucareste, um passaporte para toda a família no consulado da Rússia. Era fevereiro quando foram para a Alemanha e, no porto de Hamburgo, embarcam no navio "Cuyaba" com destino ao Brasil. Chegam a Maceió em março desse ano, sendo recebidos por Zaina, irmã de Mania, e seu marido e primo José Rabin, que viabilizara a entrada da biografada e de sua família no Brasil mediante uma "carta de chamada". Por iniciativa de seu pai, à exceção de Tania — irmã, todos mudam de nome: o pai passa a se chamar Pedro; Mania, Marieta; Leia — irmã, Elisa; e Haia, em Clarice. Pedro passa a trabalhar com Rabin, já um próspero comerciante.

1925

- A família muda-se para Recife, Pernambuco, onde Pedro pretende construir uma nova vida. A doença de sua mãe, Marieta, que ficou paralítica, faz com que sua irmã Elisa se dedique a cuidar de todos e da casa.

1928

- Passa a freqüentar o Grupo Escolar João Barbalho, naquela cidade, onde aprende a ler. Durante sua infância a família passou por sérias crises financeiras.

1930

- Morre a mãe de Clarice no dia 21 de setembro. Nessa época, com nove anos, matricula-se no Collegio Hebreo-Idisch-Brasileiro, onde termina o terceiro ano primário. Estuda piano, hebraico e iídiche. Uma ida ao teatro a inspira e ela escreve "Pobre menina rica", peça em três atos, cujos originais foram perdidos. Seu pai resolve adotar a nacionalidade brasileira.

1931

- Inscreve-se para o exame de admissão no Ginásio Pernambucano. Já escrevia suas historinhas, todas recusadas pelo Diário de Pernambuco, que àquela época dedicava uma página às composições infantis. Isso se devia ao fato de que, ao contrário das outras crianças, as histórias de Clarice não tinham enredo e fatos — apenas sensações. Convive com inúmeros primos e primas.

1932

- É aprovada no exame de admissão e, junto com sua irmã Tania e sua prima Bertha, ingressa no tradicional Ginásio Pernambucano, fundado em 1825. Passa a visitar a livraria do pai de uma amiga. Lê "Reinações de Narizinho", de Monteiro Lobato, que pegou emprestado, já que não podia comprá-lo.

1933

- Seu pai prospera e mudam-se para casa própria, no mesmo bairro.

1934

- Pedro, pai de Clarice, em Dezembro desse ano, decide transferir-se para a cidade do Rio de Janeiro.

1935

- Viaja para o Rio, em companhia de sua irmã Tania e de seu pai, na terceira classe do vapor inglês "Highland Monarch". Vão morar numa casa alugada perto do Campo de São Cristóvão. Ainda nesse ano, mudam-se para uma casa na Tijuca, na rua Mariz e Barros. No colégio Sílvio Leite, na mesma rua de sua casa, cursa o quarta série ginasial. Lê romances adocicados, próprios para sua idade.

1936

- Termina o curso ginasial. Inicia-se na leitura de livros de autores nacionais e estrangeiros mais conhecidos, alugados em uma biblioteca de seu bairro. Conhece os trabalhos de Rachel de Queiroz, Machado de Assis, Eça de Queiroz, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Dostoiévski e Júlio Diniz.

1937

- Matricula-se no curso complementar (dois últimos anos do curso secundário) visando o ingresso na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro.

1938

- Transfere-se para o curso complementar do colégio Andrews, na praia de Botafogo. Às voltas com dificuldades financeiras, dá aulas particulares de português e matemática. A relação professor/aluno seria um dos temas preferidos e recorrentes em toda a sua obra — desde o primeiro romance: Perto do Coração Selvagem. Ao mesmo tempo, aprende datilografia e faz inglês na Cultura Inglesa.

1939

- Inicia seus estudos na Faculdade Nacional de Direito. Faz traduções de textos científicos para revistas em um laboratório onde trabalha como secretária. Trabalha, também como secretária, em um escritório de advocacia.

1940

- Seu conto, Triunfo, é publicado em 25 de maio no semanário "Pan", de Tasso da Silveira. Em outubro desse ano, é publicado na revista "Vamos Ler!", editada por Raymundo Magalhães Júnior, o conto Eu e Jimmy. Esses trabalhos não fazem parte de nenhuma de suas coletâneas. Após a morte de seu pai, no dia 26 de agosto, a escritora — talvez motivada por esse acontecimento — escreve diversos contos: A fuga, História interrompida e O delírio. Esses contos serão publicados postumamente em A bela e a fera, de 1979. Passa a morar com a irmã Tania, já casada, no bairro do Catete. Consegue um emprego de tradutora no temido Departamento de Imprensa e Propaganda - DIP, dirigido por Lourival Fontes. Como não havia vaga para esse trabalho, Clarice ganha o lugar de redatora e repórter da Agência Nacional. Inicia-se, ai, sua carreira de jornalista. No novo emprego, convive com Antonio Callado, Francisco de Assis Barbosa, José Condé e, também, com Lúcio Cardoso, por quem nutre durante tempos uma paixão não correspondida: o escritor era homossexual. Com seu primeiro salário, entra numa livraria e compra "Bliss - Felicidade", de Katherine Mansfield, com tradução de Erico Verissimo, pois sentiu afinidade com a escritora neozelandesa.

1941

- Em 19 de janeiro, publica a reportagem "Onde se ensinará a ser feliz", no jornal "Diário do Povo", de Campinas (SP), sobra a inauguração de um lar para meninas carentes realizada pela primeira-dama Darcy Vargas. Além de textos jornalísticos, continua a publicar textos literários. Cursando o terceiro ano de direito, colabora com a revista dos estudantes de sua faculdade, "A Época", com os artigos Observações sobre o fundamento do direito de punir e Deve a mulher trabalhar? Passa a freqüentar o bar "Recreio", na Cinelândia, centro do Rio de Janeiro, ponto de encontro de autores como Lúcio Cardoso, Vinicius de Moraes, Rachel de Queiroz, Otávio de Faria, e muitos mais.

1942

- Começa a namorar com Maury Gurgel Valente, seu colega de faculdade. Com 22 anos de idade, recebe seu primeiro registro profissional, como redatora do jornal "A Noite". Lê Drummond, Cecília Meireles, Fernando Pessoa e Manuel Bandeira. Realiza cursos de antropologia brasileira e psicologia, na Casa do Estudante do Brasil. Nesse ano, escreve seu primeiro romance, Perto do coração selvagem.

1943

- Casa-se com o colega de faculdade Maury Gurgel Valente e termina o curso de Direito. Seu marido, por concurso, ingressa na carreira diplomática.

1944

- Muda-se para Belém do Pará (PA), acompanhando seu marido. Fica por lá apenas seis meses. Seu livro recebe críticas favoráveis de Guilherme Figueiredo, Breno Accioly, Dinah Silveira de Queiroz, Lauro Escorel, Lúcio Cardoso, Antonio Cândido e Ledo Ivo, entre outros. Álvaro Lins publica resenha com reparos ao livro mesmo antes de sua publicação, baseado na leitura dos originais. Qualifica o livro de "experiência incompleta". Há os que pretendem não compreender o romance, os que procuram influências — de Virgínia Wolf e James Joyce, quando ela nem os tinha lido — e ainda os que invocam o temperamento feminino. Nas palavras de Lauro Escorel, as características do romance revelam uma "personalidade de romancista verdadeiramente excepcional, pelos seus recursos técnicos e pela força da sua natureza inteligente e sensível." O casal volta ao Rio e, em 13/07/44, muda-se para Nápoles, em plena Segunda Guerra Mundial, onde o marido da escritora vai trabalhar. Já na saída do Brasil, Clarice mostra-se dividida entre a obrigação de acompanhar o marido e ter de deixar a família e os amigos. Quando chega à Itália, depois de um mês de viagem, escreve: "Na verdade não sei escrever cartas sobre viagens, na verdade nem mesmo sei viajar." Termina seu segundo romance, O lustre. Recebe o prêmio Graça Aranha com Perto do coração selvagem, considerado o melhor romance de 1943. Conhece Rubem Braga, então correspondente de guerra do jornal "Diário Carioca".

1945

- Dá assistência a brasileiros feridos na guerra, trabalhando em hospital americano. O pintor italiano Giorgio De Chirico pinta-lhe um retrato. Viaja pela Europa e conhece o poeta Giuseppe Ungaretti. O lustre é publicado no Brasil pela Livraria Agir Editora.

1946

- Após o lançamento do livro, Clarice vem ao Brasil como correio diplomático do Ministério das Relações Exteriores, aqui ficando por quase três meses. Nessa época, apresentado por Rubem Braga, conhece Fernando Sabino que a introduz a Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e, posteriormente, a Hélio Pellegrino. De volta à Europa, vai morar com a família em Berna, Suíça, para onde seu marido havia sido designado como segundo-secretário. Sua correspondência com amigos brasileiros a mantinha a par das novidades, em especial as trocadas com Fernando Sabino. A troca de cartas com o escritor, quase que diariamente, duraria até janeiro de 1969. A convite, passam as festas de fim de ano com Bluma e Samuel Wainer, em Paris.

1947

- Em carta às irmãs, em janeiro de 47, de Paris, Clarice expõe seu estado de inadaptação:"Tenho visto pessoas demais, falado demais, dito mentiras, tenho sido muito gentil. Quem está se divertindo é uma mulher que eu detesto, uma mulher que não é a irmã de vocês. É qualquer uma." Em carta a Lúcio Cardoso, que havia lhe enviado seu livro "Anfiteatro", demonstra sua admiração pelas personagens femininas da obra.

1948

- Clarice fica grávida de seu primeiro filho. Para ela, a vida em Berna é de miséria existencial. A Cidade Sitiada, após três anos de trabalho, fica pronto. Terminado o último capítulo, dá à luz. Nasce então um complemento ao método de trabalho. Ela escreve com a máquina no colo, para cuidar do filho. Na crônica "Lembrança de uma fonte, de uma cidade", Clarice afirma que, em Berna, sua vida foi salva por causa do nascimento do filho Pedro, ocorrido em 10/09/1948, e por ter escrito um dos livros "menos gostados" (a editora Agir recusara a publicação).

1949

- Clarice volta ao Rio. Seu marido é removido para a Secretaria de Estado, no Rio de Janeiro. A cidade sitiada é publicado pela editora "A Noite". O livro não obtém grande repercussão entre o público e a crítica.

1950

- Escrevendo contos e convivendo com os amigos (Sabino, Otto, Lúcio e Paulo M. Campos), vê chegar a hora de partir: seguindo os passos de seu marido, retorna à Europa, onde mora por seis meses na cidade de Torquay, Inglaterra.

Sofre um aborto espontâneo em Londres. É atendida pelo vice-cônsul na capital inglesa, João Cabral de Melo Neto.

1951

- A escritora retorna ao Rio de Janeiro, em março. Publica uma seleta com seis contos na coleção "Cadernos de cultura", editada pelo Ministério da Educação e Saúde. Falece sua grande amiga Bluma, ex-esposa de Samuel Wainer.

1952
- Cola grau na faculdade de direito, depois de muitos adiamentos. Volta a trabalhar em jornais, no período de maio a outubro, assinando a página "Entre Mulheres", no jornal "Comício", sob o pseudônimo de "Tereza Quadros". Atendeu a um pedido do amigo Rubem Braga, um dos fundadores do jornal. Nesse setembro, já grávida, embarca para a capital americana onde permanecerá por oito anos. Clarice inicia o esboço do romance A veia no pulso, que viria a ser A Maçã no Escuro, livro publicado em 1961.

1953

- Em 10 de fevereiro, nasce Paulo, seu segundo filho. Ela continua a escrever A Maçã no Escuro, em meio a conflitos domésticos e interiores. Mãe, Clarice Lispector divide seu tempo entre os filhos, A Maçã no Escuro, os contos de Laços de Família e a literatura infantil. Nos Estados Unidos, Clarice conhece o renomado escritor Erico Veríssimo e sua esposa Mafalda, dos quais torna-se grande amiga. O escritor gaúcho e sua esposa são escolhidos para padrinhos de Paulo. Não tem sucesso seu projeto de escrever uma crônica semanal para a revista "Manchete". Tem a agradável notícia de que seu romance Perto do coração selvagem seria traduzido para o francês.

1954

- É lançada a primeira edição francesa de Perto do coração selvagem, pela Editora Plon, com capa de Henri Matisse, após inúmeras reclamações da escritora sobre erros na tradução. Em julho, com os filhos, viaja para o Brasil, aqui ficando até setembro. De volta aos Estados Unidos, interrompe a elaboração de A maçã no escuro e se dedica, por cinco meses, a escrever seis contos encomendados por Simeão Leal.

1955

- Retorna a escrever o novo romance e contos. Sabino, que leu os seis contos feitos sob encomenda, os acho "obras de arte".

1956

- Termina de escrever A Maçã no Escuro (até então com o titulo de A veia no pulso). Érico Veríssimo e família retornam ao Brasil, não sem antes aceitarem serem os padrinhos de Pedro e Paulo. Entre os escritores, inicia-se uma vasta correspondência. A escritora e filhos vêm passar as férias no Brasil e Clarice aproveita para tentar a publicação de seu novo romance e os novos contos. Apesar de todo o empenho de Fernando Sabino e Rubem Braga, os livros não são editados. A escritora dá sinais de sua indisposição para com o tipo de vida que leva.

1957

- Rompe unilateralmente o contrato com Simeão Leal e autoriza Sabino e Braga a encaminharem seus contos — nessa altura em número de quinze — para serem publicados no "Suplemento Cultural" do jornal "O Estado de São Paulo". Seu casamento vive momentos de tensão.

1958

- Conhece e se torna amiga da pintora Maria Bonomi. É convidada a colaborar com a revista "Senhor", prevista para ser lançada no início do ano seguinte. Erico Verissimo escreve informando estar autorizado a editar seu romance e, também, seus contos pela Editora Globo, de Porto Alegre. 1.000 exemplares — dos mais de 1.700 remanescentes — de "Près du coeur sauvage" são incinerados, por falta de espaço de armazenamento. O casamento de Clarice dá sinais de seu final.

1959

- Separa-se do marido e, em julho, regressa ao Brasil com seus filhos. Seu livro continua inédito. A escritora resolve comprar o apartamento onde está residindo, no bairro do Leme, e, para isso, busca aumentar seus ganhos. Sob o pseudônimo de "Helen Palmer", inicia, em agosto, uma coluna no jornal "Correio da Manhã", intitulada "Correio feminino — Feira de utilidades".

1960

- Publica, finalmente, Laços de Família, seu primeiro livro de contos, pela editora Francisco Alves. Começa a assinar a coluna "Só para Mulheres", como "ghost-writer" da atriz Ilka Soares, no "Diário da Noite", a convite do jornalista Alberto Dines. Assina, com a Francisco Alves, novo contrato para a publicação de A maçã no escuro. Torna-se amiga da escritora Nélida Piñon.

1961

- Publica o romance A maçã no escuro. Recebe o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, por Laços de família.

1962

- Passa a assinar a coluna "Children's Corner", da seção "Sr. & Cia.", onde publica contos e crônicas. Visita, com os filhos, seu ex-marido que se encontra na Polônia. Recebe o prêmio Carmen Dolores Barbosa (oferecido pela senhora paulistana de mesmo nome), por A maçã no escuro, considerado o melhor livro do ano.

1963

- A convite, profere no XI Congresso Bienal do Instituto Internacional de Literatura Ibero-Americana, realizado em Austin - Texas, conferência sobre o tema "Literatura de vanguarda no Brasil. Conhece Gregory Rabassa, mais tarde tradutor para o inglês de A maçã no escuro. A paixão segundo G. H. é escrito em poucos meses, sendo entregue à Editora do Autor, de Sabino e Braga, para publicação. Compra um apartamento em construção no bairro do Leme.

1964

- Publica o livro de contos A legião estrangeira e o romance A Paixão Segundo G. H., ambos pela Editora do Autor. Em dezembro, o juiz profere a sentença que poria fim ao processo de separação de Clarice e Maury.

1965

- Em maio, muda-se para o apartamento comprados em 1963. Sua obra passa a ser vista com outros olhos — pela crítica e pelo público leitor — após A paixão segundo G. H. Resultado de uma seleta de trechos de seus livros, adaptados por Fauzi Arap, é encenada no Teatro Maison de France o espetáculo Perto do coração selvagem, com José Wilker, Glauce Rocha e outros. Dedica-se à educação dos filhos e com a saúde de Pedro, que apresenta um quadro de esquizofrenia, exigindo cuidados especiais. Apesar de traduzida para diversos idiomas e da republicação de diversos livros, a situação financeira de Clarice é muito difícil.

1966

- Na madrugada de 14 de setembro a escritora dorme com um cigarro aceso , provocando um incêndio. Seu quarto ficou totalmente destruído. Com inúmeras queimaduras pelo corpo, passou três dias sob o risco de morte — e dois meses hospitalizada. Quase tem sua mão direita — a mais afetada — amputada pelos médicos. O acidente mudaria em definitivo a vida de Clarice.

1967

- As inúmeras e profundas cicatrizes fazem com que a escritora caia em depressão, apesar de todo o apoio recebido de seus amigos. Não foi só um ano de acontecimentos ruins. Começa a publicar em agosto — a convite de Dines — crônicas no "Jornal do Brasil", trabalho que mantém por seis anos. Lança o livro infantil O mistério do coelho pensante, pela José Álvaro Editor. Em dezembro, passa a integrar o Conselho Consultivo do Instituto Nacional do Livro.

1968

- Em maio, o livro O mistério do coelho pensante é agraciado com a "Ordem do Calunga", concedido pela Campanha Nacional da Criança. Entrevista personalidades para a revista "Manchete" na seção "Diálogos possíveis com Clarice Lispector". Participa da manifestação contra a ditadura militar, em junho, chamada "Passeata dos 100 mil". Morrem seus amigos e escritores Lúcio Cardoso e Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta). É nomeada assistente de administração do Estado. Profere palestras na Universidade Federal de Minas Gerais e na Livraria do Estudante, em Belo Horizonte. Publica A mulher que matou os peixes, outro livro infantil, ilustrado por Carlos Scliar.

1969

- Publica seu "hino ao amor": Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, pela Editora Sabiá. O romance ganha o prêmio "Golfinho de Ouro", do Museu da Imagem e do Som. Viaja à Bahia onde entrevista para a "Manchete" o escritor Jorge Amado e os artistas Mário Cravo e Genaro. Em 14/08 é aposentada pelo INPS - Instituto Nacional de Previdência Social. Seu filho Paulo, mora nos Estados Unidos desde janeiro, num programa de intercâmbio cultural. Seu irmão Pedro, em tratamento psiquiátrico, esteve internado por um mês, em junho.

1970

- Começa a escrever um novo romance, com o título provisório de Atrás do pensamento: monólogo com a vida. Mais adiante, é chamado Objeto gritante. Foi lançado com o título definitivo de Água viva. Conhece Olga Borelli, de que se tornaria grande amiga.

1971

- Publica a coletânea de contos Felicidade clandestina, volume que inclui O ovo e a galinha, escrito sob o impacto da morte do bandido Mineirinho, assassinado pela polícia com treze tiros, no Rio de Janeiro. Há, também, um conjunto de escritos em que rememora a infância em Recife. Encarrega o professor Alexandre Severino da tradução, para o inglês, de Atrás do pensamento: monólogo com a vida. Dez de seus contos já publicados constam de "Elenco de cronistas modernos", lançado pela Editora Sabiá.

1972

- Retoma a revisão de Atrás do pensamento, com o qual não estava satisfeita. Faz inúmeras alterações no texto e passa a chamá-lo Objeto gritante. Repensando o romance, procura distrair-se. Durante um mês posa para o pintor Carlos Scliar, em Cabo Frio (RJ).

1973

- Publica o romance Água viva, após três anos de elaboração, pela Editora Artenova, que lançaria também, nesse ano, A imitação da rosa, quinze contos já publicados anteriormente em outras coletâneas. Alberto Dines, em carta à escritora, diz sobre Água viva: "[...] É menos um livro-carta e, muito mais, um livro música. Acho que você escreveu uma sinfonia". Viaja à Europa com a amiga Olga Borelli. Clarice deixa de colaborar com o "Jornal do Brasil", face à demissão de Alberto Dines, no mês de dezembro.

1974

- Para manter seu nível de renda, aumenta sua atividade como tradutora. Verte, entre outros, "O retrato de Dorian Gray", de Oscar Wilde, adaptado para o público juvenil, pela Ediouro. Publica, pela José Olympio Editora, outro livro infantil, A vida íntima de Laura e dois livros de contos, pela Artenova: A via crucis do corpo e Onde estivestes de noite. Uma curiosidade: a primeira edição de Onde estivestes de noite foi recolhida porque foi colocado, erroneamente, um ponto de interrogação no título. Seu cão, Ulisses, lhe morde o rosto, fazendo com que se submeta a cirurgia plástica reparadora reparadora realizada por seu amigo Dr. Ivo Pitanguy. Lê, em Brasília (DF), a convite da Fundação Cultural do Distrito Federal, a conferência "Literatura de vanguarda no Brasil", que já apresentara no Texas. Participa, em Cali — Colômbia, do IV Congresso da Nova Narrativa Hispano-americana. Seu filho, Paulo, vai morar sozinho, em um apartamento próximo ao da escritora. Pedro vai morar com o pai, em Montevidéu — Uruguai.

1975

- Tendo como companheira de viagem a amiga Olga Borelli, participa do I Congresso Mundial de Bruxaria, em Bogotá, Colômbia. No dia de sua apresentação sente-se indisposta e pede a alguém que leia o conto O ovo e a galinha, não apresentando a fala sobre a magia que havia preparado para a introdução da leitura. Muito embora minimizada, essa participação tem muito a ver com as palavras ditas por Otto Lara Resende, conhecido escritor, em um bate-papo com José Castello: "Você deve tomar cuidado com Clarice. Não se trata de literatura, mas de bruxaria." Otto se baseava em estudos feitos por Claire Varin, professora de literatura canadense que escreveu dois livros sobre a biografada. Segundo ela, só é possível ler Clarice tomando seu lugar — sendo Clarice. "Não há outro caminho", ela garante. Para corroborar sua tese, Claire cita um trecho da crônica A descoberta do mundo, onde a escritora diz: "O personagem leitor é um personagem curioso, estranho. Ao mesmo tempo que inteiramente individual e com reações próprias, é tão terrivelmente ligado ao escritor que na verdade ele, o leitor, é o escritor." Traduz romances, como "Luzes acesas", de Bella Chagall, "A rendeira", de Pascal Lainé, e livros policiais de Agatha Christie. Ao longo da década, faz adaptações de obras de Julio Verne, Edgar Allan Poe, Walter Scott e Jack London e Ibsen. Lança Visão do esplendor, com trabalhos já publicados na coluna "Children's Corner", da revista "Senhor" e também no "Jornal do Brasil". Publica De corpo inteiro, com algumas entrevistas que fizera anteriormente para revistas cariocas. É muito elogiada quando visita Belo Horizonte, fato que a deixa contrariada. Passa a dedicar-se à pintura. Morre, dia 28 de novembro, seu grande amigo e compadre Erico Verissimo. Reúne trabalhos de Andréa Azulay num volume artesanal ilustrado por Sérgio Mata, intitulado "Meus primeiros contos". Andréa tinha, então, dez anos de idade.

1976

- Seu filho Paulo casa-se com Ilana Kauffmann. Participa, em Buenos Aires, Argentina, da Segunda Exposición — Feria Internacional del Autor al Lector, onde recebe muitas homenagens. É agraciada, em abril, com o prêmio concedido pela Fundação Cultural do Distrito Federal, pelo conjunto de sua obra. Grava depoimento no Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro, em outubro, conduzido por Affonso Romano de Sant'Anna, Marina Colasanti e por João Salgueiro, diretor do MIS. Em maio, corre o boato de que a escritora não mais receberia jornalistas. José Castello, biógrafo e escritor, nessa época trabalhando no jornal "O Globo", mesmo assim telefona e consegue marcar um encontro. Após muitas idas e vindas é recebido. Trava então o seguinte diálogo com Clarice:

J.C. "— Por que você escreve?

C.L. "— Vou lhe responder com outra pergunta: — Por que você bebe água?"

J.C. "— Por que bebo água? Porque tenho sede."

C.L. "— Quer dizer que você bebe água para não morrer. Pois eu também: escrevo para me manter viva."

Enquanto escreve A hora da estrela com a a ajuda da amiga Olga, toma notas para o novo romance, Um sopro de vida. Revê Recife e visita parentes. Em dezembro, "Fatos e Fotos Gente", revista do grupo "Manchete", publica entrevista feita com a artista Elke Maravilha, a primeira de uma série que se estenderia até outubro de 1977.

1977

- A revista "Fatos e Fotos Gente" publica, em janeiro, entrevista feita pela escritora com Mário Soares, primeiro-ministro de Portugal. O jornal "Última Hora" passa a publicar, a partir de fevereiro, semanalmente, as suas crônicas. Ainda nesse mês, é entrevistada pelo jornalista Júlio Lerner para o programa "Panorama Especial", TV Cultura de São Paulo, com o compromisso de só ser transmitida após a sua morte. Escreve um livro para crianças, que seria publicado em 1978, sob o título Quase de verdade. Escreve, ainda, doze histórias infantis para o calendário de 1978 da fábrica de brinquedos "Estrela", intitulado Como nasceram as estrelas. Vai à França e retorna inesperadamente. Publica A hora da estrela, pela José Olympio, com introdução — "O grito do silêncio" — de Eduardo Portella. Esse livro seria adaptado para o cinema, em 1985, por Suzana Amaral. A editora Ática lança nova edição de A legião estrangeira, com prefácio de Affonso Romano de Sant'Anna. Clarice morre, no Rio, no dia 9 de dezembro de 1977, um dia antes do seu 57° aniversário vitimada por uma súbita obstrução intestinal, de origem desconhecida que, depois, veio-se a saber, ter sido motivada por um adenocarcinoma de ovário irreversível. O enterro aconteceu no Cemitério Comunal Israelita, no bairro do Caju, no dia 11. Vai ao ar, pela TV Cultura, no dia 28/12, a entrevista gravada em fevereiro desse ano.

1978

- Três livros póstumos são publicados: o romance Um sopro de vida — Pulsações, pela Nova Fronteira, a partir de fragmentos em parte reunidos por Olga Borelli; o de crônicas Para não esquecer, e o infantil, Quase de verdade, em volume autônomo, pela Ática. Para não esquecer é composto de crônicas que haviam sido publicadas na segunda parte do livro A legião estrangeira, em 1964, que compunham a seção "Fundo de Gaveta" do citado livro. A hora da estrela é agraciada com o prêmio Jabuti de "Melhor Romance". A paixão sendo G. H. é publicada na França, com tradução de Claude Farny.

1979

- É publicado A bela e a fera, pela Nova Fronteira, contendo contos publicados esparsamente em jornais e revistas. Estréia, no teatro Ruth Escobar, em São Paulo, Um sopro de vida, baseado em livro de mesmo nome, com adaptação de Marilena Ansaldi e direção de José Possi Neto.

1981

- "Clarice Lispector — Esboço para um retrato", de Olga Borelli, é lançado pela Nova Fronteira.

1984

- Reunindo a quase totalidade de crônicas publicadas no Jornal do Brasil, no período de 1967 a 1973, é lançado "A descoberta do mundo", organização de Paulo Gurgel Valente, filho da autora. A Éditions des Femmes, da França, lança, em sua coleção "La Bibliotèque des voix", fita cassete com trechos de La passion selon G. H., lidos pela atríz Anouk Aimée.

1985

- A hora da estrela recebe dois prêmios na 36ª edição do Festival de Berlim: da Confederação Internacional de Cineclubes — Cicae, e da Organização Católica Internacional do Cinema e do Audiovisual — Ocic. O longa-metragem de mesmo nome, dirigido por Suzana Amaral, com roteiro de Alfredo Oros também é premiado: Marcélia Cartaxo recebe o Urso de Prata de "Melhor Atriz".

Outros acontecimentos

Os 10 anos da morte da escritora são lembrados com diversas homenagens em sua memória. É aberto ao público o conjunto de documentos que viria a constituir o Arquivo Clarice Lispector do Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa - FCRB, no Rio de Janeiro, constituído de documentos doados por Paulo Gurgel Valente.

Em 1990, a Francisco Alves Editora inicia a reedição da obra da escritora. A paixão segundo G. H. é encenada na capital francesa, no teatro Gérard Philippe, em montagem de Alain Neddam. Diane E. Marting, em 1993, publica "Clarice Lispector. A Bio-Bibliography", pela Westport: Greenwood Press, nos Estados Unidos. Em 1996, é lançada a antologia "Os melhores contos de Clarice Lispector", pela editora Global.

Estréia no Rio de Janeiro "Clarice — Coração selvagem", adaptado e dirigido por Maria Lúcia Lima, com Aracy Balabanian, em 1998.

No ano seguinte, "Que mistérios tem Clarice", adaptado por Luiz Arthur Nunes e Mário Piragibe estréia no teatro N. E. X. T.

Fernando Sabino, em 2001, organiza e publica, pela Record, "Cartas perto do coração", contendo correspondência que manteve com a escritora de 1946 a 1969.

A editora Rocco lança, em 2002, "Correspondências — Clarice Lispector", antologia de cartas de e para a escritora, seleção de Teresa Montero.

No aniversário de Clarice, 10/12/2002, a Embaixada do Brasil na Ucrânia e a Prefeitura de Tchetchelnik se associam em homenagem à memória da escritora, inaugurando uma placa com dados biográficos gravados em russo e em português, que é afixada na entrada da sede da administração municipal.

Em 2004, os manuscritos de A hora da estrela e parte dos livros que pertenciam à biblioteca pessoal de Clarice Lispector são confiadas por Paulo Gurgel Valente à guarda do Instituto Moreira Salles, que lança, em dezembro, edição especial dos "Cadernos de Literatura Brasileira", dedicada à vida e à obra da autora.

Em artigo publicado no jornal "The New York Times", no dia 11/03/2005, a escritora foi descrita como o equivalente de Kafka na literatura latino-americana. A afirmação foi feita por Gregory Rabassa, tradutor para o inglês de Jorge Amado, Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa e de Clarice. No dia 13/01, foi discutido o viés judaico na obra da autora no Centro de História Judaica em Nova York.

O Consulado-Geral do Brasil em Córdoba - Argentina, participou, em 2007, de homenagem, dos alunos do 6º ano do nível médio, à escritora Clarice Lispector. O fato mereceu destaque na página de divulgação de eventos culturais do Ministério das Relações Exteriores. Naquela cidade encontram-se 47 escolas que ensinam a Língua Portuguesa e aspectos da cultura e literatura brasileira. O Consulado-Geral também conta com uma pequena biblioteca, que atende ao público interessado nesses assuntos, embora não haja ali nenhuma obra da citada escritora. No entanto, têm sido publicadas, nos últimos tempos, notas sobre a vida e a obra de Clarice Lispector, na imprensa local.


Obras da autora:

Romances:

Perto do Coração Selvagem (1943);

O Lustre (1946)

A Cidade Sitiada (1949)

A Maçã no Escuro (1961)

A Paixão segundo G.H. (1964)

Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres (1969)

Água Viva (1973)

Um Sopro de Vida - Pulsações (1978)

Novela:

A hora da estrela (1977)

Contos:

Alguns contos (1952)

Laços de família (1960)

A legião estrangeira (1964)

Felicidade clandestina (1971)

A imitação da rosa (1973)

A via crucis do corpo (1974)

Onde estivestes de noite? (1974)

A bela e a fera (1979)

Correspondência:

Cartas perto do coração (2001) - Organização de Fernando Sabino

Correspondência - Clarice Lispector (2002) - Organização de Teresa Cristina M. Ferreira

Crônicas:

Visão do esplendor - Impressões leves (1975)

Para não esquecer (1978) - contos inicialmente publicados em Laços de família.

A descoberta do mundo (1984)

Entrevistas:

De corpo inteiro (1975)

Literatura infantil:

O mistério do coelho pensante (1967) - Escrito em inglês e traduzido por Clarice

A mulher que matou os peixes (1968)

A vida íntima de Laura (1974)

Quase de verdade (1978)

Como nasceram as estrelas (1987)

Antologias:

Seleta de Clarice Lispector (1975) - Organização de Renato Cordeiro Gomes

Clarice Lispector (1981) - Organização de Benjamin Abdala Jr. e Samira Y. Campedelli

O primeiro beijo & outros contos, de Clarice Lispector (1991)

Os melhores contos de Clarice Lispector (2001) - Organização de Walnice N. Galvão

Aprendendo a viver (2004)

Livros publicados no exterior

Clarice Lispector tem seus livros publicados em diversos países do mundo: Alemanha, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da América, França, Israel, Holanda, Inglaterra, Itália, Noruega, Polônia, Rússia, Suécia, República Tcheca e Turquia. Citamos alguns, a título de exemplo:

Die Passion nach G.H. (A paixão segundo G. H.) (1995), tradução de Pieer Sibast

La manzana en la obscuridad (A maçã no escuro) (1974), tradução de Juan García Gayo

L'heure de l'étoile (A hora da estrela) (1989), tradução de Marguerite Wünscher

Osher samuy (Felicidade clandestina) (2001), tradução de Mirian Tivon

The Foreign Legion (A legião estrangeira) (1986), tradução de Giovanni Pontiero

The Stream of Life (Água viva) (1989), tradução de Elizabeth Lowe e outros

Dove siete stati di notte (Onde estivestes de noite) (1994), tradução de Adelina Aletti

Zivá voda (Água viva) (2000), tradução de Pavla Lidmilová

Sobre a autora:

BORELLI, Olga. Clarice Lispector: Esboço para um possível retrato. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.

BOSI, Alfredo. Clarice Lispector. In: História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1989.

CASTELLO, José. Clarice Lispector. In: O Inventário das Sombras. Rio de Janeiro: Editora Record, 1999.

FITZ, Earl Eugene. Sexuality and Being in the Poststructuralist Universe of Clarice Lispector - The Difference off Desire. Texas: University of Texas Press, 2001.

FREIXAS, Laura. Clarice Lispector. Coleção Vidas literárias. Barcelona: Omega, 2001.

GOTLIB, Nádia B. Clarice - uma vida que se conta. São Paulo: Ática, 1995.

GUIDIN, Márcia Lígia. A hora da estrela de Clarice Lispector. São Paulo: Ática, 1996. (Roteiro de Leitura).

LEITE, Ligia Chiappini Moraes. O foco narrativo. São Paulo: Ática, 1985. (Série Princípios).

NOLASCO, Edgar Cézar. Clarice Lispector: nas entrelinhas da escritura. São Paulo: Annablume, 2001.

NOVELLO, Nicolino. O ato criador de Clarice Lispector. Rio de Janeiro: Presença/MinC/Pró-Memória/INL, 1987.

PÉCAUT, Daniel. Os intelectuais e a política no Brasil. São Paulo: Ática, 1990.

ROSENBAUM, Yudith. Metamorfoses do mal: uma leitura de Clarice Lispector. São Paulo: Edusp, 1999.

VARIN, Claire. Línguas de fogo - Ensaio sobre Clarice Lispector. Tradução de Lúcia Peixoto Cherem, São Paulo: Limiar, 2002.

WALDMAN, Berta. Clarice Lispector - A paixão segundo C. L. São Paulo: Escuta, 1992.

Filmografia:

A hora da estrela (Brasil, 1985, 96min).

xDireção: Suzana Amaral.
Elenco: Marcélia Cartaxo, José Dumont e Tamara Taxman.

O corpo (Brasil, 1991, 80 min).

Direção: José Antônio Garcia
Elenco: Antônio Fagundes, Marieta Severo, Cláudia Jimenez, Carla Camurati, Sérgio Mamberti e outros.

Chamada final (Brasil/Alemanha/China e EUA, 1994)

Direção: Ana Maria Magalhães
Elenco: Claudia Ohana, Guilherme Leme e outros.

Ruído de passos (Brasil, 1995 - curta-metragem)

Direção: Denise Tavares Gonçalves.

Clandestina felicidade (Brasil, 1998 - curta metragem que trata da infância da autora)

Direção: Beto Normal e Marcelo Gomes
Elenco: Luisa Phebo.

Macabéia (Brasil, 2000 -curta-metragem)

Direção de Erly VieiraJr., Lizandro Nunes e Virgínia Jorge.

Aeroporto em o embarque (Brasil, 2002 - curta-metragem)

direção: Nicole Algranti
Elenco: Marcélia Cartaxo.

O ovo (Brasil, 2003 - curta-metragem)

Direção: Nicole Algranti
Roteiro: Luiz Carlos Lacerda.

Televisão

Feliz Aniversário, Rede Globo, 1978

Especial Clarice Lispector - TV Cultura, 1999

A hora da estrela, Rede Globo, 2003

Teatro:

Perto do coração selvagem (1965)

Direção: Fauzi Arap
Elenco: Glauce Rocha, José Wilker e outros

Um sopro de vida (1979)

Direção: José Possi Neto
Elelnco: Marilena Ansaldi.

A hora da estrela (1984)

Direção: Naum Alves de Souza
Elenco: Maria Bethânia.

A paixão segundo G. H. (1989)

Direção: Cibele Forjaz
Elenco: Marilena Ansaldi.

A pecadora queimada e os anjos harmoniosos (1992)

Direção: José Antônio Garcia
Elenco: Sérgio Mambertti e outros.

A mulher que matou os peixes (1994)

Direção: Lúcia Coelho
Elenco: Zezé Polessa.

A mulher que matou os peixes (1998)

Adaptação de Adriane Azenha.

A hora da estrela (1998)

Direção: Roberto Vignatti
Elenco: Alexandra Tavares.

Que mistérios tem Clarice? (1998)

Direção: Luiz Arthur Nunes
Elenco: Rita Elmôr (monólogo)

Clarice - Coração selvagem (1998)

Direção: Maria Lucya de Lima
Elenco: Aracy Balabanian.

Quase de verdade (2001)

Direção: Ulisses Cohn
Elenco: Cia. Delas de Teatro

A hora da estrela (2001)

Direção: Marcus Vinicius Faustini
Elenco: Marcélia Cartaxo e outros.

A descoberta do mundo (2001)

Direção: Marco Antonio Rodrigues
Elenco: Cia. Delas de Teatro

A hora da estrela (2002)

Direção: Naum Alves de Souza
Elenco: Célia Borbes, Ester Lacava e Edgar Jordão.

A paixão segundo G. H. (2002)

Adaptação:Fauzi Arap.
Direção de Enrique Diaz
Elenco: Mariana Lima.

Amor - Uma ode ao universo feminino de Clarice Lispector (2002)

Adaptação: Marta Baião e Conceição Acioli.
Direção de Conceição Acioli.
Elenco: Marta Baião.

Água viva (2003)

Direção: Maria Pia Scognamiglio
Elenco: Susana Vieira.

Encontro com Clarice (2003)

Direção: Ítalo Rossi
Elenco: Ester Jablonski

Leituras (áudio)

Clarice Lispector - Áudio (1998)

Seleção de contos feita por Paulinho Lima. Interpretação de Aracy Balabanian; Luz da Cidade, coleção Poesia Falada.

Doze lendas brasileiras - Clarice Lispector (V. 1) (2000)

Idealização e produção de Paulinho Lima; Luz da Cidade.

Clarice Lispector - A mulher que matou os peixes (V. 4) (2000)

Idealização e produção de Paulinho Lima; Luz da Cidade.

A descoberta do mundo (2002)

Seleção de crônicas feita por Teresa Montero, interpretação de Aracy Balabanian; Luz da Cidade, Coleção Os cronistas.

La passion selon G. H. (sd)

Gravação de trechos do romance A paixão segundo G. H. pela atriz Anouk Aimée; Des Femmes, Paris.

Liens de famille (sd)

Gravação de contos do livro Laços de família por Chiara Mastroianni; Des Femmes, Paris.





**Dados obtidos em livros da autora, sites da Internet, nos Cadernos de Literatura Brasileira - Instituto Moreira Salles, no "Inventário das Sombras" de José Castello e fornecidos por João Pires, amigo do Releituras.


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Reflexóes
em 10/05/2008 18:29:35 (13930 leituras)
Clarice Lispector



Reflexões


Há momentos na vida em que sentimos tanto a falta de alguém…


que o que mais queremos é tirar esta pessoa de nossos sonhos e abraça-la…


Sonhe com aquilo que você quiser…


Seja o que você quer ser…


Porque você possui apenas uma vida


E nela só temos uma chance de fazer aquilo que queremos.


Tenha felicidade bastante para faze-la doce,


dificuldades para faze-la forte,


tristeza para faze-la humana.


E esperança suficiente para faze-la feliz.


As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas,


elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.


A felicidade aparece para aqueles que choram…


Para aqueles que buscam e tentam sempre…


E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas.


O futuro mais brilhante é baseado num passado intensamente vivido.


Você só terá sucesso na vida quando perdoar os erros e as decepções do passado.


A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar…


…duram uma eternidade…



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Vida e Obra
em 09/05/2008 11:12:43 (25965 leituras)
Almeida Garrett

João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, visconde de Almeida Garrett, escritor romântico, orador, par do reino, ministro e secretário de Estado honorário português (Porto, 4 de Fevereiro de 1799 — Lisboa, 9 de Dezembro de 1854).

Filho de António Bernardo da Silva Garrett e Ana Augusta de Almeida Leitão, o escritor passou parte da infância em Portugal continental, mas teve de seguir para os Açores (Angra do Heroísmo) quando as tropas francesas de Napoleão Bonaparte invadiram Portugal.

Nos Açores foi instruído pelo tio, Dom Alexandre, bispo de Angra.

Em 1818 seguiu para Coimbra, onde se matriculou no curso de Direito.

Ainda em 1818 publicou O Retrato de Vénus, trabalho que lhe custou um processo por ser considerado "materialista, ateu e imoral".

Participou da revolução liberal de 1820, seguindo para o exílio na Inglaterra em 1823, após a Vilafrancada.

Antes havia casado com Luísa Midosi, de apenas 14 anos. Foi em Inglaterra que tomou contacto com o movimento romântico, descobrindo Shakespeare, Walter Scott e outros autores e visitando castelos feudais e ruínas de igrejas e abadias góticas, vivências que se reflectiriam na sua obra posterior.

Em 1824, seguiu para França, onde escreveu Camões (1825) e Dona Branca (1826), poemas geralmente considerados como as primeiras obras da literatura romântica em Portugal.

Em 1826 foi amnistiado e regressou à pátria com os últimos emigrados, mas teria de deixar Portugal novamente em 1828, com o regresso do Rei absolutista D. Miguel. Ainda nesse ano perdeu a filha recém-nascida. Novamente em Inglaterra, publica Adozinda (1828) e Catão (1828).

Juntamente com Alexandre Herculano e Joaquim António de Aguiar, tomou parte no Desembarque do Mindelo em 1832.

A vitória do Liberalismo permitiu-lhe instalar-se novamente em Portugal, após curta estadia em Bruxelas como cônsul-geral e encarregado de negócios, onde lê Schiller, Goethe e Herder.

Em Portugal exerceu cargos políticos, distinguindo-se nos anos 30 e 40 como um dos maiores oradores nacionais. Foram de sua iniciativa a criação do Conservatório de Arte Dramática, da Inspecção-Geral dos Teatros, do Panteão Nacional e do Teatro Normal (actualmente Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa). Mais do que construir um teatro, Garrett procurou sobretudo renovar a produção dramática nacional segundo os cânones já vigentes no estrangeiro. Em 1838, leva à cena Gil Vicente, pouco depois D. Filipa de Vilhena e, em 1842, O Alfageme de Santarém, todas sobre temas da história de Portugal.

Em 1844 é publicada a sua obra-prima, Frei Luís de Sousa, que um crítico alemão, Otto Antscherl, considerou a "obra mais brilhante que o teatro romântico produziu". Estas peças marcam uma viragem na literatura portuguesa não só na selecção dos temas, que privilegiam a história nacional em vez da antiguidade clássica, como sobretudo na liberdade da acção e na naturalidade dos diálogos.

Em 1843, Garrett publica o Romanceiro e o Cancioneiro Geral, colectâneas de poesias populares portuguesas, e em 1845 o primeiro volume d'O Arco de Santana (o segundo apareceria em 1850), romance histórico inspirado pelo Notre Dame de Paris de Victor Hugo; esta obra seduz não só pela recriação do ambiente medieval do Porto, mas sobretudo pela qualidade da prosa, desespartilhada das convenções anteriores e muito mais próxima da linguagem falada.

A obra que se lhe seguiu deu expressão ainda mais vigorosa a estas tendências: Viagens na minha terra, livro híbrido em que impressões de viagem, de arte, paisagens e costumes se entrelaçam com uma novela romântica sobre factos contemporâneos do autor e ocorridos na proximidade dos lugares descritos (outra inovação para a época, em que predominava o romance histórico). A naturalidade da narrativa disfarça a complexidade da estrutura desta obra, em que alternam e se entrecruzam situações discursivas, estilos, narradores e temas muito diversos.

Na poesia, Garrett não foi menos inovador. As duas colectâneas publicadas na última fase da sua vida (Flores sem fruto, de 1844, e sobretudo Folhas caídas, de 1853) introduziram uma espontaneidade e uma simplicidade praticamente desconhecidas na poesia portuguesa anterior. Ao lado de poemas de exaltada expressão pessoal surgem pequenas obras-primas de singeleza ímpar como "Pescador da barca bela", próximas da poesia popular quando não das cantigas medievais; a liberdade da metrificação, o vocabulário corrente, o ritmo e a pontuação carregados de subjectividade são as principais marcas destas obras.

A vida de Garrett foi tão apaixonante quanto a sua obra. Revolucionário nos anos 20 e 30, distinguiu-se posteriormente sobretudo como o tipo perfeito do dandy, ou janota, tornando-se árbitro de elegâncias e príncipe dos salões mundanos. Separado da esposa, passa a viver em mancebia com D. Adelaide Pastor até à morte desta em 1841. A partir de 1846, a sua musa é a viscondessa da Luz, Rosa Montufar Infante, inspiradora dos arroubos românticos das Folhas caídas. Em 1851, Garrett é feito visconde de Almeida Garrett em duas vidas, e em 1852 sobraça, por poucos dias, a pasta dos Negócios Estrangeiros em governo presidido pelo Duque de Saldanha. Faleceu de cancro em 1854.

No século XIX e em boa parte do século XX, a obra literária de Garrett era geralmente tida como uma das mais geniais da língua, inferior apenas à de Camões. A crítica do século XX (notavelmente João Gaspar Simões) veio questionar esta apreciação, assinalando os aspectos mais fracos da produção garrettiana. No entanto, a sua obra conservará para sempre o seu lugar na história da literatura portuguesa, pelas inovações que a ela trouxe e que abriram novos rumos aos autores que se lhe seguiram.

Garrett, até pelo acentuado individualismo que atravessa toda a sua obra, merece ser considerado o autor mais representativo do romantismo em Portugal.

-Bibliografia ordenada e completada:

-Poemas

Hino Patriótico, poema. Porto, 1820
Ao corpo académico, poema. Coimbra 1821
Retrato de Vénus, poema Coimbra, 1821
Camões, poema. Paris, 1825
Dona Branca ou a Conquista do Algarve, poema. Paris, 1826 (pseud. de F. E.)
Adozinda, poema. Londres, 1828
Lyrica de João Mínimo. Londres, 1829
Miragaia, poesia. Lisboa, 1844
Flores sem Fruto, poesia. Lisboa, 1845
Os Exilados, À Senhora Rossi Caccia , poesia. Lisboa, 1845
Folhas Caídas, poesia. Rio de Janeiro e depois Lisboa,1853
Camões, poema. 4ª ed. revista, com estudo de Camilo Castelo Branco. Porto, 1854

Obras póstumas

Dona Branca ou a Conquista do Algarve, poema. Porto Alegre, 1859
Dona Branca ou a Conquista do Algarve, poema. Nova York, 1860
Bastardo do Fidalgo, poema. Porto, 1877
Odes Anacreônticas: Ilha Graciosa. Évora, 1903
A Anália, poesia inédita de Garrett. Lisboa 1932 (redac., Porto 1819)
Magriço ou Os Doze de Inglaterra, poema. Coimbra, 1948
Roubo das Sabinas, poemas libertinos I. Lisboa, 1968
Afonseida, ou Fundação do Império Lusitano, poema. Lisboa 1985 (pseud.: Josino Duriense, redac., Angra 1815-16)
Poesias Dispersas. Lisboa, 1985
Magriço e os Doze de Inglaterra, poema incompleto, Lisboa, 1914

-Peças teatrais

Catão, tragédia. Coimbra, 1822
Catão, tragédia. Londres, 1830
Catão, tragédia. Rio de Janeiro, 1833
Mérope, tragédia. Lisboa, 1841
O Alfageme de Santarém ou A Espada do Condestável. Lisboa, 1842
Um Auto de Gil Vicente. Lisboa, 1842
Dona Filipa de Vilhena, comédia. Lisboa, 1846
Falar Verdade a Mentir, comédia. Lisboa 1846
Camões do Rossio, comédia. Lisboa, 1852 (co-autoria de Inácio Feijó)

Obras póstumas

Um noivado no Dafundo ou cada terra com seu uso cada roca com seu fuso: provérbio n'um acto. 1ª ed. Lisboa, 1857 (redac., Lisboa, 1847)
Átala, drama. Lisboa, 1914 (redac., Coimbra 1817),
Lucrécia, tragédia, Lisboa, 1914
Afonso de Albuquerque, tragédia; Lisboa, 1914
Sofonisba, tragédia; Lisboa, 1914
O Amor da Pátria, elogio dramático; Lisboa, 1914
La Lezione Agli Amanti, ópera bufa; Lisboa, 1914
Conde de Novion, comédia; Lisboa, 1914
Édipo em Colona, tragédia. Lisboa, 1952 (redac.: Porto 1820)
Ifigénia em Tauride, tragédia. Lisboa, 1952 (redac., Angra do Heroísmo 1816)
Falar Verdade a Mentir, comédia. Rio de Janeiro, 1858
As Profecias do Bandarra, comédia. Lisboa, 1877 (redac., Lisboa 1845)
Os Namorados Extravagantes, drama. Coimbra 1974 (redac., Sintra 1822)
Impronto de Sintra, comédia. Lisboa, Guimarães, Libanio, ???? (redac., Sintra, 1822)

-Artigos, ensaios, biografias e folhetos

Proclamações Académicos, Coimbra, 1820, folhetos
O Dia Vinte e Quatro de Agosto, ensaio político. Lisboa, 1821, 53 p.
Aos Mortos no Campo da Honra de Madrid, folheto. Lisboa, Jornal da Sociedade Literária Patriótica, 1822
Da Europa e da América e de Sua Mútua Influência na Causa da Civilização e da Liberdade, ensaio político. Londres 1826
Da Educação. Londres, 1829
Portugal na Balança da Europa: do que tem sido e do que ora lhe convém ser na nova ordem de coisas do mundo civilizado, Londres, 1830
Relatório dos Decretos nº 22, 23 e 24 (Reorganização da Fazenda, Administração Pública e Justiça). Lisboa, 1832, folheto
Manifesto das Cortes Constituintes à Nação, folheto. Lisboa, 1837
Necrologia do Conselheiro Francisco Manuel Trigoso de Aragão Morato, Lisboa, 1838
Relatório ao Projecto de Lei sobre a Propriedade Literária e Artística, Lisboa, 1839
Memória Histórica do Conselheiro A. M. L. Vieira de Castro, Lisboa, 1843
Conselheiro J. B. de Almeida Garrett, autobiografia. Lisboa, 1844
Memória Historica da Duqueza de Palmella: D. Eugénia Francisca Xavier Telles da Gama, Lisboa, 1845
Memória Histórica do Conde de Avilez, 1ª ed., Lisboa, 1845
Da Poesia Popular em Portugal, ensaio literário. Lisboa, 1846
Sermão pregado na dedicação da capela de Nª Srª da Bonança, folheto, Lisboa, 1847
A Sobrinha do Marquês, Lisboa, 1848, 176 p.
Memória Histórica de J. Xavier Mousinho da Silveira, Lisboa, 1849
Necrologia de D.ª Maria Teresa Midosi, Lisboa, 1950
Protesto Contra a Proposta sobre a Liberdade de Imprensa, abaixo-assinado/folheto. Lisboa 1850 (subscrito, à cabeça, por Alexandre Herculano e mais cinquenta personalidades, contra o projecto de «lei das rolhas» apresentado pelo governo)

Obras póstumas

Discursos Parlamentares e Memorias Biographicas, Lisboa, Imprensa Nacional, 1871, 438, p.
Necrologia do Sr. Francisco Krus; Monumento ao Duque de Palmela, D. Pedro de Sousa Holstein, Lisboa, 1899 (redac., Lisboa, 1839);
Memórias Biográficas, Lisboa, Empreza da História de Portugal, 1904
Necrologia à Morte de D. Leocádia Teresa de Lima e Melo Falcão Vanzeler, Lisboa, 1904 (redac., Lisboa, 1848)
Apontamentos Biográficos do Visconde d'Almeida Garrett, autobiografia. Porto, 1916
Entremez dos Velhos Namorados que Ficaram Logrados, Bem Logrados, Lisboa, 1954 (redac., 1841)

-Romances, cancioneiros e contos

Bosquejo da História da Poesia e da Língua Portuguesa, Paris, 1826
Lealdade, ou a Vitória da Terceira, canção. Londres, 1829
Romanceiro e Cancioneiro Geral, vol. I. Lisboa, 1843
O Arco de Sant'Ana, romance. Lisboa, na Imprensa Nacional, 1845, vol. 1
Viagens na Minha Terra, romance. Lisboa, Typ. Gazeta dos Tribunais, 1846, 2 v.
O Arco de Sant'Ana, romance. Lisboa, na Imprensa Nacional, 1850, vol. 2
Romanceiro e Cancioneiro Geral, vols. II e III, Lisboa 1851

Obras póstumas

Helena: fragmento de um romance inédito. Lisboa, 1871
Memórias de João Coradinho, aventuras picarescas. Lisboa, 1881 (redac., 1825)
Joaninha dos Olhos Verdes. Lisboa, 1941
Komurahi - História Brasileira, conto. 1956 (redac., 1825)
Cancioneiro de romances, xácaras e soláus e outros vestígios da antiga poesia nacional. Lisboa, 1987 (redac., 1824)

-Cartas e diários

Carta de Guia para Eleitores, em Que se Trata da Opinião Pública, das Qualidades para Deputado e do Modo de as Conhecer, ensaio político. Lisboa, 1826
Carta de M. Cévola ao futuro editor do primeiro jornal liberal que em português se publicar, panfleto político. Londres, 1830 (pseud.: Múcio Cévola)
Carta sobre a origem da língua portuguesa, ensaio literário. Lisboa, 1844

Obras póstumas

Diário da minha viagem a Inglaterra, Lisboa 1881 (redac., Birmingham, 1823
Cartas a Agostinho José Freire, Lisboa, 1904, 132 p. (redac., Bruxelas, 1834)
Cartas Íntimas, edição revista, coordenada e dirigida por Teófilo Braga. Lisboa, Empresa da História de Portugal, 1904, 172 p.
Cartas de Amor à Viscondessa da Luz, Lisboa, 1955
Correspondência do Conservatório, Lisboa, 1995 (redac.: Lisboa 1836 – 1841)
Cartas de Amor à Viscondessa da Luz

-Discursos

Oração Fúnebre de Manuel Fernandes Tomás, Lisboa, 1822
Parnaso Lusitano ou Poesias Selectas de Autores Antigos e Modernos, Paris, 1826-1827, 5 v.
Elogio Fúnebre de Carlos Infante de Lacerda, Barão de Sabrozo, Londres, 1830
Da formação da segunda Câmara das Côrtes: discursos pronunciados pelo deputado J. B. de Almeida Garrett nas sessões de 9 a 12 de Outubro de 1837, Lisboa, Imprensa Nacional, 1837
Discurso do Sr. Deputado pela Terceira J. B. de Almeida Garrett na discussão, Lisboa, 1840
Discurso do Sr. Deputado por Lisboa J. B. de Almeida Garrett, na discussão da Lei da Decima, Lisboa, 1841
Discussão da Resposta ao Discurso da Coroa, pronunciado na sessão de 8 de Fevereiro de 1840, Lisboa, 1840
Elogio Histórico do Sócio Barão da Ribeira de Saborosa, Lisboa, 1843
Parecer da Comissão sobre a Unidade Literária, Lisboa, 1846 (dito Parecer sobre a Neutralidade Literária, da Associação Protectora da Imprensa Portuguesa, assinado por Rodrigo da Fonseca Magalhães, Visconde de Juromenha, Alexandre Herculano e João Baptista de Almeida Garrett)

Obras póstumas

Política: reflexões e opúsculos, correspondência diplomática. Lisboa, 1904, 2 v.

-Participação em publicações periódicas

Toucador - Periódico sem política, dedicado às senhoras portuguesas. Lisboa, 1822 (direcção e redacção)
Heraclito e Demócrito. Lisboa, 1823
Português - Diário político, literário e comercial. Lisboa, 1826 – 1827 (direcção e redacção)
Cronista - Semanário de política, literatura, ciências e artes. Lisboa, 1827 (direcção e redacção)
Chaveco Liberal. Londres, 1829 (direcção e redacção)
Precursor. Londres, 1831
Português Constitucional. Lisboa, 1836 (direcção e redacção)
Entreacto, Jornal de Teatros. Lisboa, 1837 (fundação, direcção e redacção)
Jornal do Conservatório. Lisboa, 1841 (fundação)
Jornal das Belas-Artes. Lisboa, 1843 – 1846 (fundação)
Ilustração - Jornal Universal. Lisboa, 1845 – 1846 (fundação)


*pesquisa realizada em sites da internet

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Vida e Obra
em 07/05/2008 18:33:00 (18731 leituras)
Almada Negreiros

José Sobral de Almada Negreiros (1893-1970) nasceu em São Tomé e Príncipe, Portugal.

Em 1905 já redigia e ilustrava jornais manuscritos (“A República” e “O Mundo”). Publica seu primeiro desenho em “A Sátira” e faz sua primeira exposição individual de 90 desenhos, em 1913.

Escreve, em 1915, o “Manifesto Anti-Dantas e por extenso” e é publicado o primeiro número da revista “Orpheu”. Retorna de sua estada em Paris, em 1920.

No ano de 1925 pinta dois painéis para “A Brasileira”, um café do Chiado, em Lisboa.

De 1927 a 1932 mora em Madrid.

Em 1938, conclui os vitrais da Igreja de Nossa Sra. de Fátima. Pinta o famoso retrato de Fernando Pessoa (“Lendo Orpheu”), para o restaurante “Irmãos Unidos”, em 1954.

Em 1951, o SNI lhe confere o “Prêmio Nacional das Artes”.

Em 1966 é eleito membro honorário da Academia Nacional de Belas Artes.

No ano seguinte recebe o Grande Oficialato da Ordem de Santiago Espada.

No ano de 1970, o pintor e escritor morre em Lisboa, no mesmo quarto em que morrera o poeta Fernando Pessoa.

Companheiro de geração de Pessoa, é considerado um dos maiores pintores lusos, além de escritor e agitador cultural. Sua importância na cultura portuguesa é sentida mesmo após sua morte. Deixou contos espalhados por revistas de vanguarda de curta duração.

Obras:

O Moinho (1912 – teatro)

Manifesto Anti-Dantas e por extenso (1915)

A Engomadeira (1917 – novela)

A Cena do Ódio
(poema publicado na revista Portugal Futurista em 1917)

A Invenção do Dia Claro (1921)

Os Outros (1923 – teatro)

El uno, trajedia de la unidad (1927 – teatro)

S. O. S. (1929 – teatro)

Nome de Guerra (romance, 1938)

Antes de Começar (teatro)

Deseja-se Mulher (1959 – teatro), Poesia.


Texto extraído do livro “Os cem melhores contos de humor da literatura universal”, Ediouro – Rio de Janeiro, 2001, pág. 425, organizado por Flávio Moreira da Costa.


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Vida e Obra
em 06/05/2008 14:50:35 (11700 leituras)
Alexandre O´Neill

Alexandre Manuel Vahía de Castro O'Neill de Bulhões – nasceu em Lisboa, 19 de Dezembro de 1924 — 21 de Agosto de 1986), ou simplemente Alexandre O'Neill, descendente de irlandeses, foi um importante poeta do movimento surrealista em Portugal fundador do Movimento Surrealista de Lisboa. Foi várias vezes preso pela polícia política, a PIDE.


Autodidacta, fez os estudos liceais, frequentou a Escola Náutica (Curso de Pilotagem), trabalhou na Previdência, no ramo dos seguros, nas bibliotecas itinerantes da Fundação Gulbenkian, e foi técnico de publicidade.

Durante algum tempo, publicou uma crónica semanal no Diário de Lisboa.
Datam do ano de 1947 duas cartas de O'Neill que demonstram o seu interesse pelo surrealismo, dizendo numa delas (de Outubro) possuir já os Manifestos de Breton e a Histoire du Surrealisme de M. Nadeau.

Nesse mesmo ano, O'Neill, Cesariny e Mário Domingues começam a fazer experiências a nível da linguagem, na linha do surrealismo, sobretudo com os seus Cadáveres Esquisitos e Diálogos Automáticos, que conduziam ao desmembramento do sentido lógico dos textos e à pluralidade de sentidos.

Por volta de 1948, fundou com o poeta Cesariny, com José-Augusto França, António Pedro e Vespeira o Grupo Surrealista de Lisboa. Com a saída de Cesariny, em Agosto de 1948, o grupo cindiu-se em dois, dando origem ao Grupo Surrealista Dissidente (que integrou, além do próprio Cesariny, personalidades como António Maria Lisboa e Pedro Oom).

Em 1949, tiveram lugar as principais manifestações do movimento surrealista em Portugal, como a Exposição do Grupo Surrealista de Lisboa (em Janeiro), onde expuseram Alexandre O'Neill, António DaCosta, António Pedro, Fernando de Azevedo, João Moniz Pereira, José-Augusto França e Vespeira.

Nessa ocasião, Alexandre O'Neill publicou A Ampola Miraculosa, constituída por 15 imagens sem qualquer ligação e respectivas legendas, sem que entre imagem e legenda se estabelecesse um nexo lógico, o que torna altamente irónico o subtítulo da obra, «romance».

Esta obra poderá ser considerada paradigmática do surrealismo português. Foram lançados, ainda nesse ano, os primeiros números dos Cadernos Surrealistas.

Em Maio do mesmo ano, foi a vez de o Grupo Surrealista Dissidente organizar uma série de conferências com o título geral «O Surrealismo e o Seu Público», em que António Maria Lisboa leu o que se pode considerar o primeiro manifesto surrealista português.

Houve ainda mais duas exposições levadas a cabo por este grupo (em Junho de 1949 e no ano seguinte, no mesmo mês), sem grande repercussão junto do público.

Depois de uma fase de ataques pessoais entre os dois grupos (1950-52), que atingiram sobretudo José-Augusto França, e após a morte de António Maria Lisboa, extinguiram-se os grupos surrealistas, continuando todavia o surrealismo a manifestar-se na produção individual de alguns autores, incluindo o próprio Alexandre O'Neill, que se demarcara, já em 1951, no Pequeno Aviso do Autor ao Leitor, inserido em Tempo de Fantasmas. Nessa mesma obra, sobretudo na primeira parte, Exercícios de Estilo (1947-49), a influência do surrealismo manifesta-se em poemas como Diálogos Falhados, Inventário ou A Central das Frases e na insistência em motivos comuns a muitos poetas surrealistas, como a bicicleta e a máquina de costura.

Na segunda parte da obra, Poemas (1950-51), essa influência, embora ainda presente, é atenuada, como acontecerá em No Reino da Dinamarca (1958) e Abandono Vigiado (1960).

A poesia de Alexandre O'Neill concilia uma atitude de vanguarda (surrealismo e experiências próximas do concretismo) — que se manifesta no carácter lúdico do seu jogo com as palavras, no seu bestiário, que evidencia o lado surreal do real, ou nos típicos «inventários» surrealistas — com a influência da tradição literária (de autores como Nicolau Tolentino e o abade de Jazente, por exemplo).

Os seus textos caracterizam-se por uma intensa sátira a Portugal e aos portugueses, destruindo a imagem de um proletariado heróico criada pelo neo-realismo, a que contrapõe a vida mesquinha, a dor do quotidiano, vista no entanto sem dramatismos, ironicamente, numa alternância entre a constatação do absurdo da vida e o humor como única forma de se lhe opor.

Temas como a solidão, o amor, o sonho, a passagem do tempo ou a morte, conduzem ao medo (veja-se «O Poema Pouco Original do Medo», com a sua figuração simbólica do rato) e/ou à revolta, de que o homem só poderá libertar-se através do humor, contrabalançado por vezes por um tom discretamente sentimental, revelador de um certo desespero perante o marasmo do país — «meu remorso, meu remorso de todos nós».

Este humor é, muitas vezes, manifestado numa linguagem que parodia discursos estereotipados, como os discursos oficiais ou publicitários, ou que reflecte a própria organização social, pela integração nela operada do calão, da gíria, de lugares-comuns pequeno-burgueses, de onomatopeias ou de neologismos inventados pelo autor.

Resumo : Vida e Obra
1924: Filho de um bancário e de uma dona de casa, nasce em Lisboa Alexandre Manuel Vahia de Castro O’Neill de Bulhões. –
1944: Termina o 1.º ano da Escola Náutica de Lisboa mas, por causa da sua miopia, é-lhe recusada a cédula marítima para exercer pilotagem. Alexandre não continua os estudos. –
1945: Final da II Guerra Mundial. –
1946: Em consequência de um conflito familiar, O’Neill abandona a casa dos pais e passa a viver na casa do tio materno. –
1948: É um dos fundadores do Movimento Surrealista de Lisboa; colabora na Ampola Miraculosa, livro de colagens surrealistas. –
1949: Em Lisboa, apaixona-se pela surrealista francesa Nora Mitrani. –
1950: Grande polémica e O’Neill rompe com o Movimento Surrealista. –
1951: Publica a colectânea Tempo de Fantasmas. –
1953: Morte de Estaline. Durante 40 dias O’Neill fica preso pela PIDE. –
1956: XX Congresso do PCUS, Kruchtchev denuncia os crimes de Estaline. –
1957: Alexandre casa com Noémia Delgado. –
1958: Publica No Reino da Dinamarca. –
1959: Nascimento de Alexandre Delgado O'Neill, primeiro filho do poeta. –
1960: Publica Abandono Vigiado. –
1961: Suicídio de Nora Mitrani. –
1962: O’Neill publica Poemas com Endereço. –
1965: Publica Feira Cabisbaixa. –
1966: Em Turim, Itália, são publicados poemas de O’Neill sob o título Portogallo mio rimorso. –
1969: Publica De Ombro na Ombreira. –
1970: Publica As Andorinhas não têm Restaurante.
1971: Alexandre divorcia-se de Noémia e no mesmo ano casa com Teresa Patrício Gouveia. –
1972: Publica Entre a Cortina e a Vidraça. –
1974: A 25 de Abril, a Revolução dos Cravos. –
1976: Nascimento de Afonso O’Neill, segundo filho do poeta. –
1979: O’Neill publica A Saca de Orelhas. –
1980: Apaixona-se por Laurinda Bom; publica Uma Coisa em Forma de Assim. –
1981: Alexandre divorcia-se de Teresa; publica As Horas já de Números Vestidas. –
1983: Publica Dezanove Poemas. –
1986: Escreve O Princípio de Utopia, O Princípio de Realidade. Nesse ano teve uma doença cardíaca que leva a morte do poeta.
A sua obra poética foi ainda recolhida em Poesias Completas, 1951-1983 (1984).
Foi ainda editada uma antologia, postumamente, com o título Tomai Lá do O'Neill (1986).
Publicou dois livros em prosa narrativa, As Andorinhas não Têm Restaurante (1970) e Uma Coisa em Forma de Assim (1980, volume de crónicas), e as Antologias Poéticas de Gomes Leal e de Teixeira de Pascoaes (em colaboração com F. Cunha Leão), de Carl Sandburg e João Cabral de Melo Neto.
Gravou o disco «Alexandre O'Neill Diz Poemas de Sua Autoria».
Em 1966, foi traduzido e publicado na Itália, pela editora Einaudi, um volume da sua poesia, Portogallo Mio Rimorso. Recebeu, em 1982, o Prémio da Associação de Críticos Literários.



* Pesquisa feita em sites da internet.

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Vida e Obra
em 03/05/2008 21:50:00 (5930 leituras)
António Gedeão

António Gedeão, (Rómulo Vasco da Gama de Carvalho), nasceu em Lisboa em 1906.

Criança precoce, aos 5 anos escreveu os seus primeiros poemas e aos 10 decidiu completar "Os Lusíadas" de Camões.

A par desta inclinação para as letras, ao entrar para o liceu Gil Vicente, tomou contacto com as ciências e foi aí que despertou nele um novo interesse.

Em 1931 licenciou se em Ciências Físico Químicas pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e em 1932 conclui o curso de Ciências Pedagógicas na Faculdade de Letras do Porto, prenunciando assim qual seria a sua actividade principal daí para a frente e durante 40 anos: professor e pedagogo.

Exigente e comunicador por excelência, para Rómulo de Carvalho ensinar era uma paixão e uma dedicação.

E assim, além da colaboração como co director da "Gazeta de Física" a partir de 1946, concentrou durante muitos anos, os seus esforços no ensino, dedicando se, inclusivé, à elaboração de compêndios escolares, inovadores pelo grafismo e forma de abordar matérias tão complexas como a física e a química.

Dedicação estendida, a partir de 1952, à difusão científica a um nível mais amplo através da colecção "Ciência Para Gente Nova" e muitos outros títulos, entre os quais "Física para o Povo", cujas edições acompanham os leigos
interessados pela ciência até meados da década de 1970.

Apesar da intensa actividade científica, Rómulo de Carvalho nunca esqueceu a arte das palavras e continuou sempre a escrever poesia.

Porém, não a considerando de qualidade e pensando que nunca seria útil a ninguém, nunca tentou publicá la, preferindo destruí-la.

Só em 1956, após ter participado num concurso de poesia de que tomou conhecimento no jornal, publicou, aos 50 anos, o primeiro livro de poemas "Movimento Perpétuo" com o pseudónimo António Gedeão.

Continuou depois a publicar poesia, aventurando se, anos mais tarde, no teatro, no ensaio e na ficção.

Nos seus poemas há uma simbiose perfeita entre a ciência e a poesia, a vida e o sonho, a lucidez e a esperança.

Aí reside a sua originalidade, difícil
de catalogar, originada por uma vida em que sempre coexistiram esses dois interesses totalmente distintos..

A poesia de Gedeão é bastante comunicativa e marca toda uma geração que, reprimida por um regime ditatorial e atormentada por uma guerra, cujo fim não se adivinhava, se sentia profundamente tocada pelos valores expressos
pelo poeta e assim se atrevia a acreditar que, através do sonho, era possível encontrar o caminho para a liberdade.

É deste modo que "Pedra Filosofal", musicada por Manuel Freire, se torna num hino à liberdade e ao sonho. Mais tarde, em 1972,

José Nisa compõe doze músicas com base em poemas de Gedeão e produz o álbum "Fala do Homem Nascido".

Nos anos seguintes dedicou se por inteiro à investigação, publicando numerosos livros, tanto de divulgação científica, como de história da
ciência.

Gedeão também continuou a sonhar, mas o fim aproximava se e o desejo da morrer determinou, em 1984, a publicação de Poemas Póstumos.

Em 1990, já com 83 anos, Rómulo de Carvalho assumiu a direcção do Museu Maynense da Academia das Ciências de Lisboa, sete anos depois de se ter tornado sócio correspondente da Academia de Ciências, função que desempenharia até ao fim dos seus dias.

Quando completou 90 anos de idade, a sua vida foi alvo de uma homenagem a nível nacional.

O professor, investigador, pedagogo e historiador da ciência, bem como o poeta, foi reconhecido publicamente por personalidades da política, da ciência, das letras e da música. Faleceu em 1997.

Obra Literária:

Poesia:
"Movimento Perpétuo", 1956;
"Teatro do Mundo", 1958;
"Declaração de Amor", 1959;
"Máquina de Fogo", 1961;
"Poesias Completas", 1964;
"Linhas de Força", 1967;
"Soneto", 1980;
"Poema para Galileu", 1982;
"Poemas Póstumos",1984;
"Poemas dos textos", 1985;
"Novos Poemas Póstumos", 1990

Ficção:
"A poltrona e outras novelas", 1973

Teatro:
"RTX 78/24", 1978;
"História Breve da Lua", 1981

Ensaio:
"O Sentimento Científico em Bocage", 1965;
"Ay Flores, Ay flores do verde pino", 1975

Obra Científica:
"Ciência Hermética", 1947;
"Embalsamento Egípcio", 1948;
"Compêndio de Química para o 3º Ciclo", 1953;
"Sr. Tompkins explora o átomo", 1956;
"Guias de trabalhos práticos de Química" [3º Ciclo], 1957;
"Que é a física?", 1959;
"Problemas de Física para o 3º Ciclo do Ensino
Liceal", I volume, 1959;
"A Física para o Povo", 1968;
"Ciências da Natureza",1974;
"Aditamento ao guia de trabalhos práticos de Química", 1975;
"A Descoberta do Mundo da Física", 1979;
"A Experiência Científica", 1979;
"A Natureza Corpuscular da Matéria", 1979;
"Moléculas, Átomos e Iões", 1979;
"A Energia", 1980;
"A Estrutura Cristalina", 1980;
"As Forças", 1980;
"As Reacções Químicas", 1980;
"O Peso e a Massa", 1980;
"A Composição do Ar", 1982;
"A Electricidade Estática", 1982;
"A Pressão Atmosférica", 1982;
"A Corrente Eléctrica", 1983;
"A Electrónica", 1983;
"Magnetismo e Electromagnetismo", 1983;
"A Energia Radiante", 1985;
"A Radioactividade", 1985;
"Ondas e Corpúsculos",1985

Investigação histórica:
"História da Fundação do Colégio Real dos Nobres de Lisboa [1765 1772]", 1959;
"História do gabinete de Física da Universidade de Coimbra [1772 1790] desde a sua fundação em 1772 até ao Jubileu do Prof. Giovani António Dalla Bella", 1978;
"Relações entre Portugal e a Rússia no Século XVIII", 1979;
"A Actividade Pedagógica da Academia das Ciências da Lisboa nos Séculos XVIII e XIX", 1981;
"A Física Experimental em Portugal no Século XVIII", 1982;
"A Astronomia em Portugal no Século XVIII", 1985;
"História do Ensino em Portugal, desde a fundação da nacionalidade até ao fim do regime de Salazar Caetano", 1986;
"O Texto Poético Como Documento Social", 1994


*pesquisa feita nos sites da internet
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O Amor queixando-se a Vénus
em 31/03/2008 21:50:00 (5599 leituras)
Bocage

Odes Anacreôntocas

II

Em torno de áurea colmeia
Amor adejava um dia;
E a mãozinha introduzindo
Húmidos favos colhia:

Abelha, mais forte que eu,
Porque de Amor não tem medo,
Eis do guloso menino
Castiga o furto num dedo.

Chupando o tenro dedinho
Entra Cupido a chorar;
E ao colo da mãe voando
Do insecto se vai queixar.

Vénus carinhosa, e bela,
Diz, amimando-o no peito:
«Desculpa o que te fizeram
Recordando o que tens feito.

«O ténue ferrão da abelha
Dói menos que teus farpões;
O que ela te fez no dedo
Fazes tu nos corações.»

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Ilha
em 15/03/2008 00:00:00 (5658 leituras)
David Mourão-Ferreira

Deitadas és uma ilha. E raramente
surgem ilhas no mar tão alongadas
com tão prometedoras enseadas
um só bosque no meio florescente

promontórios a pique e de repente
na luz de duas gémeas madrugadas
o fulgor das colinas acordadas
o pasmo da planície adolescente

Deitas és uma ilha. Que percorro
descobrindo-lhe as zonas mais sombrias
Mas nem sabes se grito por socorro

ou se te mostro só que me inebrias
Amiga amor amante amada eu morro
da vida que me dás todos os dias.

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Coração sem imagens
em 29/02/2008 16:00:00 (6976 leituras)
Raul de Carvalho

Deito fora as imagens,
Sem ti para que me servem
as imagens?

Preciso habituar-me
a substituir-te
pelo vento,
que está em toda a parte
e cuja direcção
é igualmente passageira
e verídica.

Preciso habituar-me ao eco dos teus passos
numa casa deserta,
ao trémulo vigor de todos os teus gestos
invisíveis,
à canção que tu cantas e que mais ninguém ouve
a não ser eu.

Serei feliz sem as imagens.
As imagens não dão
felicidade a ninguém.

Era mais difícil perder-te,
e, no entanto, perdi-te.

Era mais difícil inventar-te,
e eu te inventei.

Posso passar sem as imagens
assim como posso
passar sem ti.

E hei-de ser feliz ainda que
isso não seja ser feliz.

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E por vezes...
em 26/02/2008 19:20:00 (5261 leituras)
David Mourão-Ferreira

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.


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Suave é...
em 24/02/2008 12:40:00 (6643 leituras)
Pablo Neruda

Suave é a bela como se música e madeira,
ágata, telas, trigo, pêssegos transparentes,
tivessem erigido a fugitiva estátua.
Para a onda dirige seu contrário frescor.

O mar molha polidos pés copiados
à forma recém-trabalhada na areia
e é agora seu fogo feminino de rosa
uma borbulha só que o sol e o mar combatem.

Ai, que nada te toque senão o sal do frio!
Que nem o amor destrua a primavera intacta.
Formosa, revérbero da indelével espuma,

deixa que teus quadris imponham na água
uma medida nova de cisne ou de nenúfar
e navegue tua estátua pelo cristal eterno.


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Chega de saudade
em 24/02/2008 12:30:00 (13674 leituras)
Vinícius de Moraes

Vai minha tristeza
E diz a ela que sem ela não pode ser,
Diz-lhe numa prece
Que ela regresse
Porque não posso mais sofrer.
Chega de saudade,
A realidade é que sem ela
Não há paz, Não há beleza,
É só tristeza e a melancolia
Que não sai de mim,
Não sai de mim,
Não sai.
Mas, se ela voltar,
Se ela voltar que coisa linda!
Que coisa louca!
Pois há menos peixinhos a nadar no mar
Do que os beijinhos
Que eu darei na sua boca.
Dentro dos meus braços, os abraços
Hão de ser milhões de abraços
Apertado assim, colado assim, calada assim,
Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim,
Que é pra acabar com esse negócio
De viver longe de mim.
Não quero mais esse negócio
De você viver assim,
Vamos deixar esse negócio
De você viver sem mim...


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Horizonte
em 24/02/2008 12:20:00 (20002 leituras)
Fernando Pessoa

O mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
'Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves, flores,
Onde era só, de longe a abstrata linha

O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp'rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte —
Os beijos merecidos da Verdade.



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Se tu viesses ver-me hoje à tardinha
em 24/02/2008 12:00:00 (17777 leituras)
Florbela Espanca

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus barcos...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...


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Amor e seu tempo
em 24/02/2008 12:00:00 (15694 leituras)
Carlos Drummond de Andrade

Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.

É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe

valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.


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Poema(s) da Cabra
em 24/02/2008 12:00:00 (3697 leituras)
João Cabral de Melo Neto

Nas margens do Mediterrâneo
não se vê um palmo de terra
que a terra tivesse esquecido
de fazer converter em pedra.

Nas margens do Mediterrâneo
Não se vê um palmo de pedra
que a pedra tivesse esquecido
de ocupar com sua fera.

Ali, onde nenhuma linha
pode lembrar, porque mais doce,
o que até chega a parecer
suave serra de uma foice,

não se vê um palmo de terra
por mais pedra ou fera que seja,
que a cabra não tenha ocupado
com sua planta fibrosa e negra.

1

A cabra é negra. Mas seu negro
não é o negro do ébano douto
(que é quase azul) ou o negro rico
do jacarandá (mais bem roxo).

O negro da cabra é o negro
do preto, do pobre, do pouco.
Negro da poeira, que é cinzento.
Negro da ferrugem, que é fosco.

Negro do feio, às vezes branco.
Ou o negro do pardo, que é pardo.
disso que não chega a ter cor
ou perdeu toda cor no gasto.

É o negro da segunda classe.
Do inferior (que é sempre opaco).
Disso que não pode ter cor
porque em negro sai mais barato.

2

Se o negro quer dizer noturno
o negro da cabra é solar.
Não é o da cabra o negro noite.
É o negro de sol. Luminar.

Será o negro do queimado
mais que o negro da escuridão.
Negra é do sol que acumulou.
É o negro mais bem do carvão.

Não é o negro do macabro.
Negro funeral. Nem do luto.
Tampouco é o negro do mistério,
de braços cruzados, eunuco.

É mesmo o negro do carvão.
O negro da hulha. Do coque.
Negro que pode haver na pólvora:
negro de vida, não de morte.

3

O negro da cabra é o negro
da natureza dela cabra.
Mesmo dessa que não é negra,
como a do Moxotó, que é clara.

O negro é o duro que há no fundo
da cabra. De seu natural.
Tal no fundo da terra há pedra,
no fundo da pedra, metal.

O negro é o duro que há no fundo
da natureza sem orvalho
que é a da cabra, esse animal
sem folhas, só raiz e talo,

que é a da cabra, esse animal
de alma-caroço, de alma córnea,
sem moelas, úmidos, lábios,
pão sem miolo, apenas côdea.

4

Quem já encontrou uma cabra
que tivesse ritmos domésticos?
O grosso derrame do porco,
da vaca, do sono e de tédio?

Quem encontrou cabra que fosse
animal de sociedade?
Tal o cão, o gato, o cavalo,
diletos do homem e da arte?

A cabra guarda todo o arisco,
rebelde, do animal selvagem,
viva demais que é para ser
animal dos de luxo ou pajem.

Viva demais para não ser,
quando colaboracionista,
o reduzido irredutível,
o inconformado conformista.

5

A cabra é o melhor instrumento
de verrumar a terra magra.
Por dentro da serra e da seca
não chega onde chega a cabra.

Se a serra é terra, a cabra é pedra.
Se a serra é pedra, é pedernal.
Sua boca é sempre mais dura
que a serra, não importa qual.

A cabra tem o dente frio,
a insolência do que mastiga.
Por isso o homem vive da cabra
mas sempre a vê como inimiga.

Por isso quem vive da cabra
e não é capaz do seu braço
desconfia sempre da cabra:
diz que tem parte com o Diabo.

6

Não é pelo vício da pedra,
por preferir a pedra à folha.
É que a cabra é expulsa do verde,
trancada do lado de fora.

A cabra é trancada por dentro.
Condenada à caatinga seca.
Liberta, no vasto sem nada,
proibida, na verdura estreita.

Leva no pescoço uma canga
que a impede de furar as cercas.
Leva os muros do próprio cárcere:
prisioneira e carcereira.

Liberdade de fome e sede
da ambulante prisioneira.
Não é que ela busque o difícil:
é que a sabem capaz de pedra.

7

A vida da cabra não deixa
lazer para ser fina ou lírica
(tal o urubu, que em doces linhas
voa à procura da carniça).

Vive a cabra contra a pendente,
sem os êxtases das decidas.
Viver para a cabra não é
re-ruminar-se introspectiva.

É, literalmente, cavar
a vida sob a superfície,
que a cabra, proibida de folhas,
tem de desentranhar raízes.

Eis porque é a cabra grosseira,
de mãos ásperas, realista.
Eis porque, mesmo ruminando,
não é jamais contemplativa.

8

O núcleo de cabra é visível
por debaixo de muitas coisas.
Com a natureza da cabra
outras aprendem sua crosta.

Um núcleo de cabra é visível
em certos atributos roucos
que têm as coisas obrigadas
a fazer de seu corpo couro.

A fazer de seu couro sola,
a armar-se em couraças, escamas:
como se dá com certas coisas
e muitas condições humanas.

Os jumentos são animais
que muito aprenderam com a cabra.
O nordestino, convivendo-a,
fez-se de sua mesma casta.

9

O núcleo de cabra é visível
debaixo do homem do Nordeste.
Da cabra lhe vem o escarpado
e o estofo nervudo que o enche.

Se adivinha o núcleo de cabra
no jeito de existir, Cardozo,
que reponta sob seu gesto
como esqueleto sob o corpo.

E é outra ossatura mais forte
que o esqueleto comum, de todos;
debaixo do próprio esqueleto,
no fundo centro de seus ossos.

A cabra deu ao nordestino
esse esqueleto mais de dentro:
o aço do osso, que resiste
quando o osso perde seu cimento.

*

O Mediterrâneo é mar clássico,
com águas de mármore azul.
Em nada me lembra das águas
sem marca do rio Pajeú.

As ondas do Mediterrâneo
estão no mármore traçadas.
Nos rios do Sertão, se existe,
a água corre despenteada.

As margens do Mediterrâneo
parecem deserto balcão.
Deserto, mas de terras nobres
não da piçarra do Sertão.

Mas não minto o Mediterrâneo
nem sua atmosfera maior
descrevendo-lhe as cabras negras
em termos da do Moxotó.


Texto extraído do livro "João Cabral de Melo Neto - Obra completa", Editora Nova Aguilar - Rio de Janeiro, 1994, pág. 254.

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A máquina do mundo
em 11/02/2008 22:10:00 (6157 leituras)
Carlos Drummond de Andrade

E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.



Este poema foi escolhido como o melhor poema brasileiro de todos os tempos por um grupo significativo de escritores e críticos, a pedido do caderno “MAIS” (edição de 02-01-2000), publicado aos domingos pelo jornal “Folha de São Paulo”. Publicado originalmente no livro “Claro Enigma”, o texto acima foi extraído do livro “Nova Reunião”, José Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1985, pág. 300.



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LEMBREM DE MIM
em 11/02/2008 09:18:12 (11797 leituras)
Paulo Leminski

1.

como quem assiste missa
como quem hesita, mestiça,
entre a pressa e a preguiça

2.

já me matei faz muito tempo
me matei quando o tempo era escasso
e o que havia entre o tempo e o espaço
era o de sempre
nunca mesmo o sempre passo

morrer faz bem à vista e ao baço
melhora o ritmo do pulso
e clareia a alma

morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma

3.

um homem com uma dor
é muito mais elegante
caminha assim de lado
como se chegando atrasado
andasse mais adiante

carrega o peso da dor
como se portasse medalhas
uma coroa um milhão de dólares
ou coisa que os valha

ópios édens analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo que me sobra
sofrer, vai ser minha última obra

4 e 5.

LÁPIDE 1
epitáfio para o corpo

Aqui jaz um grande poeta.
Nada deixou escrito.
Este silêncio, acredito
são suas obras completas.

LÁPIDE 2
epitáfio para a alma

aqui jaz um artista
mestre em disfarces

viver
com a intensidade da arte
levou-o ao infarte

deus tenha pena
dos seus disfarces

6.

Aço e Flor

Quem nunca viu
que a flor, a faca e a fera
tanto fez como tanto faz,
e a forte flor que a faca faz
na fraca carne,
um pouco menos, um pouco mais,
quem nunca viu
a ternura que vai
no fio da lâmina samurai,
esse, nunca vai ser capaz.

7.

a estrela cadente
me caiu ainda quente
na palma da mão

8.

parem
eu confesso
sou poeta

cada manhã que nasce
me nasce
uma rosa na face

parem
eu confesso
sou poeta

só meu amor é meu deus

eu sou o seu profeta

9.

desta vez não vai ter neve como em petrogrado aquele dia
o céu vai estar limpo e o sol brilhando
você dormindo e eu sonhando

nem casacos nem cossacos como em petrogrado aquele dia
apenas você nua e eu como nasci
eu dormindo e você sonhando

não vai mais ter multidões gritando como em petrogrado
[aquele dia
silêncio nós dois murmúrios azuis
eu e você dormindo e sonhando

nunca mais vai ter um dia como em petrogrado aquele dia
nada como um dia indo atrás do outro vindo
você e eu sonhando e dormindo

10.

para a liberdade e luta

me enterrem com os trotskistas
na cova comum dos idealistas
onde jazem aqueles
que o poder não corrompeu

me enterrem com meu coração
na beira do rio
onde o joelho ferido
tocou a pedra da paixão

11.

en la lucha de clases
todas las armas son buenas
piedras
moches
poemas


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Ambiciosa
em 30/01/2008 15:10:00 (9112 leituras)
Florbela Espanca

Para aqueles fantasmas que passaram,
Vagabundos a quem jurei amar,
Nunca os meus braços lânguidos traçaram
O voo dum gesto para os alcançar...

Se as minhas mãos em garra se cravaram
Sobre um amor em sangue a palpitar...
- Quantas panteras bárbaras mataram
Só pelo raro gosto de matar!

Minh'alma é como uma pedra funerária
Erguida na montanha solitária,
Interrogando a vibração dos céus!

O amor dum homem? - Terra tão pisada,
Gota de chuva ao vento baloiçada...
Um homem? - Quando eu sonho o amor dum Deus!...



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Tenho frio e ardo em febre!
em 30/01/2008 15:10:00 (7247 leituras)
Olavo Bilac

Tenho frio e ardo em febre!
O amor me acalma e endouda! O amor me eleva e abate!
Quem há que os laços, que me prendem, quebre?
Que singular, que desigual combate!
Não sei que ervada flecha
Mão certeira e falaz me cravou com tal jeito,
Que, sem que eu a sentisse, a estreita brecha
Abriu, por onde o amor entrou meu peito.

O amor me entrou tão cauto
O incauto coração, que eu nem cuidei que estava,
Ao recebê-lo, recebendo o arauto
Desta loucura desvairada e brava.

Entrou. E, apenas dentro,
Deu-me a calma do céu e a agitação do inferno...
E hoje... ai de mim!, que dentro em mim concentro
Dores e gostos num lutar eterno!

O amor, Senhora, vede:
Prendeu-me. Em vão me estorço, e me debato, e grito;
Em vão me agito na apertada rede...
Mais me embaraço quanto mais me agito!

Falta-me o senso: a esmo,
Como um cego, a tatear, busco nem sei que porto:
E ando tão diferente de mim mesmo,
Que nem sei se estou vivo ou se estou morto.

Sei que entre as nuvens paira
Minha fronte, e meus pés andam pisando a terra;
Sei que tudo me alegra e me desvaira,
E a paz desfruto, suportando a guerra.

E assim peno e assim vivo:
Que diverso querer! Que diversa vontade!
Se estou livre, desejo estar cativo;
Se cativo, desejo a liberdade!

E assim vivo, e assim peno:
Tenho a boca a sorrir e os olhos cheios de água;
E acho o néctar num cálix de veneno,
A chorar de prazer e a rir de mágoa.

Infinda mágoa! Infindo
Prazer! Pranto gostoso e sorrisos convulsos!
Ah! Como dói assim viver, sentindo
Asas nos ombros e grilhões nos pulsos!



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Rifa-se um coração (quase novo)
em 30/01/2008 15:00:00 (26155 leituras)
Clarice Lispector

Rifa-se um coração quase novo.
Um coração idealista.
Um coração como poucos.
Um coração à moda antiga.
Um coração moleque que insiste em pregar peças no seu usuário.
Rifa-se um coração que na realidade
está um pouco usado, meio calejado, muito machucado
e que teima em alimentar sonhos, e cultivar ilusões.
Um pouco inconseqüente
que nunca desiste de acreditar nas pessoas.
Um leviano e precipitado,
coração que acha que Tim Maia estava certo
quando escreveu... "não quero dinheiro,
eu quero amor sincero, é isso que eu espero...".
Um idealista...
Um verdadeiro sonhador...
Rifa-se um coração que nunca aprende.
Que não endurece,
e mantém sempre viva a esperança de ser feliz,
sendo simples e natural.
Um coração insensato que comanda o racional
sendo louco o suficiente para se apaixonar.
Um furioso suicida que vive procurando relações
e emoções verdadeiras.
Rifa-se um coração que insiste
em cometer sempre os mesmos erros.
Esse coração que erra, briga, se expõe.
Perde o juízo por completo em nome de causas e paixões.
Sai do sério e, às vezes revê suas posições
arrependido de palavras e gestos.
Este coração tantas vezes incompreendido.
Tantas vezes provocado. Tantas vezes impulsivo.
Rifa-se este desequilibrado emocional que,
abre sorrisos tão largos que quase dá pra engolir as orelhas,
mas que também arranca lágrimas e faz murchar o rosto.
Um coração para ser alugado,
ou mesmo utilizado por quem gosta de emoções fortes.
Um órgão abestado
indicado apenas para quem quer viver intensamente e,
contra indicado para os que apenas pretendem passar pela vida
matando o tempo, defendendo-se das emoções.
Rifa-se um coração tão inocente
que se mostra sem armaduras e deixa louco o seu usuário.
Um coração que quando parar de bater
ouvirá o seu usuário dizer para São Pedro na hora da prestação de contas:
" O Senhor poder conferir", eu fiz tudo certo,
só errei quando coloquei sentimento.
Só fiz bobagens e me dei mal
quando ouvi este louco coração de criança
que insiste em não endurecer e, se recusa a envelhecer".
Rifa-se um coração, ou mesmo troca-se por outro
que tenha um pouco mais de juízo.
Um órgão mais fiel ao seu usuário.
Um amigo do peito que não maltrate tanto o ser que o abriga.
Um coração que não seja tão inconseqüente.
Rifa-se um coração cego, surdo e mudo,
mas que incomoda um bocado.
Um verdadeiro caçador de aventuras que,
ainda não foi adotado, provavelmente,
por se recusar a cultivar ares selvagens ou racionais,
por não querer perder o estilo.
Oferece-se um coração vadio, sem raça, sem pedigree.
Um simples coração humano.
Um impulsivo membro de comportamento até meio ultrapassado.
Um modelo cheio de defeitos que,
mesmo estando fora do mercado,
faz questão de não se modernizar, mas vez por outra,
constrange o corpo que o domina.
Um velho coração que convence seu usuário
a publicar seus segredos e, a ter a petulância
de se aventurar como poeta.


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Amavisse
em 15/01/2008 16:40:00 (3703 leituras)
Hilda Hilst

Como se te perdesse, assim te quero.

Como se não te visse (favas douradas

Sob um amarelo) assim te apreendo brusco

Inamovível, e te respiro inteiro



Um arco-íris de ar em águas profundas.



Como se tudo o mais me permitisses,

A mim me fotografo nuns portões de ferro

Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima

No dissoluto de toda despedida.



Como se te perdesse nos trens, nas estações

Ou contornando um círculo de águas

Removente ave, assim te somo a mim:

De redes e de anseios inundada.


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Eu amo tudo o que foi
em 28/12/2007 13:50:00 (29470 leituras)
Fernando Pessoa

Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.




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Poema de natal
em 19/12/2007 22:10:00 (18404 leituras)
Vinícius de Moraes

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados,
Para chorar e fazer chorar,
Para enterrar os nossos mortos - Por isso temos braços longos para os adeuses,
Mãos para colher o que foi dado,
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida;
Uma tarde sempre a esquecer,
Uma estrêla a se apagar na treva,
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar,
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.

Não há muito que dizer:
Uma canção sôbre um berço,
Um verso, talvez, de amor,
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E que por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.

Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre,
Para a participação da poesia,
Para ver a face da morte -
De repente, nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte apenas
Nascemos, imensamente.


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O Amor em Visita
em 09/12/2007 14:50:00 (10297 leituras)
Herberto Helder

O AMOR EM VISITA

Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lúbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar,
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marítimo
e o pão for invadido pelas ondas,
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes
ele - imagem inacessível e casta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.

Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.
Ah! em cada mulher existe uma morte silenciosa;
e enquanto o dorso imagina, sob nossos dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
- Ó cabra no vento e na urze, mulher nua sob
as mãos, mulher de ventre escarlate onde o sal põe o espírito,
mulher de pés no branco, transportadora
da morte e da alegria.

Dai-me uma mulher tão nova como a resina
e o cheiro da terra.
Com uma flecha em meu flanco, cantarei.

E enquanto manar de minha carne uma videira de sangue,
cantarei seu sorriso ardendo,
suas mamas de pura substância,
a curva quente dos cabelos.
Beberei sua boca, para depois cantar a morte
e a alegria da morte.

Dai-me um torso dobrado pela música, um ligeiro
pescoço de planta,
onde uma chama comece a florir o espírito.
À tona da sua face se moverão as águas,
dentro da sua face estará a pedra da noite.
- Então cantarei a exaltante alegria da morte.

Nem sempre me incendeiam o acordar das ervas e a estrela
despenhada de sua órbita viva.

- Porém, tu sempre me incendeias.
Esqueço o arbusto impregnado de silêncio diurno, a noite
imagem pungente
com seu deus esmagado e ascendido.
- Porém, não te esquecem meus corações de sal e de brandura.

Entontece meu hálito com a sombra,
tua boca penetra a minha voz como a espada
se perde no arco.
E quando gela a mãe em sua distância amarga, a lua
estiola, a paisagem regressa ao ventre, o tempo
se desfibra - invento para ti a música, a loucura
e o mar.

Toco o peso da tua vida: a carne que fulge, o sorriso,
a inspiração.
E eu sei que cercaste os pensamentos com mesa e harpa.
Vou para ti com a beleza oculta,
o corpo iluminado pelas luzes longas.
Digo: eu sou a beleza, seu rosto e seu durar. Teus olhos
transfiguram-se, tuas mãos descobrem
a sombra da minha face. Agarro tua cabeça
áspera e luminosa, e digo: ouves, meu amor?, eu sou
aquilo que se espera para as coisas, para o tempo -
eu sou a beleza.
Inteira, tua vida o deseja. Para mim se erguem
teus olhos de longe. Tu própria me duras em minha velada beleza.

Então sento-me à tua mesa. Porque é de ti
que me vem o fogo.
Não há gesto ou verdade onde não dormissem
tua noite e loucura,
não há vindima ou água
em que não estivesses pousando o silêncio criador.
Digo: olha, é o mar e a ilha dos mitos
originais.
Tu dás-me a tua mesa, descerras na vastidão da terra
a carne transcendente. E em ti
principiam o mar e o mundo.

Minha memória perde em sua espuma
o sinal e a vinha.
Plantas, bichos, águas cresceram como religião
sobre a vida - e eu nisso demorei
meu frágil instante. Porém
teu silêncio de fogo e leite repõe
a força maternal, e tudo circula entre teu sopro
e teu amor. As coisas nascem de ti
como as luas nascem dos campos fecundos,
os instantes começam da tua oferenda
como as guitarras tiram seu início da música nocturna.

Mais inocente que as árvores, mais vasta
que a pedra e a morte,
a carne cresce em seu espírito cego e abstracto,
tinge a aurora pobre,
insiste de violência a imobilidade aquática.
E os astros quebram-se em luz sobre
as casas, a cidade arrebata-se,
os bichos erguem seus olhos dementes,
arde a madeira - para que tudo cante
pelo teu poder fechado.
Com minha face cheia de teu espanto e beleza,
eu sei quanto és o íntimo pudor
e a água inicial de outros sentidos.

Começa o tempo onde a mulher começa,
é sua carne que do minuto obscuro e morto
se devolve à luz.
Na morte referve o vinho, e a promessa tinge as pálpebras
com uma imagem.
Espero o tempo com a face espantada junto ao teu peito
de sal e de silêncio, concebo para minha serenidade
uma ideia de pedra e de brancura.
És tu que me aceitas em teu sorriso, que ouves,
que te alimentas de desejos puros.
E une-se ao vento o espírito, rarefaz-se a auréola,
a sombra canta baixo.

Começa o tempo onde a boca se desfaz na lua,
onde a beleza que transportas como um peso árduo
se quebra em glória junto ao meu flanco
martirizado e vivo.
- Para consagração da noite erguerei um violino,
beijarei tuas mãos fecundas, e à madrugada
darei minha voz confundida com a tua.

Oh teoria de instintos, dom de inocência,
taça para beber junto à perturbada intimidade
em que me acolhes.

Começa o tempo na insuportável ternura
com que te adivinho, o tempo onde
a vária dor envolve o barro e a estrela, onde
o encanto liga a ave ao trevo. E em sua medida
ingénua e cara, o que pressente o coração
engasta seu contorno de lume ao longe.
Bom será o tempo, bom será o espírito,
boa será nossa carne presa e morosa.
- Começa o tempo onde se une a vida
à nossa vida breve.

Estás profundamente na pedra e a pedra em mim, ó urna
salina, imagem fechada em sua força e pungência.
E o que se perde de ti, como espírito de música estiolado
em torno das violas, a morte que não beijo,
a erva incendiada que se derrama na íntima noite
- o que se perde de ti, minha voz o renova
num estilo de prata viva.

Quando o fruto empolga um instante a eternidade
inteira, eu estou no fruto como sol
e desfeita pedra, e tu és o silêncio, a cerrada
matriz de sumo e vivo gosto.
- E as aves morrem para nós, os luminosos cálices
das nuvens florescem, a resina tinge
a estrela, o aroma distancia o barro vermelho da manhã.
E estás em mim como a flor na ideia
e o livro no espaço triste.

Se te apreendessem minhas mãos, forma do vento
na cevada pura, de ti viriam cheias
minhas mãos sem nada. Se uma vida dormisses
em minha espuma,
que frescura indecisa ficaria no meu sorriso?
- No entanto és tu que te moverás na matéria
da minha boca, e serás uma árvore
dormindo e acordando onde existe o meu sangue.

Beijar teus olhos será morrer pela esperança.
Ver no aro de fogo de uma entrega
tua carne de vinho roçada pelo espírito de Deus
será criar-te para luz dos meus pulsos e instante
do meu perpétuo instante.
- Eu devo rasgar minha face para que a tua face
se encha de um minuto sobrenatural,
devo murmurar cada coisa do mundo
até que sejas o incêndio da minha voz.

As águas que um dia nasceram onde marcaste o peso
jovem da carne aspiram longamente
a nossa vida. As sombras que rodeiam
o êxtase, os bichos que levam ao fim do instinto
seu bárbaro fulgor, o rosto divino
impresso no lodo, a casa morta, a montanha
inspirada, o mar, os centauros do crepúsculo
- aspiram longamente a nossa vida.

Por isso é que estamos morrendo na boca
um do outro. Por isso é que
nos desfazemos no arco do verão, no pensamento
da brisa, no sorriso, no peixe,
no cubo, no linho, no mosto aberto
- no amor mais terrível do que a vida.

Beijo o degrau e o espaço. O meu desejo traz
o perfume da tua noite.
Murmuro os teus cabelos e o teu ventre, ó mais nua
e branca das mulheres. Correm em mim o lacre
e a cânfora, descubro tuas mãos, ergue-se tua boca
ao círculo de meu ardente pensamento.
Onde está o mar? Aves bêbedas e puras que voam
sobre o teu sorriso imenso.
Em cada espasmo eu morrerei contigo.

E peço ao vento: traz do espaço a luz inocente
das urzes, um silêncio, uma palavra;
traz da montanha um pássaro de resina, uma lua
vermelha.
Oh amados cavalos com flor de giesta nos olhos novos,
casa de madeira do planalto,
rios imaginados,
espadas, danças, superstições, cânticos, coisas
maravilhosas da noite. Ó meu amor,
em cada espasmo eu morrerei contigo.

De meu recente coração a vida inteira sobe,
o povo renasce,
o tempo ganha a alma. Meu desejo devora
a flor do vinho, envolve tuas ancas com uma espuma
de crepúsculos e crateras.

Ó pensada corola de linho, mulher que a fome
encanta pela noite equilibrada, imponderável -
em cada espasmo eu morrerei contigo.

E à alegria diurna descerro as mãos. Perde-se
entre a nuvem e o arbusto o cheiro acre e puro
da tua entrega. Bichos inclinam-se
para dentro do sono, levantam-se rosas respirando
contra o ar. Tua voz canta
o horto e a água - e eu caminho pelas ruas frias com
o lento desejo do teu corpo.
Beijarei em ti a vida enorme, e em cada espasmo
eu morrerei contigo.

Herberto Helder


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Autopsicografia
em 01/06/2008 12:20:00 (3948 leituras)
Fernando Pessoa


O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.



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Vida e Obra
em 30/05/2008 14:22:24 (38384 leituras)
Bertold Brecht

Bertolt Brecht (Augsburg, 10 de Fevereiro de 1898 — Berlim, 14 de Agosto de 1956) foi um influente dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX.

Biografia

Nascido Eugen Berthold Friedrich Brecht na Baviera, Brecht estudou Medicina e trabalhou como enfermeiro num hospital em Munique durante a Primeira Guerra Mundial. Filho da burguesia, sofreu, como todos em seu país, a sensação de desolamento de encarar um país completamente destruído pela guerra.

Depois da guerra mudou-se para Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para a apetência do público pelo teatro moderno. Já em Munique, as suas primeiras peças (Baal (1918/1926) "Tambores na Noite" Trommeln in der Nacht(1918-1920) ) foram levadas ao palco e Brecht conheceu Erich Engel com quem veio a trabalhar até ao fim da sua vida. Em Berlim, a peça Im Dickicht der Städte, protagonizado por Fritz Kortner e dirigido por Engel, tornou-se no seu primeiro sucesso.

O totalitarismo afirmava-se como a força renovadora que não só iria reerguer o país, como se outorgava a missão de reviver o Sacro Império Romano-Germânico. Mas, ao mesmo tempo, chegavam à Alemanha influências da recém formada União Soviética, com sua bem-sucedida implantação de um regime socialista, o que significava esperança para um povo sofrido como o da Alemanha naquele período. É a este último grupo que Brecht vai se unir, na ânsia de debelar o seu desespero existencial. No entanto, depois de Hitler eleito em 1933 Brecht não estava totalmente seguro na Alemanha Nazista, exilando-se na Áustria, Suíça, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e finalmente nos Estados Unidos. Recebeu o Prêmio Lênin da Paz em 1954.

Obra

As suas principais influências foram Constantin Stanislavski, Vsevolod Emilevitch Meyerhold e Erwin Piscator. Stanislavski é o primeiro revolucionário, e suas teorias servem de base para o trabalho de Meyerhold e seu "método biomecânico" cuja principal intenção é fazer com que o ator exprima as nuanças psicológicas de seu personagem através de uma "máscara pantomímica".

Ele já desenvolve a técnica de comentar o texto através do gesto, inspiração asiática evidente no teatro de Brecht. A contribuição de Piscator é a noção de um teatro propagandístico e educativo. É ele quem abre caminho para o verdadeiro teatro épico teorizado e executado por Brecht. Também foram influências significativas os seus estudos sobre Sociologia e o marxismo.

Podem ser identificadas duas motivações principais para o Teatro Épico de Brecht:

•a concepção marxista do Homem, um ser que deve ser entendido observando-se o conjunto de todas as relações sociais de que participa. Para Brecht, a forma épica é a única capaz de apresentar as determinantes sociais das relações inter-humanas.

•o seu intuito didático, a necessidade de um "palco científico" capaz de desmistificar as relações da sociedade, esclarecendo o público e suscitando a ação transformadora.

Algumas de suas principais obras são:

"Um Homem É um Homem", em que cresce a idéia do homem como um ser transformável,

"Mãe Coragem e Seus Filhos", sobre a Guerra dos Trinta Anos, escrita no exílio no começo da Segunda Guerra Mundial, e

"A Vida de Galileu", drama biográfico com o qual Brecht encontra definitivamente o caminho do teatro dialético. Afirma Bernard Dort a respeito deste último:

"... Galileu foi escrita, pelo menos originalmente, para servir de exemplo e de conselho aos sábios alemães tentados a abdicar seu saber nas mãos dos chefes nazistas. "

Além dessas, escreveu "Seu Puntila e seu Criado Matti", "A Irresistível Ascenção de Arturo Ui", "O Círculo de Giz Caucasiano" e "A Boa Alma de Setzuan".

Brecht deixou marcas em Berlim:

Um trajeto por Berlim resgata os passos do dramaturgo Bertolt Brecht pela metrópole da República de Weimar e capital da Alemanha Oriental.
Berlim é uma cidade por onde já passaram incontáveis artistas e intelectuais. Mas talvez nenhum outro escritor moderno tenha deixado pistas tão nítidas na cidade como o dramaturgo Bertolt Brecht, autor da Ópera dos Três Vinténs e mentor do chamado Teatro Épico.

Berlim foi a cidade em que o jovem autor nascido em Augsburg conseguiu chamar a atenção dos intelectuais e do público para sua obra. Em 1924, Brecht mudou de sua cidade bávara para Berlim, onde trabalhou com o escritor Carl Zuckmayer no Deutsches Theater.

A efervescência cultural da República de Weimar teve fim com a ascensão do nazismo. No início de 1933, uma apresentação da peça A Medida, de Brecht, foi interrompida por policiais. Um dia antes do atentado incendiário contra o Reichstag (Platz der Republik 1), em fevereiro do mesmo ano, Brecht partiu com seus filhos e sua terceira mulher, a atriz vienense Helene Weigel, para o exílio dinamarquês. No mesmo ano, as obras de Brecht foram lançadas ao fogo durante a queima de livros organizada pelos nazistas na Opernplatz, atual Bebelplatz.

Após os nazistas invadirem a Dinamarca, Brecht emigrou para os Estados Unidos, onde permaneceu até 1948. Após uma permanência na Suíça, o dramaturgo retornou à Alemanha Oriental em 1949, com passaporte tcheco, já que sua cidadania tinha sido cassada pelos nazistas em 1935.

Ao retornar a Berlim, Brecht residiu com Helene Weigel numa casa na Chausseestrasse 125, em Mitte. Desde 1989, este endereço abriga a Casa Brecht, onde se pode visitar a última residência do casal, o arquivo Berthold Brecht e o restaurante com receitas da austríaca Helene Weigel.

De volta à Alemanha, Brecht e Weigel criaram sua própria companhia, o Berliner Ensemble, que inicialmente funcionou no Deutsches Theater, instalando-se posteriormente no Theater am Schiffbauerdamm, onde a Ópera dos Três Vinténs havia estreado em 1928. Em 1954, esta se tornou a sede definitiva do Berliner Ensemble.

A Akademie der Künste (Academia das Artes) da Alemanha Oriental (Pariser Platz 4), da qual Brecht era membro, foi reinaugurada em maio de 2005, nas imediações do Portão de Brandemburgo. O edifício foi projetado por Behnisch & Partner com Werner Durth e funciona hoje como espaço de exposições.

Bertolt Brecht faleceu no hospital Charité (o único arranha-céu nas imediações do Berliner Ensemble), em agosto de 1956, em decorrência de um infarto. Ele está enterrado ao lado de Helene Weigel no Dorotheenstädtischer Friedhof ao lado da Casa Brecht.



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Vida e Obra
em 23/05/2008 20:18:16 (27683 leituras)
Augusto dos Anjos

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu no Engenho Pau d'Arco, Paraíba, no dia 20 de abril de 1884. Aprendeu com seu pai, bacharel, as primeiras letras. Fez o curso secundário no Liceu Paraibano, já sendo dado como doentio e nervoso por testemunhos da época. De uma família de proprietários de engenhos, assiste, nos primeiros anos do século XX, à decadência da antiga estrutura latifundiária, substituída pelas grandes usinas. Em 1903, matricula-se na Faculdade de Direito do Recife, formando-se em 1907. Ali teve contato com o trabalho "A Poesia Científica", do professor Martins Junior. Formado em direito, não advogou; vivia de ensinar português. Casou-se, em 04 de julho de 1910, com Ester Fialho. Nesse ano, em conseqüência de desentendimento com o governador, é afastado do cargo de professor do Liceu Paraibano. Muda-se para o Rio de Janeiro e dedica-se ao magistério. Lecionou geografia na Escola Normal, depois Instituto de Educação, e no Ginásio Nacional, depois Colégio Pedro II, sem conseguir ser efetivado como professor. Em 1911, morre prematuramente seu primeiro filho. Em fins de 1913 mudou-se para Leopoldina MG, onde assumiu a direção do grupo escolar e continuou a dar aulas particulares. Seu único livro, "Eu", foi publicado em 1912. Surgido em momento de transição, pouco antes da virada modernista de 1922, é bem representativo do espírito sincrético que prevalecia na época, parnasianismo por alguns aspectos e simbolista por outros. Praticamente ignorado a princípio, quer pelo público, quer pela crítica, esse livro que canta a degenerescência da carne e os limites do humano só alcançou novas edições graças ao empenho de Órris Soares (1884-1964), amigo e biógrafo do autor.

Cético em relação às possibilidades do amor ("Não sou capaz de amar mulher alguma, / Nem há mulher talvez capaz de amar-me"), Augusto dos Anjos fez da obsessão com o próprio "eu" o centro do seu pensamento. Não raro, o amor se converte em ódio, as coisas despertam nojo e tudo é egoísmo e angústia em seu livro patético ("Ai! Um urubu pousou na minha sorte"). A vida e suas facetas, para o poeta que aspira à morte e à anulação de sua pessoa, reduzem-se a combinações de elementos químicos, forças obscuras, fatalidades de leis físicas e biológicas, decomposições de moléculas. Tal materialismo, longe de aplacar sua angústia, sedimentou-lhe o amargo pessimismo ("Tome, doutor, essa tesoura e corte / Minha singularíssima pessoa"). Ao asco de volúpia e à inapetência para o prazer contrapõe-se porém um veemente desejo de conhecer outros mundos, outras plagas, onde a força dos instintos não cerceie os vôos da alma ("Quero, arrancado das prisões carnais, / Viver na luz dos astros imortais").

A métrica rígida, a cadência musical, as aliterações e rimas preciosas dos versos fundiram-se ao esdrúxulo vocabulário extraído da área científica para fazer do "Eu" - desde 1919 constantemente reeditado como "Eu e outras poesias" - um livro que sobrevive, antes de tudo, pelo rigor da forma. Com o tempo, Augusto dos Anjos tornou-se um dos poetas mais lidos do país, sobrevivendo às mutações da cultura e a seus diversos modismos como um fenômeno incomum de aceitação popular. Vitimado pela pneumonia aos trinta anos de idade, morreu em Leopoldina em 12 de novembro de 1914.

Na 46ª edição desse livro consta na contra capa, o comentário de Drummond sobre "EU".

Comentário de Carlos Drummond de Andrade sobre o livro "EU":

"Li o "EU" na adolescência e foi como se levasse um soco na cara. Jamais eu vira antes, engastados decassílabos, palavras estranhas como "simbiose", "fenomênica", "quimiotaxia", "zooplasma", "intracefálica"... E elas funcionaram bem nos versos. Ao espanto sucedeu intensa curiosidade. Quis ler mais esse poeta diferente dos clássicos, dos românticos, dos simbolistas, de todos os poetas que eu conhecia. A leitura do "EU" foi para mim uma aventura milionária. Enriqueceu minha noção de poesia. Vi como se pode fazer lirismo sem dramaticidade permanente, que se grava para sempre na memória do leitor. Augusto dos Anjos continua sendo o grande caso singular da poesia brasileira."

Carlos Drummond de Andrade


*Resposta ao Inquérito por Augusto dos Anjos para Licínio dos Santos. RJ-1914.

Nome: Augusto dos Anjos

Idade: 28 anos

Profissão: Professor e Advogado

Filiação Filho legítimo do bacharel Alexandre R.dos Anjos e D. Córdula C.R. dos Anjos.

Estado Civil: Casado

Antecedentes Hereditários: Meu pai, vítima de surmenage, morreu de paralisia geral, e minha mãe é excessivamente nervosa.

Antecedentes Pessoais:

O que pode me adiantar sobre sua infância? – Desde a mais tenra idade eu me entreguei exclusivamente aos estudos, relegando por completo tudo quanto concerne ao desenvolvimento, numa atmosfera de rigorosíssima moralidade, da chamada vida física.

Onde e como foi educado? - Na Paraíba do Norte, Engenho Pau d”Arco.

Quais os autores que mais o impressionaram? – Shakespeare, Edgar Poe.

Qual o seu autor favorito? – Todos os bons autores me agradam.

Como faz o seu trabalho intelectual? – Durante o dia, quase sempre andando no meio de toda azáfama ambiente ou à noite, deitado. Conservo de memória tudo quanto produzo. São poucas vezes quem me sento à mesa para produzir.

Quais as horas que dedica ao seu trabalho intelectual? – Não tenho horas metodicamente preferidas para o meu trabalho mental.

O que sente de anormal quando está produzindo? – Uma série indescritível de fenômenos nervosos, acompanhados muitas vezes de uma vontade de chorar.

Em que idade começou a produzir? – Se não me falha o poder de reminiscência, presumo, comecei a produzir muito antes dos 9 anos.

Quais os trabalhos que deu à luz até a presente data? – Um livro de versos, EU.

Quais as cores de sua predileção? – A vermelha e a azul.

Quantas horas repousa? – Meu repouso varia de 7 a 8 horas.
Sofre de insônia, cefaléia ou amnésia? – Até a data não sofro absolutamente de amnésia. Tenho insônia raras vezes, mas a cefalalgia persegue-me constantemente.

Tem continuados sonhos fantásticos? – Quanto a sonhos fantásticos é também muito raramente que os tenho.

Faz as suas refeições com irregularidade? – Sim.

Tem muito apetite? – Regular.

Faz uso de álcool? – Não.

Faz uso excessivo do café, chá ou outro excitante intelectual? – Sou contra os excessos, o que não impede, entretanto, de abusar um pouco do café.


*Fonte: 46ªEdição "EU" e outras poesias de Augusto dos Anjos.


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Vida e Obra
em 21/05/2008 15:50:00 (22490 leituras)
Arthur Rimbaud

Jean-Nicolas Arthur Rimbaud (20 de outubro de 1854, Charleville - 10 de novembro de 1891, Marselha) foi um poeta francês.

Arthur Rimbaud nasceu em no seio da classe média provincial de Charleville (hoje parte de Charleville-Mézières) no Ardennes departement no nordeste da França.

Ele foi o segundo filho de Vitalie Rimbaud (Cuif, antes de se casar) e o Capitão Frédéric, que lutou na conquista de Algeria e foi premiado com a Légion d'honneur.

Logo depois que o casal teve a quinta criança (Frédéric, Arthur, Victorine (que morreu um mês depois do nascimento), Vitalie e Isabelle), o pai deixou a família.

Crescendo separadamente de seu pai, pelos escritos de Rimbaud é evidente que nunca se sentiu amado por sua mãe. Quando garoto era impaciente, inquieto, porém um estudante brilhante. Pela idade de quinze anos ganhou muitos prêmios e compôs versos originais e diálogos em Latim.

Em 1870 seu professor Georges Izambard se tornou o mentor literário de Rimbaud e seus versos em francês começaram a melhorar rapidamente.

Ele fugia freqüentemente de casa e pode ter se unido por pouco tempo à Comuna de Paris de 1871, que foi retratada em seu poema L'orgie parisienne (“A Orgia Parisiense” ou “Paris Repovoada”); pode ter sofrido violências sexuais por soldados bêbados da comuna (e seu poema Le cœur supplicié (“O Coração Torturado”) parece sugerir).

Nesta época ele se tornou um anarquista, começou a beber e se divertia chocando a burguesia local com suas vestes rotas e o cabelo longo. Neste mesmo tempo escreveu para Izambard e Paul Demeny sobre seu método para atingir a transcendência poética ou o poder visionário através do “longo, imenso e sensato desregramento de todos os sentidos.” (Les lettres du Voyant [As Cartas do Vidente]).

Ele retornou a Paris em setembro de 1871 por um convite do eminente poeta simbolista Paul Verlaine (depois que Rimbaud lhe mandou uma carta contendo vários exemplos do seu trabalho) e residiu brevemente em sua casa. Este, que era casado, apaixonou-se prontamente pelo adolescente calado, de olhos azuis e cabelo castanho-claro comprido. Tornaram-se amantes e levaram uma vida ociosa, regrada a absinto e haxixe. Escandalizaram o círculo literário parisiense por causa do comportamento ultrajante de Rimbaud, o arquetípico enfant terrible, que durante este período continuou a escrever notáveis versos visionários.

O caso amoroso tempestuoso do Rimbaud e Verlaine os levou a Londres em setembro de 1872, Verlaine abandonando sua esposa e um filho pequeno (ambos sofriam de abusos durante as iras alcoólicas de Verlaine). Os amantes viveram em uma pobreza considerável, em Bloomsbury e em Camden Town, desprezando uma vida de ensino e uma pensão da mãe de Verlaine. Rimbaud passou seus dias no Reading Room do British Museum onde "calor, luz, penas e tinta eram de graça".

Em junho de 1873, Verlaine voltou para Paris, onde a ausência de Rimbaud foi difícil de agüentar. Em oito de julho, ele mandou um telegrama ao jovem poeta, lhe dando instruções para ir ao Hotel Liège em [[Bruxelas]; Rimbaud concordou imediatamente. O encontro de Bruxelas foi péssimo; um argumentando contra o outro e Verlaine bebendo constantemente. Na manhã de dez de julho, Verlaine comprou um revolver e munição; à tarde, numa "fúria de bêbado", disparou dois tiros em Rimbaud, um deles ferindo o poeta de dezoito anos no pulso.

Rimbaud considerou o ferimento superficial e a princípio não acusou Verlaine. Após isto, ele e sua mãe acompanharam Rimbaud a uma estação de trem em Bruxelas, onde Verlaine se comportou como um louco. Isto fez Rimbaud sentir medo do poeta, que então se virou e foi embora. Em suas palavras "então eu [Rimbaud] implorei para um policial o prender [Verlaine]". Ele foi detido por tentativa de homicídio e submetido a um exame médico humilhante. Também foi interrogado sobre sua correspondência íntima com seu amante e sobre as acusações de sua mulher sobre a natureza de sua relação com Rimbaud, que eventualmente retirou suas queixas, porém o juiz condenou Verlaine a dois anos de prisão.

Rimbaud retornou a sua casa em Charleville e completou sua prosa Une Saison em Enfer (Uma Estação no Inferno), considerada pioneira nas instâncias do simbolismo moderno e escreveu uma descrição sobre sua vida de drôle de ménage (farsa doméstica) com Verlaine, seu frère pitoyable (lamentável irmão) e a vierge folle (virgem louca) por quem ele era um l'époux infernal (noivo infernal). Em 1874 retornou para Londres com o poeta Germain Nouveau e suas arrasantes Illuminações.

Rimbaud e Verlaine se encontraram pela última vez em março de 1875, em Stuttgart, Alemanha, depois que o último saiu da prisão e se converteu ao catolicismo. Rimbaud acabou por desistir de escrever e decidiu-se por uma vida fixa, de trabalho; alguns especulam que ele ainda possuía vivo o seu antigo estado selvagem, enquanto outros sugerem que ele buscou ficar rico e independente para algum dia poder viver como um poeta despreocupado; de qualquer forma, continuou a viajar intensivamente pela Europa, principalmente a pé.

Em maio de 1876 ele se alistou como um soldado no Exército Colonial Holandês para poder viajar livremente para Java (Indonésia) onde ele prontamente desertou, retornando para a França por navio. Na residência oficial do major de Salatiga, uma pequena cidade a 46km do sul de Semarang, capital da Província Central de Java, existe uma placa de mármore declarando que Rimbaud um dia esteve na cidade.

Em dezembro de 1878, Rimbaud chegou a Lanarca, Chipre, onde trabalhou para uma empresa de construção como capataz numa pedreira. Em maio do ano seguinte teve que deixar Chipre por causa de uma febre, que mais tarde, na França, foi diagnosticada como febre tifóide. Em 1880 Rimbaud finalmente adaptou-se em Aden como um empregado principal na agência de Bardey. Ele teve várias mulheres nativas como amantes e por algum tempo viveu com uma amante da Etiópia. Em 1884 ele deixou o trabalho na Bardey para se tornar um mercador por conta própria em Harar, Etiópia. Notavelmente, as vendas de Rimbaud incluíam café e armas. Rimbaud desenvolveu sinovite em seu joelho direito e subseqüentemente um carcinoma no mesmo joelho. Seu estado de saúde o forçou a partir para a França em nove de maio, onde foi admitido num hospital em Marseille, e ali teve sua perna amputada a vinte e sete de maio. Após uma curta estadia na casa de sua família, voltou a viajar para a África, mas sua condição médica piorou durante a viagem, e logo foi readmitido no mesmo hospital em Marseille. Lá, após algum tempo de sofrimento e eventuais visitas de sua irmã Isabelle, Rimbaud morreu a dez de novembro de 1891, com 37 anos, e seu corpo foi enterrado no jazigo da família em Charleville.


Resumo Cronológico:

1854: Em 20 de outubro, nasce Jean Nicholas-Arthur Rimbaud em Charleville (norte da Franca). Seu pai, Fréderic Rimbaud, estava ausente. Neste mesmo ano sua mãe herdará, com a morte do pai, uma fazenda em Roche. Arthur ganha um irmão, Fréderic, nascido em 1853.

1857: Victorine Pauline Vitalie, sua primeira irmã, nasce em 4 de junho, mas morre no mês seguinte.

1858: Sua irmã Vitalie Rimbaud nasce no dia 15 de junho. Ela guardará um diário de informações preciosas sobre a vida do irmão Arthur.

1860: Nasce Isabelle Rimbaud, que se tornará a guardiã das obras de Arthur e também sua grande amiga, o acompanhando ao decorrer de sua agonia. Em agosto seus pais separam-se definitivamente. O capitão Rimbaud engaja-se na guarnição de Grenoble, de onde não dará mais sinal de vida.

1861: Rimbaud inicia seus estudos na Instituição Rossat, em outubro deste ano, e mostra-se um aluno precoce, alcançando as melhores notas.

1869: Seu primeiro prêmio literário acontece no Concurso Acadêmico de Douai, um concurso de versos latinos. Escreve seu primeiro poema conhecido em francês em dezembro deste ano, intitulado : "Les Etrennes des Orphelins".

1870: Ingressa na escola Georges Izambard, em janeiro. Escreve uma carta ao poeta Théodore de Banville após alguns meses, apresentando os poemas "Sensation", "Ophélie" e "Credo in Unam". No dia 19 de julho inicia a Guerra Franco-Prussiana. Um mês depois, Rimbaud foge de casa e vai de trem a Paris. É preso na chegada, e sai graças e intervenção de Izambard, que o leva de volta a Charleville. Em 7 de outubro foge novamente, a pé, passando por Fumay, Charleroi e Bruxelas até chegar a Douai. Durante a jornada, escreve os poemas "Au Cabaret Vert" e "Ma Boheme".

1871: Em fevereiro faz sua terceira fuga, de trem, com destino a Paris, onde fica por 15 dias. Volta a pé a Charleville. Em 18 de marco Rimbaud passa a contribuir com o jornal Le Progrès des Ardennes, em correlacão com a Comuna de Paris. De acordo com alguns autores, ele próprio teria participado da Comuna entre abril e maio. Neste mesmo mês escreve ao escritor Paul Verlaine "Lettre du Voyant", e compõe paralelamente "Le Bateau Ivre". Recebe resposta de Verlaine, no verão, que escreveu : "Venha, querida grande alma, eu o espero".

1871: Em setembro, comeca suas andancas pela Europa. Vai a Paris, onde é acolhido por Verlaine. É bem recebido entre os poetas parisienses com seu "Le Bateau Ivre".

1872: Mathilde, mulher de Verlaine, exige que o marido se afaste de Rimbaud. Entretanto, em julho, os dois viajam juntos e são presos em Arras, em decorrência de "conduta suspeita". Em setembro chegam a Londres. Três meses após, Rimbaud volta a Charleville, atendendo o pedido de sua mãe.

1873: Em janeiro, Verlaine, doente, chama Rimbaud a Londres. Em 3 de julho os dois se afastam, e Verlaine viaja a Bruxelas. Rimbaud o segue alguns dias depois e, durante uma discussão, leva dois tiros de revólver de Verlaine, que lesam seu punho esquerdo. Rimbaud volta a Paris, e antes de partir, denuncia seu amigo a um guarda, na estacão de trem. Verlaine é preso. Após o incidente, Rimbaud inicia o poema "Une Saison en Enfer" em abril.

1874: As "Iluminacões" iniciam-se em marco, quando viaja com o poeta Germain Noveau a Londres e escreve a maior parte da obra. Noveau retorna a Franca em junho. Rimbaud permanece e, doente, recebe a visita da mãe e da irmã, Vitalie. Publica em novembro o anúncio : "Parisiense de altos conhecimentos literários e linguísticos e excelente conversacão ficaria contente em acompanhar um gentleman ou uma família que desejem viajar aos países do Sul ou do Oriente ".

1875: Viaja para Stuttgart em fevereiro, e trabalha como preceptor. Verlaine é solto em marco, e procura Rimbaud com intuito, em vão, de convertê-lo ao catolicismo. Em maio, Rimbaud vai a pé a Itália. Retorna a Charleville doente, onde passa a maior parte do inverno. Em 18 de dezembro, morre Vitalie.

1876: Em abril viaja a Viena; é assaltado e acaba sendo expulso do país. No mês seguinte engaja-se no exército colonial holandês. Em julho embarca para Java, onde deserta e foge. Retorna a Charleville no último dia do ano.

1877: Viaja pela Suécia e Dinamarca, trabalhando como intérprete de um circo de Hamburgo.

1878: Vai a Gênova em outubro, de onde embarca meses depois para Alexandria. Arranja um emprego como capataz na pedreira de uma firma francesa, em Chipre.

1879: Novamente retorna, doente, à família, para restabelecer-se de tifo. Após uma melhora, torna-se comerciante na África.

1880: Parte para o Egito em junho, onde arranja emprego, em Áden, numa firma comercial de café e couro, que o transfere para sua filial na Etiópia. Viaja 20 dias a cavalo pelo deserto, chegando ao seu destino em dezembro.

1881: Prossegue como comerciante, fazendo negócios com peles e marfim no interior da África. Envia, por carta, fotos a família, as quais surpreendem pela extrema mudança fisionômica : pele escura, magro e cabeça raspada.

1882: Torna-se o primeiro europeu a percorrer o rio Ugadine, seguindo a jornada como negociante da empresa onde trabalha, que o encarrega de explorar o deserto da Somália.

1883: Recebe notícias de sua irmã Isabelle, que pede para visitá-lo, mas rejeita a idéia respondendo : "Isto aqui em um fundo de vulcão". Aconselha-a a casar e diz que, se pudesse, também constituiria uma família. Em abril, retorna a Harrar (Etiópia).

1884: Passa e viver em Áden, após a empresa onde trabalha falir. Mora nessa época com uma jovem abissínia.

1885: Na Franca, seis poemas inéditos seus são publicados por Verlaine, entre eles "Le Bateau Ivre". Rimbaud junta-se a Pierre Labatut, no final do ano, no comércio de tráfico de armas.

1886: Suas "Iluminações" são publicadas por Verlaine, em maio, na revista Vogue, que apresenta o autor como "o falecido Arthur Rimbaud". Chefia uma caravana levando armas para os rebeldes que lutam pela independência na Etiópia meses depois, numa viagem que dura quatro meses.

1887: Passa o mês de abril no Cairo, onde descansa e escreve à família : " Sinto que minha existência periclita. Carrego sempre comigo, atados na cintura, 16 mil francos-ouros, que pesam oito quilos ".

1888/90: Ingressa novamente em uma jornada, comandando uma caravana de 200 camelos e 3 mil fuzis, com destino ao líder rebelde Makonnen. Nesta época trabalha como diretor de uma feitoria. Em julho de 1890 é surpreendido com uma carta da revista Le France Moderne, que pede sua colaboração literária.

1891: Em abril é internado em Áden, em decorrência de um inchaço em sua perna direita. Quatro meses depois, retorna a Franca, onde convalesce no hospital da Conception, em Marselha. Recebe a visita de sua mãe. Sua perna é amputada, após constatação de câncer. No mesmo mês encontra-se com a irmã Isabelle, em Roche, com quem viaja, em agosto, para Marselha. Volta a ser internado e morre em 10 de novembro. É enterrado quatro dias depois em Charleville.

Arthur Rimbaud publicou, em vida, apenas uma obra, Une saison en enfer (Uma temporada no inferno), em 1873. Porém, escreveu ainda outras duas: Poésies (1871) e Illuminations (1873). Nesses dois livros, verifica-se uma aproximação sinestésica entre as palavras, os sons, as cores e os cheiros. Trata-se de uma característica marcante do Simbolismo, cujo prenúncio se deu com Charles Baudelaire em As flores do mal.

Rimbaud pretendeu compor um novo universo através da sua poesia. Para tanto não mediu esforços, indo a lugares os mais indesejáveis, como se verifica nesse trecho:

Queremos que o fogo nos queime o cérebro
Imergir no abismo, no inferno ou no céu, o que importa?
Ao fundo do desconhecido para encontrar o novo!

Suas atitudes se caracterizam por uma revisão do mundo: da moral judaico-cristã e da sociedade burguesa, capitalista. Tal objetivo é flagrante, por exemplo, em um poema como "Vogais" (Iluminações), no qual estabelece uma relação entre as cores, as vogais e os símbolos do Universo:

A negro, E branco, I vermelho, U verde, O azul: vogais

O A representaria a existência em uma nova ordem; o E a água, sem a qual não pode haver vida; o I representa o sexo; o U a vida bucólica e o retorno à natureza; e O o espaço celeste, o além-Terra. É interessante assinalar que Rimbaud abandona, até certo ponto, toda essa fulguração destruidora e recriadora em Uma temporada no inferno, ainda que permaneça a idéia de transformar a linguagem literária, conferindo-lhe uma simbologia perdida devido ao materialismo capitalista. Eis uma aspecto da importância do legado de Rimbaud, que influenciou toda uma geração, incluindo o Simbolismo no Brasil, o Surrealismo de André Breton e também músicos como Jim Morrison, do extinto grupo de rock The Doors.


Extraido do Comentário:

"Quando Rimbaud tornou-se traficante de negros, agindo contra seus ideais poéticos, deixou de escrever. Foi a solução honesta." (Eugênio Evtuchenko, Autobiografia Precoce - cantadas literárias, brasiliense, 1987, p 7)


*pesquisa feita em sites da internet

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Vida e Obra
em 17/05/2008 15:34:30 (42800 leituras)
Antero de Quental

Antero Tarquínio de Quental (Ponta Delgada, 18 de Abril de 1842 — 11 de Setembro de 1891) Nasceu na ilha de S. Miguel, Açores e desde de jovem destacou-se pelas suas opiniões revolucionárias e pela forma de estar na vida. Lutador e muito congruente com os seus ideais socialistas.

Antero espalhou saber pela poesia, filosofia e política. Estudou direito em Coimbra, onde brilhou como líder estudantil. Foi o guia espiritual da geração de 70, um agitador político a “tempo inteiro”, que se afirmou pelo desejo de intervenção e renovação da vida política e cultural portuguesa. Tinha uma personalidade complexa, que oscilava entre a euforia e a mais profunda depressão, acabando em suicido.

Antero de Quental herdou em 1873 uma quantia considerável de dinheiro, o que lhe permitiu viver desafogadamente, dos rendimentos dessa fortuna.

Em 1852, com 13 anos, vem com a sua mãe, para Lisboa. Em Julho de 1858 matriculou-se na Faculdade de Direito, de Coimbra. O primeiro ano decorreu de forma atribulada. Um excesso cometido durante a praxe aos caloiros custou a Antero de Quental oito dias de prisão. Era muito popular no meio académico. Concluiu o curso em Julho de 1864.

Em 1865, foi um dos principais envolvidos na polêmica conhecida por Questão Coimbra, em que humilhou António Feliciano de Castilho, seu antigo professor e renomado crítico literário que se tinha por cânone para os escritores nacionais: ao livro Odes modernas de Antero, Castilho respondeu com críticas duras sobre o aventureirismo de um jovem tolo que escrevia de forma assaz estranha e de gosto muito duvidoso.

Antero respondeu com o opúsculo bom senso e bom gosto, a que definia a sua literatura por oposição à instituída: ao Ultra-Romantismo decadente, torpe, beato, estupidificante e moralmente degradado, Antero opunha o Realismo, a exposição da vida tal como ela era, das chagas da sociedade, da pobreza, da exploração: estas preocupações sociais levaram-no a co-fundar o Partido Socialista Português: Antero defendia a poesia como Voz da Revolução, como forma de alertar as consciências para as desigualdades sociais e para os problemas da humanidade.

A polémica só terminou com um duelo entre Antero de Quental e Ramalho Ortigão travado, a 6 de Fevereiro de 1866, no Jardim de Arca d'Água, no Porto, que se saldou por ferimentos ligeiros.

Ainda em 1866 foi viver em Lisboa, onde experimentou a vida de operário, trabalhando como tipógrafo. Uma profissão que exerceu também em Paris, em janeiro e fevereiro de 1867. Em 1868 regressou a Lisboa, onde formou o Cenáculo, de que fizeram parte, entre outros, Eça de Queirós e Ramalho Ortigão. Em 1874 adoeceu de psicose maníaco-depressiva (doença bipolar), que desde então o afligiu. Foi convidado pelo Partido Republicano para candidatar-se como deputado, mas teve de recusar.

Em 1890, devido à reacção nacional contra o ultimato inglês, de 11 de Janeiro, aceita presidir à Liga Patriótica do Norte, mas a existência da Liga é efémera. Quando regressou a Lisboa, em Maio de 1891, instalou-se em casa da irmã, Ana de Quental. Neste momento o seu estado de depressão era permanente. Passado um mês, em Junho de 1891, regressa a Ponta Delgada, acabando por suicidar-se dia 11 de Setembro de 1891, com um tiro na cabeça, disparado num banco de jardim.

Para Antero de Quental, os ideais da fraternidade e solidariedade não poderiam ser em vão. Foi dos primeiros a trazer o socialismo, o republicanismo e o marxismo para a discussão pública.

A poesia de Antero de Quental apresenta três faces distintas:

A das experiências juvenis, em que coexistem diversas tendências
A da poesia militante, empenhada em agir como “voz da revolução”
E a da poesia de tom metafísico, voltada para a expressão da angustia de quem busca um sentido para a existência.

A oscilação entre uma poesia de combate, dedicada ao elogio da acção e da capacidade humana, e uma poesia intimista, direcionada para a análise de uma individualidade angustiada, parece ter sido constante na obra madura de Antero, abandonando a posição que costumava enxergar uma sequência cronológica de três fases.

Antero atinge um maior grau de elaboração em seus sonetos, considerados dos melhores da língua e comparados aos de Camões e aos de Bocage. Há, na verdade, alguns pontos de contato estilísticos e temáticos entre esses três poetas: os sonetos de Antero tem inegável sabor clássico, quer na adjetivação e na musicalidade equilibrada, quer na análise de questões universais que afligem o homem.

Obras principais:

Poesia: Sonetos, 1861; Beatrice, 1863; Odes Modernas, 1865; Primaveras Românticas - Versos dos Vinte Anos, 1872; Sonetos, 1881; Sonetos Completos, 1886; Raios de Extinta Luz, 1892;
— Prosa Polêmica e Folclórica: Cartas de Antero de Quental, 1915; Cartas Inéditas de Antero de Quental a Oliveira Martins, 1931; Cartas Inéditas de Antero de Quental a Wilhelm Storck, 1931; Cartas de Antero de Quental a Antônio Azevedo Castelo Branco, 1942.




*pesquisa realizada em sites da internet.

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Saudade
em 12/05/2008 14:48:18 (32356 leituras)
Clarice Lispector

Saudade
(Clarice Lispector)

Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda
que a presença é pouco:
quer-se absorver a outra pessoa toda.
Essa vontade de um ser o outro
para uma unificação inteira
é um dos sentimentos mais urgentes
que se tem na vida.


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Sonhe com aquilo que você quiser
em 09/05/2008 23:50:00 (32916 leituras)
Clarice Lispector

Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas.


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Vida E Obra
em 08/05/2008 18:26:18 (19719 leituras)
Álvares de Azevedo


Manuel Antônio Álvares de Azevedo, precursor do romantismo em nossas letras, nasceu em São Paulo (SP), a 12 de setembro de 1831.

Autor de "Noites na Taverna", "Macário" e de copiosa produção poética, muito influenciada pela obra de Byron, morreu no Rio de Janeiro (RJ), a 25 de abril de 1852, quando aluno do quinto ano da Academia de Direito de São Paulo.

É o patrono da cadeira nº. 2, da Academia Brasileira de Letras.

Autor de versos de grande vibração dramática, como os que escreveu impetrando clemência para o capitão Pedro Ivo, herói da revolução praieira, por vezes feriu também a nota humorística. Os versos acima são uma prova disso.

Disse dele Edgard Cavalheiro: "Faltou-lhe para ser gênio, exclusivamente isto: tempo.Fez vibrar todas as cordas da lira, do mais ingênuo lirismo ao mais desabusado erotismo. É zombeteiro e irônico, alegre e triste, vibrante e meigo, sensual e pudico. Devemos-lhe a introdução do humor na poesia brasileira."


Poeta, ensaísta, contista, romancista e dramaturgo, Álvares de Azevedo fez os estudos primários e secundários na cidade do Rio de Janeiro, onde passou a residir a partir dos dois anos de idade.

Em 1844, voltou a São Paulo, de onde retornou no ano seguinte para ingressar no Colégio Pedro II, formando-se em 1846.

Com 17 anos, matriculou-se no curso jurídico da Faculdade de Direito de São Paulo, onde vários grupos intelectuais defendiam a formação de sociedades e publicações de revistas como forma de atuar na vida cultural brasileira.

Participou de várias atividades acadêmicas, entre as quais a fundação da revista Ensaio Filosófico, que discutia o sentimento nacionalista e o sentido da poesia brasileira.

Elaborou também o projeto de fundação de um jornal literário (Crepúsculo ou Estrela), que não chegou a se realizar.

Pertencendo a uma geração que sofreu influência vital do satanismo de Byron, o poeta não fugiu, conforme aponta Mário de Andrade, à "imagem do rapaz morto" disseminada durante o período romântico.

Introjetando não só em sua obra, mas em sua própria vida, o mal-do-século, morreu aos 21 anos incompletos, sem terminar a faculdade, deixando inédita sua obra, composta por poemas, contos, um romance, peças de teatro (escritas entre 1848 e 1851), além de ensaios, cartas e discursos. Em 1853, um ano após a sua morte, foi publicado o livro Lira dos vinte anos, cuja edição o poeta havia deixado preparada.

Obras

12 de Setembro
Adeus, meus sonhos!
Amor
Anima Mea
Anjinho
Anjos do mar
Aí Jesus!
Boêmios
Cantiga
Cantiga do sertanejo, A
Crepúsculo do mar
Crepúsculo nas montanhas
Cônego Filipe, O
Desalento
Despedidas
Desânimo
Dinheiro
Dorme
Editor, O
Esperanças
Eutanásia
Fantasia
Harmonia, A
Hinos do profeta
Idéias íntimas
Itália
Lembrança de morrer
Lembrança dos quinze anos
Lenço dela, O
Lira dos Vinte Anos
Lágrimas da vida
Lélia
Macário
Malva-maça
Meu desejo
Meu sonho
Minha amante
Minha desgraça
Morena
Na minha terra
Na várzea
Namoro a cavalo
No mar
No túmulo do meu amigo
Noite na Taverna
Oh! Não maldigam!
Pastor moribundo, O
Pensamentos dela
Poemas Malditos
Poeta, O
Por mim?
Por que mentias?
Página rota
Pálida imagem
Pálida inocência
Saudades
Seio de virgem
Solfieri
Sombra de D. Juan
Soneto 2
Soneto 3
Soneto 4
Soneto 5
Sonhando
Spleen e "charutos"
Só um olhar por compaixão de peço
T, A
Tarde de outono
Tarde de verão
Terza rima
Toda aquela mulher tem a pureza
Trindade
Um cadáver de poeta
Vida
Virgem morta
À minha mãe
Álvares de Azevedo
É Ela! É Ela!


*pesquisa feita em sites da internet.

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Vida e Obra
em 07/05/2008 10:59:01 (8330 leituras)
Vinícius de Moraes

Vinicius de Moraes


"São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E se deixa no céu, como esquecida
E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher..."


O biógrafo de Vinicius, José Castello, autor do excelente livro "Vinicius de Moraes: o Poeta da Paixão - uma biografia" nos diz que o poeta foi um homem que viveu para se ultrapassar e para se desmentir. Para se entregar totalmente e fugir, depois, em definitivo. Para jogar, enfim, com as ilusões e com a credulidade, por saber que a vida nada mais é que uma forma encarnada de ficção. Foi, antes de tudo, um apaixonado — e a paixão, sabemos desde os gregos, é o terreno do indomável. Daí porque fazer sua biografia era obra ingrata.

Dele disse Carlos Drummond de Andrade: "Vinicius é o único poeta brasileiro que ousou viver sob o signo da paixão. Quer dizer, da poesia em estado natural". "Eu queria ter sido Vinicius de Moraes". Otto Lara Resende assim o definiu: "Manuel Bandeira viveu e morreu com as raízes enterradas no Recife. João Cabral continua ligado à cana-de-açúcar. Drummond nunca deixou de ser mineiro. Vinicius é um poeta em paz com a sua cidade, o Rio. É o único poeta carioca". Mas ele dizia nada mais ser que "um labirinto em busca de uma saída".

O que torna Vinicius um grande poeta é a percepção do lado obscuro do homem. E a coragem de enfrentá-lo. Parte, desde o princípio, dos temas fundamentais: o mistério, a paixão e a morte. Quando deixa a poesia em segundo plano para se tornar show-man da MPB, para viver nove casamentos, para atravessar a vida viajando, Vinicius está exercendo, mais que nunca, o poder que Drummond descreve, sem conseguir dissimular sua imensa inveja: "Foi o único de nós que teve a vida de poeta".

Marcus Vinitius da Cruz e Mello Moraes aos nove anos de idade parece que pressente o poeta: vai, com a irmã Lygia ao cartório na Rua São José, centro do Rio, e altera seu nome para Vinicius de Moraes. Nascido em 19-10-1913, na Rua Lopes Quintas, 114 — bairro da Gávea, na Cidade Maravilhosa, desde cedo demonstra seu pendor para a poesia. Criado por sua mãe, Lydia Cruz de Moraes, que, dentre outras qualidades, era exímia pianista, e ao lado do pai, Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, poeta bissexto, Vinicius cresce morando em diversos bairros do Rio, infância e juventude depois contadas em seus versos, que refletiam o pensamento da geração de 1940 em diante.

Em 1916, a família muda-se para a rua Voluntários da Pátria, 129, no bairro de Botafogo, passando a residir com os avós paternos, Maria da Conceição de Mello Moraes e Anthero Pereira da Silva Moraes.

No ano seguinte mudam-se para a rua da Passagem, 100, no mesmo bairro. Nasce seu irmão Helius. Com a irmão Lydia, passa a freqüentar a escola primária Afrânio Peixoto, à rua da Matriz.

Em 1920, por disposição de seu avô materno, é batizado na maçonaria, cerimônia que lhe causaria grande impressão.

Após três outras mudanças, em 1922 a família transfere-se para a Ilha do Governador, na praia de Cocotá, 109-A.

Faz sua primeira comunhão na Matriz da rua Voluntários da Pátria, no ano seguinte.

Em 1924, inicia o Curso Secundário no Colégio Santo Inácio, na rua São Clemente. Começa a cantar no coro do colégio nas missas de domingo, criando fortes laços de amizade com seus colegas Moacyr Veloso Cardoso de Oliveira e Renato Pompéia da Fonseca Guimarães, este sobrinho de Raul Pompéia. Participa, como ator, em peças infantis.

Torna-se amigo dos irmãos Paulo e Haroldo Tapajóz, em 1927, com os quais começa a compor. Com eles, e alguns colegas do colégio, forma um pequeno conjunto musical que atua em festinhas, em casas de famílias conhecidas.

Compõe, no ano seguinte, com os irmãos Tapajóz, "Loura ou morena" e "Canção da noite", que têm grande sucesso. Nessa época, namora invariavelmente todas as amigas de sua irmã Laetitia.

A família volta a morar na rua Lopes Quintas em 1929, ano em que Vinicius bacharela-se em Letras no Santo Inácio. No ano seguinte entra para a faculdade de Direito da rua do Catete, sem vocação especial. Defende tese sobre a vinda de d. João VI para o Brasil, para ingressar no "Centro Acadêmico de Estudos Jurídicos e Sociais" (CAJU), tornando-se amigo de Otávio de Faria, San Thiago Dantas, Thiers Martins Moreira, Antônio Galloti, Gilson Amado, Hélio Viana, Américo Jacobina Lacombe, Chermont de Miranda, Almir de Andrade e Plínio Doyle.

Em 1931, entra para o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR).

Forma-se em Direito e termina o Curso de Oficial da Reserva, em 1933. Estimulado por Otávio de Faria, publica seu primeiro livro, O caminho para a distância, na Schimidt Editora.

Forma e exegese, seu livro de poesias lançado em 1935, ganha o prêmio Felipe d'Oliveira.

Em 1936, substitui Prudente de Moraes Neto como representante do Ministério da Educação junto à Censura Cinematográfica. Publica, em separata, o poema "Ariana, a mulher". Conhece o poeta Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, dos quais se torna amigo.

Em 1938, é agraciado com a primeira bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford, para onde parte em agosto daquele ano. Trabalha como assistente do programa brasileiro da BBC. Conhece, então, na casa de Augusto Frederico Schmidt, o poeta e músico Jayme Ovalle, de quem se tornaria um dos maiores amigos. Instado por outro grande amigo, Otávio de Faria, a se tornar um poeta mais com os pés no chão, e não o "inquilino do sublime" como, então, o chamou, lança Novos Poemas. Seguindo esta mesma linha, são lançados, posteriormente, Cinco Elegias, em 1943, e Poemas, Sonetos e Baladas, escrito em 1946, que já começam a mostrar o poeta sensual e lírico, mas, como ele próprio disse, um "poeta do cotidiano".

No ano seguinte, casa-se por procuração com Beatriz Azevedo de Mello. No final desse ano, retorna ao Brasil devido à eclosão da II Grande Guerra. Parte da viagem é feita em companhia de Oswald de Andrade.

O ano de 1940 marca o nascimento de sua primeira filha, Suzana. Torna-se amigo de Mário de Andrade.

Estréia como crítico de cinema e colaborador no Suplemento Literário do jornal "A Manhã", em companhia de Cecília Meireles, Manuel Bandeira e Afonso Arinos de Melo Franco, sob a orientação de Múcio Leão e Cassiano Ricardo, em 1941.

Em 1942, nasce seu filho Pedro. Favorável ao cinema silencioso, Vinicius inicia um debate sobre o assunto com Ribeiro Couto, que depois se estende à maioria dos escritores brasileiros mais em voga, e do qual participam Orson Welles e madame Falconetti. A convite do então prefeito de Belo Horizonte (MG), Juscelino Kubitschek, chefia uma caravana de escritores brasileiros àquela cidade, onde se liga por amizade a Hélio Pelegrino, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino e Otto Lara Resende. Juntamente com Rubem Braga e Moacyr Werneck de Castro, inicia a roda literária do Café Vermelhinho, no Rio de Janeiro, à qual se misturam a maioria dos jovens arquitetos e artistas plásticos da época, como Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Afonso Reidy, Jorge Moreira, José Reis, Alfredo Ceschiatti, Santa Rosa, Pancetti, Augusto Rodrigues, Djanira e Bruno Giorgi, entre outros. Conheceu a escritora argentina Maria Rosa Oliveira e, através dela, Gabriela Mistral. Freqüenta as domingueiras na casa de Aníbal Machado. Ainda nesse ano, faz extensa viagem ao Nordeste do Brasil acompanhando o escritor americano Waldo Frank, a qual muda radicalmente sua visão política, tornando-se um antifacista convicto. Na estada em Recife, conhece o poeta João Cabral de Melo Neto, de quem se tornaria, depois, grande amigo.

No ano seguinte, ingressa, por concurso, na carreira diplomática. Publica Cinco Elegias em edição mandada fazer por Manuel Bandeira, Aníbal Machado e Otávio de Faria.

Dirige, em 1944, o Suplemento Literário de "O Jornal", onde lança, entre outros, Pedro Nava, Francisco de Sá Pires, Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Marcelo Garcia e Lúcio Rangel, em colunas assinadas, e publica desenhos de artistas plásticos até então pouco conhecidos, como Athos Bulcão, Maria Helena Vieira da Silva, Alfredo Ceschiatti, Carlos Scliar, Eros (Martin) Gonçalves e Arpad Czenes.

Em 1945, um grande susto: sofre grave desastre de avião na viagem inaugural do hidro "Leonel de Marnier", perto da cidade de Rocha, no Uruguai. Em sua companhia estão Aníbal Machado e Moacyr Werneck de Castro. Colabora com vários jornais e revistas, como articulista e crítico de cinema. Escreve crônicas diárias para o jornal "Diretrizes". Faz amizade com o poeta chileno Pablo Neruda.

No ano de 1946, assume seu primeiro posto diplomático: vice-consul do Brasil em Los Angeles, Califórnia (USA). Ali permanece por quase cinco anos, sem retornar ao seu país. Publica, em edição de luxo, com ilustrações de Carlos Leão, seu livro, Poemas, sonetos e baladas.

Vinicius, amante da sétima arte, inicia seus estudos de cinema com Orson Welles e Gregg Toland. Lança, com Alex Viany, a revista Film, em 1947.

Em 1949, João Cabral de Melo Neto tira, em sua prensa manual, em Barcelona, uma edição de cinqüenta exemplares de seu poema Pátria Minha.

Visita o poeta Pablo Neruda, no México, que se encontrava gravemente enfermo. Ali conhece o pinto Diogo Siqueiros e reencontra o pintos Di Cavalcanti. Morre seu pai. Volta ao Brasil, em 1950.

No ano seguinte, casa-se, pela segunda vez, com Lila Maria Esquerdo e Bôscoli. A convite de Samuel Wainer, começa a colaborar no jornal "Última Hora", como cronista diário e posteriormente crítico de cinema.

Em 1952, é nomeado delegado junto ao Festival de Punta del Este, fazendo paralelamente sua cobertura para "Última Hora". Terminado o evento, parte para a Europa, encarregado de estudar a organização dos festivais de cinema de Cannes, Berlim, Locarno e Veneza, no sentido da realização do Festival de Cinema de São Paulo, dentro das comemorações do IV Centenário da cidade. Em Paris, conhece seu tradutor francês, Jean Georges Rueff, com quem trabalha, em Estrasburgo, na tradução de suas Cinco Elegias. Sob encomenda do diretor Alberto Cavalcanti, com seus primos Humberto e José Francheschi, visita, fotografa e filma as cidades mineiras que compõem o roteiro do Aleijadinho, com vistas à realização de um filme sobre a vida do escultor.

Em 1953, nasce sua filha Georgiana. Compõe seu primeiro samba, música e letra, "Quando tu passas por mim". Faz crônicas diárias para o jornal "A Vanguarda" e colabora no tablóide semanário "Flan", de "Última Hora". Parte para Paris como segundo secretário de Embaixada. Escreve Orfeu da Conceição, obra que seria premiada no Concurso de Teatro do IV Centenário da Cidade de São Paulo no ano seguinte, e que teve montagem teatral em 1956, com cenários de Oscar Niemeyer. Posteriormente transformada em filme (com o nome de Orfeu negro) pelo diretor francês Marcel Camus, em 1959, obteve grande sucesso internacional, tendo sido premiada com a Palma de Ouro no Festival de Cannes e com o Oscar, em Hollywood, como o melhor filme estrangeiro do ano. Nesse filme acontece seu primeiro trabalho com Antônio Carlos Jobim (Tom Jobim).

Sai da primeira edição de sua Antologia Poética. A revista "Anhembi" publica Orfeu da Conceição, em 1954.

No ano seguinte, compõe, em Paris, uma série de canções de câmara com o maestro Cláudio Santoro. Começa a trabalhar para o produtor Sasha Gordine, no roteiro do filme Orfeu negro. Volta ao Brasil em curta estada, buscando obter financiamento para a realização do filme. Diante do insucesso da missão, retorna a Paris em fins de dezembro.

Em 1956, retorna à pátria, no gozo de licença-prêmio. Nasce sua filha, Luciana. A convite de Jorge Amado, colabora no quinzenário "Para Todos", onde publica, na primeira edição, o poema O operário em construção. A peça Orfeu da Conceição é encenada no Teatro Municipal, que aparece também em edição comemorativa de luxo, ilustrada por Carlos Scliar. As músicas do espetáculo são de autoria de Antônio Carlos Jobim, dando início a uma parceria que, tempos depois, com a inclusão do cantor e violonista João Gilberto, daria início ao movimento de renovação da música popular brasileira que se convencionou chamar de bossa nova. Retorna ao posto, em Paris, no final do ano.

Publica Livro de Sonetos, em edição de Livros de Portugal, em 1957. É transferido da Embaixada em Paris para a Delegação do Brasil junto à UNESCO. No final do ano é transferido para Montevidéu, regressando, em trânsito, ao Brasil.

Em 1958, sofre um grave acidente de automóvel. Casa-se com Maria Lúcia Proença. Parte para Montevidéu. Sai o LP "Canção do amor demais", de músicas suas com Antônio Carlos Jobim, cantadas por Elizete Cardoso. No disco ouve-se, pela primeira vez, a batida da bossa nova, no violão de João Gilberto, que acompanha a cantora em algumas faixas, entre as quais o samba "Chega de saudade", considerado o marco inicial do movimento.

1959 marca o lançamento do LP "Por toda a minha vida", de canções suas com Jobim, pela cantora Lenita Bruno. Casa-se sua filha Susana.

No ano seguinte, retorna à Secretaria de Estado das Relações Exteriores. Em novembro, nasce seu neto Paulo. Sai a segunda edição de sua Antologia Poética, uma edição popular da peça Orfeu da Conceição e Recette de femme et autres poèmes, tradução de Jean-Georges Rueff.

Começa a compor com Carlos Lyra e Pixinguinha. Aparece Orfeu negro, em tradução italiana de P. A. Jannini, em 1961.

Dá início à composição de uma série de afro-sambas, em parceria com Baden Powell, entre os quais "Berimbau" e "Canto de Ossanha". Com Carlos Lyra, compõe as canções de sua comédia musicada Pobre menina rica. Em agosto desse ano, 1962, faz seu primeiro show, que obteve grande repercussão, ao lado de Jobim e João Gilberto, na boate "Au Bon Gourmet", iniciando a fase dos "pocket-shows", onde foram lançados grandes sucessos internacionais como "Garota de Ipanema" e "Samba da benção". Na mesma boate, faz apresentação com Carlos Lyra para apresentar "Pobre menina rica", ocasião em que é lançada a cantora Nara Leão. Compõe, com Ary Barroso, as últimas canções do grande mestre da MPB, como "Rancho das Namoradas". É lançado o livro Para viver um grande amor. Grava, como cantor, um disco com a atriz e cantora Odete Lara.

Em 1963, inicia uma parceria que produziria grandes sucessos com Edu Lobo. Casa-se com Nelita Abreu Rocha e retorna a Paris, assumindo posto na Delegação do Brasil junto à UNESCO.

No início da revolução de 1964, retorna ao Brasil e colabora com crônicas semanais para a revista "Fatos e Fotos", ao mesmo tempo em que assinava crônicas sobre música popular para o "Diário Carioca". Começa a compor com Francis Hime. Com Dorival Caymmi, participa de show muito sucesso na boate Zum-Zum, onde lança o Quarteto em Cy. Desse show é feito um LP.

1965 marca o lançamento de Cordélia e o peregrino, em edição do Serviço de Documentação do Ministério de Educação e Cultura. Ganha o primeiro e segundo lugares do I Festival de Música Popular de São Paulo, da TV Record, em canções de parceria com Edu Lobo e Baden Powell. Parte para Paris e St. Maxime para escrever o roteiro do filme "Arrastão". Indispõem-se com o diretor e retira suas músicas do filme. Parte de Paris para Los Angeles a fim de encontrar-se com Jobim. Muda-se de Copacabana para o Jardim Botânico, à rua Diamantina, 20. Começa a trabalhar no roteiro do filme "Garota de Ipanema", dirigido por Leon Hirszman. Volta ao show com Caymmi, na boate Zum-Zum.

No ano seguinte é lançado o livro Para uma menina com uma flor. São feitos documentários sobre o poeta pelas televisões americana, alemã, italiana e francesa. Seu "Samba da benção", em parceria com Baden Powell, é incluído, em versão do compositor e ator Pierre Barouh, no filme "Un homme... une femme", vencedor do Festival de Cannes do mesmo ano. Vinicius participa do juri desse festival.

Em 1967, sai a sexta edição de sua Antologia Poética e a segunda de Livro de Sonetos (aumentada). Faz parte do júri do Festival de Música Jovem, na Bahia. Ocorre a estréia do filme "Garota de Ipanema". É colocado à disposição do governo de Minas Gerais no sentido de estudar a realização anual de um Festival de Arte em Ouro Preto.

Falece sua mãe, em 25 de fevereiro de 1968. Aparece a primeira edição de sua Obra Poética. Seus poemas são traduzidos para o italiano por Ungaretti.

Em 1969, é exonerado do Itamaraty. Casa-se com Cristina Gurjão, com quem tem uma filha chamada Maria.

No ano seguinte, casa-se com a atriz baiana Gesse Gessy. Inicia parceria com o violonista Toquinho.

Em 1971, muda-se para Salvador, Bahia. Viaja pela Itália, numa espécie de auto-exílio. No ano seguinte, com Toquinho, lança naquele país o LP "Per vivere un grande amore".

A Pablo Neruda é lançado em 1973. Trabalha, no ano seguinte, no roteiro, não concretizado, do filme "Polichinelo". Participa de show com Toquinho e a cantora Maria Creuza, no Rio. Confirmando os boatos de que o governo o perseguia, excursiona pela Europa e grava dois discos na Itália com Toquinho, em 1975.

Em 1976, novo casamento, agora com Marta Rodrigues Santamaria. Escreve as letras de "Deus lhe pague", em parceria com Edu Lobo.

Participa de show na casa de espetáculos "Canecão", no Rio, com Tom Jobim, Toquinho e Miúcha. Grava um LP em Paris, com Toquinho, em 1977.

No ano seguinte, excursiona com Toquinho pela Europa. Casa-se com Gilda de Queirós Matoso.

Em 1979, participa de leitura de poemas no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP), a convite do líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva. Voltando de viagem à Europa, sofre um derrame cerebral no avião. Perdem-se, na ocasião, os originais de Roteiro lírico e sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

No dia 17 de abril de 1980, é operado para a instalação de um dreno cerebral. Morre, na manhã de 09 de julho, de edema pulmonar, em sua casa na Gávea, em companhia de Toquinho e de sua última mulher. Extraviam-se os originais de seu livro O deve e o haver.

Lançado postumamente, no Livro de Letras, publicado em 1991, estão mais de 300 letras de músicas de autoria de Vinícius, com melodias suas e de um sem número de compositores, ou parceirinhos, como carinhosamente os chamava.

Em 1992, é lançado um livro que hibernou anos junto ao poeta: Roteiro Lírico e Sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, onde Nasceu, Vive em Trânsito e Morre de Amor o Poeta Vinicius de Moraes.

No ano seguinte, uma coletânea de poesias é publicada no livro As Coisas do Alto - Poemas de Formação, mostrando a processo de formação do poeta, que é uma descida do topo metafísico à solidez do cotidiano.

Em 1996, é lançado livro de bolso com o título Soneto de Fidelidade e outros poemas, a preços populares. Essa publicação fica diversas semanas na lista dos mais vendidos, o que vem mostrar que mesmo após 16 anos de seu desaparecimento, sua poesia continuava viva entre nós.

Em 2001, a industria de perfumes Avon lança a "Coleção Mulher e Poesia - por Vinicius de Moraes", com as fragrâncias "Onde anda você", "Coisa mais linda", "Morena flor" e "Soneto de fidelidade".

Inconstante no amor (seus biógrafos dizem que teve, oficialmente, 09 mulheres), um dia foi questionado pelo parceiro Tom Jobim: "Afinal, poetinha, quantas vezes você vai se casar?".

Num improviso de sabedoria, Vinicius respondeu: "Quantas forem necessárias."

No dia 08/09/2006, é homenageado pelo governo brasileiro com sua reintegração post mortem aos quadros do Ministério das Relações Exteriores, ocasião em que foi inaugurado o "Espaço Vinicius de Moraes" no Palácio do Itamaraty - Rio de Janeiro (RJ).

BIBLIOGRAFIA

Do Autor:

Poesia/Prosa:

- O Caminho para a Distância, 1933 - Schmidt Ed, Rio (recolhida pelo autor)

- Ariana, a Mulher, 1936 - Pongetti - Rio

- Forma e Exegese, 1935 - Pongetti - Rio (Prêmio Felippe d'Oliveira)

- Novos Poemas, 1938 - José Olympio - Rio

- Cinco Elegias, 1943 - Pongetti - Rio (ed.feita a pedido de Manuel Bandeira, Aníbal Machado e Octávio de Farias)

- 10 poemas em manuscrito - 1945, Condé (edição ilustrada de 150 exemplares)

- Poemas, Sonetos e Baladas, 1946 - Ed. Gávea - São Paulo (ilustrações de Carlos Leão)

- Pátria Minha, 1949 - O Livro Inconsútil - Barcelona (ed.feita por João Cabral de Melo Neto em sua prensa manual)

- Orfeu da Conceição, 1956 - Editora do Autor - Rio (ilustrações de Carlos Scliar)

- Livro de Sonetos, 1957 - Livros de Portugal - Rio

- Novos Poemas (II), 1959 - Livraria São José - Rio.

- Orfeu da Conceição, 1960 - Livraria São José - Rio (edição popular)

- Para Viver um Grande Amor, 1962 - Ed. do Autor - Rio

- Cordélia e o Peregrino, 1965 - Ed.do Serviço de Documentação do M. da Educação e Cultura - Brasília

- Para uma Menina com uma Flor, 1966 - Ed. do Autor - Rio

- Orfeu da Conceição, 1967 - Editora Dois Amigos - Rio (com ilustrações de Carlos Scliar)

- O Mergulhador, 1968 - Atelier de Arte - Rio (fotos de Pedro de Moraes, filho do autor. Tiragem limitada a 2.000 exemplares, sendo 50 numerados em algarismos romanos de I a L e assinados pelos autores, comportando um manuscrito original e inédito de Vinícius de Moraes;450 exemplares numerados em algarismos arábicos e 51 a 500 e assinados pelos autores; e,finalmente, 1.500 exemplares numerados de 501 a 2.000)

- História natural de Pablo Neruda, 1974 - Ed.Macunaíma - Salvador.

- O falso mendigo, poemas de Vinicius de Moraes - 1978, Ed. Fontana - Rio

- Vinicius de Moraes - Poemas de muito amor, 1982 - José Olympio, Rio (ilustrações de Carlos Leão)

- A arca de Noé - 1991, Cia. das Letras - São Paulo

- Livro de Letras, 1991, Cia. das Letras - São Paulo

- Roteiro lírico e sentimental da Cidade do Rio de Janeiro e outros lugares por onde passou e se encantou o poeta, 1992 - Cia. das Letras - São Paulo

- As Coisas do Alto - Poemas de Formação, 1993 - Cia. das Letras - São Paulo

- Jardim Noturno - Poemas Inéditos, 1993 - Cia. das Letras - São Paulo

- Soneto de Fidelidade e outros Poemas, 1996 - Ediouro - Rio (ed. bolso)

- Procura-se uma Rosa, Massao Ohno Ed. - São Paulo (peça de teatro em colaboração com Pedro Bloch e Gláucio Gil)

- A Arca de Noé, Cia. das Letras - São Paulo

- O Cinema de Meus Olhos, Cia. das Letras - São Paulo

- Nossa Senhora de Paris, Ediouro - Rio

- Teatro em Versos - 1995, Cia. das Letras - São Paulo

- Rio de Janeiro (com Ferreira Gullar), Ed. Record - Rio (edições em alemão, francês, inglês, italiano e português).

- Querido Poeta - Correspondências de Vinicius de Moraes (organização de Ruy Castro), Cia. das Letras, São Paulo, 2003.

Francês:

- Cinc Elégies, 1953 - Ed. Seghers - Paris (trad. de Jean-Georges Rueff)

- Recette de Femme et autres poèmes, 1960 - Ed. Seghers - Paris (escolha e tradução de Jean-Georges Rueff)

Italiano:

- Orfeo Negro, 1961 - Nuova Academia Editrice - Milão (tradução de P. A. Jannini)

Antologias:

- Antologia Poética, 1954 - Editora A Noite - Rio de Janeiro

- Obra poética - Poesia Completa e Prosa, Editora Nova Aguillar, 1968

Teatro

- Procura-se uma rosa, 1962 (com Pedro Bloch e Gláucio Gil.)

Sobre o Autor:

- O Poeta da Paixão, José Castello, 1994 - Cia. das Letras - São Paulo

- Vinícius de Moraes - Uma Geografia Poética, José Castello, 1996 - Ed. Relume Dumará

- Rio (coleção Perfis do Rio)

- Vinícius de Moraes, Pedro Lyra, Editora Agir

Discos de poesias:

- Vinicius em Portugal, 1969, Fiesta, IG 79.034 - Rio

- Antologia Poética, 1977, Philips, 6641 708, Série de Luxo - 2 Long-Plays (com participação de Tom Jobim, Edu Lobo, Toquinho, Luis Roberto, Jorginho, Roberto Menescal e Francis Hime)

Homenagens:

- Ciclo Vinícius de Moraes - Meu Tempo é Quando, 05 de janeiro a 23 de fevereiro de 1990, Centro Cultural do Banco do Brasil - Rio de Janeiro


Dados compilados dos livros "Vinicius de Moraes: O poeta da Paixão - uma biografia", "Perfis do Rio", de José Castello, e de "Obra Poética - Poesia Completa e Prosa", Ed. Nov Aguillar - Rio, além dos constantes nos livros do autor e informações obtidas na Internet.


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Vida e Obra
em 05/05/2008 11:10:00 (3155 leituras)
Al Berto

Alberto Raposo Pidwell Tavares nasce em Coimbra a 11 de Janeiro de 1948.

No ano seguinte já está em Sines, onde passa parte da infância e adolescência.

Poucos conhecem o seu lado escultórico, mas os amigos de infância ainda recordam os "bonecos" em argila que esculpia em casa, muito antes da António Arroio.

Teve sempre um ar extremamente irreverente para o seu tempo.

Filho de família da alta burguesia de origem britânica extraordinariamente conservadora, na sua adolescência, traja de modo displicente de calças de ganga e ténis rotos, para escândalo geral.

Terá sido a primeira afirmação da sua diferença intelectual.

Al Berto frequentou diversos cursos de artes plásticas, em Portugal e em Bruxelas, onde se exilou em 1967.

A partir de 1971 dedicou-se exclusivamente à literatura.

Estreou-se com o título «À Procura do Vento num Jardim d'Agosto», 1977.

A sua poesia retomou, de algum modo, a herança surrealista, fundindo o real e o imaginário.

Está presente, frequentemente, uma particular atenção ao quotidiano como lugar de objectos e de pessoas, de passagem e de permanência, de ligação entre um tempo histórico e um tempo individual.

Posteriormente, os seus textos passam a apresentar um carácter fragmentário, numa ambiguidade entre a poesia e a prosa («Lunário», 1988; e «O Anjo Mudo», 1993).

Foi distinguido em 1988 com Prémio Pen Club de Poesia pela obra «O Medo».

"A eternidade é uma permanência da força que está dentro de nós"

"Todos os meus livros tiveram um carácter de urgência", disse Al Berto ao jornal "Expresso" um mês antes de falecer.

Aterrador foi ter-me apercebido o que havia neste livro de premonitório («Horto de Incêndio»).

A eternidade não é lerem-me dentro de 50 ou 60 anos ou ficar na história da literatura portuguesa. Só espero que meia dúzia de doidos me leiam agora e isso os toque.

"Sinto-me como se tivesse cegado por excesso de olhar o mundo", em «O Medo»

Al Berto morre de linfoma em Lisboa a 13 de Junho de 1997.


Nota: Esta Biografia foi composta a partir da leitura de vários textos biográficos de Al Berto, dos quais, reuni alguns excertos que considerei relevantes.

Obra:

«À Procura do Vento num Jardim d'Agosto». Lisboa: 1977.
«Meu Fruto de Morder, Todas as Horas». Lisboa: 1980.
«Trabalhos do Olhar». Lisboa: Contexto, 1982.
«O Último Habitante». Lisboa, 1983.
«Salsugem». Lisboa: Contexto, 1984.
«A Seguir o Deserto». Lisboa: & etc., 1984.
«Três Cartas da Memória das Índias». Lisboa: 1985.
«Uma Existência de Papel». Porto: Gota d'Água, 1985.
«O Medo»(Trabalho Poético 1974-1986). Lisboa: Contexto, 1987.
«O Livro dos Regressos». Lisboa: Frenesi, 1989.
«A Secreta Vida das Imagens». Lisboa: Contexto, 1991.
«Canto do Amigo Morto». Lisboa: 1991.
«Luminoso Afogado». Lisboa: Salamandra / Casa Fernando Pessoa, 1995.
«Horto de Incêndio». Lisboa: Assírio & Alvim, 1997.
«O Medo». Lisboa: Assíro & Alvim, 1998.
Deixou incompletos textos para uma ópera, para um livro de fotografia sobre Portugal e uma «falsa autobiografia», como o próprio autor a intitulava.
«Lunário». Lisboa: Contexto, 1988.
«O Anjo Mudo». Lisboa: Contexto, 1993.

TRADUÇÕES

Em Castelhano:

«Doce Señales», trad. Adolfo Navas. Madrid, Cuaderno de Poesía Portuguesa, 1989;
«Una Existencia de Papel», trad. Ángel Campos Pámpano, Valencia, Pre-Textos, 1993;
«La Secreta Vida de las Imágenes», trad. José Luis Puerto, Amarú Ediciones, 1997.

Em francês:

«Voyage d'un Portugais avec un stylo en Cévennes», (Viagem de um Português com uma Caneta nas Cévennes), in Les itinéraires littéraires en Corèze, Ed. Jacques Brémond, 1989;
«Chant de l'ami mort» / Canto do Amigo Morto (ed. bil.). Lisboa, Europália, 1991;
«La peur et les signes» (anthologie), trad. Michel Chandeigne, Bordeaux, L'Escampette, 1993;
«La secrete vie des images», trad. Jean-Pierre Leger, Bordeaux, L'Escampette, 1996;

Em inglês:

«The Images's Secret Life», (A Secreta Vida das Imagens), trad. Richard Zenith, Dublin,
«Mermaid Turbulence», 1997 (a sair).

Em Italiano:

«Lavori dello sguardo», trad. Carlo Vittorio Cattaneo, Roma,


*pesquisa feita em sites da internet

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Dez reis de esperança
em 03/05/2008 19:00:00 (5921 leituras)
António Gedeão

Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos á boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.

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As duas flores
em 31/03/2008 21:50:00 (26967 leituras)
Castro Alves

São duas flores unidas,
São duas rosas nascidas
Talvez no mesmo arrebol,
Vivendo no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
Das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

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Manifesto anti-Dantas (Declamado)
em 10/03/2008 00:10:00 (11773 leituras)
Almada Negreiros

Basta pum basta!!!

Uma geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um coio d'indigentes, d'indignos e de cegos! É uma resma de charlatães e de vendidos, e só pode parir abaixo de zero!

Abaixo a geração!

Morra o Dantas, morra! Pim!

Uma geração com um Dantas a cavalo é um burro impotente!

Uma geração com um Dantas ao leme é uma canoa em seco!

O Dantas é um cigano!

O Dantas é meio cigano!

O Dantas saberá gramática, saberá sintaxe, saberá medicina, saberá fazer ceias pra cardeais, saberá tudo menos escrever que é a única coisa que ele faz!

O Dantas pesca tanto de poesia que até faz sonetos com ligas de duquesas!

O Dantas é um habilidoso!

O Dantas veste-se mal!

O Dantas usa ceroulas de malha!

O Dantas especula e inocula os concubinos!

O Dantas é Dantas!

O Dantas é Júlio!

Morra o Dantas, morra! Pim!

O Dantas fez uma soror Mariana que tanto o podia ser como a soror Inês ou a Inês de Castro, ou a Leonor Teles, ou o Mestre d'Avis, ou a Dona Constança, ou a Nau Catrineta, ou a Maria Rapaz!

E o Dantas teve claque! E o Dantas teve palmas! E o Dantas agradeceu!

O Dantas é um ciganão!

Não é preciso ir pró Rossio pra se ser pantomineiro, basta ser-se pantomineiro!

Não é preciso disfarçar-se pra se ser salteador, basta escrever como o Dantas! Basta não ter escrúpulos nem morais, nem artísticos, nem humanos! Basta andar com as modas, com as políticas e com as opiniões! Basta usar o tal sorrisinho, basta ser muito delicado, e usar coco e olhos meigos! Basta ser Judas! Basta ser Dantas!

Morra o Dantas, morra! Pim!

O Dantas nasceu para provar que nem todos os que escrevem sabem escrever!

O Dantas é um autómato que deita pra fora o que a gente já sabe o que vai sair... Mas é preciso deitar dinheiro!

O Dantas é um soneto dele-próprio!

O Dantas em génio nem chega a pólvora seca e em talento é pim-pam-pum.

O Dantas nu é horroroso!

O Dantas cheira mal da boca!

Morra o Dantas, morra! Pim!

O Dantas é o escárnio da consciência!

Se o Dantas é português eu quero ser espanhol!

O Dantas é a vergonha da intelectualidade portuguesa!

O Dantas é a meta da decadência mental!

E ainda há quem não core quando diz admirar o Dantas!

E ainda há quem lhe estenda a mão!

E quem lhe lave a roupa!

E quem tenha dó do Dantas!

E ainda há quem duvide que o Dantas não vale nada, e que não sabe nada, e que nem é inteligente, nem decente, nem zero!

Vocês não sabem quem é a soror Mariana do Dantas? Eu vou-lhes contar:

A princípio, por cartazes, entrevistas e outras preparações com as quais nada temos que ver, pensei tratar-se de soror Mariana Alcoforado a pseudo autora daquelas cartas francesas que dois ilustres senhores desta terra não descansaram enquanto não estragaram pra português, quando subiu o pano também não fui capaz de distinguir porque era noite muito escura e só depois de meio acto é que descobri que era de madrugada porque o bispo de Beja disse que tinha estado à espera do nascer do Sol!

A Mariana vem descendo uma escada estreitíssima mas não vem só, traz também o Chamilly que eu não cheguei a ver, ouvindo apenas uma voz muito conhecida aqui na Brasileira do Chiado. Pouco depois o bispo de Beja é que me disse que ele trazia calções vermelhos.

A Mariana e o Chamilly estão sozinhos em cena, e às escuras, dando a entender perfeitamente que fizeram indecências no quarto. Depois o Chamilly, completamente satisfeito, despede-se e salta pela janela com grande mágoa da freira lacrimosa. E ainda hoje os turistas têm ocasião de observar as grades arrombadas da janela do quinto andar do Convento da Conceição de Beja na Rua do Touro, por onde se diz que fugiu o célebre capitão de cavalos em Paris e dentista em Lisboa.

A Mariana que é histérica começa a chorar desatinadamente nos braços da sua confidente e excelente pau de cabeleira soror Inês.

Vêm descendo pla dita estreitíssima escada, várias Marianas, todas iguais e de candeias acesas, menos uma que usa óculos e bengala e ainda toda curvada prá frente o que quer dizer que é abadessa.

E seria até uma excelente personificação das bruxas de Goya se quando falasse não tivesse aquela voz tão fresca e maviosa da Tia Felicidade da vizinha do lado. E reparando nos dois vultos interroga espaçadamente com cadência, austeridade e imensa falta de corda... Quem está aí?... E de candeias apagadas?

- Foi o vento, dizem as pobres inocentes varadas de terror... E a abadessa que só é velha nos óculos, na bengala e em andar curvada prá frente manda tocar a sineta que é um dó d'alma o ouvi-la assim tão debilitada. Vão todas pró coro, mas eis que, de repente, batem no portão sem se anunciar nem limpar-se da poeira, sobe a escada e entra plo salão um bispo de Beja que quando era novo fez brejeirices com a menina do chocolate.

Agora completamente emendado revela à abadessa que sabe por cartas que há homens que vão às mulheres do convento e que ainda há pouco vira um de cavalos a saltar pla janela. A abadessa diz que efectivamente já há tempos que vinha dando pela falta de galinhas e tão inocentinha, coitada, que naqueles oitenta anos ainda não teve tempo pra descobrir a razão da humanidade estar dividida em homens e mulheres. Depois de sérios embaraços do bispo é que ela deu com o atrevimento e mandou chamar as duas freiras de há pouco com as candeias apagadas. Nesta altura esta peça policial toma uma pedaço d'interesse porque o bispo ora parece um polícia de investigação disfarçado em bispo, ora um bispo com a falta de delicadeza de um polícia d'investigação, e tão perspicaz que descobre em menos de meio minuto o que o público já está farto de saber - que a Mariana dormiu com o Noel. O pior é que a Mariana foi à serra com as indiscrições do bispo e desata a berrar, a berrar como quem se estava marimbando pra tudo aquilo. Esteve mesmo muito perto de se estrear com um par de murros na coroa do bispo no que se mostrou de um atrevimento, de uma insolência e de uma decisão refilona que excedeu todas as expectativas.

Ouve-se uma corneta tocar uma marcha de clarins e Mariana sentindo nas patas dos cavalos toda a alma do seu preferido foi qual pardalito engaiolado a correr até às grades da janela gritar desalmadamente plo seu Noel. Grita, assobia e rodopia e pia e rasga-se e magoa-se e cai de costas com um acidente, do que já previamente tinha avisado o público e o pano cai e o espectador também cai da paciência abaixo e desata numa destas pateadas tão enormes e tão monumentais que todos os jornais de Lisboa no dia seguinte foram unânimes naquele êxito teatral do Dantas.

A única consolação que os espectadores decentes tiveram foi a certeza de que aquilo não era a soror Mariana Alcoforado mas sim uma merdariana-aldantascufurado que tinha cheliques e exageros sexuais.

Continue o senhor Dantas a escrever assim que há-de ganhar muito com o Alcufurado e há-de ver que ainda apanha uma estátua de prata por um ourives do Porto, e uma exposição das maquetes pró seu monumento erecto por subscrição nacional do "Século" a favor dos feridos da guerra, e a Praça de Camões mudada em Praça Dr. Júlio Dantas, e com festas da cidade plos aniversários, e sabonetes em conta "Júlio Dantas" e pasta Dantas prós dentes, e graxa Dantas prás botas e Niveína Dantas, e comprimidos Dantas, e autoclismos Dantas e Dantas, Dantas, Dantas, Dantas... E limonadas Dantas- Magnésia.

E fique sabendo o Dantas que se um dia houver justiça em Portugal todo o mundo saberá que o autor de Os Lusíadas é o Dantas que num rasgo memorável de modéstia só consentiu a glória do seu pseudónimo Camões.

E fique sabendo o Dantas que se todos fossem como eu, haveria tais munições de manguitos que levariam dois séculos a gastar.

Mas julgais que nisto se resume literatura portuguesa? Não Mil vezes não!

Temos, além disto o Chianca que já fez rimas prá Aljubarrota que deixou de ser a derrota dos Castelhanos pra ser a derrota do Chianca.

E as pinoquices de Vasco Mendonça Alves passadas no tempo da avózinha! E as infelicidades de Ramada Curto! E o talento insólito de Urbano Rodrigues! E as gaitadas do Brun! E as traduções só pra homem do ilustríssimos excelentíssimo senhor Mello Barreto! E o frei Matta Nunes Moxo! E a Inês Sifilítica do Faustino! E as imbecelidades do Sousa Costa! E mais pedantices do Dantas! E Alberto Sousa, o Dantas do desenho! E os jornalistas do Século e da Capital e do Notícias e do Paiz e do Dia e da Nação e da República e da Lucta e de todos, todos os jornais! E os actores de todos os teatros! E todos os pintores das Belas-Artes e todos os artistas de Portugal que eu não gosto. E os da Águia do Porto e os palermas de Coimbra! E a estupidez do Oldemiro César e o Dr. José de Figueiredo Amante do Museu e ah oh os Sousa Pinto hu hi e os burros de cacilhas e os menos do Alfredo Guisado! E (o) raquítico Albino Forjaz de Sampaio, crítico da Lucta a quem Fialho com imensa piada intrujou de que tinha talento! E todos os que são políticos e artistas! E as exposições anuais das Belas-Arte(s)! E todas as maquetas do Marquês de Pombal! E as de Camões em Paris; e os Vaz, os Estrela, os Lacerda, os Lucena, os Rosa, os Costa, os Almeida, os Camacho, os Cunha, os Carneiro, os Barros, os Silva, os Gomes, os velhos, os idiotas, os arranjistas, os impotentes, os celerados, os vendidos, os imbecis, os párias, os ascetas, os Lopes, os Peixotos, os Motta, os Godinho, os Teixeira, os Câmara, os diabo que os leve, os Constantino, os Tertuliano, os Grave, os Mântua, os Bahia, os Mendonça, os Brazão, os Matos, os Alves, os Albuquerques, os Sousas e todos os Dantas que houver por aí!!!!!!!!!

E as convicções urgentes do homem Cristo Pai e as convicções catitas do homem Cristo Filho!...

E os concertos do Blanch! E as estátuas ao leme, ao Eça e ao despertar e a tudo! E tudo o que seja arte em Portugal! E tudo! Tudo por causa do Dantas!

Morra o Dantas, morra! Pim!

Portugal que com todos estes senhores conseguiu a classificação do país mas atrasado da Europa e de todo o Mundo! O país mais selvagem de todas as Áfricas! O exílio dos degredados e dos indiferentes! A África reclusa dos europeus! O entulho das desvantagens e dos sobejos! Portugal inteiro há-de abrir os olhos um dia - se é que a sua cegueira não é incurável e então gritará comigo, a meu lado, a necessidade que Portugal tem de ser qualquer coisa de asseado!

Morra o Dantas, morra! Pim!

*

José de Almada Negreiros
Poeta d'Orpheu
Futurista E Tudo

*

OUVI AGORA SENHORES
UMA HISTÓRIA DE ENCANTAR:
-O "MANIFESTO ANTI-DANTAS"...Declamado pelo grande "Diseur" MÁRIO VIEGAS !

EM: http://triplov.com/almada_negreiros/anti_dantas.htm

APRECIEM, COM UM ABRAÇO!

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Soneto de amor
em 26/02/2008 19:20:00 (9209 leituras)
José Régio

Não me peças palavras, nem baladas,
Nem expressões, nem alma...Abre-me o seio,
Deixa cair as pálpebras pesadas,
E entre os seios me apertes sem receio.

Na tua boca sob a minha, ao meio,
Nossas línguas se busquem, desvairadas...
E que os meus flancos nus vibrem no enleio
Das tuas pernas ágeis e delgadas.

E em duas bocas uma língua..., - unidos,
Nós trocaremos beijos e gemidos,
Sentindo o nosso sangue misturar-se.

Depois... - abre os teus olhos, minha amada!
Enterra-os bem nos meus; não digas nada...
Deixa a Vida exprimir-se sem disfarce!



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Áspero amor
em 24/02/2008 12:50:00 (8268 leituras)
Pablo Neruda

Áspero amor, violeta coroada de espinhos...
Arbusto entre tantas paixões erguidas,
Lança das dores, coroa da ira,
Por quais caminhos e como te dirigiu a minha alma?
Por que precipitaste teu fogo doloroso,
Repentinamente, entre as folhas frias do meu caminho?
Quem te ensinou os passos que te levaram a mim?
Que flor, que pedra, que fumaça mostraram minha casa?
A verdade é que tremeu a noite apavorante,
A aurora encheu todas as taças com seu vinho
E o sol estabeleceu sua presença celeste,
Enquanto o amor cruel me cercava sem trégua,
Até que padecendo-me com espadas e espinhos,
Abriu meu coração um caminho ardente.

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Talvez
em 24/02/2008 12:40:00 (13444 leituras)
Pablo Neruda

Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma
flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento,

E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás...Seremos...

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Morte e vida Severina
em 24/02/2008 12:30:00 (4516 leituras)
João Cabral de Melo Neto

O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR
QUEM É E A QUE VAI

— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.
ENCONTRA DOIS HOMENS CARREGANDO
UM DEFUNTO NUMA REDE,
AOS GRITOS DE "Ó IRMÃOS DAS ALMAS!
IRMÃOS DAS ALMAS! NÃO FUI EU
QUEM MATEI NÃO!"
— A quem estais carregando,
irmãos das almas,
embrulhado nessa rede?
dizei que eu saiba.
— A um defunto de nada,
irmão das almas,
que há muitas horas viaja
à sua morada.
— E sabeis quem era ele,
irmãos das almas,
sabeis como ele se chama
ou se chamava?
— Severino Lavrador,
irmão das almas,
Severino Lavrador,
mas já não lavra.
— E de onde que o estais trazendo,
irmãos das almas,
onde foi que começou
vossa jornada?
— Onde a caatinga é mais seca,
irmão das almas,
onde uma terra que não dá
nem planta brava.
— E foi morrida essa morte,
irmãos das almas,
essa foi morte morrida
ou foi matada?
— Até que não foi morrida,
irmão das almas,
esta foi morte matada,
numa emboscada.
— E o que guardava a emboscada,
irmão das almas
e com que foi que o mataram,
com faca ou bala?
— Este foi morto de bala,
irmão das almas,
mas garantido é de bala,
mais longe vara.
— E quem foi que o emboscou,
irmãos das almas,
quem contra ele soltou
essa ave-bala?
— Ali é difícil dizer,
irmão das almas,
sempre há uma bala voando
desocupada.
— E o que havia ele feito
irmãos das almas,
e o que havia ele feito
contra a tal pássara?
— Ter um hectares de terra,
irmão das almas,
de pedra e areia lavada
que cultivava.
— Mas que roças que ele tinha,
irmãos das almas
que podia ele plantar
na pedra avara?
— Nos magros lábios de areia,
irmão das almas,
os intervalos das pedras,
plantava palha.
— E era grande sua lavoura,
irmãos das almas,
lavoura de muitas covas,
tão cobiçada?
— Tinha somente dez quadras,
irmão das almas,
todas nos ombros da serra,
nenhuma várzea.
— Mas então por que o mataram,
irmãos das almas,
mas então por que o mataram
com espingarda?
— Queria mais espalhar-se,
irmão das almas,
queria voar mais livre
essa ave-bala.
— E agora o que passará,
irmãos das almas,
o que é que acontecerá
contra a espingarda?
— Mais campo tem para soltar,
irmão das almas,
tem mais onde fazer voar
as filhas-bala.
— E onde o levais a enterrar,
irmãos das almas,
com a semente do chumbo
que tem guardada?
— Ao cemitério de Torres,
irmão das almas,
que hoje se diz Toritama,
de madrugada.
— E poderei ajudar,
irmãos das almas?
vou passar por Toritama,
é minha estrada.
— Bem que poderá ajudar,
irmão das almas,
é irmão das almas quem ouve
nossa chamada.
— E um de nós pode voltar,
irmão das almas,
pode voltar daqui mesmo
para sua casa.
— Vou eu que a viagem é longa,
irmãos das almas,
é muito longa a viagem
e a serra é alta.
— Mais sorte tem o defunto
irmãos das almas,
pois já não fará na volta
a caminhada.
— Toritama não cai longe,
irmãos das almas,
seremos no campo santo
de madrugada.
— Partamos enquanto é noite
irmãos das almas,
que é o melhor lençol dos mortos
noite fechada.
O RETIRANTE TEM MEDO DE SE EXTRAVIAR POR SEU GUIA, O RIO CAPIBARIBE, CORTOU COM O VERÃO
—— Antes de sair de casa
aprendi a ladainha
das vilas que vou passar
na minha longa descida.
Sei que há muitas vilas grandes,
cidades que elas são ditas
sei que há simples arruados,
sei que há vilas pequeninas,
todas formando um rosário
cujas contas fossem vilas,
de que a estrada fosse a linha.
Devo rezar tal rosário
até o mar onde termina,
saltando de conta em conta,
passando de vila em vila.
Vejo agora: não é fácil
seguir essa ladainha
entre uma conta e outra conta,
entre uma e outra ave-maria,
há certas paragens brancas,
de planta e bicho vazias,
vazias até de donos,
e onde o pé se descaminha.
Não desejo emaranhar
o fio de minha linha
nem que se enrede no pêlo
hirsuto desta caatinga.
Pensei que seguindo o rio
eu jamais me perderia:
ele é o caminho mais certo,
de todos o melhor guia.
Mas como segui-lo agora
que interrompeu a descida?
Vejo que o Capibaribe,
como os rios lá de cima,
é tão pobre que nem sempre
pode cumprir sua sina
e no verão também corta,
com pernas que não caminham.
Tenho que saber agora
qual a verdadeira via
entre essas que escancaradas
frente a mim se multiplicam.
Mas não vejo almas aqui,
nem almas mortas nem vivas
ouço somente à distância
o que parece cantoria.
Será novena de santo,
será algum mês-de-Maria
quem sabe até se uma festa
ou uma dança não seria?
NA CASA A QUE O RETIRANTE CHEGA ESTÃO CANTANDO EXCELÊNCIAS PARA UM DEFUNTO, ENQUANTO UM HOMEM, DO LADO DE FORA,
VAI PARODIANDO A PALAVRAS DOS CANTADORES
—— Finado Severino,
quando passares em Jordão
e o demônios te atalharem
perguntando o que é que levas..
—— Dize que levas cera,
capuz e cordão
mais a Virgem da Conceição.
—— Finado Severino,
etc...
—— Dize que levas somente
coisas de não:
fome, sede, privação.
—— Finado Severino,
etc...
—— Dize que coisas de não,
ocas, leves:
como o caixão, que ainda deves.
—— Uma excelência
dizendo que a hora é hora.
—— Ajunta os carregadores
que o corpo quer ir embora.
—— Duas excelências...
—— ... dizendo é a hora da plantação.
—— Ajunta os carreadores...
—— ... que a terra vai colher a mão.
CANSADO DA VIAGEM O RETIRANTE PENSA
INTERROMPÊ-LA POR UNS INSTANTES
E PROCURAR TRABALHO ALI ONDE SE ENCONTRA.
—— Desde que estou retirando
só a morte vejo ativa,
só a morte deparei
e às vezes até festiva
só a morte tem encontrado
quem pensava encontrar vida,
e o pouco que não foi morte
foi de vida severina
(aquela vida que é menos
vivida que defendida,
e é ainda mais severina
para o homem que retira).
Penso agora: mas por que
parar aqui eu não podia
e como Capibaribe
interromper minha linha?
ao menos até que as águas
de uma próxima invernia
me levem direto ao mar
ao refazer sua rotina?
Na verdade, por uns tempos,
parar aqui eu bem podia
e retomar a viagem
quando vencesse a fadiga.
Ou será que aqui cortando
agora minha descida
já não poderei seguir
nunca mais em minha vida?
(será que a água destes poços
é toda aqui consumida
pelas roças, pelos bichos,
pelo sol com suas línguas?
será que quando chegar
o rio da nova invernia
um resto de água no antigo
sobrará nos poços ainda?)
Mas isso depois verei:
tempo há para que decida
primeiro é preciso achar
um trabalho de que viva.
Vejo uma mulher na janela,
ali, que se não é rica,
parece remediada
ou dona de sua vida:
vou saber se de trabalho
poderá me dar notícia.
DIRIGE-SE À MULHER NA JANELA QUE DEPOIS, DESCOBRE TRATAR-SE DE QUEM SE SABERÁ
—— Muito bom dia senhora,
que nessa janela está
sabe dizer se é possível
algum trabalho encontrar?
—— Trabalho aqui nunca falta
a quem sabe trabalhar
o que fazia o compadre
na sua terra de lá?
—— Pois fui sempre lavrador,
lavrador de terra má
não há espécie de terra
que eu não possa cultivar.
—— Isso aqui de nada adianta,
poucos existe o que lavrar
mas diga-me, retirante,
o que mais fazia por lá?
—— Também lá na minha terra
de terra mesmo pouco há
mas até a calva da pedra
sinto-me capaz de arar.
—— Também de pouco adianta,
nem pedra há aqui que amassar
diga-me ainda, compadre,
que mais fazias por lá?
—— Conheço todas as roças
que nesta chã podem dar
o algodão, a mamona,
a pita, o milho, o caroá.
—— Esses roçados o banco
já não quer financiar
mas diga-me, retirante,
o que mais fazia lá?
—— Melhor do que eu ninguém
sei combater, quiçá,
tanta planta de rapina
que tenho visto por cá.
—— Essas plantas de rapina
são tudo o que a terra dá
diga-me ainda, compadre
que mais fazia por lá?
—— Tirei mandioca de chãs
que o vento vive a esfolar
e de outras escalavras
pela seca faca solar.
—— Isto aqui não é Vitória
nem é Glória do Goitá
e além da terra, me diga,
que mais sabe trabalhar?
—— Sei também tratar de gado,
entre urtigas pastorear
gado de comer do chão
ou de comer ramas no ar.
—— Aqui não é Surubim
nem Limoeiro, oxalá!
mas diga-me, retirante,
que mais fazia por lá?
—— Em qualquer das cinco tachas
de um bangüê sei cozinhar
sei cuidar de uma moenda,
de uma casa de purgar.
—— Com a vinda das usinas
há poucos engenhos já
nada mais o retirante
aprendeu a fazer lá?
—— Ali ninguém aprendeu
outro ofício, ou aprenderá
mas o sol, de sol a sol,
bem se aprende a suportar.
—— Mas isso então será tudo
em que sabe trabalhar?
vamos, diga, retirante,
outras coisas saberá.
—— Deseja mesmo saber
o que eu fazia por lá?
comer quando havia o quê
e, havendo ou não, trabalhar.
—— Essa vida por aqui
é coisa familiar
mas diga-me retirante,
sabe benditos rezar?
sabe cantar excelências,
defuntos encomendar?
sabe tirar ladainhas,
sabe mortos enterrar?
—— Já velei muitos defuntos,
na serra é coisa vulgar
mas nunca aprendi as rezas,
sei somente acompanhar.
—— Pois se o compadre soubesse
rezar ou mesmo cantar,
trabalhávamos a meias,
que a freguesia bem dá.
—— Agora se me permite
minha vez de perguntar:
como senhora, comadre,
pode manter o seu lar?
—— Vou explicar rapidamente,
logo compreenderá:
como aqui a morte é tanta,
vivo de a morte ajudar.
—— E ainda se me permite
que volte a perguntar:
é aqui uma profissão
trabalho tão singular?
—— é, sim, uma profissão,
e a melhor de quantas há:
sou de toda a região
rezadora titular.
—— E ainda se me permite
mais outra vez indagar:
é boa essa profissão
em que a comadre ora está?
—— De um raio de muitas léguas
vem gente aqui me chamar
a verdade é que não pude
queixar-me ainda de azar.
—— E se pela última vez
me permite perguntar:
não existe outro trabalho
para mim nesse lugar?
—— Como aqui a morte é tanta,
só é possível trabalhar
nessas profissões que fazem
da morte ofício ou bazar.
Imagine que outra gente
de profissão similar,
farmacêuticos, coveiros,
doutor de anel no anular,
remando contra a corrente
da gente que baixa ao mar,
retirantes às avessas,
sobem do mar para cá.
Só os roçados da morte
compensam aqui cultivar,
e cultivá-los é fácil:
simples questão de plantar
não se precisa de limpa,
as estiagens e as pragas
fazemos mais prosperar
e dão lucro imediato
nem é preciso esperar
pela colheita: recebe-se
na hora mesma de semear.
O RETIRANTE CHEGA À ZONA DA
MATA, QUE O FAZ PENSAR, OUTRA VEZ,
EM INTERROMPER A VIAGEM.
—— Bem me diziam que a terra
se faz mais branda e macia
quando mais do litoral
a viagem se aproxima.
Agora afinal cheguei
nesta terra que diziam.
Como ela é uma terra doce
para os pés e para a vista.
Os rios que correm aqui
têm água vitalícia.
Cacimbas por todo lado
cavando o chão, água mina.
Vejo agora que é verdade
o que pensei ser mentira
Quem sabe se nesta terra
não plantarei minha sina?
Não tenho medo de terra
(cavei pedra toda a vida),
e para quem lutou a braço
contra a piçarra da Caatinga
será fácil amansar
esta aqui, tão feminina.
Mas não avisto ninguém,
só folhas de cana fina
somente ali à distância
aquele bueiro de usina
somente naquela várzea
um bangüê velho em ruína.
Por onde andará a gente
que tantas canas cultiva?
Feriando: que nesta terra
tão fácil, tão doce e rica,
não é preciso trabalhar
todas as horas do dia,
os dias todos do mês,
os meses todos da vida.
Decerto a gente daqui
jamais envelhece aos trinta
nem sabe da morte em vida,
vida em morte, severina
e aquele cemitério ali,
branco de verde colina,
decerto pouco funciona
e poucas covas aninha.
ASSISTE AO ENTERRO DE UM
TRABALHADOR DE EITO E OUVE O QUE
DIZEM DO MORTO OS AMIGOS QUE O
LEVARAM AO CEMITÉRIO
—— Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a cota menor
que tiraste em vida.
—— é de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
é a parte que te cabe
neste latifúndio.
—— Não é cova grande.
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida.
—— é uma cova grande
para teu pouco defunto,
mas estarás mais ancho
que estavas no mundo.
—— é uma cova grande
para teu defunto parco,
porém mais que no mundo
te sentirás largo.
—— é uma cova grande
para tua carne pouca,
mas a terra dada
não se abre a boca.
—— Viverás, e para sempre
na terra que aqui aforas:
e terás enfim tua roça.
—— Aí ficarás para sempre,
livre do sol e da chuva,
criando tuas saúvas.
—— Agora trabalharás
só para ti, não a meias,
como antes em terra alheia.
—— Trabalharás uma terra
da qual, além de senhor,
serás homem de eito e trator.
—— Trabalhando nessa terra,
tu sozinho tudo empreitas:
serás semente, adubo, colheita.
—— Trabalharás numa terra
que também te abriga e te veste:
embora com o brim do Nordeste.
—— Será de terra
tua derradeira camisa:
te veste, como nunca em vida.
—— Será de terra
e tua melhor camisa:
te veste e ninguém cobiça.
—— Terás de terra
completo agora o teu fato:
e pela primeira vez, sapato.
—— Como és homem,
a terra te dará chapéu:
fosses mulher, xale ou véu.
—— Tua roupa melhor
será de terra e não de fazenda:
não se rasga nem se remenda.
—— Tua roupa melhor
e te ficará bem cingida:
como roupa feita à medida.
—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu teu suor vendido).
—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu o moço antigo)
—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu tua força de marido).
—— Desse chão és bem conhecido
(através de parentes e amigos).
—— Desse chão és bem conhecido
(vive com tua mulher, teus filhos)
—— Desse chão és bem conhecido
(te espera de recém-nascido).
—— Não tens mais força contigo:
deixa-te semear ao comprido.
—— Já não levas semente viva:
teu corpo é a própria maniva.
—— Não levas rebolo de cana:
és o rebolo, e não de caiana.
—— Não levas semente na mão:
és agora o próprio grão.
—— Já não tens força na perna:
deixa-te semear na coveta.
—— Já não tens força na mão:
deixa-te semear no leirão.
—— Dentro da rede não vinha nada,
só tua espiga debulhada.
—— Dentro da rede vinha tudo,
só tua espiga no sabugo.
—— Dentro da rede coisa vasqueira,
só a maçaroca banguela.
—— Dentro da rede coisa pouca,
tua vida que deu sem soca.
—— Na mão direita um rosário,
milho negro e ressecado.
—— Na mão direita somente
o rosário, seca semente.
—— Na mão direita, de cinza,
o rosário, semente maninha,
—— Na mão direita o rosário,
semente inerte e sem salto.
—— Despido vieste no caixão,
despido também se enterra o grão.
—— De tanto te despiu a privação
que escapou de teu peito à viração.
—— Tanta coisa despiste em vida
que fugiu de teu peito a brisa.
—— E agora, se abre o chão e te abriga,
lençol que não tiveste em vida.
—— Se abre o chão e te fecha,
dando-te agora cama e coberta.
—— Se abre o chão e te envolve,
como mulher com que se dorme.
O RETIRANTE RESOLVE APRESSAR OS
PASSOS PARA CHEGAR LOGO AO RECIFE
—— Nunca esperei muita coisa,
digo a Vossas Senhorias.
O que me fez retirar
não foi a grande cobiça
o que apenas busquei
foi defender minha vida
de tal velhice que chega
antes de se inteirar trinta
se na serra vivi vinte,
se alcancei lá tal medida,
o que pensei, retirando,
foi estendê-la um pouco ainda.
Mas não senti diferença
entre o Agreste e a Caatinga,
e entre a Caatinga e aqui a Mata
a diferença é a mais mínima.
Está apenas em que a terra
é por aqui mais macia
está apenas no pavio,
ou melhor, na lamparina:
pois é igual o querosene
que em toda parte ilumina,
e quer nesta terra gorda
quer na serra, de caliça,
a vida arde sempre com
a mesma chama mortiça.
Agora é que compreendo
por que em paragens tão ricas
o rio não corta em poços
como ele faz na Caatinga:
vivi a fugir dos remansos
a que a paisagem o convida,
com medo de se deter,
grande que seja a fadiga.
Sim, o melhor é apressar
o fim desta ladainha,
o fim do rosário de nomes
que a linha do rio enfia
é chegar logo ao Recife,
derradeira ave-maria
do rosário, derradeira
invocação da ladainha,
Recife, onde o rio some
e esta minha viagem se fina.
CHEGANDO AO RECIFE O
RETIRANTE SENTA-SE PARA DESCANSAR
AO PÉ DE UM MURO ALTO E
CAIADO E OUVE, SEM SER NOTADO,
A CONVERSA DE DOIS COVEIROS
—— O dia hoje está difícil
não sei onde vamos parar.
Deviam dar um aumento,
ao menos aos deste setor de cá.
As avenidas do centro são melhores,
mas são para os protegidos:
há sempre menos trabalho
e gorjetas pelo serviço
e é mais numeroso o pessoal
(toma mais tempo enterrar os ricos).
—— pois eu me daria por contente
se me mandassem para cá.
Se trabalhasses no de Casa Amarela
não estarias a reclamar.
De trabalhar no de Santo Amaro
deve alegrar-se o colega
porque parece que a gente
que se enterra no de Casa Amarela
está decidida a mudar-se
toda para debaixo da terra.
—— é que o colega ainda não viu
o movimento: não é o que se vê.
Fique-se por aí um momento
e não tardarão a aparecer
os defuntos que ainda hoje
vão chegar (ou partir, não sei).
As avenidas do centro,
onde se enterram os ricos,
são como o porto do mar
não é muito ali o serviço:
no máximo um transatlântico
chega ali cada dia,
com muita pompa, protocolo,
e ainda mais cenografia.
Mas este setor de cá
é como a estação dos trens:
diversas vezes por dia
chega o comboio de alguém.
—— Mas se teu setor é comparado
à estação central dos trens,
o que dizer de Casa Amarela
onde não para o vaivém?
Pode ser uma estação
mas não estação de trem:
será parada de ônibus,
com filas de mais de cem.
—— Então por que não pedes,
já que és de carreira, e antigo,
que te mandem para Santo Amaro
se achas mais leve o serviço?
Não creio que te mandassem
para as belas avenidas
onde estão os endereços
e o bairro da gente fina:
isto é, para o bairro dos usineiros,
dos políticos, dos banqueiros,
e no tempo antigo, dos bangunlezeiros
(hoje estes se enterram em carneiros)
bairro também dos industriais,
dos membros das
associações patronais
e dos que foram mais horizontais
nas profissões liberais.
Difícil é que consigas
aquele bairro, logo de saída.
—— Só pedi que me mandasse
para as urbanizações discretas,
com seus quarteirões apertados,
com suas cômodas de pedra.
—— Esse é o bairro dos funcionários,
inclusive extranumerários,
contratados e mensalistas
(menos os tarefeiros e diaristas).
Para lá vão os jornalistas,
os escritores, os artistas
ali vão também os bancários,
as altas patentes dos comerciários,
os lojistas, os boticários,
os localizados aeroviários
e os de profissões liberais
que não se libertaram jamais.
—— Também um bairro dessa gente
temos no de Casa Amarela:
cada um em seu escaninho,
cada um em sua gaveta,
com o nome aberto na lousa
quase sempre em letras pretas.
Raras as letras douradas,
raras também as gorjetas.
—— Gorjetas aqui, também,
só dá mesmo a gente rica,
em cujo bairro não se pode
trabalhar em mangas de camisa
onde se exige quepe
e farda engomada e limpa.
—— Mas não foi pelas gorjetas, não,
que vim pedir remoção:
é porque tem menos trabalho
que quero vir para Santo Amaro
aqui ao menos há mais gente
para atender a freguesia,
para botar a caixa cheia
dentro da caixa vazia.
—— E que disse o Administrador,
se é que te deu ouvido?
—— Que quando apareça a ocasião
atenderá meu pedido.
—— E do senhor Administrador
isso foi tudo que arrancaste?
—— No de Casa Amarela me deixou
mas me mudou de arrabalde.
—— E onde vais trabalhar agora,
qual o subúrbio que te cabe?
—— Passo para o dos industriários,
que também é o dos ferroviários,
de todos os rodoviários
e praças-de-pré dos comerciários.
—— Passas para o dos operário,
deixas o dos pobres vários
melhor: não são tão contagiosos
e são muito menos numerosos.
—— é, deixo o subúrbio dos indigentes
onde se enterra toda essa gente
que o rio afoga na preamar
e sufoca na baixa-mar.
—— é a gente sem instituto,
gente de braços devolutos
são os que jamais usam luto
e se enterram sem salvo-conduto.
—— é a gente dos enterros gratuitos
e dos defuntos ininterruptos.
—— é a gente retirante
que vem do Sertão de longe.
—— Desenrolam todo o barbante
e chegam aqui na jante.
—— E que então, ao chegar,
não tem mais o que esperar.
—— Não podem continuar
pois têm pela frente o mar.
—— Não têm onde trabalhar
e muito menos onde morar.
—— E da maneira em que está
não vão ter onde se enterrar.
—— Eu também, antigamente,
fui do subúrbio dos indigentes,
e uma coisa notei
que jamais entenderei:
essa gente do Sertão
que desce para o litoral, sem razão,
fica vivendo no meio da lama,
comendo os siris que apanha
pois bem: quando sua morte chega,
temos que enterrá-los em terra seca.
—— Na verdade, seria mais rápido
e também muito mais barato
que os sacudissem de qualquer ponte
dentro do rio e da morte.
—— O rio daria a mortalha
e até um macio caixão de água
e também o acompanhamento
que levaria com passo lento
o defunto ao enterro final
a ser feito no mar de sal.
—— E não precisava dinheiro,
e não precisava coveiro,
e não precisava oração
e não precisava inscrição.
—— Mas o que se vê não é isso:
é sempre nosso serviço
crescendo mais cada dia
morre gente que nem vivia.
—— E esse povo de lá de riba
de Pernambuco, da Paraíba,
que vem buscar no Recife
poder morrer de velhice,
encontra só, aqui chegando
cemitério esperando.
—— Não é viagem o que fazem
vindo por essas caatingas, vargens
aí está o seu erro:
vêm é seguindo seu próprio enterro.
O RETIRANTE APROXIMA-SE DE
UM DOS CAIS DO CAPIBARIBE
—— Nunca esperei muita coisa,
é preciso que eu repita.
Sabia que no rosário
de cidade e de vilas,
e mesmo aqui no Recife
ao acabar minha descida,
não seria diferente
a vida de cada dia:
que sempre pás e enxadas
foices de corte e capina,
ferros de cova, estrovengas
o meu braço esperariam.
Mas que se este não mudasse
seu uso de toda vida,
esperei, devo dizer,
que ao menos aumentaria
na quartinha, a água pouca,
dentro da cuia, a farinha,
o algodãozinho da camisa,
ao meu aluguel com a vida.
E chegando, aprendo que,
nessa viagem que eu fazia,
sem saber desde o Sertão,
meu próprio enterro eu seguia.
Só que devo ter chegado
adiantado de uns dias
o enterro espera na porta:
o morto ainda está com vida.
A solução é apressar
a morte a que se decida
e pedir a este rio,
que vem também lá de cima,
que me faça aquele enterro
que o coveiro descrevia:
caixão macio de lama,
mortalha macia e líquida,
coroas de baronesa
junto com flores de aninga,
e aquele acompanhamento
de água que sempre desfila
(que o rio, aqui no Recife,
não seca, vai toda a vida).
APROXIMA-SE DO RETIRANTE O
MORADOR DE UM DOS MOCAMBOS
QUE EXISTEM ENTRE O CAIS
E A ÁGUA DO RIO
—— Seu José, mestre carpina,
que habita este lamaçal,
sabes me dizer se o rio
a esta altura dá vau?
sabe me dizer se é funda
esta água grossa e carnal?
—— Severino, retirante,
jamais o cruzei a nado
quando a maré está cheia
vejo passar muitos barcos,
barcaças, alvarengas,
muitas de grande calado.
—— Seu José, mestre carpina,
para cobrir corpo de homem
não é preciso muito água:
basta que chega o abdome,
basta que tenha fundura
igual à de sua fome.
—— Severino, retirante
pois não sei o que lhe conte
sempre que cruzo este rio
costumo tomar a ponte
quanto ao vazio do estômago,
se cruza quando se come.
—— Seu José, mestre carpina,
e quando ponte não há?
quando os vazios da fome
não se tem com que cruzar?
quando esses rios sem água
são grandes braços de mar?
—— Severino, retirante,
o meu amigo é bem moço
sei que a miséria é mar largo,
não é como qualquer poço:
mas sei que para cruzá-la
vale bem qualquer esforço.
—— Seu José, mestre carpina,
e quando é fundo o perau?
quando a força que morreu
nem tem onde se enterrar,
por que ao puxão das águas
não é melhor se entregar?
—— Severino, retirante,
o mar de nossa conversa
precisa ser combatido,
sempre, de qualquer maneira,
porque senão ele alarga
e devasta a terra inteira.
—— Seu José, mestre carpina,
e em que nos faz diferença
que como frieira se alastre,
ou como rio na cheia,
se acabamos naufragados
num braço do mar miséria?
—— Severino, retirante,
muita diferença faz
entre lutar com as mãos
e abandoná-las para trás,
porque ao menos esse mar
não pode adiantar-se mais.
—— Seu José, mestre carpina,
e que diferença faz
que esse oceano vazio
cresça ou não seus cabedais
se nenhuma ponte mesmo
é de vencê-lo capaz?
—— Seu José, mestre carpina,
que lhe pergunte permita:
há muito no lamaçal
apodrece a sua vida?
e a vida que tem vivido
foi sempre comprada à vista?
—— Severino, retirante,
sou de Nazaré da Mata,
mas tanto lá como aqui
jamais me fiaram nada:
a vida de cada dia
cada dia hei de comprá-la.
—— Seu José, mestre carpina,
e que interesse, me diga,
há nessa vida a retalho
que é cada dia adquirida?
espera poder um dia
comprá-la em grandes partidas?
—— Severino, retirante,
não sei bem o que lhe diga:
não é que espere comprar
em grosso tais partidas,
mas o que compro a retalho
é, de qualquer forma, vida.
—— Seu José, mestre carpina,
que diferença faria
se em vez de continuar
tomasse a melhor saída:
a de saltar, numa noite,
fora da ponte e da vida?
UMA MULHER, DA PORTA DE
ONDE SAIU O HOMEM,
ANUNCIA-LHE O QUE SE VERÁ
—— Compadre José, compadre,
que na relva estais deitado:
conversais e não sabeis
que vosso filho é chegado?
Estais aí conversando
em vossa prosa entretida:
não sabeis que vosso filho
saltou para dentro da vida?
Saltou para dento da vida
ao dar o primeiro grito
e estais aí conversando
pois sabeis que ele é nascido.
APARECEM E SE APROXIMAM DA CASA DO
HOMEM VIZINHOS,
AMIGOS, DUAS CIGANAS, ETC
— Todo o céu e a terra
lhe cantam louvor.
Foi por ele que a maré
esta noite não baixou.
—— Foi por ele que a maré
fez parar o seu motor:
a lama ficou coberta
e o mau-cheiro não voou.
—— E a alfazema do sargaço,
ácida, desinfetante,
veio varrer nossas ruas
enviada do mar distante.
—— E a língua seca de esponja
que tem o vento terral
veio enxugar a umidade
do encharcado lamaçal.
—— Todo o céu e a terra
lhe cantam louvor
e cada casa se torna
num mocambo sedutor.
—— Cada casebre se torna
no mocambo modelar
que tanto celebram os
sociólogos do lugar.
—— E a banda de maruins
que toda noite se ouvia
por causa dele, esta noite,
creio que não irradia.
—— E este rio de água, cega,
ou baça, de comer terra,
que jamais espelha o céu,
hoje enfeitou-se de estrelas.
COMEÇAM A CHEGAR PESSOAS
TRAZENDO PRESENTES PARA
O RECÉM-NASCIDO
COMEÇAM A CHEGAR PESSOAS TRAZENDO
PRESENTES PARA
O RECÉM-NASCIDO
— Minha pobreza tal é
que não trago presente grande:
trago para a mãe caranguejos
pescados por esses mangues
mamando leite de lama
conservará nosso sangue.
—— Minha pobreza tal é
que coisa alguma posso ofertar:
somente o leite que tenho
para meu filho amamentar
aqui todos são irmãos,
de leite, de lama, de ar.
—— Minha pobreza tal é
que não tenho presente melhor:
trago este papel de jornal
para lhe servir de cobertor
cobrindo-se assim de letras
vai um dia ser doutor.
—— Minha pobreza tal é
que não tenho presente caro:
como não posso trazer
um olho d'água de Lagoa do Cerro,
trago aqui água de Olinda,
água da bica do Rosário.
—— Minha pobreza tal é
que grande coisa não trago:
trago este canário da terra
que canta sorrindo e de estalo.
—— Minha pobreza tal é
que minha oferta não é rica:
trago daquela bolacha d'água
que só em Paudalho se fabrica.
—— Minha pobreza tal é
que melhor presente não tem:
dou este boneco de barro
de Severino de Tracunhaém.
—— Minha pobreza tal é
que pouco tenho o que dar:
dou da pitu que o pintor Monteiro
fabricava em Gravatá.
—— Trago abacaxi de Goiana
e de todo o Estado rolete de cana.
—— Eis ostras chegadas agora,
apanhadas no cais da Aurora.
—— Eis tamarindos da Jaqueira
e jaca da Tamarineira.
—— Mangabas do Cajueiro
e cajus da Mangabeira.
—— Peixe pescado no Passarinho,
carne de boi dos Peixinhos.
—— Siris apanhados no lamaçal
que já no avesso da rua Imperial.
—— Mangas compradas nos quintais ricos
do Espinheiro e dos Aflitos.
—— Goiamuns dados pela gente pobre
da Avenida Sul e da Avenida Norte.
FALAM AS DUAS CIGANAS QUE HAVIAM
APARECIDO COM OS VIZINHOS
— Atenção peço, senhores,
para esta breve leitura:
somos ciganas do Egito,
lemos a sorte futura.
Vou dizer todas as coisas
que desde já posso ver
na vida desse menino
acabado de nascer:
aprenderá a engatinhar
por aí, com aratus,
aprenderá a caminhar
na lama, como goiamuns,
e a correr o ensinarão
o anfíbios caranguejos,
pelo que será anfíbio
como a gente daqui mesmo.
Cedo aprenderá a caçar:
primeiro, com as galinhas,
que é catando pelo chão
tudo o que cheira a comida
depois, aprenderá com
outras espécies de bichos:
com os porcos nos monturos,
com os cachorros no lixo.
Vejo-o, uns anos mais tarde,
na ilha do Maruim,
vestido negro de lama,
voltar de pescar siris
e vejo-o, ainda maior,
pelo imenso lamarão
fazendo dos dedos iscas
para pescar camarão.
—— Atenção peço, senhores,
também para minha leitura:
também venho dos Egitos,
vou completar a figura.
Outras coisas que estou vendo
é necessário que eu diga:
não ficará a pescar
de jereré toda a vida.
Minha amiga se esqueceu
de dizer todas as linhas
não pensem que a vida dele
há de ser sempre daninha.
Enxergo daqui a planura
que é a vida do homem de ofício,
bem mais sadia que os mangues,
tenha embora precipícios.
Não o vejo dentro dos mangues,
vejo-o dentro de uma fábrica:
se está negro não é lama,
é graxa de sua máquina,
coisa mais limpa que a lama
do pescador de maré
que vemos aqui vestido
de lama da cara ao pé.
E mais: para que não pensem
que em sua vida tudo é triste,
vejo coisa que o trabalho
talvez até lhe conquiste:
que é mudar-se destes mangues
daqui do Capibaribe
para um mocambo melhor
nos mangues do Beberibe.
FALAM OS VIZINHOS, AMIGOS, PESSOAS QUE
VIERAM COM PRESENTES, ETC
—— De sua formosura
já venho dizer:
é um menino magro,
de muito peso não é,
mas tem o peso de homem,
de obra de ventre de mulher.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é uma criança pálida,
é uma criança franzina,
mas tem a marca de homem,
marca de humana oficina.
—— Sua formosura
deixai-me que cante:
é um menino guenzo
como todos os desses mangues,
mas a máquina de homem
já bate nele, incessante.
—— Sua formosura
eis aqui descrita:
é uma criança pequena,
enclenque e setemesinha,
mas as mãos que criam coisas
nas suas já se adivinha.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é belo como o coqueiro
que vence a areia marinha.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como o avelós
contra o Agreste de cinza.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como a palmatória
na caatinga sem saliva.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é tão belo como um sim
numa sala negativa.
—— é tão belo como a soca
que o canavial multiplica.
—— Belo porque é uma porta
abrindo-se em mais saídas.
—— Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia.
—— é tão belo como as ondas
em sua adição infinita.
— Belo porque tem do novo
a surpresa e a alegria.
—— Belo como a coisa nova
na prateleira até então vazia.
—— Como qualquer coisa nova
inaugurando o seu dia.
—— Ou como o caderno novo
quando a gente o principia.
—— E belo porque o novo
todo o velho contagia.
—— Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia.
—— Infecciona a miséria
com vida nova e sadia.
—— Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria.
O CARPINA FALA COM O RETIRANTE QUE
ESTEVE DE FORA,
SEM TOMAR PARTE DE NADA
— Severino, retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte e da vida
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga
é difícil defender,
só com palavras, a vida,
ainda mais quando ela é
esta que vê, severina
mas se responder não pude
à pergunta que fazia,
ela, a vida, a respondeu
com sua presença viva.
E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
ver a fábrica que ela mesma,
teimosamente, se fabrica,
vê-la brotar como há pouco
em nova vida explodida
mesmo quando é assim pequena
a explosão, como a ocorrida
como a de há pouco, franzina
mesmo quando é a explosão
de uma vida severina.


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Canção do vento e da minha vida
em 24/02/2008 12:10:00 (37329 leituras)
Manuel Bandeira

O vento varria as folhas,
O vento varria os frutos,
O vento varria as flores...

E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De frutos, de flores, de folhas.

O vento varria as luzes,
O vento varria as músicas,
O vento varria os aromas...

E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De aromas, de estrelas, de cânticos.

O vento varria os sonhos
E varria as amizades...
O vento varria as mulheres...

E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De afetos e de mulheres.

O vento varria os meses
E varria os teus sorrisos...
O vento varria tudo!

E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De tudo.

Para ouvir este poema declamado pelo próprio Manuel Bandeira, clique neste link:

http://ecosdapoesia.net/acervo/manuelbandeira/manuel_bandeira.htm

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Desejos
em 24/02/2008 12:00:00 (18201 leituras)
Carlos Drummond de Andrade

DESEJOS

Desejo a vocês...
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho.
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu.

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Os teus pés
em 24/02/2008 12:00:00 (19901 leituras)
Pablo Neruda

Quando não posso contemplar teu rosto,
contemplo os teus pés.

Teus pés de osso arqueado,
teus pequenos pés duros.

Eu sei que te sustentam
e que teu doce peso
sobre eles se ergue.

Tua cintura e teus seios,
a duplicada purpura
dos teus mamilos,
a caixa dos teus olhos
que há pouo levantaram voo,
a larga boca de fruta,
tua rubra cabeleira,
pequena torre minha.

Mas se amo os teus pés
é só porque andaram
sobre a terra e sobre
o vento e sobre a água,
até me encontrarem.

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Definitivo
em 16/02/2008 15:20:00 (34919 leituras)
Carlos Drummond de Andrade

Definitivo

Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.

Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos
o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções
irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado
do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter
tido junto e não tivemos,por todos os shows e livros e silêncios que
gostaríamos de ter compartilhado,
e não compartilhamos.
Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.

Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas
as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um
amigo, para nadar, para namorar.

Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os
momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas
angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.

Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.

Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo
confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam,
todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.

Por que sofremos tanto por amor?
O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma
pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez
companhia por um tempo razoável,um tempo feliz.

Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um
verso:

Se iludindo menos e vivendo mais!!!
A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida
está no amor que não damos, nas forças que não usamos,
na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do
sofrimento,perdemos também a felicidade.

A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional...


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O Português é belo
em 11/02/2008 09:20:00 (8974 leituras)
Clarice Lispector

Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...
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Sintam a genialidade da poetisa leiam o poema de cima a baixo e de baixo a cima.


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Para sempre
em 10/02/2008 12:50:00 (25457 leituras)
Carlos Drummond de Andrade

Para Sempre
Por que Deus permite
que as mães vão se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não se apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
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Acho esse poema lindo, e ainda fico muito emocionado quando o leio desde que perdi minha mãe, gostaria que este poema fosse postado em homenagem a ela. Obrigado


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Um beijo
em 30/01/2008 15:10:00 (24475 leituras)
Olavo Bilac

Foste o beijo melhor da minha vida,
ou talvez o pior...Glória e tormento,
contigo à luz subi do firmamento,
contigo fui pela infernal descida!

Morreste, e o meu desejo não te olvida:
queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
e do teu gosto amargo me alimento,
e rolo-te na boca malferida.

Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
batismo e extrema-unção, naquele instante
por que, feliz, eu não morri contigo?

Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto,
beijo divino! e anseio delirante,
na perpétua saudade de um minuto....



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Soneto de fidelidade
em 30/01/2008 15:00:00 (25053 leituras)
Vinícius de Moraes

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me preocupe
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive)
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


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A educação pela pedra
em 30/01/2008 15:00:00 (9100 leituras)
João Cabral de Melo Neto

Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta;
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.

Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra; lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.

Recentemente, ou melhor dia nove foi aniversário de nascimento do grande poeta.
Se quiser saber mais clique no link

http://ecosdapoesia.net/acervo/meloneto/joao_cabral_melo_neto.htm

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Rotação
em 30/12/2007 16:31:23 (6775 leituras)
Nuno Júdice

É nos teus olhos que o mundo inteiro cabe,
mesmo quando as suas voltas me levam para longe de ti;
e se outras voltas me fazem ver nos teus
os meus olhos, não é porque o mundo parou, mas
porque esse breve olhar nos fez imaginar que
só nós é que o fazemos andar.

Nuno Júdice


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Nem tudo é fácil
em 26/12/2007 20:00:00 (89741 leituras)
Cecília Meireles

Nem tudo é fácil

É difícil fazer alguém feliz, assim como é fácil fazer triste.
É difícil dizer eu te amo, assim como é fácil não dizer nada
É difícil valorizar um amor, assim como é fácil perdê-lo para sempre.
É difícil agradecer pelo dia de hoje, assim como é fácil viver mais um dia.
É difícil enxergar o que a vida traz de bom, assim como é fácil fechar os olhos e atravessar a rua.
É difícil se convencer de que se é feliz, assim como é fácil achar que sempre falta algo.
É difícil fazer alguém sorrir, assim como é fácil fazer chorar.
É difícil colocar-se no lugar de alguém, assim como é fácil olhar para o próprio umbigo.
Se você errou, peça desculpas...
É difícil pedir perdão? Mas quem disse que é fácil ser perdoado?
Se alguém errou com você, perdoa-o...
É difícil perdoar? Mas quem disse que é fácil se arrepender?
Se você sente algo, diga...
É difícil se abrir? Mas quem disse que é fácil encontrar
alguém que queira escutar?
Se alguém reclama de você, ouça...
É difícil ouvir certas coisas? Mas quem disse que é fácil ouvir você?
Se alguém te ama, ame-o...
É difícil entregar-se? Mas quem disse que é fácil ser feliz?
Nem tudo é fácil na vida...Mas, com certeza, nada é impossível
Precisamos acreditar, ter fé e lutar
para que não apenas sonhemos, Mas também tornemos todos esses desejos,
realidade!!!

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Certezas
em 15/12/2007 00:50:00 (70773 leituras)
Mario Quintana

Não quero alguém que morra de amor por mim...
Só preciso de alguém que viva por mim, que queira estar junto de mim, me abraçando.
Não exijo que esse alguém me ame como eu o amo, quero apenas que me ame, não me importando com que intensidade.
Não tenho a pretensão de que todas as pessoas que gosto, gostem de mim...
Nem que eu faça a falta que elas me fazem, o importante pra mim é saber que eu, em algum momento, fui insubstituível...
E que esse momento será inesquecível...
Só quero que meu sentimento seja valorizado.
Quero sempre poder ter um sorriso estampando em meu rosto, mesmo quando a situação não for muito alegre...
E que esse meu sorriso consiga transmitir paz para os que estiverem ao meu redor.
Quero poder fechar meus olhos e imaginar alguém...e poder ter a absoluta certeza de que esse alguém também pensa em mim quando fecha os olhos, que faço falta quando não estou por perto.
Queria ter a certeza de que apesar de minhas renúncias e loucuras, alguém me valoriza pelo que sou, não pelo que tenho...
Que me veja como um ser humano completo, que abusa demais dos bons sentimentos que a vida lhe proporciona, que dê valor ao que realmente importa, que é meu sentimento...e não brinque com ele.
E que esse alguém me peça para que eu nunca mude, para que eu nunca cresça, para que eu seja sempre eu mesmo.
Não quero brigar com o mundo, mas se um dia isso acontecer, quero ter forças suficientes para mostrar a ele que o amor existe...
Que ele é superior ao ódio e ao rancor, e que não existe vitória sem humildade e paz.
Quero poder acreditar que mesmo se hoje eu fracassar, amanhã será outro dia, e se eu não desistir dos meus sonhos e propósitos, talvez obterei êxito e serei plenamente feliz.
Que eu nunca deixe minha esperança ser abalada por palavras pessimistas...
Que a esperança nunca me pareça um NÃO que a gente teima em maquiá-lo de verde e entendê-lo como SIM.
Quero poder ter a liberdade de dizer o que sinto a uma pessoa, de poder dizer a alguém o quanto ele é especial e importante pra mim, sem ter de me preocupar com terceiros... Sem correr o risco de ferir uma ou mais pessoas com esse sentimento.
Quero, um dia, poder dizer às pessoas que nada foi em vão...
Que o amor existe, que vale a pena se doar às amizades a às pessoas, que a vida é bela sim, e que eu sempre dei o melhor de mim... e que valeu a pena.


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Respiro o teu corpo
em 02/12/2007 14:40:00 (8623 leituras)
Eugénio de Andrade

Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,
sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca.



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