Sonetos : 

MEUS SONETOS VOLUME 002

 

101

A cruz abandonada no caminho
Traduz a sorte triste da paixão.
Não quero a sensação de estar sozinho,
Por isso risco trilhas, novo chão...

Quem fora tempestade no sertão,
A dona dos meus olhos, sem carinho...
Razão de vida mata o coração
Que teima... Vai morrendo, passarinho...

Esta cruz foi fincada por alguém
Que nunca poderia imaginar
Que simbolizaria o nosso bem...

Agora, novo sonho, novo mar...
Cansado de na vida ir sem ninguém,
Embarco em novo amor... Vou ao luar...



102

A cruz abandonada no caminho,
Traduz a sorte; morte sem perdão.
Quem passa e nem percebe, vai sozinho,
Riscando pelas trilhas, novo chão.

Mal sabe que viveu, nesse sertão,
A dona dos meus olhos, meu carinho,
Razão de vida, pobre coração.
Que teima , vai batendo, passarinho...

Essa cruz foi fincada por alguém,
Que nunca poderia imaginar;
Que ela também fora meu triste bem.

Mas, meu Deus, nunca posso revelar,
Nem a Ti, nem sequer mais a ninguém,
Esse amor consagrado no luar...

103

A cruz que carregamos dia-a-dia
Na angústia rotineira, nos permite
Saber qual é por certo o meu limite
Porém, a resistência, aos poucos, cria.

Uma alma que não sofre é tão vazia,
Por isso, a dor, amigo não evite.
O sol após a chuva, que olhar fite
A estrela que virá comanda e guia

Aquele que percebe que a beleza
Se faz do lacrimar e do tormento,
A força pra vencer a correnteza

Nos braços do sofrido remador,
A luz que surgirá no firmamento
Trará a paz e o alento ao sofredor...



104

A culpa é de quem não teve perdão
Sabendo disso procurei abrigo
Nos olhos mansos de um amor amigo
Que traga sempre um verso em redenção.

Contigo, o medo; um sentimento em vão,
Jamais trará ao pleno amor perigo.
Demonstração do que em palavras digo
Num turbilhão de chama em paz, vulcão.

Há tanto tempo eu perseguia o riso
Insensatez que profanou o siso
Negando sempre o que busquei em méis

Da calmaria que nos mostra o cais;
Embora audazes e jamais formais,
Nós somos os retratos mais fiéis
Marcos Loures



105

Da culpa; não mais fujas, ela é nossa,
Omissos e idiotas, vendilhões
Das almas em que as velhas podridões
Exalam este perfume que me acossa.

No sangue que escorrendo, já se empoça,
Das fétidas e podres multidões
Eu vejo retratados meus grilhões,
Enquanto a fantasia, tola, adoça...

Não posso mais fugir da realidade,
Omisso! Sou omisso! Sim, eu sou.
A minha mão jamais esfaqueou,

Porém ao vomitar felicidade
Fechando a porta a todos que padecem
Os meus dedos também logo apodrecem...


106

A cúmplice perfeita que encontrei
Irmãos nos mesmos sonhos esquecidos.
Reinados tão distantes, nossa lei
Tocando nas feridas dos vencidos.

Inglórias que tivemos e sangrei
Nos plasmas derramados convertidos
Em larvas canibais. Mergulharei
Nos poços que pensamos já perdidos

E deles beberei espuma e ódio
Nos louros da vitória em cada pódio
Açoda este cadáver insepulto

Fazendo da mortalha nosso culto,
Estigma que trazemos, podridões
Irmanam nossos lodos, corações...
Marcos Loures



107

A dádiva suprema esboçada na dor
Permite que se vença o medo, os dissabores
Um velho caminheiro irá sempre propor
Caminho conhecido envolto em belas flores

Porém ao perceber as garras do rancor
Mudará, num segundo o céu em novas cores
Na certeza que irei meu mundo recompor
O olhar cego e vazio em meio aos estupores.

Mas sequer o rumo encontro ao fim do dia,
Enfrentando o temor de velhas tempestades
Esboço algum sorriso imerso em ironia

Mantendo nos meus pés as antigas correntes
Da noite sinto vir em falsas claridades
As sombras do meu sonho, algozes penitentes...
Marcos Loures



108

A dama da cidade andando nua
Tomando em meu desejo, tanta luz,
Num sonho mais profundo reproduz
A sorte que eu queria e continua.

Em festas a minha alma assim flutua
Roubando todo o gozo que me induz
A ter tão inclemente e dura cruz
Verdade que se mostra nua e crua.

A dama da cidade não disfarça;
Dum desejo imenso, uma comparsa,
Que faz de todo o sonho uma loucura.

Nas bocas que osculava, sem perdão,
Uma ave aprisionando o coração
De quem na sedução, louco; a procura...



109

A dama de vermelho, o cabaré
As noites entranhadas mil desejos!
O cheiro inebriante do café,
Minhas mãos percorrendo, peço beijos...

Beijos que sonhei fossem sinceros,
Da dama apaixonante desta noite...
Amores que julguei não fossem feros,
Transformam-se, venais, cruel açoite!

A dama de vermelho, sedutora...
Vestido transparente, belos seios...
A noite que passei, me revigora,

Na espera cruel, os meus anseios...
A dama de vermelho, solidão....
Nas danças, cabaré, meu coração!
Marcos Loures



110


A dama em seu castelo, desejando
Que venha um cavaleiro em noite plena,
Nas mãos a lança imensa agora acena
Com um futuro manso, calmo e brando

Aos poucos em tristezas se entornando
A dura realidade volta à cena
Matando esta ilusão, doce e serena,
O dia-a-dia amargo retornando.


A moça solitária no bordel,
Contando tanta estrela, em seu corcel
Cavalga pelo espaço sideral.

O santo que sonhara, nunca veio,
Apenas nos seus olhos o receio
Transborda a fantasia em árduo sal...
Marcos Loures


111



A dama imaginária que encontrara
Em sonhos, iludido, jamais vem.
Qual fora uma emoção singela e rara
Transporta um sentimento que não tem.

A dama imaginária é fantasia
De quem navega só, faz tanto tempo.
A noite que me engana não traria
Amor, já me causando contratempo.

Ao vê-la assim formosa, nada fala.
Apenas me cerceia e me domina,
Nudez invade a casa, o quarto, a sala,
E aos poucos, mansamente me alucina...

O medo de perdê-la me entorpece,
E rogo sua volta em cada prece...
Marcos Loures



112

A decadência bate em minha porta...
Não me restando luzes, ando cego.
Minha esperança luta, mas vai morta.
As dores do passado inda carrego.

Os tempos já são outros... Quem se importa?
As mãos tão calejadas. eu me entrego.
O resto que desaba, sangra, corta...
As lutas que perdi, embalde, nego!

A decadência serve-se do resto,
Não tenho a lucidez para enfrentar
A morte. Companheira a quem empresto

O que sobrou dos raios do luar!
A mão vai descrevendo em simples gesto
a sombra do que fora tanto amar...



113

A Deus com emoção, tanta alegria,
Eu agradeço, em preces, nosso amor.
Que trouxe tão depressa este pendor
A quem morria só, dura agonia.

Além do que bem sei, esperaria,
Um coração tão triste e sonhador,
Cansado de penar, um sofredor,
Na espreita pela luz de um novo dia.

No dia em que falamos tanto disso,
Do amor de namorados sonhadores,
Trazendo para ti milhões de flores,

Refaço o sentimento em brilho e viço
E canto sem parar amor sincero,
O tudo que desejo, o bem que eu quero...
Marcos Loures


114

A Deus, eu agradeço cada dia;
A força e a sensação de ser feliz.
Sabendo ser fugaz uma alegria,
Eu sinto como é bom ser aprendiz.

Não temo sua ira nem vingança
Meu Deus é do perdão e pleno amor.
A mão abençoada sempre alcança
Quem sabe que viver já é louvor.

Eu creio neste amor em plenitude,
Eu creio na esperança mais singela;
Viver felicidade é atitude,
A paz, quando cultivas, se revela...

Te agradeço Senhor, a liberdade
A de, por Ti, sentir, uma amizade!


115


A deusa alabastrina em tramas lúbricas
Enlanguescente imagem que me entranha.
Das horas que vivi, outrora, lúcidas
Mostrando a realidade tão tacanha,

Sorrisos de menina em poses lúdicas
Mudando a direção de minha sanha.
Desejos e vontades, chamas túrgidas
Desnuda maravilha que me assanha.

Os lábios vasculhando cada ponto
Sem tempo de partida ou de chegada,
Adentro em maravilha a madrugada,

A raríssima aurora, agora apronto
E sinto o sol chegando em nosso quarto,
Deitado, extasiado, manso e farto...



116


A deusa dos amores, Afrodite,
Derrama sobre nós, tantos desejos;
Fazendo que; no amor, eu acredite;
Carinhos, mansidão, nos nossos beijos...

Na rosa que ofereço; meus amores.
Perfumes delicados, meu jardim...
Os templos dedicados, amor, flores;
Exprimem toda a luz que existe assim...

Eros e suas flechas; sobrevoa,
Mirando o coração, me aprisionou.
O canto deste Amor, no peito ecoa,
Ao mesmo tempo em que me libertou...

Vivendo, ao mesmo tempo, espinho e flor;
Cativo e senhorio deste amor.


117

Deidade em luz imensa
Amor que nada cala
A vida me avassala
Minha alma em ti compensa
O quanto fora intensa
A sorte invade a sala
E todo o brilho exala
A clara recompensa
Ousando ser feliz
Vivendo o quanto eu quis
Num ato mais amável,
O sonho se transforma
E toma a clara forma
De um tempo tão afável.



118

O quanto mais queria ser feliz
Ousando noutro instante, de repente
O passo onde deveras se apresente
Traduz o que deveras sempre quis.

Marcando cada passo com tal giz
A vida se apresenta plenamente
E o tanto quanto quero a vida sente
Gerando dentro da alma a cicatriz

Infaustos são comuns no dia a dia,
E quando na verdade eu poderia
Ousar noutro momento e crer na sorte

Desditas costumeiras de quem ama
A sorte não poupando qualquer drama
Aos poucos nega ao sonho cada aporte.

119



A deusa se encantou com a morena
Mais bela que deus Júpiter criou;
Beleza sem igual quando me acena
A minha fortaleza derrubou,

Vencido sem quer sequer batalha,
Entrego-me aos teus braços, bela flor;
Perfume que domina enquanto espalha
Promessas divinais de tanto amor...

Olhando, no cerrado, tal canteiro,
Um templo se prepara pra Cupido,
Neste conto de fadas verdadeiro,
Remédio para um peito desvalido

Que sofre sem poder a flor cheirar,
E deixa-se, num êxtase levar...

120



A deusa seminua em fogo e riso
De constelar beleza rara e imensa
Enquanto em seus delírios já se adensa
Semeia; paulatina, o Paraíso...

Efêmera loucura sem aviso
Fazendo do prazer a recompensa
Que numa absurda cena, mansa e intensa
Explode-se em cristais, luz e granizo.

E nua esta fantástica miragem
Perfaz ao infinito esta viagem
E, orgástica, fecunda e se engravida

Numa partenogênese sem par.
Ao mesmo tempo céu, mar e luar
Numa explosão fantástica da vida...

121


A deusa seminua qual bacante
Orgástica sereia que insinua
A fome que se mata num instante
Na divindade rara, bela e nua,

Sátiro em tropel vai galopante
E a sílfide real, ele cultua
Tocado pelo fogo deslumbrante
Chegando ao paraíso, invado a lua.

E tanjo meus desejos mais audazes,
Recebo os teus carinhos tão vorazes,
Segredos que se demonstras sem sarcasmo.

Cedendo à chama intensa amor em brasa
Desfruto de teu corpo, minha casa,
Reflito em tua carne cada orgasmo...
Marcos Loures


122

A direita devora criancinhas,
A velha seborreica tão obesa
Fazendo da criança sua presa
Cobrando por arcaicas “lembrancinhas”.

Burguesas fedorentas e galinhas
Cadáveres desnudos sobre a mesa,
Nas quermesses vendendo cada presa
Beneméritas faces das fuinhas.

A roupa démodé, bom donativo,
Mostrando um ar deveras mais altivo
Parece que se veste assim de santa.

As filhas nos motéis de cinco estrelas
Com outros burguesinhos. Sacripanta
Figura repetida em podres telas...
Marcos Loures


123


A distância entre amigos não existe
Tampouco ausência cause algum abalo,
Amizade decerto já resiste
Pois sei, amigo sempre onde encontrá-lo.

Amigo de verdade não desiste,
Por isso esta certeza de eu amá-lo,
Quem tem um bom amigo, mesmo triste,
Pode contar com mão a consolá-lo.

Eu sei que este caminho é complicado,
Uma escultura feita com carinho,
Jardim tão bem florido e bem cuidado

Uma amizade consta de alegria,
Ouvir e dar abrigo, rumo e ninho,
Nos vôos desta vida... Em harmonia...


124

A distância, senhora do meu fado,
Machuca, destrutiva, dor horrível!
Meu pranto se imiscui calando o brado...
Na noite desumana, é tão terrível...

Melancolicamente, meu recado...
De todas as maneiras, perceptível,
Um sonho se esgarçando derrotado;
Não posso mais viver tal dor incrível!

Retrovisor me mostra essa poeira...
Acérrima, profunda dor mortal,
Um karma a me tomar, rasga a bandeira.

A morte incandescente já lateja,
Cortinas descerrando. Ato final,
A morte benfazeja enfim me beija...
Marcos Loures


125


A divina presença da verdade
Reflete nos meus versos qual navalha...
Um cego procurando claridade,
A morte, num segundo, tudo atalha.

Nas plagas mais distantes, na cidade,
O gesto que maltrata me agasalha.
A fome que sacias, cedo ou tarde,
Um canto universal, o vento espalha...

Nas visões dessa insânia sem resposta,
Andando pedras brasas fogo, inverno...
O medo da verdade queima e tosta,

Esfacela qualquer sombra de paz...
A vida se transforma nesse inferno,
Teus medos te corrompem: Satanás!
Marcos Loures


126

A doce embriaguez que me domina
De bar em bar a noite desfiada.
Gosto de liberdade que alucina
No copo e na cerveja derramada.

Vermutes e conhaque e a calibrina,
Não resta nas garrafas quase nada.
Somente o beijo doce da menina
Deixando minha boca adocicada...

Meu mundo destruído e sem ter volta;
Os olhos fumegantes denunciam...
Porém em tua boca, esta revolta;

Amor se refazendo da fumaça
Reclames de jornais já me anunciam
O banco me convida, a mesma praça...



127

A dona do canteiro dos meus sonhos,
Espinha em cada rosa, lagos plácidos.
Os lábios prometidos, beijos ácidos
Tornando os meus cantares mais medonhos.

Olhando para espelhos são bisonhos
Os olhos que eu julgara beneplácitos
Os templos da esperança sendo flácidos
Embaçam velhos mitos tão risonhos.

Se eu guardo na memória tua foto,
O amor que se tornou magro e remoto,
Não deixa que isso siga plenamente.

E o passo se mal dado leva ao tombo,
Vergasta qual cinzel cortando o lombo,
Impede da emoção qualquer semente...


128



A dona dos meus sonhos nesta noite
Rondando o pensamento chega mansa,
O frio do vazio, duro açoite,
Enquanto a fantasia já me alcança,
Sem ter uma ilusão que amor acoite,
Só resta com certeza esta esperança.

Viver cada momento mais e mais,
Beber de tua boca este licor,
Delírios em desejos sensuais
Delícia inesgotável deste amor.
Em loucos e profanos rituais,
Espécie de tortura em raro ardor...

Eu te amo desta forma louca e sã,
Vontade de te ter cada manhã...
Marcos Loures



129


A dor como constante companheira
Talvez tenha um disfarce até bem feito,
Trazendo o meu sorriso insatisfeito
Mostrando uma carcaça qual bandeira.

O podre de minha alma varejeira
Podendo te assustar, vai contrafeito
Vestindo de um perfume, trama em leito
Aquilo que perdeu a vida inteira.

Não veja minha amada, o meu sorriso,
É quase desdentado e não tem brilho.
O passo no percurso falsifico,

E tendo bem distante o paraíso,
Invento a cada verso um novo trilho,
E finjo de esperanças ser bem rico...


130

A dor da punhalada em corte fundo,
Na dura traição de quem amamos,
Decepa do arvoredo grandes ramos
E mata esta alameda num segundo.

Vagando meus olhares pelo mundo
Encontro este caminho em que passamos,
Nas flores que em conjunto nós cevamos,
Perfume se perdendo em mal profundo.

Amor quando se trai depressa morre,
A seiva em podridão assim se escorre
E deixa tão somente ressequido

O tronco que já fora tão frondoso
Destino se mostrando caprichoso
Pressente o nosso amor vago e perdido...



131

À dor da solidão eu me recolho
E sinto transformada a minha sina.
A mão que acaricia e me assassina
Perfura em ironia, rasgando o olho

O sangue vai servindo qual um molho
Que ao gotejar decerto me alucina
Secando da esperança qualquer mina,
Na janela dos sonhos, um ferrolho.

À farsa que me trazes, logo cedo
E finjo estar contigo, ser submisso.
A morte prenuncia vir mais cedo

Ao opacificar, negando o viço
Olhar vai se tornando, então mortiço
E a solidão, aos poucos, enveredo...
Marcos Loures



132

A dor da solidão maltrata tanto
Que às vezes, dá vontade de morrer.
Não posso e nem resisto, tanto pranto
Cansado de, na vida, só sofrer.

Amiga necessito teu encanto,
Em cantos que me trazes meu prazer.
O manso do teu canto faz viver
E cobre meu amor com claro manto.

Imanando meu sorriso, minha amiga,
A vida sem ter medo, já periga.
E novo sentimento me persegue.

Amor que tanto tempo não sabia
Vivendo e se escondendo a cada dia.
Procura um coração que o carregue!
Marcos Loures



133

A dor de amar demais e nunca estar contente,
Amordaçando o sonho em velhas catedrais
No quanto nada fui; vazio se pressente
O meu olhar distante aguarda um novo cais.

Arcanas ilusões num canto tão demente
Sangrando o coração. Amores são vitais,
Porém a dor prossegue e toma totalmente
Deixando como herança estranhos funerais...

Quem dera se tivesse o vento da bonança
Nos lábios da mulher que tantas vezes quis.
A noite se aproxima, a tarde em dor avança,

A solidão se mostra inteira em noite plena.
Um dia até pensara, enfim ser mais feliz.
As brumas, tempestade, apagaram a cena...



134

A dor de estar tão só ruge em meu peito,
O brilho de uma estrela? Não vem mais.
Lembrando destes dias magistrais
A vida se esvaindo sem proveito...

Enquanto a solidão adentra o leito,
Resíduos esboçados, ancestrais,
Ouvir a tua voz? Sei que jamais...
Apenas teu perfume quando deito

Guardado nos lençóis, nas velhas fronhas,
As noites sem ninguém, duras, medonhas
O frio penetrando na janela.

A sombra do que fomos me persegue,
Às torpes, vãs lembranças vou entregue,
Inutilmente a lua se revela...
Marcos Loures



135




A dor de uma existência sem sentido
Perfaz a caminhada pelos sonhos,
Apenas um sussurro ou um gemido,
Momentos melancólicos, tristonhos...

Se às vezes, do teu lado, ao mar regrido
Buscando os meus escombros mais risonhos,
Carrego um coração tão desvalido
Pesando com seus fardos vãos, bisonhos.

Pereço quando penso liberdade
E morto, nada tenho atrás da grade
Que um dia servirá como armadilha.

Melancolia é coisa de quem ama,
E ao ver; fortalecida, alguma chama,
Enforco-me nos laços da presilha...



136

A dor deste prazer que não tem fim
Encharca em nossa cama, um fogo intenso
Inundação divina em corpo tenso,
Relaxa e me transtorna, sempre assim.

Um maremoto insano dentro em mim,
Depois na calmaria mar imenso
Deixando-me levar, perdido eu venço
E encontro com mim mesmo, vago, enfim.

Nas artimanhas, santa fantasia
Louvores às bacantes numa orgia
Fazendo de teu corpo um belo altar.

Teus gozos vão servindo como preces
Nas tramas que embrenhados, sempre teces
Orgasmos nos ensinam como orar...



137

A dor é companheira em parceria...
Meu tesouro guardado noutras grutas.
Não posso descobrir mais alegria,
As luzes que me emanas, duras, brutas.

Corcéis, imobilizas, montaria.
As podres maravilhas dessas frutas,
Sem sombras do que fora fantasia
Nas noites nos perdemos e sem lutas...

Não penso nas conquistas que não tive
Nem prendo meus olhares no vazio...
Na cama que roçamos me contive...

Aurora torporosa me alvorece,
A dor que nunca sai permite cio
Amor que nunca veio, me entorpece


138

A dor em esperanças convertida
Batalha por um riso mais audaz,
O vento que nos toca e satisfaz
Permite vislumbrar a nova vida.

Levando a solidão já de vencida
O quanto te desejo a noite traz
Caminho repartido volta atrás
O jogo decidido de saída.

Mas tenho uma reserva de alegria,
Jogando para longe a fantasia,
O prazo não se vence, é sempre igual.

Teimosa, vai seguindo sem cansaço
No verso em desafio logo traço
Uma esperança em paz, mansa e vestal



139


A dor em que se molda o pensamento
Num verso me transforma plenamente.
Enquanto a solidão já se pressente,
Procuro tão somente algum ungüento

Que possa me curar do sofrimento
Num último desejo, ser contente,
Andando libertário entre esta gente
O peito sem defesa, aberto ao vento.

As lágrimas traduzem o que sinto,
Numa álgica lembrança do que fomos.
Às vezes, tolamente cismo e minto

Tentando até sorrir. Mas é maldade...
Do fruto da esperança, amargos gomos,
Inundando o meu peito. De saudade...
Marcos Loures


140

À dor em sua nobre serventia
Erijo meus altares. Minhas preces
Nos tronos da tristeza e da agonia
No quanto em ilusão; amada, teces.

Minha alma sem juízo e tão vadia
Vagando pelas luas, por quermesses
Encontra na amargura esta alegria
De amores insensatos que confesses

Sem medidas, mergulhos abismais,
Loucuras em paixões que não têm fim
Vasculho cada seixo dentro em mim

E vejo tão somente os temporais
No fogo mais bravio; pura essência
No olho do furacão sem penitência...



141

A dor já se afastando, em despedida
Amor que se aproxima: turbilhão...
Estrela que me guia pela vida,
Rainha dos meus dias, sedução

De todas as tristezas a saída
Encontra-se no fogo da paixão
Que torna a poesia mais querida
E vibra em nosso peito, coração!

Eu quero estar contigo o tempo inteiro,
Caminho em que me guias, verdadeiro
Sonega o que eu tivera em desencantos.

Não tendo mais fantasmas, sigo em frente,
Um novo encantamento se pressente
Cevando em harmonia nossos cantos.
Marcos Loures



142


A dor maior que trago, o desamor,
Festeja uma saudade que sentimos...
Vibramos com tesão, farto calor,
Nas horas divinais, nos divertimos...

Porém depois de certo desengano
Causado por ciúmes, não sei bem;
O vento vai mudando, novo plano,
Será que depois disso, sem ninguém?

Desculpe mas não quero ser mais chato,
Amor que tanto temos somos tantos,
As águas que inundaram outro regato,
Não podem te causar tantos espantos...

Amada, minha lua é par constante,
Seu brilho, já me basta, deslumbrante!



143

A dor que consome
Coração da gente
Trazendo em seu nome
Um mundo descrente

Tantas tempestades
Promessas de chuva
Saber das maldades
Da estrada na curva.

É ter a certeza
Que a vida maltrata
Contra a correnteza

Somente teu braço,
Amiga, nos ata
Permitindo um passo.



144


A dor que dilacera corações,
Reside nas profundas de minha alma...
Herdando velhas chagas, aflições,
Não tenho mais sequer quem já me acalma!

As rosas exalando podridões,
Teu nome rabisquei na mão, na palma...
Vermelhos velhos vermes vendilhões,
Meus versos são versões antigo trauma...

Minha dor, resistente não perece...
A cada novo dia me envelhece,
Nas rugas que desenha minha face...

Desdenha sutil corda que embarace
Meus passos sertanejos na cidade.
A dor que já me enluta, a da saudade!



145


A dor que já me enluta, a da saudade
Não deixa que eu caminhe livremente.
Quem dera se eu pudesse. A liberdade
Distante dos meus olhos, vou demente

Enquanto a fantasia ainda mente,
Vazio se transforma em realidade;
Nem mesmo a solução já se pressente
Ausência impedirá tranqüilidade...

Eu vejo a tua face em qualquer rosto,
O tempo se fazendo em vão desgosto,
Não sei por que tu foste amor, embora.

O gosto de teus lábios sinto agora,
Meu peito sem defesas segue exposto
Minha alma solitária pena e chora...



146


A dor que latejara no meu peito
Aos poucos se esvaindo lentamente,
Ao ver que posso amor tão plenamente
O meu prazer em ti; querida, eu deito.

Vanglória que me ufana a cada feito,
Invade com desejos minha mente,
Entorno esta vontade que é da gente
E tudo o que fizeres é perfeito.

Na sílfide divina e colossal,
O riso desejado e sensual
Encharca de vontades e ternuras...

Uma escultura rara em puro encanto
Permite-me dizer que eu quero tanto
Teu corpo; a mais divina das molduras.
Marcos Loures



147

A dor que latejara no meu peito
Atônita se perde em confusão,
Sentindo deste amor a inundação
No rio dos meus sonhos, vaza o leito.

Ao ter tua presença quando deito
Recebo a mais completa sensação
Do bem que nos tomou em convulsão,
Tornando o nosso mundo mais perfeito.

Ao ver tua nudez perambulando,
O dia bem melhor se anunciando
Deixando bem distantes as procuras

No céu que imaginei em rara tela
Ao meu em fantasia já se atrela
Teu corpo a mais divina das molduras.
Marcos Loures



148

A dor que me acompanha, hereditária,
Nascida desde antanho, nebulosa.
Farnel das ilusões em tenebrosa
E amarga sensação em peito pária,

Negrume que se insere em luz tão vária,
Estrume de minha alma pavorosa,
Na desintegração perfeita rosa,
Adentrando esta pele até que escare-a.

E folga quando torna-me refém
De suas garras lépidas e finas.
Ao me negar destarte todo bem,

Refaz vastas feridas; dentro da alma,
E aos poucos minhas carnes exterminas,
E me toma e me entranha em sua palma..


149

A dor que me oprimindo me redime,
Estima que terei o teu amor.
Sentado na cadeira, sei, de vime.
O tempo que passamos traz a dor.

Mas dor que, me salvando, quer que estime
O vento da promessa, sem rancor.
A dor não mais machuca nem oprime
Um peito que se fez todo esplendor.

As roxas violetas da saudade
Morreram mal entrou felicidade,
Um vento que te trouxe me encantou.

Das dores que tiveste minha amada,
Agora minhas dores não são nada.
A nossa dor, querida me salvou!



150

A dor que me penetra qual mortalha,
Trazendo minhas ânsias, ser feliz...
Os brilhos que esta lua sempre espalha
São látegos denotam cicatriz...

Sombrias tempestades, qual navalha,
Malditas me torturam. Por um triz
O bote destes lumes, dor canalha,
Vestida de ilusões, vã meretriz!

Forjando santidade se revela
Nas horas mais sombrias, vago o mundo...
Ó lua, por que queimas, sua vela?

Traíste meus delírios de poeta,
Meu verso vai embalde, vagabundo...
Mataste qual Cupido e sua seta!
Marcos Loures


151


A dor que me procura sempre estava
Escondida na boca que eu beijei.
Sentinela perdido me enlutava
Das saudades deixadas me entranhei...

O tempo levará toda essa lei
Que não permite sonhos nem os lava...
Nos vulcânicos dias me encontrei,
Escorrem pelos olhos calor, lava...

A despedida feita neste portal,
A amargura da vida, velho sal...
Os restos das fronteiras que não vi.

Os amores fatais que, sei, perdi...
Todas rosas mais belas do rosal.
As flores dos amores que esqueci...



152


A dor que me tortura, tão antiga,
No peito de quem ama já se atreve
Ferocidade imensa, uma inimiga,
Pesando uma esperança outrora leve.
Tristeza em solidão logo se abriga,
Felicidade morre em luz mais breve.

Meu sonho- ser feliz – assim, morrendo,
Não deixando um rastro mais sequer,
Meu rumo pela vida se perdendo,
Na pérfida tristeza, o que se quer
É ter um novo sol que me aquecendo
Permita-me outro rosto de mulher

Que possa me trazer felicidade,
Na força de um amor em amizade...



153

A dor que nos domina, formidável,
Escárnios que formaram primaveras,
Os dentes afiados destas feras
Tocaia que percebo inevitável.

Sorriso traiçoeiro, quase amável,
Nas garras tão cortantes das panteras
As farpas espinhosas que assim geras
Sugerem um caminho inencontrável.

Facínoras, as noites sensuais
Nos ódios em que cedo transbordais
Reflexos de meus olhos amauróticos.

No beijo em ironia que me dás
Escolha que fizeste, Barrabás
Momentos tresloucados e neuróticos...
Marcos Loures



154


A dor que nos ensina a caminhar,
Vencer os claustros tolos que cevamos.
Rompendo a relação escravos/amos
Os sinos dobrarão, não vou negar.

Porém quando entranhamos o luar
Aos poucos os segredos desvendamos,
E em todos funerais que freqüentamos
A vida mostra a face. Eterno lar...

Assim pensava há tempos, mas agora
Distante de quem amo, sigo em vão.
Cavando com meus dias, ledo chão

A morte redentora já demora,
Ninguém escuta a voz que em agonia
Reveste em amargura, o dia-a-dia...
Marcos Loures



155

A dor que nos invade, impertinente
Em erma solidão, turva e sombria
Por vezes me transforma em penitente
E uma esperança mórbida me guia.

Um coração estranho e assim plangente
Aflora-se em ressaibos, fantasia.
O chão quase desértico, tão quente
Impede o renascer de uma alegria.

Mistérios que se fazem nesta vida,
Os medos acumulam negações.
Senzala em que minha alma apodrecida

Aborta uma sutil felicidade.
Talvez ao conceber as ilusões
Refaça toda a trilha em amizade...
Marcos Loures



156


A dor que quando vem nos entristece,
Ferindo muitas vezes nos humilha;
Negando ao próprio Deus, calando a prece,
Matando de um amor, a maravilha.

Tanta tristeza e mágoa sempre tece.
Aos corações amantes, cega, humilha
Uma esperança assim, cedo fenece;
Nem mesmo a fantasia compartilha...

Sozinhos, sem ter rumo, nada vem,
O gosto tão amargo, uma quimera.
Distante do que fora nosso bem,

O sol já se perdendo em falsidade.
Só resta em nosso peito a leda espera
Do brilho salvador de uma amizade...



157

A dor que reconheço desde infante,
Atravessando toda a juventude,
Roubando da esperança o seu turbante
Mudando vez em quando de atitude.

Por mais que a fantasia ainda ajude
O passo agora vai titubeante,
Mas sigo sem olhar para adiante,
Quem sabe meu futuro a sorte mude.

E vista algum sorriso em minha face,
Ausente de alegria não me calo,
Fragrância de ilusão, sonho renasce

Das cinzas do que fomos tão antigas.
A vida vou bebendo no gargalo,
Roubando esta emoção que desabrigas.


158


A dor que se promete não virá
Se o bem que nos domina inda ficasse.
Por mais que a solidão temível grasse
O dia com certeza brilhará.

O olhar da aurora rubra em tom grená
Diversa poesia em que se trace
O som de um novo tempo que me abrace
E mude todo o rumo, desde já...

Sem ter o que me impeça de sonhar,
Esqueço o que se foi, adoço o mar
E risco um raio lúdico em meu céu.

As cordas dedilhando, o violão,
O amor vencendo enfim a solidão,
O sol virá cumprir o seu papel...
Marcos Loures



159

A dor se anuncia bruta,
Dor cruel que me destrata
A vida merece essa luta
Os brilhos desta cascata

Do meu peito colho a juta
Que plantaste, dor ingrata.
Tuas mãos, triste batuta,
Embrenham na minha mata.

A dor que fora primeira
Fez descanso no meu peito
Minou minha vida inteira

Não restou nem o direito
De buscar a companheira
Que me deixe satisfeito...
Marcos Loures



160

A dor sempre acompanha um grande sentimento
E traz; a cada dia, um novo desengano,
Por mais que seja nobre o sofrimento humano
O tempo quando em dor, demora-se e vai lento.

Não tendo na verdade, o bem de um novo alento
Quem sabe e reconhece, invoca em outro plano
O dia que virá cobrindo com seu pano
Porém em cada rasgo, invade forte vento.

À parte do que sinto, eu bebo uma esperança,
E dela faço meta. A luta, porém cansa
E tendo na batalha o fim como certeza

A solidão retorna e volta bem mais forte,
Trazendo em sua mão, adaga fina e corte
Arrasta-me depressa, a dura correnteza.



161


A dura sensação de uma ignorância
Faz mal a quem recebe com carinho.
Palavra que se toma em discrepância
Demonstra ser estúpido o caminho

De quem cresceu inerme desde a infância
Confunde saparia com sapinho.
Educação se faz com elegância
Porém isso se cria desde o ninho...

Meu verso se criou em liberdade
Não teve mãe nem pai, foi abortado.
Vagando pelas ruas da cidade

Não tem nem paradeiro nem grilhões.
Primeiro é melhor ter estudado
Do que falar asneira aos borbotões....


162

À espreita de um desfecho mais feliz
O coração se deixa aprisionar,
Eu sinto assim chegando, devagar
O bem que toda a vida eu sempre quis.

Se o céu da juventude foi tão gris
Agora vejo tudo clarear
Deixando a triste flor desabrochar
Mudando do canteiro o seu matiz.

Acendo o meu cigarro, tiro um trago,
Espero ansiosamente esta chegada,
Teu rosto em pensamentos eu afago

E sinto a maciez de tua tez
Depois de tanto tempo sem ter nada:
Respondo ao coração: é sua vez!



163

A estampa na parede demonstrando
O retrato cruel do fim do mundo,
Vagabundo meu mundo vai rodando,
E assim quando eu percebo; já me inundo,

De toda crueldade, me afogando.,.
Qual abissal marinho, sou profundo,
Resta-me tão somente esse segundo,
A vida nada vale, mas me abrando.

Incrivelmente, manso nada temo,
Espectral fantasia tudo toma,
Minha vida vai trôpega, sem remo,

Mas nem mesmo ao temor a dor se soma,
E de encanto tenaz, incrível, gemo...
A morte assim será um simples coma.



164


A eterna companheira: poesia
Jamais me abandonou e está comigo,
Nos mundos mais diversos que ela cria
O quanto que desejo e até persigo.

De todas as mulheres que eu já tive
Durante a minha vida, um sonhador.
Apenas poesia sobrevive
Toando a melodia em puro amor.

Por mais que enfrente imensos vendavais,
Ou mesmo a calmaria chegue enfim,
Dos sonhos delicados, sensuais
Eu vejo a força intensa dentro em mim

Daquela que se faz eterna amante,
O par que é predileto e sei constante...



165


A eterna sensação de um novo sim
Tornando mais suave a minha lida
Alçando uma emoção que sei sem fim,
Encontro no final, a nossa vida,

Semeias alegrias dentro em mim,
Demonstras minha sorte decidida
Na flor que já brotando no jardim
Perfuma a tarde inteira e faz querida

A noite iluminada deste amor,
Depois da maravilha do sol pôr
Fazendo deste sonho um bem imenso.

Na crença de saber amor profano,
Distante do andarilho audaz cigano
No quanto eu te desejo sempre penso...
Marcos Loures



166

A Fábrica de heróis pediu falência.
A gente não suporta mais mentiras
Perdi, tenho a certeza, a paciência
Rasgando esta bandeira em tantas tiras.

Se há concordância ou não, tenha clemência,
Aos leões os heróis falsos atiras,
Na verdade o que falta é competência,
Nas calças deste povo, ainda embiras.

O desdentado diz: muito obrigado
Aos Senas, aos Ronaldos e aos Thiagos,
Num chute que desferem nos meus bagos

O caco deste espelho destroçado,
Retratos desta frágil educação
Os ídolos criados vão ao chão...
Marcos Loures


167


A faca com dois gumes mostra a cena
Na qual o nosso caso fez de tudo
Deixando o coração já quase mudo.
No fundo o que eu desejo é tua pena.

Se apenas o que fiz não mais acena
Prefiro seguir sempre, mas contudo
Às vezes idiota inda me iludo
Tentando uma palavra mais serena.

As costas vão lanhadas pelas garras
Mesmo que inúteis, fúteis e bizarras
Da moça que em panteras quis espelhos

E agora mostra um toque de sarcasmo.
O amor vai sucumbindo a tal marasmo,
Deixando o sentimento de joelhos...
Marcos Loures


168

A faca de dois gumes dita amor
Algumas vezes fez de mim cobaia,
Enquanto a solidão velha não traia
Ainda quero ser um sonhador.

Porém ao ver o nada a me propor
Sequer um só momento de alegria,
Resisto bravamente. Fantasia...
Meu sonho num eterno decompor...

O encanto preparando este desfecho,
O olhar que inda iludido, quer a luz.
Caminho de esperança agora fecho

E deixo meu cadáver mais exposto.
Ao nada de onde vim, amor conduz,
Marcando com as garras o meu rosto...
Marcos Loures



169


A faca penetrando em meu pescoço,
Ausência de esperança, morte à vista,
Enquanto a poesia ainda assista
Ao fim do que sonhei, não me alvoroço

De tudo o que pensei, ledo destroço,
O coração fingindo-se de artista,
Por vezes sonhador ou egoísta,
Eu tento disfarçar, mas não mais posso.

Eu sou um velho traste, torpe imagem,
Amor nunca passou de uma miragem,
Olhar se perdeu tolo em descaminhos.

Não tendo mais sequer algum sorriso,
Exposto, me perdendo sem aviso,
Os dias que virão serão sozinhos...
Marcos Loures



170



A faca tem dois gumes, disto eu sei,
Meu erro foi somente acreditar.
Agora que em teus braços me enganei
Procuro nova estrela em outro mar.

As mãos que acariciam me torturam,
Os olhos vão vazios; vida afora.
Os erros tantas vezes se procuram
Assumo meus pecados; vou embora

Buscando em outro amor, amanhecer,
Legando ao meu passado o que vivemos.
Quem sabe encontrarei algum prazer,
Depois do imenso nada que tivemos.

Apaixonadamente, fui um tolo,
Não quero mais sequer algum consolo...



171


A faca tem dois gumes
E neles me percebo,
Além destes costumes
Estrelas quero e bebo,

Não sinto teus perfumes,
Amor virou placebo
Não tento seguir lumes
Nem mesmo o bem concebo..

Aberta a temporada
A caça continua,
Mulher tão almejada

Se entrega à plena lua,
Enquanto desmaiada
Se espalha pela rua...



172

A faca tem dois gumes, riso e pranto
Metade do que eu sou não representa
O quanto na verdade ainda venta
Durante a tempestade e o desencanto.

Se às vezes contra a luz eu me adianto
Eu tento perceber a vida lenta,
Vencendo em calmaria uma tormenta,
Herdei somente dor, medo e quebranto...

As cifras vão mudando a cada dia,
Riqueza se transforma em simples dívida,
Ao ver esta mulher pálida e lívida

Uma sorte melhor já merecia
Aquele que comprou mais que vendeu
E mesmo assim, perceba: inda sou teu...



173

A fada com varinha de condão
Transforma esta menina na princesa
Tornando seu amor uma explosão
De rara e salutar, nobre beleza.

Porém a bruxa má em maldição
Prevê para esta moça tal tristeza
Que traga pro seu lar destruição
Fazendo da menina simples presa

De um sapo disfarçado em principesco,
Trazendo um pesadelo tão dantesco
E tendo todo o mal como seu dom.

E em lágrimas castelo desabando,
Varinha desta fada demonstrando
Que é sempre necessário um bom Condon...


174

A fala de quem fala em desamor
Seria verdadeira se não fosse
A troça que o palhaço finge doce,
No fim trazendo sempre este amargor.

Ciúme é resultado do louvor,
E quando a realidade mais acosse
Sem ter a claridade que remoce
A carne já começa a decompor.

Brincando com palavras, vou liberto,
E quando te proponho algum acerto,
Em desacerto estúpido, naufragas.

Otário não precisa de conselho,
Quebrando em desvario o próprio espelho,
Fazendo do vazio, as tuas sagas...



175

À falsa fantasia eu já me apego,
A sensação de paz mais atrevida,
Mordendo devagar a minha vida,
Um caminheiro segue assim, tão cego.

Por vezes mais sedento, em vão me entrego
Na luz insanamente percebida
O amor que busco ofusca a despedida,
Amor que nunca veio; jamais nego.

Nos bares e prostíbulos, a luz...
A boca que me cospe me seduz
O leito amargurado de viúvo

Aos olhos deste sonho que me curvo
Serei tão simplesmente um idiota.
Felicidade existe? Tão remota...
Marcos Loures



176

A fantasia chega e vem ligeira,
Dourando o meu caminho, com certeza,
Sabendo que encontrei a companheira,
A vida já transborda em tal beleza.

No teu aniversário, uma surpresa
Tocando em emoção mais verdadeira,
A sorte se deslinda sobre a mesa
E mostra esta alegria costumeira.

Depois de ser errante em cada passo,
Encontro a mansidão de um belo abraço
Tramando um paraíso em que prevejo

O riso mais sincero e mais perfeito.
Amor em tal magia faz seu pleito
Tocando o coração, nosso desejo.


177

A farsa que se fez mudando o trilho
Desaba na profunda ribanceira,
Quem ama, na verdade traz bandeira
Diversa deste peito, um andarilho.

A vida vai puxando o seu gatilho,
Deixando para trás a sorte inteira,
Quem sabe alguma luz inda me queira,
Legando ao meu passando este empecilho.

Correndo sempre atrás de uma ilusão,
Vencido pela força do tufão,
Meus trunfos eu perdi não sobrou nada.

Lançados pelas mãos, os frios dados,
Desejos em pecados incrustados,
O jogo sempre foi carta marcada.
Marcos Loures



178

A farsa que se monta em versos tantos
Atalhos percorridos noite afora.
Se em mares tão diversos, desencantos,
O olhar sem ter um porto não se ancora.

Sou ávido e talvez sem ter havido
Não tenho mais um álibi, que faço?
Amor, além de um cais para a libido
Refém de um bom sorriso ou de um abraço

Quando em vicissitudes traz alento.
Eu sei que isto é difícil para poucos
Que urdem na surdina, um vão tormento,
Espumam feito lobos, velhos loucos

Que apodrecendo em vida sem ninguém
Não sabem da magia que amor tem...



179



" A guia que ilumina esse farol
e passa aos corações as cores,
alumia muito mais que o Sol,
estrela matutina que chama Loures.

Chaplin

A fascinante estrela que ora vi,
Tornando por si só meu céu azul,
Na verve sem igual de Golberi
O imenso minuano, vem do Sul.

Fazendo de uma prenda, uma rainha,
Romântico poeta, sonhador,
Palavra nos teus lábios, a avezinha
Que beija com ternura cada flor.

Tu sabes quanto admiro o teu talento,
De ti, eu sou apenas um reflexo,
E quando acompanhar-te, amigo eu tento
Num complemento, côncavo e convexo

Por vezes, se eu me perco, o teu perdão
Eu peço, por ser árido, o meu chão...


180


A febre me queimando, já transtorna...
Não posso mais pensar, toma-me inteiro,
Teu nome não me larga, vai, retorna,
O teu perfume está no travesseiro

Na cama, nos lençóis, minha alma adorna,
Em todos os lugares sinto o cheiro...
Não posso mais passar pela madorna
Acordo em sobressalto! Um verdadeiro

Desatino me doma, e nada faço
Senão pensar em ti; somente nisso...
Não consigo sequer dar mais um passo.

No roçar dos teus lábios, imagino
Amor que na paixão ganha mais viço,
Num turbilhão intenso me alucino...


181


A febre que me toma neste instante,
Quarenta graus, intenso fogaréu,
Qual fora um livro exposto numa estante
Sem ser tocado; um monte de papel

Jogado pela casa, delirante
As sombras na parede, sonho ao léu.
A morte me rondando e a faiscante
Presença de uma deusa em rubro véu.

O vinho de teus lábios. Tudo gira,
E o vento ainda acende antiga pira
Dizendo que talvez tenha uma chance.

Agonizante, bebo esta esperança,
Porém soturna luz vem e me alcança
Nada impede, enfim, que a morte avance...


182

A felicidade
Abrindo a janela
Já traz qualidade,
Amor que revela,

Tem a faculdade
De ser bem mais bela
Nesta mocidade,
Eu pinto esta tela.

Do riso tão franco
Que mostra o meu peito,
No sonho mais branco,

Ando satisfeito,
A dor eu desanco,
Te encontro em meu leito...



183

A fêmea que em volúpia, assim se entrega,
Deliciosamente aqui despida,
Sabendo desfrutar o bem da vida,
Mergulha enquanto o corpo nu navega.

Delírio que em delícias já se esfrega,
Uma fruta de vez que ao ser comida
Descreve do prazer embevecida
O gozo que profano, a mão quer, pega.

Enlanguescida, os seios fartos, belos,
Fazendo desta cama meus castelos,
Chamando pro festejo dos sentidos.

E enquanto vago imerso nestas brenhas,
Descubro dos segredos, chaves, senhas,
Orgásticos caminhos divididos...
Marcos Loures



184



A fêmea que lateja dentro em ti,
Há tanto adormecida em vãos pudores,
Desnuda-se voraz e chega aqui
Mudando do cenário suas cores.

Tu sabes quantas vezes eu pedi
Do corpo desejado, tais fulgores,
Irei acompanhando aonde fores,
Encanto como o teu, não conheci...

Parece, meu amor que finalmente,
Sem medo que a saudade a violente,
Virás sem ter vergonha, medo ou pejo.

Arranco tuas roupas e ao ver-te nua
Minha alma sem amarras já flutua
Matando plenamente o meu desejo..


185


A Fênix travestida em ilusões
Esgarça cada pano do cenário.
Aonde pululavam emoções
Argutas fantasias num fichário.

O tempo corroendo o calendário
Enfrenta as mais diversas diversões,
Veraneando o peito, se ao contrário
Encontro o desencontro em mil versões.

Mas tenho que dizer quanto eu te gosto!
No amor que tantas vezes sempre aposto
O ganho não se esgota, e recomeça.

Registro em cada verso esta harmonia
Do amor que a gente às vezes fantasia,
Mas vivo, nos traduz santa promessa...


186


A fera dá seu bote sem espera
E cria diamantes, todos falsos,
O tempo sem ter rédeas não me espera
E deixa no caminho cadafalsos

A falsa poesia feita em prosa
De tudo o que mais quero, sem ciência
A moça se espetando em minha rosa
Percebe não ser simples coincidência

O verso sem estrela e sem jardim,
A lua que não veio, o frio intenso.
Jornada que percorro dentro em mim,
O parto na verdade é sempre tenso.

Deste imenso monólito que sou
Apenas um resquício, o que sobrou...
Marcos Loures



187


A fera decidida quer o gozo
Que possa em explosão cerzir um magnífico
Orgasmo num momento em que específico
Nos mostre este delírio fabuloso.

No amor tudo decerto é sempre lícito.
Rocios entre espasmos provocantes,
Delitos e pecados fascinantes
Num ato fulgurante e tão explícito.

Bebendo cada gole de teu gozo,
Comer deste maná delicioso
Sentindo cada frêmito, ser teu.

A deusa sem a blusa, seios belos,
As coxas já se abrindo aos meus rastelos
Num lúbrico desejo intenso, ateu...
Marcos Loures


188


A fera que enjaulada nada teme,
Irrompe estas cadeias, sem temores.
Um barco que se vai, perdendo o leme,
Prenúncio de tempestas e de horrores.

Toda a dor quando impele que blasfeme,
Deixando para trás perfume e flores,
Criando fantasia onde amor treme
Seguindo sem a sorte dos penhores.

Porém ao perceber tuas mazelas,
Espero paciente tua volta.
Na força que me mostras e revelas,

Certeza de que um dia serás minha;
Entendo, meu amor, tua revolta,
Mas voltarás pra mim, qual andorinha...



189

A fera que se entrega à louca caça,
Espreita a sua vítima, num bote,
Instinto predador quando amor traça,
Desejo sem igual que não se esgote.

A gente se encontrando se embaraça
Não teima e com certeza quebra o pote.
Porém quando de noite, tão devassa
A moça vem mordendo o meu cangote.

Nos lotes dos prazeres quero algum
Que tenha pelo menos bela vista.
O amor quando passando por revista

Transporta uma emoção e aumenta o zoom.
Assim esta pantera se faz nua,
Caçando a noite inteira sob a lua...
Marcos Loures


190


À festa em que se gesta nova vida
O peito já se abrindo não discute,
A noite vai chegando distraída
Verdade em cada sonho já se embute

Parelhos os caminhos de quem ama,
Refazem mocidade e juventude.
A sorte num momento vem e inflama
Mudando de conversa e de atitude.

Assim, um caminheiro antes sozinho,
Agora persevera e segue em frente,
No colo deste amor quando eu me aninho
Pressinto um novo encanto mais presente.

Vislumbro com firmeza e com vontade
Quanto é possível ter tranqüilidade.



191

A festa prometida
Na noite que virá
Mudando a nossa vida
Na certa brilhará

Em taças de cristal
Um brinde nos alcança
No toque sensual
Delícias e festança

Enlevos e meneios
Cabelos como crinas,
Amando sem receios
Adentro campos, minas

E sinto o teu perfume
Em fogo, gosto e lume...

192

O quanto poderia
A sorte sem final
Num ato ritual
A vida rege o dia

Lamento em agonia
E sei do vago astral
Imenso e sideral
E nada mais traria

Sequer o que desejo
Momento mais sobejo
Em glória e luz intensa.

Depois de certo tempo,
Inverto o contratempo
E ganho a recompensa

193

A festa que fazemos cama posta
Em bares e botecos, mesas, lua
Meu corpo quando enfim no teu se encosta
Promessa divindade inteira e nua.

Andei em solidão calçada e rua
Calada a noite fez-se mais disposta
Na pele uma emoção bem forte exposta,
Sentando num momento fogo e pua.

Refém desta vontade que não passa
Sou caça da mulher que assim me traça
Destino desejado com tesão.

Arranco tua roupa, tire a minha,
Ao explorar teu corpo o meu se aninha
Até que chegue assim, a convulsão...


194

A festa que se empresta em alegria
Traduz tanto querer que não tem fim,
No amor que em cada verso se dizia
A flor que floresceu neste jardim.

Se tudo que se quer já se recria
Num verso enamorado, chego enfim
Ao ápice do sonho em poesia
Falando desse encanto, tanto assim.

Feliz aniversário, parabéns
Que tudo seja claro em teu caminho
Do tempo de esperança que tu vens

Vencendo as tempestades e os temores,
Contigo eu não irei jamais sozinho
Pois tenho em teus olhares, refletores...
Marcos Loures



195

A fétida metade da maçã
Há tanto decomposta. Hoje eu te trago.
Não posso resistir ao duro afã
Da vida que se deu sem ter afago.

Não vejo mais deslumbre na manhã,
Matando da esperança cada bago,
A sorte tão estúpida e malsã
Renega a placidez do velho lago

Não posso suportar mais este peso
Que ainda teimo, às vezes carregar.
A vida traz a herança de um desprezo

Na cruel gargalhada desta harpia
Cismando em ironia me beijar
Bebendo cada gota da sangria...
Marcos Loures



196

A fixação me toma e assim fascina
Fazendo do sonhar monotonia.
O corpo tão perfeito da menina
Diversas emoções decerto cria.

Do quanto havia outrora em tristezas,
Agora se perfaz felicidade.
Tomando já de assalto tais defesas
Penetra com audácia e liberdade.

Agora não consigo disfarçar
Nem mesmo assim pretendo outro caminho.
Tocado pela força do luar
Argêntea solução, eu já adivinho

E bebo cada gota de suor,
No mundo que se faz sempre melhor...
Marcos Loures



197

A flor da juventude renovada
Depois desta outonal desesperança,
Traz-me primaveril manhã raiada
Ao fim desta jornada, longa andança.

Na mão a bela rosa que, encanada,
Convida novamente para a dança
Depois de tanto tempo abandonada,
Ciranda retocando esta lembrança.

Florindo no jardim quase deserto,
Os olhos da menina me convidam.
Como voltar de um sonho, estar desperto,

No retorno aos vinte anos, quem me dera!
Os cantos juvenis já se deslindam
Volvendo para a vida, em primavera!
198

A flor da mocidade faz tão bela
A moça que desnuda, soberana,
Deitando em minha cama, rara estrela,
Rebenta de vontade quase insana,

E toda uma loucura me revela,
Sorrindo mansamente, mais sacana,
Ao gozo da emoção amor atrela
E sabe o quanto a vida nos engana.

Além do que pensei e se imagina,
Mulher que se aflorou numa menina
Esboça num sorriso esta loucura

Que é feita na delícia e na ternura
Audaciosamente em minha cama,
Espalha suas iscas e me chama...
Marcos Loures



199

A flor da mocidade no meu peito
Dormia em berço amado, enlanguescente,
Sem ter acanhamento, insatisfeito,
Buscava do prazer, toda a vertente.

Logrado pelo engodo da beleza,
Me acreditava eterno, temerário..
A dor me parecia uma incerteza
Num rol de sentimentos, louco e vário.

Amor era um dilema em labirinto,
Desejo suplantava qualquer senso,
Vivendo sem saber quanto é bonito
Amor em plenitude, amor imenso...

Agora que envelheço a cada dia,
Amor vem renovando a fantasia...



200

À flor da pele, exposto em carne viva.
Jamais refugarei, cabelo ao vento.
O tempo que transtorna o sentimento
Mantendo a fantasia que me aviva.

Alma encarcerada. Vã cativa
Dos medos, das insônias, não lamento.
Até percebo algum tipo de alento
Por mais que me pareças tão esquiva.

Estático, não movo nenhum dedo.
Masmorra aonde, intenso, eu me emparedo
Regressa ininterrupta, nunca falha.

A boca da pantera sempre aberta,
Tempero feito em fel, já não me alerta,
Prefiro andar no fio da navalha...
 
Autor
MARCOSLOURES
 
Texto
Data
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