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DA FAMILIA

 
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Estarmos ao lado de quem amamos é intuitivo.
A necessidade da presença do ser amado, a força do ar que trespassa a carne
Como uma flecha de aromas atirada à libido,
É tão natural como a sede que se consubstancia na água,
A fome que se resolve no alimento,
Os pulmões que encontram no ar o êxtase da vida.
Estarmos ao lado de quem amamos é instintivo.
Então para quê institucionalizar o instinto?
Para quê racionalizar a energia requerida pelos nossos corpos
Quando bramem como pára-raios pela faísca da paixão?
Para quê criar monumentos frívolos e manias acérrimas
Pecados bordados a seda em papiros encontrados no deserto
- Nunca sem que antes alguém os coloque lá! –
Para justificar o que apenas a necessidade da fusão dos corpos
Na argamassa da sobrevivência mais pura reclama?

Para quê construir amuradas e cais à beira rio dos sentimentos?
Para quê inventar cordas de aço para fazer atracar o coração?
Em que pintado altar de cores bafientas e nubladas diante de troncos de árvore secos
Fazem ajoelhar incrédulos e prometer a eternidade de uma aliança cujo peso
Arranca o próprio dedo onde é crivada numa solene promessa por cumprir?
Para que querem fazer do amor o feudo de todas as obrigações e deveres?
Porque há-de ser a paixão o declínio da propriedade privada do desejo da carne
E da alma?
Deixai as asas de luz romperem com fragrâncias de ouro e pérolas os céus
Afastarem o nublado das nuvens que ofuscam a razão dos sentimentos e vontades
Poisar no divino altar dos olhos brilhantes de paz e ternura
Como o brilho lascivo e dominante na íris dos perfeitos amantes!
Não chamem à corda de aço família porque a família não é uma forma nem um fuzil!
Não rotulem os casais pelo convencionalismo das etiquetas decrépitas e desvalidas
Inventadas à altura da necessidade de se controlar de perto as manifestações pessoais
Quando se acreditavam que todos eram potenciais bruxos e bruxas e que deus
Ou quem de serviço ocupasse o seu lugar na bancada do circo da humanidade
Pudesse estar a ser vituperado por quantos acreditavam que o diabo era gente
E fazia parte de algum movimento contestatário às instituições do poder!
Não destruam o amor que brota como pétala de flor dos corações amantes
Com um formulário de obrigações à altura da caducidade dos desejos avarentos!
Deixai o amor fluir como todas as coisas que devem fluir
Nas asas de uma abelha, no zumbir de uma cigarra, no olhar da serpente
Ou no rosnar de um gato que se amova num sofá da sala junto ao aquecedor!

Porquê família se os laços que unem as pessoas são só por si extensões
Da individualidade
Muito mais seguros e firmes que as palavras rochedos instituídas em definições
Teóricas
Para nos fazerem acreditar numa verdade reconhecida por todos como tal
E obrigarem-nos a julgar a banalidade como acérrima sabedoria de edilidades cultas!

Porque definham no rol das significâncias a realidade da família co-sanguínea?
Porque impregnam de fiscalidade a acção natural de ascendentes e descendentes
Desde o amor que resolve o amparo e a protecção dos seres que se amam
Até à falsidade de tomarem como obrigação o que o direito à existência determina?
Liberem as palavras! Liberem as acções! Idolatrizem a paixão!
Façam amor nas praias sem pronomes que não sejam pessoais!
Atirem a família ao lixo!
A família é o rascunho das concepções de propriedade e ninguém é de ninguém nem
De nada!
Um filho é nosso enquanto a necessidade de o educar estiver patente no instinto
Paternal ou maternal!
Um pai é nosso enquanto o respeito e o amor pelos progenitores ditar a necessidade
De os amar com a mesma intensidade
Com que se devotaram a nós em amor ao longo da vida!
O amor é isso! A família é isso! Naturalidade pré-histórica!
Tudo o que se acrescente uma retórica instituída…!

Que os casais mergulhem nas folhas das árvores pelos jardins
Resolvem a necessidade de aproximação com um beijo
Selem o casamento com um olhar profundo
E amem
Como a natureza se resolve em amor!

antóniocasado

 
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antóniocasado
 
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