Contos : 

O paraíso perdido dos proletários

 
O PARAÍSO PERDIDO DOS PROLETÁRIOS

Sexta – feira , oito horas da noite. A avenida e seus carros , um mar vermelho á espera de um Moisés enfurecido . A algaravia urbana em toda a sua força enlouquecedora . No estacionamento da estação do metrô ,suspiro entre assustada e perplexa , porque ainda estou aqui , um atraso de quase meia- hora , em dia, hora e local á essa altura ,errados .
Mas lá vem ele . Alto , desempenado , falso magro, só músculos , sob aquela pele escura , a carne dura , tesão que rima com nós dois , há sei lá quantos anos ? Abre a porta do Mercedes sem a cerimônia dos primeiros encontros , rindo pelos olhos , assoviando uma breguice qualquer .
Calça jeans bem justinha , camiseta de grife bacana , o relevo musculoso de tesão senta ao meu lado . Sinto o perfume que presenteei no Natal passado ; aquele sorriso de marfim após oito horas de chão de fábrica , uma hora sacolejando naquele metrô sem ar condicionado , mais pra sucursal do inferno que qualquer coisa ; mas chega pra gostosa dele impecável , gostoso , meu lindo teúdo , manteudo e tesudo , ai meu Deus...na idade em que estou , aparecem os tigres,-toca no rádio, ele diz que a música é uma merda , quer mudar de faixa ,digo que merda é o que ele assovia ,com aqueles lábios carnudos de preguiça e belezura , pensei em malemolência, mas ele não sabe o que é nem ninguém hoje fala mais isso ; cinqüenta bem vividos , mas não precisa anunciar falando feito coroa , a idade é minha e basta .
Aí , o sorriso derretido . Morde – me lentamente o pescoço , tenho medo das marcas, hoje não seriam mais um troféu . Acaricia – me entre as coxas , a marca branca da aliança na pele escura dá ciúme , mas penso no mar ,num domingo azul e já distante , fazendo amor dentro d’água , cavalgando aquele falo generoso , tendo o sol por testemunha .
Saímos do estacionamento , direto ao motel , com o meu amor bruxo á tiracolo ; escolhi um mais distante hoje . Tenho de correr , antes que tudo vire rotina , aí...nada que trinta comprimidos de diazepam e um copo de joãozinho andarilho não resolvam .

Ele me despe, fica só de cuecas ; hoje, botou a minha predileta , rebola do jeito que eu gosto , resolve dançar encima da cama agora girante a trilha de Pulp Fiction , os espelhos multiplicam o meu tesão , aquele deus de ébano ,da minha cor , agora todo meu , por míseros trezentos reais , uma noite de cinderela .
Nus , abraçamo- nos , entre beijos vertiginosos rolamos pela cama , ele explora meu corpo ,ávido como na primeira vez , numa busca longa e sedenta pelo meu sexo, Indiana Jones no templo da perdição, sedento , sacia – se nas nascentes do meu desejo , vou ao enésimo céu ,sinto sua explosão dentro de mim , o aríete recua , satisfeito após a estocada final . Banhamo-nos , a brincar feito Adão e Eva na aurora do mundo ; roupa vestida , voltamos á rua .
Deixo –o no ponto do seu ônibus , a tempo de pegar o carro já de saída ,lotado ; ei –lo com a mochila ás costas , segura- - se com uma das mãos , com a outra , manda – me um beijo e mais um adeus, grato e encabulado , o mais gostoso dos meus torneiros mecânicos.





andrealbuquerque

 
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andrealbuquerque
 
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