Prosas Poéticas : 

DEZENOVE DE MAIO

 
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DEZENOVE DE MAIO - prosa ligeira

Às vezes ainda me sinto como aquele garoto,
Que tentava sozinho se tornar um homem.
Quando, distantes pai, padrinho ou ao menos um padrasto,
Tinha apenas as próprias confusões como guia.

A vida me ensinou que amigos não são confiáveis.
Tampouco parentes ou, sobretudo, amores.
Demorei para entender que estou mesmo só,
Ainda que habite uma metrópole junto com milhões de pessoas.
Estamos todos sós, mesmo cercados de gente.
Mesmo que muitos nos conheçam pelo nome e nos chamem, conversando.
Não adianta: na hora de pô-los à prova, falharão! ...
Todo mundo é bom até ter a oportunidade de se dar bem.

Eu muitas vezes quis estar enganado sobre as pessoas, mas...
Eu muitas vezes me enganei sobre as pessoas...

Tinha esperança dum dia saber separar os bons dos nem tanto.
Todavia, até os melhores (os excelentes!) se mostraram egoístas e falsos.
Todos mentindo, manipulando, especulando e, ao fim, se escondendo atrás de Deus ou do próprio Deus.

Mas o que me desanima mesmo é ver todos essas misérias -- os lamentáveis pensamentos-palavras-ações-e-hábitos que tão bem acuso nos outros -- os tenho todos dentro de mim!

Sou tão egoísta quanto; tão absurdo quanto...

De facto, se houvesse alguma verdade capaz de definir alguém, seria, ainda assim, tão precária ou provisória quanto qualquer outra.
-- "Fulano é bom." ou ainda "Cicrano é egoísta"... Não significa nada.

Talvez devesse andar escudado, pronto para o próximo golpe.
Sim, porque dói! Dói quando encaixam direto no queixo!
A gente cambaleia, sentindo o murro, e desaba.
Do chão, contempla a extensão da própria derrota
Alheio e incerto d'haver um Universo com estrelas ou sequer planetas habitados.

Impossível eu precisar o quanto me surpreendera mal...
Inútil explicar o que me acontece sem que eu me exaspere.
Capitulo como se uma nação atônita por perder muito mais do que julgava possível perder.
Rendido a inimigos cuja intimidade hoje me assusta.
Gente que tratei bem, cuja comida compartilhei: companheiros!
Gente que favoreci; a quem servi com admiração e respeito.

Essa atitude - justa ou não - apenas me demonstra o quanto sou irrelevante.
Pouco importa o que eu pense ou sinta.
Com ou sem mim, a vida continua...

Eu me apoio nos degraus da escada e me sento.
Choro, porque sou miserável e depressivo.
Lamento, porque reconheço a consequência de escolhas em minha decepção.
Posso cuidar de minhas feridas, mas não me furtar à tristeza.
Hoje, nesse momento, é tudo o que possuo.
Uma tristeza pura, cristalina, que se soma a todas as tristezas da infância;
Aquelas cujo ardor rememorei no início.

Sim, o sentimento parece o mesmo:

-- Pequeno, desamparado, sozinho e triste. --

Eis! É tudo...


Ubi caritas est vera
Deus ibi est.


 
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RicardoC
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