Poemas : 

De lobo para a lua

 
Lobo:
Melancolia que dreno,
lançado ao salgado mar,
à colheita
do melhor que ser amado
...É amar!
E o pior que ser odiado
...É odiar!

Lua:
Reveste a tua virtude,
amando em qualquer magnitude,
veste o teu olfacto,
rasgando por qualquer tacto,
Deixai que cair toda a vertigem,
à luz da minha santa virgem.

Lobo:
Ao seu,
chamamento que me cala,
nesta caminhada
que alcancei em escala,
que fui filho a quem me criou,
fui irmão a quem me sorriu,
fui pai a quem me amou.

Lua:
Saudoso ventre que te acendeu,
sendo chama que nunca morreu,
na nebulosa paixão,
da mão do inverno,
deixando a colheita
em que se faz razão.

Lobo:
Colhi toda a esperança,
plantei toda a fé,
em lembrança,
Onde floriu a minha inocência,
que deixo perdida,
no dialeto da decência.

Lua:
Não temais a vida,
não temais a morte,
que o universo te espera,
com um lugar teu,
junto à galáxia norte,
para que não representes a escuridão,
e representa somente a dignidade,
para outro ser que cresça,
com a verdade.

Lobo:
Prometo eu,
representar tudo o que sou,
mostrando que a imagem,
não passa d'um revestimento,
e fazer ver que do lobo mau,
sao apenas contos de fadas,
por contadores babados.

Lua:
Deixa que toda a comunidade veja,
A flor que promete vida,
a água que maneja,
as árvores,
a terra,
o fruto de viver.

Lobo:
Além do cansaço,
de qualquer raiz,
nesta bruta humanidade
... Na força que está a ausência,
de sua e minha saudade,
procurando o sereno,
no beijo a monte,
do aposento sobre o
Tejo.

Lua:
A todos vós meus filhos,
quando sentir nostalgia,
lá das estrelas e da escuridão,
na noite estou,
ouvindo cada palavra,
cada canção,
cada uivo que penetra,
atmosfera vazia.

Lobo:
Vazia foi minha escuridão,
contudo abri as portas
da minha alma,
e o portão
do meu coração,
deixando o sol encarnar
minha face,
sonhando paisagens encantadas,
outrora destruídas,
por mãos armadas.

Lua:
Não lamento a ignorância do povo,
todo o universo, é meu pai,
teu e de todos vós,
ele irá recuar o giro da terra,
fazer sentir o inverso das coisas,
a todo o homem,
em que foi dado,
lar e colheita,
terra e céu,
água e fogo,
deixando em vossas mãos,
uma nova era,
que deveria ser feito,
paraíso da vida,
Ao invés de ser
a catástrofe dos deuses.


Hugo Dias 'Marduk'

 
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HugoDiasMarduk
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 16/04/2017 15:13  Atualizado: 16/04/2017 15:13
 Re: De lobo para a lua
Tão diferente da banalidade que por aqui anda,
os profissionais aqui do burgo não devem comentar, mas eu comento,...
Bravo.


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 17/04/2017 11:26  Atualizado: 17/04/2017 11:26
 Re: De lobo para a lua
Tudo se reveste dos sentido onde os encantos se faz dos místicos se acionando as noites enluarada pelo tempo

Enviado por Tópico
Rogério Beça
Publicado: 17/04/2017 18:46  Atualizado: 17/04/2017 18:48
Usuário desde: 06/11/2007
Localidade:
Mensagens: 1940
 Re: De lobo para a lua
Poema muito curioso, colocado sob forma de diálogo, em que avançamos estrofe a estrofe nas falas do Lobo e da Lua.
Na primeira fala (quase soa a peça de teatro) entra o Lobo duma forma fortíssima, primeiro lamento em que demonstra o estado em que se encontra (melancolia). “Melhor que ser amado\... É amar!\Pior que ser odiado\... É odiar!”. Apesar de se cair num lugar-comum, não deixa de ser uma reflexão válida, que vai contra a ideia que não há nada como amar e ser amado. Fala-nos do amor, sensação ilusória, mas magnífica, e sem se desejar nada em troca, nem a reciprocidade. E do ódio como manifestação do mais natural e desprezível do sentimentos. O ódio? Que odeiem os outros, podemos pensar lendo o que nos diz o Lobo.
Na segunda fala entra a outra personagem. Esta estrofe determina o papel da Lua em todo o poema. Num tom maternal, vai transmitindo ao Lobo que vale sempre a pena. “Reveste a tua virtude” (já que a despiste) \ “amando em qualquer magnitude”, muito belos estes versos, poderemos abdicar dessa coisa lamechas? Amar será sempre melhor do que pior. Mas o lobo não se sente convencido e explica-se nas seguintes estrofes.
Mostrando várias formas de amor disfarçadas de qualidades universais: “ fui filho a quem me criou\ fui irmão a quem me sorriu\ fui pai a quem me amou”. Fui, fui, fui… Um pretérito perfeito que sublinha a mágoa. Na resposta, a Lua elogia o lobo e admite-lhe as qualidades, elogiando “o saudoso ventre que te acendeu”, mais uma luz que surgiu no poema.
Mas de que se queixa verdadeiramente este Lobo, aparentemente, sem alcateia? A quinta estrofe di-lo bem; colheu, plantou, floriu, perdeu. E ao perder a inocência “no dialecto da decência” (bom) achou a melancolia.
Mas o Lobo não é apenas um ser lamuriento e queixoso. Faz a promessa, talvez já influenciado pela Lua que lhe fala ao coração, de ser ele mesmo, mas retirar o Mau do Lobo. Imagem de que vive, que o desumaniza e diaboliza. “Em contos de fadas” que não passam de mitos. Os próprios animais não são bons ou maus, eles podem ser perigosos para as pessoas. Para se alimentarem ou para se defenderem. A sétima estrofe perde algo com o seu último verso: “por contadores babados”. Acho que o adjectivo foge demasiado do resto de linguagem.
Na última estrofe compete à Lua o lado maduro e doído da parelha. Tendo para com o Lobo a intenção de justificar as faltas da “humanidade bruta”, da sua ignorância (Einstein chamou-lhe estupidez) infinita, incapazes de entenderem a natureza e compreenderem a seu legado:
O de serem Lobos a procurar o melhor de si mesmos.

O poema é extenso, sem ser uma epopeia. Nunca perde estrofe após estrofe a sua força, quer na linguagem, na beleza dos seu versos e no rumo que o poeta lhes quer dar (excepção ao verso supracitado).

Gostei muito.