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Da insuportável bondade

 
Da insuportável bondade


Bondade... palavra mole, palavra viscosa,

Que me escorre pelos dedos quando tento segurá-la!

Pior do que a maldade crua, brutal, honesta,

É essa bondade doce e adocicada,

Que cheira a perfume barato e a desculpa ensaiada.

Bondade é o teatro dos fracos,

A bengala moral dos que não têm coragem de ser monstros!

Preferia mil vezes um inimigo sincero

Do que um amigo bondoso que sorri enquanto me apunhala com ternura.

Quantos atos de bondade são apenas gestos de culpa enfeitada?

Quantos abraços caridosos escondem nojo e piedade?

Quantas esmolas são cuspidas com luvas de veludo?

Não, não quero a tua bondade,

Não quero essa necessidade urgente de te sentires puro!

Faz o mal, se tens de fazer — mas sê grande nisso!

Não mintas para ti mesmo com esse sorriso de papelão!

A bondade verdadeira (se existe...)

Deveria ser um relâmpago frio, sem vanglória,

Um gesto que se desfaz no próprio ato,

Como uma lágrima que ninguém vê cair.

Mas nós, humanos, precisamos tanto de nos iludir,

Que inventamos a bondade como quem inventa um céu de papel

Para cobrir o lixo onde nos deitamos...

E assim seguimos — puros, bondosos,

Enquanto apodrecemos lentamente por dentro,

Cheios de boas intenções.

 
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Elisantos
 
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Enviado por Tópico
AlexandreCosta
Publicado: 27/05/2025 14:29  Atualizado: 27/05/2025 14:29
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 Re: Da insuportável bondade
Essa bondade, das bestas famintas, também eu dispenso! Mas continuo a acreditar que há pessoas genuinamente bondosas.

Um poema de uma pertinência inviolável!