No começo, ninguém vê.
Nem o sorriso forçado, nem a lágrima contida.
Ando pelos dias como quem carrega
um segredo que tem gosto de despedida.
Disfarço a dor com café frio
e um bom-dia que não me convence.
Enquanto o espelho sussurra baixinho:
“Você ainda está aqui, mas por pouco.”
Amar foi fácil — ser notado, não.
Sempre fui a pausa no meio do riso,
o plano B do destino de alguém,
o detalhe bonito que não era preciso.
Vi ela passar com a luz nos olhos
que faz até a fé dos céticos tremer.
Mas pra mim, sempre restou o quase,
o toque que não veio, o beijo que faltou acontecer.
Ela dizia que me achava profundo,
mas não mergulhava nem no raso.
Ficava na borda, com medo do abismo
que é amar alguém por inteiro e sem prazo.
Fui jardim não visitado,
poema lido pela metade.
Fui flor que murcha esperando
ser regada com sinceridade.
Agora, o tempo me cobra.
A vida me deu um diagnóstico sem poesia.
E só agora lembram meu nome,
só agora notam minha melodia.
Ela veio com flores nas mãos
e os olhos molhados de arrependimento.
Disse que nunca foi por mal,
só não soube lidar com meu sentimento.
Tarde demais, amor.
Eu já tô partindo, aos poucos, em silêncio.
E pela primeira vez, todo mundo olha pra mim
como se eu fosse algo imenso.
Gritam que vão sentir falta,
que eu era "único", "intenso", "verdadeiro"...
Mas onde estavam quando eu gritava por dentro,
com a alma chorando o tempo inteiro?
Me encheram de flores,
mas nenhuma delas me viu florescer.
A beleza que tanto exaltam hoje
foi a mesma que ninguém quis colher.
Agora sou notícia em redes sociais,
legenda de luto e comoção.
Mas antes disso, fui só silêncio,
fui só amor sem condição.
E se um dia lembrar de mim pesar no peito,
lembra que eu tentei, do meu jeito, sinais.
Que tudo que eu quis foi ser visto em vida,
não ser amado só nos funerais.