Rasguei a ausência
com dedos lentos
como quem se despe do tempo.
Aprendi a pele
na fricção suave dos dias
mesmo os dias que sangravam.
Aquele verão tinha margens de sal
e procurávamos terra
em bocas de fruta
sem polpa
sem perdão.
Tu eras voo
entre raízes.
Eu
um mapa sem norte
a tropeçar em sombras verdes.
Hoje
somos silêncio em trânsito.
O teu olhar
promessa aérea
o meu corpo
véu em combustão.
Neste lado da memória
o sol pisca palavras quebradas.
E a borboleta
imóvel
e sábia
murmura nomes esquecidos
sem idade
e sem língua.
No outro lado do tempo
a tarde escorre
como rio que não sabe
onde começa o mar.