Naquele fim de tarde, quando o céu parecia escrito
em tinta dourada,
o Poema caminhava inquieto.
Sentia cada verso como um músculo tenso,
cada rima como uma obrigação antiga
que já não lhe bastava.
Ele buscava algo que não sabia nomear.
Talvez um brilho.
Talvez um desvio suave nos trilhos da forma.
Talvez… ela.
E então surgiu a Poesia.
Não veio anunciada, nem se mostrou de uma vez.
Ela apareceu primeiro como um murmúrio,
uma cintilação discreta no ar,
como quando o coração pressente alegria
antes que ela se revele.
Ela se aproximou sem pressa,
e cada passo dela parecia tecer
um novo horizonte sobre o chão.
— Por que vens tão contido, Poema? —
perguntou ela, com voz que era brisa e melodia.
O Poema curvou-se levemente,
não por submissão, mas por reconhecimento:
— Porque fui feito de regras, minha amada.
Mas hoje percebo que sou incompleto.
Minhas rimas obedecem, mas não sentem.
Preciso do teu incêndio para respirar.
A Poesia tocou o rosto dele —
se é que ideias podem ter rosto —
e onde seus dedos passavam,
os versos ganhavam brilho,
como se fossem incendiados por dentro.
— E eu, — disse ela,
com aquele sorriso que nasce nos olhos —
eu preciso da tua forma para não me perder.
Sou vento, sou voo, sou chama leve…
Mas contigo, encontro morada.
Tu me transformas em sentido.
E o Poema, que sempre se julgara rígido,
descobriu ali que podia ser macio.
Descobriu que sua métrica podia dançar.
Que suas estrofes podiam se abrir
como janelas ao amanhecer.
Eles se uniram —
não como palavra e música,
mas como vida e pulsação.
A partir desse encontro,
cada nova criação no mundo
carregava um pouco desse enlace:
a disciplina do Poema,
a liberdade da Poesia,
e o milagre de serem um só.
E até hoje, quando alguém escreve
algo que vibra por dentro,
diz-se que foi ali, no silêncio da alma,
que Poema e Poesia se encontraram
Fragmentos de Sonhos
Senhora Poesia