lembranças
um dia,
olhei lá para
baixo.
tinha perdido
as nuvens e a
grande capacidade
de flutuar.
lembro
de passar os dias
nas esquinas da
cama, olhando
o lustre com as
duas luzes queimadas.
heidegger
e sartre não mais
respondiam as minhas
dúvidas insolentes.
minha toda filosofia
tinha morrido naqueles
olhos verdes,naquelas
terras que aprendi
a amar.
um dia,
um dia qualquer,
de um ano qualquer,
cheguei na janela
e abri alguns comprimidos.
tomei todos com tanta
pressa e emoção.
quando acordei
minha mãe segurava
a minha mão.
chiara
palavra
a vida coagulou-se:
nada circula nas veias
além da morte prematura
da palavra.
a filosofia deve explicar
o que já não se entende
na poesia.
chiara
eu sou eu mesma
eu sou
eu mesma
e você já
sabia.
que falta de
coração não
prestigiar
a minha pobre
poesia.
tem problema não,
quem sabe
um dia...
né?
chiara
c'est le vent, chiara
deve ser o vento
que me arrasta
sem minha permissão.
deve ser a força
da correnteza
afogando minhas
palavras na contramão.
ninguém pode fazer
isso parar.
ninguém me ensinou
a rezar.
e já não mais
consigo me proteger
ou correr para
dentro de mim.
isso é quase
um desespero,
é uma cegueira
atroz.
rouca,
sem voz,
quem pode me ouvir?
por quanto tempo
mais vou conseguir
fugir de ti,
de mim,
de tudo que não
escrevi.
alguém
me digar por favor
como posso me livrar
do amor, do amor
não escolhido,
do que é sem
nunca ter sido,
do vento sem perdão.
alguém por favor
explique-me como
peço ao vento para
que ele cuspa
o meu coração.
chiara
a atriz
tuas armas
afiadas,
tua adaga
na minha mão
é a verdade
estendida
no meu ego.
mas, se perguntares,
eu nego,
eu cego,
eu alego
que o sangue
não é meu,
não é teu
e que foi você
quem primeiro
meteu.
Chiara
eu sou a minha própria lei
a minha lei
sou quem faço
com o meu ar
peregrino e
a minha alma
de aço.
beijos
e abraços
não me comovem
muito.
palavras bonitas
não me movem,
nem me falam
de segurança.
conheço os passos
dessa pseudo confiança.
conheço e nem sei se gosto
de ver as motivações.
pouco me importa
algumas (in)verdades
ou mentiras gloriosas.
as palavras não podem
conter todo os nomes
das rosas, tudo
que tranquei em/de
mim.
não preciso de juiz:
sei me julgar.
não preciso de coisas
que ainda fazem tanto
sentido.
fale-me ao ouvido
o que preciso saber:
nem mais, nem menos,
nem isso ou aquilo.
eu sempre sou
o meu próprio veneno,
dinamite e explosão.
eu sou um deslumbramento
sereno sem muita emoção.
quando me dispo,
continuo vestida.
quando cheguei,
já estou de saída.
o que parece me engaiolar
e me tornar tão bela
é apenas ilusão.
nunca dou muito de mim,
nem mesmo a mão.
a minha cobra
está embaixo da pedra.
está dormindo como a tua
também.
mas, não pise nela.
(não pise não...)
porque ela sabe atacar
muito bem.
(com muita classe, sempre)
chiara
amor clandestino
rastejam sombras
deste livro
sem explicação.
páginas mortas
ou poemas
angustiados?
- acaricio o livro -
e quando amo mais,
hiberno, morrendo,
morrendo
de ler.
Chiara
sugestão
fale com os meus olhos,
amarre as minhas mãos,
toda a coragem
é apenas submissão.
palavras mentem,
escuto
tua pele
nos livros
empoeirados.
em minha boca
amordaçada
a noite
sugere.
agora
somos.
Chiara
remorso
recebo a manhã
sem muitas histórias
ou perspectivas.
abro os olhos
mecanicamente
sou apenas
eu
e minha mente
nesse jogo
sem espaços
para perda
ou para a vida.
preciso de uma
passagem de ida.
a volta
é apenas revolta.
e eu não quero
o mesmo remorso
todo dia.
Chiara
poema igual
se eu me repetir
que seja.
todas as minhas
palavras já foram
escritas e
pronunciadas.
cheguei de novo
atrasada.
resta apenas
a semântica
intraduzível
dos meus olhos
sempre iguais.
Chiara