Poemas, frases e mensagens de Mariadomar

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Mariadomar

No dobrar do tempo

 
Já me esqueci
Das cantigas de embalar
Das histórias de encantar
Na hora de adormecer

Já me esqueci
Do nome dessa boneca
Feita e de trapo coberta
Que me ajudou a crescer

Já me esqueci
Do primeiro livro que li
Ou da carta que escrevi
Manifestando o meu querer

Mas não esqueci
O carinho e os abraços
Envoltos em fortes laços
Criados logo ao nascer

Nem quero pensar
Que o tempo possa apagar
A prata desse luar
Que alimenta este meu ser !
 
No dobrar do tempo

A Alma do Fado

 
Na velha viela fria quase deserta
Ouvem-se os passos de quem lá pereceu
São almas perdidas há muito esquecidas
Histórias de vida que ninguém escreveu

Portas fechadas postigos sem luz
Vidraças partidas que abrigam pardais
Sombras espalhadas em sóbrios recantos
Ervas que vingam por entre os beirais

E quem à noite por ali passar
Vai poder ouvir choros e gemidos
Vindos de tabernas gravadas no tempo

É alguém que sofre e chora a cantar
As desilusões de amores já perdidos
E a guitarra geme ao som do lamento
 
A Alma do Fado

Dedicação

 
Quando se ama de alma e coração
O pensamento não é livre de voar
Tomando sempre a mesma direcção
Não encontra outro motivo p´ra pensar

Tenta lembrar-se de tudo o que passou
Revivendo os bons momentos com saudade
Lembra também os momentos que chorou
Quando a ausência se transforma em ansiedade

Se soubesses meu amor o quanto tempo
Te dedico dia a dia o meu pensar
Sentirias no teu peito esse lamento
De alguém que apenas vive só p´ra te amar
 
Dedicação

Perfume

 
Abro a janela e sinto o perfume
Das flores de mil cores que se entrelaçam
Da sua graça sinto ciúme
Dessa ternura com que se abraçam

São frágeis e puras paletas de cores
São promessa de sonhos a quem vai nascer
São cânticos que falam de eternos amores
São escravas das mãos que as irão colher

Quem me dera ter tamanha beleza
E que pudesses ler no meu triste olhar
A sede da vida que me atormenta

Sentirias bem a minha incerteza
De no teu peito eu desabrochar
Numa primavera de que estou sedenta
 
Perfume

Quem sou eu

 
Quem és tu afinal assim pergunto
À imagem no espelho reflectida
Que um sopro de luz desconhecida
Ofusca os traços que redesenho e junto

Na esperança de ali eu encontrar
No silêncio da alma adormecida
Envolta em rara seda de amor tecida
O génio que a impede de acordar

E o tempo esgota em tão longa espera
Pela resposta que tarda em chegar
Ao espelho de mistério emoldurado

Serei eu sombra ou luz duma quimera?
Pássaro ferido que insiste no voar?
Ou ninguém,como se fosse passado… ?
 
Quem sou eu

Murmúrio

 
Maré que vai e vem sem descansar
Fase da lua que a guia e lhe dá vida
O seu murmúrio não me canso de escutar
Fala de amor e de esperança em vão perdida

Fala de sonhos de espuma já desfeitos
De tesouros que teima em guardar
Fala do vento que a impele e seus efeitos
Lamenta o mal que daí possa causar

Maré que vai e vem sem descansar
O seu múrmurio não me canso de escutar
 
Murmúrio

Procuro

 
Procuro meu pensamento
No tempo que não vivi
Na razão do que escrevi
Meu livro que nunca li
Filho de um breve momento
Que o vento esfarrapou
E no vazio espalhou
Só esta mágoa deixou
Num triste e farto lamento
Contra o meu peito dorido
Pela raiva do castigo
Da dor que trago comigo
Que me retira o alento
E por remorso ou por pena
O presente me condena
Ao ritmo que o mundo ordena
Este meu caminhar lento
Jamais eu quero pensar
O fim da estrada alcançar
Sem nunca me encontrar
Com meu próprio pensamento
 
Procuro

É madrugada

 
É madrugada
Soam os passos lá fora
Mas que importa
Quem caminha a esta hora
Se a minha esperança está morta
Do sonho não resta nada

É madrugada
Lembra o relógio da torre
Num canto de Ave-Marias
P´ra quem nasce e p´ra quem morre
Rezando todos os dias
Como freira enclausurada

Adormeço
Vencida pelo cansaço
Das madrugadas vazias
Um filho teu no regaço
Fruto de mil fantasias
É tudo quanto mereço
 
É madrugada

Negro do mar

 
E quando o sol se põe no horizonte
O mar ao rubro eleva a sua cor
Tingindo os espelhos do histórico sextante
Que se confundem em tão vasto esplendor

Negra silhueta de um veleiro ao longe
Em contraluz navega rumo a outros mares
Duas gaivotas se aninham nos mastros
Vão à descoberta de outros lugares

E o velho farol fiel sentinela
Recebe o regresso do escuro da noite
Emprestando ao mar seu facho de luz

E avistando ao longe uns panos de vela
Abre-lhe o caminho para que se afoite
E ao negro do mar seu medo reduz
 
Negro do mar

Rio Cavado a Grosso

 
Sob o céu cinzento triste nublado
Dançam as gaivotas no leito do rio
E num piar estridente quase ao desafio
Envolvem o canto num grande bailado

O vento do sul sussurra a promessa
Que em breve o leito irá acalmar
E ávidas de nele poder mergulhar
Se entrelaçam no vôo que em queda tropeça

Nasce o desespero quando a fome abunda
E se o rio se agita bem cavado a grosso
Arrasta a esperança em suas correntes

Lembra o meu país que aos poucos se afunda
Voltando ao principio de quando era moço
E o ânimo se esgota entre as suas gentes
 
Rio Cavado a Grosso

Sono Velado

 
Na casa onde ao mundo vim
Havia um berço pintado
De rosa cor de menina
Pertencia a gente fina
A meus pais foi ofertado

Nesse berço de princesa
Minha mãe me embalava
E nos sonhos de criança
De que não tenho lembrança
O mar meu sono velava

Um dia eu em pé no berço
Cai... não cai...sorte ou magia
Olho através da janela
E o que vi através dela
Descrever eu não sabia…

Uma baía serena ...
Vestida de um azul céu
E a beleza que ostentava
Meu coração entregava
Ao mar a quem chamo MEU !
 
Sono Velado

Guarda-jóias

 
Abri o meu guarda-jóias
No passado mergulhei
São as jóias de família
Que há muito ali guardei

Cada uma delas tem
Uma história p´ra contar
São valores que recebi
Que um dia vou confiar

O pregador da avó
Uma libra já sem cor
Estou a vê-la ao seu peito
Que lhe dava mais valor

Uma pequena medalha
Que em pequena me ofereceu
Dela recebi a fé
Que sempre me protegeu

O alfinete do pai
Com pedra de imitação
Fora eu que lhe oferecera
Mostrando a minha afeição

Jóias sem qualquer valor
P´ra quem as quiser comprar
Elas só valem amor
P´ra sempre as quero guardar
 
Guarda-jóias

Paciencia

 
Enfrentar o dia a dia tortuoso
Sem cólera que impeça o raciocínio
É subir o caminho virtuoso
Ao mais alto degrau da inteligência
Que do cimo acena num grito amistoso
Um lenço bordado com ramo frondoso
Exemplo do fruto da sagaz paciência
 
Paciencia

Por um acaso

 
Hora a hora dia a dia
Dou largas à fantasia
Neste romance sem fim
Levando minha emoção
Ao fundo do coração
Que bate dentro de mim

Somos nós és tu sou eu
Neste amor que em mim nasceu
E comigo há-de morrer
O amor que me tens dado
Trago no peito gravado
Jamais o irei esquecer

E se fôr o meu destino
P´ra breve o poder divino
A minha vida levar
Ergue os teus olhos ao céu
Que envolta de luz em véu
Lá estarei p´ra te guiar
 
Por um acaso

Desnorte

 
Este mar sem esperança
Sem rasgo de sorte
A praia varrida
O vento é do norte

Que sopra o delírio
Dos Deuses, a fúria
Gaivotas se agitam
Piando em lamúria

Há sabor a fome
Há um frio de morte
Há desesperança
Angústia e desnorte!
 
Desnorte

Mar sonoro, mar sem fundo mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós.
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim

Sophia de Mello Br...