Quando os pés ficam sem a maré
O destemido olhar
Recria o mar
Fora do lugar
E deixa o cair
Como cascata
Numa vida
Transformada
Em grãos de praia
E na ravina do peito
O vento
Não acalma
Olhares
E naquele cais
[casa]
Existe uma pressa
Que não cessa
Há verdes que ardem
No centro de mim
Antes mesmo
De serem tabuas
Do teu último jardim
Um dia
Voltarei para ti
Voltarei
Com todas as palavras
Que não te disse
Tatuadora de interiores
guardo
aquele caderno
que me deste
como tesouro
precioso
do nosso sonho
lá dentro
vive um pouco
do nosso amor
do começo
dos nossos versos
e tu …
o que guardas da minha parte ?
que parte guardas de mim ?
da minha parte
não há parte
que não tenha
a memória
da tua imagem
serás para sempre
a minha tatuadora de interiores
há marcas de ti
na raiz da pele
no chão do coração
no corredor do peito
no sótão da razão
enfim existe uma galeria de ti
exposta no salão do meu ser
até na janela do olhar
existe o teu último aceno
tatuado
impossível de apagar
mesmo nas noites
dos meus silêncios
chuvosos ...
Semeando a flor na terra adubada de pólvora
a alma nua
[maquilhada de ternura ]
regressa a esta casa
em ruinas
com a esperança
de ver nascer
a tal flor
nos destroços
de uma guerra
impura
traz a lágrima na cortina
de um sorriso
a beleza de amar
na retina das letras
contudo
o tempo surdo
não para de distanciar
a luz das estrelas
…e tudo se esquece
num parágrafo
…e tudo foge dos braços
…e tudo o silêncio sossega
nos atrasos
das horas
mas a tal flor
mostrará ao mundo
a beleza das suas folhas
sagrando por dentro
as raízes da sua dor
...e no fim de tudo.
o que vai sobejar
ao inverno e ao outono,
são as raízes e o tronco …
Queria muito mais que o teu corpo …
os dedos
sabem
deslizar
na sombra
dos teus olhos
sem serem ensinados
contorna-los
com a suavidade
lenta
de uma circunferência
feita de cetim
devo-te confessar…
que nunca vi olhos
tão raros
aquela savana africana
rodeada do branco ártico
e um milhão de estrelas
condensadas
duplicadas
no rosto
tão mágico
naquela tarde
o que mais me impressionou
não foi toque da pele
não foi o roçar da carne
foi a esperança adormecida do teu olhar
e aquela menina feita mulher
querendo voar
naquela tarde
trazíamos dois corações abarrotar de melodias sem nome
e a promessa de uma espera
por validar
vá lá …diz-me …a onde guardas esse amor de ontem?
Pintar amor
a fúria das pálpebras
as glândulas exacerbadas
o fogo em água
o corpo salivando
a falta
da pele
enleada
entre as
mãos
e alma
a saudade
á solta
sussurrando
no dérmico
rumorejo
do tronco
a traqueia
chamando
o suspiro
de um raspançar
de beijo
o arrepio
riscado
pelos dedos
nos teus seios
clivosos
a vontade
de ser
branco
sangue
no
teu
ventre
prenda
o desejo de ser anjo
entre o suor dos membros
e no final
a cedência mortal
de um gemido
a dois
num inexplicável
avolumar de paz
e delicadeza
Primeiros instantes
a afinidade da tarde
contrastava com nervosismo
das mãos
o coração embrulhava-se
com ansiedade
dos nervos
antes de te ver
a musicar o olhar
com essa beleza
de doce em flor
fui obrigado
a beber um
litro de água
pensei que me acalmava
mas só apressou
a ida á casa de banho
mais tarde
quando te vi chegar
fiquei transbordando
admiração …
aquela linda mulher
era real
fora do ecrã
fora do poema
o sentimento sentido
fez sentido
para lá do tecido dérmico das palavras
finamente percebi
que a alma vestia a Prada da carne
finalmente
o sonho tinha perfume
calor
ternura a montes
finalmente
a gémea alma
sentia-se em casa
no tocar de mãos
no tocar de asas
Ária da Alma é o meu intento
como te posso explicar
que te amo
a cada vocábulo
arremessado
de lábio a lábio
que a letra
é como frasco
que guarda
a delicadeza
de te amar
por isso te escrevo
com o coração apoiados nos dedos
um poema
escorrendo
saudade
A ponte do horizonte… pode bem ser os nossos braços
a distância das vagas
enganam
serei forte na espuma
cobarde …
no meio da rocha
e da onda
mas se tiveres
afogando o sol
eu levo-te a lua
para te trazer de volta
Existe beleza nos regressos?
já não sei
o que semeei em teu coração
se foi a pureza dos afetos
[desaprendidos ]
se foi a novidade dos apegos
[por aprender ]
um dia
estive tão perto
de uma lágrima
acesa
no olhar teu
quando dizia adeus
um dia
estive tão perto
dos teus olhos
quando multipliquei
seu brilho
descosturando a dor do teu peito
um dia
partilhamos um sonho
e não um pesadelo
um dia prolongamos as horas
só para estarmos mais tempo
próximos
de um coração
só nosso
Deixa-me metamorfosear a mágoa em teu peito … num apego de bem
que ambicioso
querer retornar
ao núcleo do teu peito
depois de semear
o desconforto
do abandono
seria…
como minar o âmago
com marcas
de um desertor
que deixou num lugar
do coração
a desilusão
seria...
como arrancar a crosta
antes da escoriação
diminuindo o caudal
do seu ardor
mas este amor que te trago
é um duplicado ao quadrado
daquela relação
que um dia
nos fez
chorar
de querer
e não poder
transformar
o legado
de um sentimento
a dois