Beijo
Era o beijo, o sopro, a sede de alma
Duas pétalas coladas numa sombra
Era a sede, a chuva, a doce palma
Aberta em dádiva, o voar da pomba
Nas asas do olhar. No encalço
O amor…
…percalço?...
Cruz
Era a cruz, o sangue, a inanição
A causa, a consequência, a demência
Era a fenda funda o núcleo da fusão
A cria, o rebento, em mim, dolência
Espasmo sem cura, ai turbulência
O amor…
…penitência…
Como se faz o poeta (Inspiração de Flávio Silver)
No poema maluco
As aves vão na carreira
Para a praia da palavreira
Entre o gato e o rato
Está um feijão a suar estuprado pelas pombas
- rompe-se a casca e da raiz nos diz-
Oh águias destemperadas
Nómadas do fim do verbo
A candeia está apagada, a vela desmoronada.
O poeta só tem treta feita de vinho em proveta
Será que nasce no céu, ou é do feijão a inspiração?
Era o não
Era o não, o nunca a latejar prementes
Em águas perdidos, uma espera, assim
Era a falha o abismo em queda dementes
O abraço dos dois contrários de mim
Persigo-me em fuga, agarro-me enfim
Ao amor…
…sim, sim, sim...
Tempo
Era o tempo, a espera, o desespero
O desencontro fatal, o desvario
Era a alma desalmada, o exaspero
Queixume, queda e calafrio.
Na troca do nada p’lo vazio,
O amor…
…silencio?…