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Primeiro capítulo do meu livro "Muito mais que apenas amor"

 
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Por mais que o tempo me tente numa corrida. Que tudo a meu redor me prenda a uma velocidade que não consigo escoltar, tenho como plena a convicção que este pensamento, que te recapitula e dá vida, permanecerá eternamente estático na minha cabeça. Frequenta meu pensamento. Gostaria de driblar o tempo e recuar-me nele para modificar o que na altura parecia certo, e que hoje nada mais é do que puro arrependimento. Lembro-me do teu cabelo e da sua forma de ondular ao brincar do vento, a sua cor negra, suficiente para me fazer renunciar todo o medo da escuridão. Questionava-me por vezes como poderia ser tão mau e ter um caráter tão depreciativo algo que à sombra dos meus olhos era meramente belo. Os seus olhos, esses, eram raiados de mar, de um azul tão sublime que jurei que nunca os confundiria e que um dia desejaria poder navegá-los. Meros sonhos. Igual era o desejo de navegar e atracar na saliva dos seus lábios, ou se mais não fosse beijar a sua face, mas tudo o que senti desse seu paraíso foi o cheiro, o único que conseguia sobrevoar e ir mais além da distância que separava ambas as janelas. Estava e sentia-me tão perto a ti, mas ao mesmo tempo a uma distância de morte, a distância que desagregava dois corações feitos como se duas peças de puzzle se tratassem, que nasceram para estarem interligadas, tendo em conta que nenhuma funciona de modo independente.
Engraçado, lembro-me de nunca questionar o facto de sermos vizinhos e na verdade nunca termos tido convivência para além das meras janelas. Por vezes, sentia-me dentro de um livro de contos, em que procurava de modo insaciável ser o protagonista, mas o espaço cénico me impedia de brilhar e mais importa fazer alguém brilhar, ao ponto de ofuscar tão belos olhos. Perdido nas linhas que te formavam, e nas palavras incapazes de descrever tão sublime ser e tamanho sentimento, lembro-me de nunca ter questionado o teu nome. Por entre tanto amor, o nome de ambos entrava numa dimensão supérflua, sem significado ou qualquer importância, tudo para além das estrelas dos nossos olhos não tinha brilho, tudo para além da ligação mecânica que nossos corações estabeleciam, encontrava-se morto.
Nunca pensei, sequer imaginei ser possível guardar uma quantidade tão excessiva de amor dentro de tão diminuto coração. Leva-me a crer que este seria deveras grande. Será que ainda o será? Pergunto-me também se aqueles belos olhos, banhados de oceano, ainda me deixarão navegar. Será que ainda terei a capacidade dos distinguir perante uma multidão de caras? Não imaginas o quanto te procuro. Não imaginas sequer a porção de medo em mim, o medo de nunca te encontrar. A minha vida sem ti é como um velho palheiro. Sinto-me a agulha que chora a tristeza de nunca ser encontrada, não tenho mãos, nem sequer pernas, pergunto como me conseguirei mexer para ir ao teu encontro. É como se lutasse por algo que nunca irei ter, sinto-me impotente nesta luta que devia ligar-me a ti e não fazer-me perder esperanças. O meu maior medo. O meu maior medo será um dia ver-te e não percecionar que és tu. Que tenho à minha frente o ser mais perfeito que alguma vez pisou e mereceu efetivamente pisar esta terra. Seria uma dor demasiado forte, saber que te poderia ter, como minha, e deixar-te escapar novamente. Não sei porque tudo foi tão rápido. Não sei por que razão a despedida venceu o adeus nessa corrida.
Lembro o contar de cada segundo, na ânsia da tua vinda. A vontade de descobrir esse sorriso rutilando com maior intensidade que o sol. Poder iluminar novamente a minha janela. Recordo cada palavra, que inocentes permutamos e hoje apenas posso delegar o vento da missão de os transportar a teu encontro. Não sei se a culpa de não colher nada vindo de ti, possa ser do vento. Gosto de acreditar que sim. Gosto de acreditar que cada palavra que proferes ao meu encontro se perde e alimenta o mundo de amor na sua passagem. Lembro-me de quando permanecia imóvel na minha janela, nas noites em que o sol parecia brilhar a tua janela e os clarões de luz me permitiam ver perante a vidraça. Lembro-me de matar várias noites acordado, com o intuito de ver tão harmonioso anjo dormir. Por vezes admitia que flutuavas, mas não o suficiente para vir ao meu encontro. Mas ver-te dormir era como sentir-te a meu lado, o teu respirar suave e a tua bela face, o descanso final da beleza. Podiam voar e dispersarem-se horas e horas, porque todo o tempo contigo parecia reduzir-se a míseros segundos, curtos e diminutos demais para usufruir por completo da sua extensão.
Com tua partida, por várias noites incriminei a vida. Culpei a força que insistia em repelir dois corações débeis. Dois corações que demandavam interligarem suas artérias para um funcionamento em pleno, numa só palavra – amor. Rasguei as folhas mentais que tendiam a culpar o teu criador. Intentei não cuidar como seria, se tudo o que não foi, simplesmente fosse. Culpei somente a vida, de uma culpa que não lhe poderia ser facultada. Fui injusto com ela, mas seria mais injusto comigo próprio se te magoasse a ti. Lembro-me de um dia te ter escrito algo, que o vento encarregou de fazer escutar ao teu ouvido, algo como isto:

“Poderia passar o mundo a deliciar-me nas linhas do céu, mas o mundo é efémero, o céu é infinito e o meu mundo és tu. Podia então rasgar um pouco do céu para te mostrar meu mundo que ele não é tão grande como tu. Poderia ainda rasgar um pouco de mim para te oferecer, mas nunca rasgar o meu mundo para oferecer ao céu.”

Ao ouvires tamanho sentimento, recordo a imagem mais bela que algum dia estes olhos presenciaram. Esse mar belo que teus olhos conserva, fez cair uma pequena gota. Uma simples gota que criou uma cascata de sentimentos onde as palavras se mostram insuficientes para descrever. Desde então venero as cascatas, porque acredito que eles só existem porque um dia o mar chorou. O mar mostrou que é possível circular o sentimento e não aprisionar tamanha força num espaço tão diminuto. Desde então acredito que parte de ti ganha vida em cada gota, ganha vida em cada rio ou poça onde tropeço, ganha vida na água que bebo e mais importante ainda, na água que me mantêm vivo. Por várias noites chorei em vão, confiando que te podia fazer viver numa lágrima. Que te podia ver correr no meu rosto e desaguar no meu coração. Mas isso não sucedeu. Percebi assim que nada iguala tão belo mar, tão bela cor e tão inocentes olhos. Percebi que a cascata que um dia vi cair, hoje já não caí, porque a nuvem que trouxe a chuva já não está próxima dessa cascata e toda a água acabou por secar, perdurando apenas gotas, as gotas que procuro, as gotas que me levam a ti. Mas se algo não morre em mim, tem o nome de esperança. O rio sempre correu para o mar. As gotas sempre formaram uma poça. Hoje estou convicto que se seguir o seu rumo encontrarei finalmente o mar. O mais azul. Aquele que preservas puro, dentro dos teus olhos. Aquele onde pretendo mergulhar, mesmo não sabendo como o faça, onde não tenho medo de me afogar, sabendo que um amor assim não passa.

“Sei que me amparas, que não me deixas perder nos remoinhos desse mar, sei também que me amas e que nunca me deixarias afogar. Sei que tudo o que tinhas, tu me deste e eu te dei, sabia outrora tanta coisa, que hoje confesso, já não sei. Sabia que te amo e como promessa sempre amarei, sabia que me amavas, como partiste já não sei. Apenas sei como te quero, e como é grande a vontade de te encontrar, apenas eu sei como desespero, nas noites que passo só, sem te olhar.”


Hoje sem o amor desmedido que nos cegava vejo como tudo se emaranhava à nossa volta. Via como todo o mundo competia para separar o que havia nascido para estar junto. Via como algo tão exequível e fácil, ganhava contornos vastos e tudo se complicava ao ponto de ser insustentável. O que separava tão semelhantes mundos e teimava a matar o sentimento, nada mais era que, uma rivalidade na qual não participava-mos ou fazia-mos parte, mas a qual nos incluía e usava como trunfo nas guerras consecutivas. Nenhum de nós compreendia tal guerra, nenhum de nós queria fazer parte das mesma e nenhum de nós conseguia ver o seu fim, que simbolizaria o nosso ponto de partida. Algo que já tinha começado, mas que só por entre janelas se partilhava, só de janelas se via e só nas janelas se sentia. Nossos pais há décadas que mantinham uma relação distante, funcionavam como dois polos de um velho íman, que se repeliam pelas suas semelhanças. A convivência entre ambos era quase nula e consequentemente e como vizinhos, a minha com aquela pequena flor tornava-se um ato de sorte. Nunca sequer entrei no seu jardim, por mais que pretendesse regar aquela pequena flor de todo o meu amor, todo o esforço era em vão. Nada podia fazer para combater tamanha força. Éramos ingénuos, simples crianças apenas. Tenho pena de não ter maturidade suficiente para te socorrer desse castelo e te libertar para sempre de um mal que nenhum de nós cometeu. Quem me dera poder fugir contigo. Quem me dera ao menos saber porque razão partiste e porque não me incluíste no teu plano de fuga.
Desde crianças que o único contacto entre nós se processava de janela para janela das nossas casas. Descobrimos como é viver assim. Depois de vários esforços falhados de um possível encontro ou um simples contacto, aprendemos a viver com a ideia de que os nossos mundos apenas se poderiam cruzar por detrás daquelas janelas. Não imaginas no teu cérebro brilhante, o quando eu te queria abraçar. O quanto eu queria poder voar e ir ao teu encontro, mesmo sabendo que isso era impossível e que ia para além dos meus limites. Estávamos limitados, por esta luta que nos afastava e que conduziu ao nosso final. O final onde te perdi. Quando os nossos pais desvendaram o nosso mundo, tudo terminou. Deixei de te ver à janela. Deixei de te ver por completo. Até ao dia em que o meu mundo cessou, o dia em que partiste. O dia em que tive efetivamente a certeza que nunca mais te viria, mesmo não querendo acreditar nisso. Por mais que o tempo passe, ainda te procuro. Por mais que o tempo passe, nunca irá passar de mim a ideia de que um amor assim só se tem uma vez. Eu tive-te uma vez, e se acredito no amor é porque existes. Se existes farei tudo para te encontrar, e peço ajuda ao vento para te levar esta promessa “Vou lutar pelo nosso amor”.

 
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Vigilante
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1886
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