Poemas : 

VISITAÇÃO

 
Tags:  De fina palavra  
 
Volto, às vezes, à serenidade do teu sono.
Não me vês -
fico a ver-te dormir
na escuridão que prolongo além das minhas vestes
e adivinho-te a entrega dócil
ao resvalar da noite já morrente.

O dia acorda devagarinho, sem que suspeites.
É a minha hora, o meu sinal –
as tuas pálpebras não sabem, mas são reposteiros
que dão para o vestíbulo donde te espio
como ave de rapina ao frio madrugar da luz.

O teu corpo desatento espraia-se
alongando o vício do meu prazer.

De súbito, antes que os teus olhos me vejam
escura e funda
o ar frio que transporto
penetra no teu peito despreparado e tenro.

Fissuras abrem-se, engolindo a luz por que acordaste
e, lá fora, um pássaro indistinto
procura o espinho sublimante
do canto que há-de ser.

Os teus cílios agitam-se, como asas condenadas
a tua pele escuta
o teu coração aperta o medo que lhe vem nas veias:

“Será saudade, será tristeza?...”

perguntas-te, à mercê de mim
incógnita e negra
sub-reptícia e alastrante.

“És tu, saudade...?”

perguntas baixinho
estendendo a mão como quem precisa
de um colo de mãe.

E eu não te abraço, só finjo sorrir.

“És tu, tristeza...?”

pedem os teus lábios aos teus olhos secos
como quem estranha os pântanos de sempre.

E eu só avivo a sede que te mata.

Aperto mais um pouco, em gozo de fel
aproximo a Dor, cubro a tua pele

Limpo-te o suor, retraio os meus véus
e nos teus olhos mudos tremem mares e céus
_

“Eu sou a Angústia”
digo-te ao ouvido.

E o dia lá fora
morre com o pássaro
num mesmo gemido.



Teresa Teixeira


 
Autor
Sterea
Autor
 
Texto
Data
Leituras
1697
Favoritos
1
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
11 pontos
1
1
1
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
Tonton
Publicado: 27/02/2017 20:56  Atualizado: 27/02/2017 20:56
Colaborador
Usuário desde: 13/09/2016
Localidade:
Mensagens: 612
 Re: Angústia
lindo