Poemas : 

copo de três

 
 
antes a pés do que a sapatos. porque doce, não azeda, alcooliza. no devido ponto de fermentação, esmagada, esfolada, do calcanhar ao quinto dedo, inicia a metamorfose, sorte de crisálida a borboleta. idade curta até uma boca cheia de sede. no lagar convém manter o espírito aceso. seja a uva que no cacho ganhou sol, mas também frio e chuva; ou o rio que ganhou chuva, mas também o calor do sol, o vento que seca, o silêncio. já nem falo do Homem. quanto ferro e fogo enterro no jogo de perder e perder. sorrisos, beijos, carícias, a canção de embalar da mãe, ou do pai. tempo. nos dias cinza a fome, a violência do chão, do soco sem mão. mas o ter ganha sempre. a mesa inclina. sem medo, sem batota com batoteiros acotovelados, de esperto armados. algures o amor e a ferida, é um ter mais e um menos ter. completa e complica a poda da videira. da simples, mas bela asneira que é a vida. a sapatos, nunca.


Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.

Eugénio de Andrade

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Autor
Rogério Beça
 
Texto
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 07/12/2019 21:01  Atualizado: 07/12/2019 21:01
 Re: copo de três
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Certamente um dos melhores textos que já escreveste, a todos os níveis: emocional, estrutural, imagético, prosódico...
Muita técnica e muita intensidade.
Parabéns, caro irmão de letras.