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Vendedor de sonhos

 
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Era bom ligar as coisas pelas pontas,
Imagina assim,
Eu era um vendedor de roupa usada,
Daquela feia,
Que ninguém quer e só a maledicência nos leva a aproximar,...

Tu ias querer um vestido sem cor,
De uma transparência mediamente reveladora,
Que custasse barato,
Eu aproximava-me para dizer que o que vendia eram realmente sonhos,
Que poderiam agradar-te pois também eram diáfanos,
Quase opacos,...

Chegávamos a um consenso,
E levavas para casa um sonho de cordas,
Com muitas pontas soltas e desfiadas,
Que de ti iriam exigir uma dedicação extrema,
E quase literária,...

Não te cobraria nada,
Pois sei que amanhã estarás nessa mesma esquina,
Necessitada de luz com música

 
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pleonasmo
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Enviado por Tópico
Rogério Beça
Publicado: 02/05/2020 05:45  Atualizado: 02/05/2020 05:45
Usuário desde: 06/11/2007
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 Re: Vendedor de sonhos
Mascarada de suposições e imaginadas interacções este poema tem uma força bem intensa.
Os dois primeiros versos colocam o sujeito poético a exercer a profissão desde a primeira palavra.
Há sonhos que são puro desejo, imaginação.
E depois de intentar "...ligar (verbo complicadinho) as coisas pelas pontas..." o leitor já está a pensar que pontas serão, se o princípio e o fim, se o meio também conta, se o meio com outro meio...
Depois há que imaginar e ser guiado pelo dito sujeito.
E aqui a fantasia começa com uma dramatização idealizada. Há uma personagem central que tem o nome apropriado de “...tu...”.
Vem-me à ideia a feira da ladra.
A primeira imagem pretendida foi bem passada. Um pouco com a ideia das feiras, em que o senhor cigano vende tangas com preços verdadeiros. Mas um vendedor, assumidamente, de roupas improváveis. O “...feias...” dá-lhe um picante que conquista um leitor mais romântico.
A diferença entre a meia transparência e a meia opacidade deixou-me um sorriso.
Sendo que, alguém que vai comprar vestidos, vir de lá com sonhos, já é pedir muito. Um bocado à cigano, convenhamos.
Mas o que é este vestir? Será a peça sobre peça de roupa que nos cobre? E já agora, porque damos tanto valor ao estilo e às cores? Procuraremos identidade, ou conforto?
O “tu” tem um gosto simples no plano. Transparência quanto baste e não gastar rios de dinheiro nessas coisas. Gosto. O meu estilo de “...tu..”.
O consenso é o esperado, mas essa dedicação de que o sujeito poético fala, estabelece uma relação de vendedor-comprador que parece inverter um pouco os papéis.
E as pontas do início, voltam no fim e quase pode haver um momento sensual se levarmos demasiado à letra o poema e imaginarmos um “...tu..” por aí vestida de cordas...
Numa esquina, outro nome para verso...

Eu gosto de me perder em poemas. Este é uma perdição.
Por este e por outros, tenho tido um prazer acrescido de ultimamente vir a este nosso site.
Cheira a poesia por aqui ultimamente.
Grandes aparições, como a tua, bons regressos, alguns bem inesperados.
Se este site fosse uma rede social, ia por um gosto.
Só espero que isto não passe com o fim do confinamento....
Abraço