Textos : 

Terça-feira, 02 de abril de 2024

 
Terça-feira, 02 de abril
Aguardando a vez na sala de espera da Oftalmocentro da Cohab, desde as seis e quarenta da manhã, chamam todas, menos a minha senha PCP2 e meus pés doem dentro dos sapatos, principalmente o esquerdo que a unha do dedão caíra. Para passar o tempo li o final de “Senhora Dona do Baile” com o casal Amado expulso de Paris e resolvo alguns sudokus.
Uma hora depois finalmente chamam a minha senha e direcionam-me para o segundo andar. Entro no elevador com um casal de idosos e aperto o dois. Pouco movimento. Seu Jo, meu parceiro da Vila foi recolado para dia 13, mas não ficou brabo se resignou. Entreguei as xeroxs a enfermeira, que os folheou um por um e vetou o de sangue:
- O sr. Vai ter de refazer esse exame. A validade é de seis meses, e está quase uma ano – Imprimiu-me um encaminhamento e entregou-me juntos com os exames – Quando o senhor tiver o resultado, volte aqui e marcaremos a cirurgia – Sem mais nada a objetar, envelopei-os e desci no mesmo elevador.
O pé esquerdo doía-me barbaridade e manquejando arrastei-me até a parada em frente ao Mateus da Cohab, onde encontrei um velho conhecido do Desterro, Pedro Fuzil, irmão do finado Capão que descia de um ônibus – Embarquei num fresquinho UEMA_IPASE e desci próximo a Biblioteca da Deodoro. Devolvi os livros e apanhei dois – a biografia da grande diva Maria Callas, ex-exposa de Onassis, antes de Jackie Kennedy e mais uma da senhora Jorge Amado “Um Chapéu para viagem”. Passei num laboratório e inteira-me do preço do exame;
- Setenta e sete reais, senhor! – informou-me um pixixitinha.
- Ok, baby! – e sai para a parada apanhando um 314 e começando a devorar a biografia da diva grega que encantou o mundo lírico no século passado.
Na pensão bebeu um cafe com pão e as onze e quinze saiu para o périplo pelo mercado ou seja ao Comercial Vila de seu mestre e comandante La Sierra entornar umas dositas antes do almoço. Uma boa galinha frita com toicinho defumado e azeite de óleo babaçu que comprou fiado no brabo do Mazico. Fechou nas dez listas no caderno de Mestre La Sierra –

Meia-noite de quinta-feira, 04
Um friozinho de 26 graus. Uma boa leitura com Dona Zelia nos levando a intimidade com o mestre Jorge Amado em 1946 – inicio do grande romance. Muito bom saber que eles leram os mesmos escritores que tanto admiro e os possuo na minha humilde ‘biblioteca’.
Depois que emborquei tudo por goela baixo, almocei a minha adorável gororoba e apaguei a tarde toda, despertando a noite. Um silencio sepulcral sobre a Vila Embratel, apenas os zunidos dos mosquitos e de alguns grilos apaixonados.
Manhã
- Tá mijando ai no balde! – Gritou o barbeiro Costa para espantar Peter, o cão de Avelino que preparava-se para o evento na calçada da oficina, na saída acompanhando o dono e sua parceira Aminata.
Avelino foi demitido na terça, após faltar na segunda, alegando sentir-se mal devido a pontada de faca na boca do abdômen desferida pelo seu parceiro T., a sorte que a faquinha de serra estava cega.
Nessa manhã de sol siberiano, ele e Clay agilizam um ‘corre’ que pode tira-lo da lisura – a intermediação da venda de uma caixa d’agua. Primeiro levar a mesa ou melhor devolve-la a sua ex que lhe prometeu dez reais. Clay arranjou-lhe um carro de mão.
Uma triste noticia lhe aguardava na pensão. A morte de ume velho amigo de adolescência do Desterro; Alexander Rudakov ambos da mesma idade – ele agente policial e parceiro intermináveis de álcool no casarão da travessa Feliz. O infeliz vinha sofrendo dos rins obrigando-o a fazer hemodiálise. Um bom parceiro – lamentou o poeta. O pai era russo da Siberia. Estava a caminho de Nova York e o navio procedendo de Buenos Aires deu problema. Desembarcou para se encantar com a bela Dona Tereza e com ela ter três filhos e um prédio colonial a travessa Feliz no bairro do Desterro.
Depois das doses, seu La Sierra preparou seu copo para viaje – uma galinha o esperava temperada com toicinho defumado e azeite de coco babaçu – no radio do comercial, Fred Mercury cantava, enquanto seu La Sierra saia para trocar e dar o troco para o poeta:
- Galileo! Galileo! – fazia o coro o resto do Queens e Juvan Senior pagou-lhe uma dose. Seu Riba Fodinha malhado desceu para o lar sem falar com ninguém, tirou um bode pesado na viela do mercado..
Na pensão requentou os últimos resquícios da galinha e acrescentou o pato cozido de domingo. Depois do banho voltou aos seus aposentos e a prima dona Maria Callas que começar o affair com arquibilionário da época Aristóteles Onassis, antes dele se casar com a viúva de Kennedy, a bela Jackie.
- Treze e vinte e seis – anuncia Domingo Ribeiro na ultima AM do estado. Vai almoçar e depois bodar como sempre.

Sabado, 06
Antes das seis da manhã, mesmo enjoadinho, li as ultimas e saudosas paginas do belo livro da sra. Gattai – “Um Chapeu para Viagem” – partindo num navio com o filho recém nascido para a Italia reencontrar o seu amado Amado – uns dias antes a policia invadira o sitio deles e confiscaram alguns objetos, inclusivo algumas galinhas.
Depois do meio- dia – a segunda dpose é entornada num gole só a moda russa – bebera as duas, graças a benevolência do velho parceiro Natty Roots que lhe dera dois reais, assim que saia da barbaria vizinha e encontrara com o poeta em pé na porta da oficina.
- E ai vamos molhar a garganta? – perguntou o prestimoso Natty e com o beiço apontou na direção para a quitanda de Pére Cardin mais baixo.
- Não, lá não tem o que gosto – desculpou-se – Não, tem vodka.
- E quanto é?
- Qualquer dois reais serve.
O pixixitinho meteu a mão no bolso dianteiro da bermuda e tirou um bolo amarfanhado de cédulas, o troco do corte do cabelo, catou uma cédula de dois reais e deu-lhe:
- Pronto, tome a sua dose – e foi embora subindo a ladeira no sentido da rotatória.
Sr. Com rapidamente colocou os trens para dentro e fechou o atelier. Antes de ir para a pensão bebeu uma no Comercial Vila e deixou paga a outra, voltando meia-hora depois -antes viu um trailer do filme Medea de Pasolini com a grande Callas – um fracasso comercial, assim como os livros do poeta que não vendem nada. Coitado!
No bar de Deco, uma mesa florida de buenas personas – capitaneada pelo Prof. Val e o radialista Calorzinho. Uma senhora do mocotó que montou sua banca provisória na calçada de Seu Biné serve a galera. E o poeta com a fome corroendo suas entranhas vazias observa com inveja.
Derruba a terceira e acrescentou mais um risco no papelote de la Sierra. Onassis casa com Jackie deixando Callas numa depressão profunda. Um velho Kadett da GM azul metálico bem conservado estacionado em frente ao restaurante de Cibabá. A quarta dose e mais um riscado e o poeta resolve se recolher.
A pixixitinha dar um grau no banheiro da pensão sob o restrito olhar da Sra. Vince que não está nos seus dias. Os gatos urinaram na cara de Dostoievski, não respeitaram nem o grande mestre, a vontade do poeta foi de esgana-los – mas a ‘mãe” intercedeu alegando inocência de seus felinos – “Eles não tem juízo, nem tu também não tem”.

 
Autor
efemero25
Autor
 
Texto
Data
Leituras
24
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
0 pontos
0
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.