Toda Quinta-Feira, o Louco

 
Garrafa d'água na mão,
o vidro pesa menos que o tempo.
Deslizo entre os que sussurram ao nada,
os que lançam pedras às próprias sombras,
como quem joga migalhas ao destino.

Aquele que recita em calçadas vazias
carrega um sol gasto no bolso
e um poema no frio.
As mãos falam antes da boca,
os olhos viajam antes dos passos.
O louco—não, o poeta
lança palavras em poças d’água,
espera que virem estrelas antes de secarem.

Amo olhar,
olhar dentro do olhar que não ama,
nada amando tudo,
tudo despedaçado na borda do delírio.

Há beleza nos que não pertencem.
Na linha trêmula do queixo, um verso incompleto.
No descompasso do riso, um segredo inalcançável.
E eu, sempre ali,
toda quinta-feira,
sentada no vórtice entre o real e o impossível,
lucidez e vento,
deixando que me veja sem saber que é visto.

E se um dia ele parasse?
Se pousasse os olhos no vazio e nada dissesse?
Talvez o mundo inteiro desmoronasse
num silêncio maior que qualquer poema.
 
Toda Quinta-Feira, o Louco

É QUINTA-FEIRA....

 
Quinta-feira...
Aula de Esportes... Futebol na quadra.
Jovens maravilhosos, canalizando diversos sentimentos naquela atividade.
Cada um, trazendo sua dor... sua alegria...
Esse turbilhão de emoções que existe no coração dos jovens.
Um futebol maravilhoso!
Eram crianças grandes, correndo atrás da bola!!
E havia uma admirável criança... PEDRO.
Criança?
Sim... Um generoso coração de criança.
Nossa! Que coração!
Gosto muito de observá-los quando atuam...
Seus comportamentos, socialização, o “viver” em grupo.
Mas, devo confessar que adorava vê-lo jogar.
Havia sempre um carinho para mim, guardado em sua “manga”.
Não posso traduzir a generosidade desse garoto...
Não consigo traduzir o meu afeto por este garoto.
Mas posso traduzir a imensa gratidão a Deus...
Por ele ter passado em minha vida profissional...
E ter-me ensinado, tantas vezes, a ser uma pessoa melhor.
Exercitando minha paciência...
Ensinando-me que o carinho transpõe qualquer sentimento ruim.
Aliás... Nunca consegui ficar “brava” verdadeiramente com ele.
Nenhum de nós...
Porque ele sempre fazia uma excelente reflexão sobre seus atos.
E sempre os reconstruía... com muita humildade, decência, reconhecimento... Isto o traduz.
Muitas vezes, mais educador do que eu.
Sempre defendendo, intercedendo por seus amigos...
Eu costumava dizer pra ele que poderia ser um excelente advogado!!
E ele dizia: “Quem sabe, ‘né’, professora?!!”
Quinta-feira... Quadra... Futebol...
Ele fez um gol para mim...
E gritou meu nome, bem alto!!
Braços abertos... e presenteou-me.
Seu grito... ficará ecoando em meu coração.
Nas árvores, em volta daquele campo.
Nas gavetas de minha memória.
Tenho, hoje, mais um degrau abaixo de minha trajetória profissional.
Mais um aprendizado... e uma enorme perda.
Porque, PEDRO, você me foi um grande desafio...
Ensinou-me muito.
E, fundamentalmente, mostrou-me que vale a pena SIM...
Continuar acreditando no ser humano como protagonista de suas ações.
Porque você evoluiu muito enquanto ser humano, PEDRO.
Evoluiu, espalhou amor... e partiu.
Até um dia, filho.
Deus esteja contigo.
(HOMENAGEM PÓSTUMA A UM EDUCANDO QUE PERDÍ PARA A SOCIEDADE)

Karla Mello
Junho/2009
 
É QUINTA-FEIRA....

Quinta-Feira Santa (William Blake)

 
Quinta-Feira Santa (William Blake)
 
É coisa santa de se ver,
Em terra fértil e opulenta,
Deixar na miséria um bebê,
Nutrido por mão avarenta?

Este grito é uma canção?
Será ela de alegria?
E tantas crianças pobres?
É uma terra de indigência!

E seu sol nunca tem brilho.
Seus campos secos, desertos
Seus caminhos, com espinhos
E lá é um eterno inverno.

Pois onde quer que o sol brilhe
Onde quer que a chuva assente:
Bebês não podem passar fome
Nem miséria assustar a mente.

William Blake (1757-1827), poeta e artista plástico inglês.

Imagens: Uma criança africana e outra das Ilhas Salomão (cabelos loiros, traço genético característico da ilha).
 
Quinta-Feira Santa (William Blake)

Quinta-Feira da Paixão

 
Esta noite é mais longa do que as outras
É uma noite mais fria do que todas
Nunca uma noite foi tão estranha
Como esta de que falam nossas bocas!

Esta noite cheira a ódios sem destino
É a noite que mergulha o mundo em solidão
E há sombras a espreitar em cada esquina
Com vontade de prender um coração!

Esta noite tudo é podre nos olhares
Só há trevas nos gestos e nos corpos
É a noite que jamais terá retorno
Porque prende na tumba os seus mortos!

Esta é a noite em que o Senhor é manietado
Preso com grilhões de um pé à outra mão!
Que estranha noite é esta cheia de punhais?!
É a noite de Quinta-Feira da Paixão!!!
 
Quinta-Feira da Paixão

Quinta-feira, 13/11/25

 
Quinta-feira, 13
O melhor mesmo ocorrera no final da tarde de ontem, a descoberta de que seu amigo e mentor literário está no IA (inteligência artificial) do chatgpt -Fazendo uma pesquisa, digitou aleatoriamente “Quem é Raimundo Nonato Rodrigues – escritor maranhense?” e para sua grata boa surpresa – na tela surgira a foto icônica de um barbudo, de cabelos brancos e uma camisa vermelha e os dados biográficos mais embaixo e sua bibliografia com uma analise deles.. Poxa, cara o Sr. Com foi as alturas e a muito custo custou a descer. Caramba era o reconhecimento do seu amigo como escritor, coisa que nem ele mesmo admitia – “não sou escritor apenas escrevo”.
Dois ovos cozidos, dois tomates cortados em rodelas, meio-copo de farinha, sal a gosto – vinagre ou limão – ovo pode ser substituído pela sardinha ou salsicha – a nova dieta de LaSierra – O poeta zerou a conta do compadre e trouxe um copo quase cheio de vodka. O poeta pegou oito comprimidos de dipironas no Pai Cardin, aumentando a conta.
Friday, 14 – falta 45 dias para terminar o ano.
O poeta dormiu bem, sem interrupções, acordando pontualmente as cinco da manhã, no exato momento que começava o programa “Acorde Maranhão” apresentado pelo ex-vereador Marcial Lima. A porta da rua destrambelho de vez e o trinco travou – não abria e nem fechava – obrigando a Sra. Vince levantar-se puta da vida para abri-la. As goiabas maduras caem. A vodka com gosto de cachaça a desconfiança.
 
Quinta-feira, 13/11/25

quinta-feira.

 
queria construir uma balança onde equilibrar o afecto. estou terrível, não sei onde parar a solidão, deixar morrer. falo para o vento, espero que te encontre hoje sentado em frente ao mar, talvez te leve as gaivotas um pouco para mais longe ou um pouco para mais perto, não sei já o peso do coração. tenho nos olhos a crescer sargaço, na pele das mãos urtigas. não sei como dar as mãos ao corpo, não sei como dar o corpo ao mar. hoje queria despedir-me de ti com um beijo, trago nos dentes um feriado por dizer, é quinta-feira e estou ainda em pânico. se me deixares talvez te constrúa um lugar novo, que não caiba no destino, onde acordar seja como abrir os braços ao vento e voar alto, sobre os penhascos, na copa das árvores em círculos, passar pelo tempo sem ele passar por mim. o resto, que não te disse hoje por não saber o que fazer, é esta vontade de te trazer para mais perto.
 
quinta-feira.

quinta-feira (continuação)

 
julgo ter sido feliz, agarrei na cabeça ao destino e espetei-a contra uma rocha, dessas tantas rochas por que passei hoje, enquanto tu escrevias uma carta ao teu ex amigo. as rochas falam de água e correm com ela rio abaixo, há uma ponte a cruzar o espaço, dois rostos conhecidos dentro dele. julgo ter sido feliz quando já dentro de água arrefeci a pele e a dor com ela. imaginei que estarias fechado num quarto, uma janela minúscula em frente a uma secretária onde ias agrafando palavras. gostava que estivesses dentro de água, esta doce, que visses como eu a cor das rochas, lá onde os pés não conseguiam chegar mesmo que impulsionasses o corpo. seria muito menos dolorosa esta passagem, do que essa onde ficas à espera das tuas gaivotas. tudo isto é breve como o vento e tu sabes que ventos me levam, mas tudo isto voltará como uma memória de um tempo onde julgo ter sido feliz.
 
quinta-feira (continuação)

QUINTA-FEIRA

 
QUINTA-FEIRA 21/05/2015

Hoje ainda é quinta,
cresce a ansiedade
na perspectiva
de uma certa liberdade.

Ainda é quinta-feira,
mas o amanhã virá
Amanhã terá,
eu já vejo.

Passeio de carro
um dia de sol
e muita cerveja.

E se esse amanhã
não vier.
Se chover.
Se o carro quebrar.
Se a cerveja esquentar.

Ai mesmo assim
não vou ser pessimista veja.
Vou a pé ao açougue
Comprar uma costelinha
Se não tiver dinheiro
Uma barriga
Coloca-la na cerveja,
para outro amanhã.

Não me esqueço
se houver esperança.
Amanhã é só um
adjunto adverbial
no tempo.

É só o tempo.
Sempre haverá
um outro amanhã.
Depois e depois
do amanhã.

Dante Locateli

http://naquelesegundo.blogspot.com.br/2015/05/quinta-feira.html
 
QUINTA-FEIRA

Quinta-feira, 06/11/25

 
Quinta-feira, 06/11/25
As três e meia da madruga acordou para urinar e ver as horas no relógio da sala de visita. A cadelinha preta dormia chumbada, convalescia de uma cirurgia feita por um veterinário a domicilio na sala do computador.
Dois sonhos encabulosos que lhe deixara atônito. Um foi com o filho, que embarca hoje para o interior do Pará trabalhar num frigorifico e outro foi com seu agente cultural que lhe falou algo incompreensível e lhe deu uma cédula de cinquenta reais.
Perdera o segundo 314 das cinco e meia e as seis horas apanhava o terceiro. As sete chegou na Clinica dos idosos na Cohab, pegando a senha 9 e agendou o exame de sangue e urina para o dia 24 próximo. Beleza. Na volta, aproveitando o embalo passou na Receita Federal e minutos depois saiu todo contente e satisfeito, resolvera o imbróglio – corrigira o nome da mãe. Agora correr atrás da segunda via da Certidão de Nascimento e depois o RG digital e assim esperar os 65 anos completos para dar entrada no BPC, se Deus assim quiser.
Meio-dia – Seu Pietro lava suas roupas, o cheiro infantil de terra molhada que emana do canteiro improvisado rente ao muro do fundo, aguado ainda pouco pela a Sra. Vince, que respira aliviada depois de encher tudo. Sr. Com ingeriu a última dipirona para combater a maldita ciática e lendo o Almanaque Abril 2012 deu uma boa aliviada nos intestinos. Louvado, quatro dias sem evacuar. Ontem comprou uma cartela de quatro pilhas no Comandante de La Sierra que voltou todo serelepe e promete seguir uma dieta rigorosa sem açúcar – diabético, amputaram o dedão de seu pé direito. O Sr. Vince com a pupila do olho esquerdo esbranquiçado como daquele personagem cego de Kung Fu – mestre Po. Pobre Sr. Vince. O poeta segue lendo Baudolino, mas levou Dashiel Hammett para ler na viagem. E ouve o velho Bob Dilan – No meio da tarde foi comprar os pães na padaria e preparou um sanduba com uns fígados da semana passada– mas receoso teme uma diarreia como da outra vez.
 
Quinta-feira, 06/11/25

Quinta-feira, 27 e Sexta, 28/11/2025

 
Quinta-feira, 27
Meia-noite e uns quebrados – merendei um bom cachorro frio com café e ouvindo os clássicos do rock-pop dos anos 80 na Jovem Pan e lendo na penumbra “Todos os homens do presidente”.
Manhã
A mulher do vestido preto com um rabão de tanajura saúda o poeta. Apolos e Seu Jojó teimando e divergindo – o segundo acha somente o seu ponto de vista é valido.
- Seu Apolos só fala besteira. Não sabe nada – e todas as manhãs bem cedo estão juntos na porta de seu Apolos.
A conta de energia da oficina veio zerada, mas tem as atrasadas dos anos anteriores. Pai Cardin sentou-se no seu lugar de sempre, na cadeira plástica ao lado de sua quitanda.
- É hora do cufé – disse o poeta para si, colocando o livro didático de português sobre o de filosofia e este encima do calhamaço de inglês. Apanhou a caneca ao lado e levantou-se – É hora do cufé – e saiu.
Depois do café, Juvan Senior apareceu e colocaram as conversas em dia. Um papo sobre os primórdios da vila Embratel e seus personagens. Ele e sua família, liderada pelo mestre Dudu migraram da baixada para tentar uma vida melhor na cidade. Combinaram que ele vai dar uma força na mudança talvez do poeta para o centro, para seu quarto.

Friday, 28
A casa e a quitanda de pai Cardin fechada. – O poeta estranhou, mas logo dissipou os maus pensamentos – Devem terem ido a consulta – pensou. Mas a verdade veio a tona através do pedreiro Marcio Pedra – Pai Cardin sentiu-se mal ontem a tarde e o levaram a UPA no carro de Nemnem, o dono do lava jato em frente.
Seu Bastos sentado a beira da calçada de costas para rua observando atentamente o pedreiro rebocando a marquise na fachada do seu comercio.
- Seu Costa! Seu Costa! – grita alguém na porta semi fechada da barbearia ao lado.
O pedreiro paraense MIlson passa apressado, mas saúda o poeta que lia embevecido “Momentos Culturais – uma misto de religiosidade e prazer na Vila de Icatu, Maranhão” – a segunda cidade do estado, dois anos depois da fundação de São Luís pelos franceses em 1612 .
- Agora sim, sim senhor, assim quer gosto – disse a Sra. Caraolho, que entristece ao vê-lo encharcando-se de vinho no Pai Cardin.
Dona Graça, a viúva e vizinha do lado limpa a lixeira com cara de poucos amigos.
- Bom dia! – Cumprimenta a Sra. Cinzay em companhia do emagrecido Jamanta, velho de guerra, de copos e garrafas.
- Bom dia! – disse sorridente a Sra. Raimundo Sanchez, mãe da grandona Jaíná do Alto do São Benedito.
- Oh! Barba branca! – cantarola o carroceiro Rafé debaixo de seu chapelão de palha sentado no varal da carroça carregada de tralhas, puxada pela sua égua branca.
Little Paul, filho do finado João Preto e suas sacolas vindo do serviço num dos condomínios da família Sarney na Península da Ponta D’areia.
Bruna e o marido saem e fecham a porta da casa de Pai Cardin. Ela é sua caçulinha.
O tempo encoberto. Quarta-feira passada não deu agua, as esperanças voltam-se para hoje. Segundo o jovem Ornildo, neto do pioneiro e finado seu Eriberto, foi um cano estourado na avenida.
Little Fat chegou da UPA, o pai ficou internado em observação, presume-se que foi começo de derrame. Um bom filho. O poeta aproveita e pega um refrigerante fiado e vai bebê-lo com os pães.
- Onde é o teu banheiro? Pergunta o pedreiro Seu Paulo, o factótum do mercado ao poeta.
- Vai no beco. – Indica
- Eu quero cagar – desabafa batendo na barriga com rosto aflito e escandindo as palavras.
- Então corra até o mercado – aconselhou o fulero do poeta que continuava impassível lendo “Todos os homens do Presidente”
A gostosa da Glaus, sobrinha de Pai Cardin destilava sua sensualidade e seu charme sedutor lavando as cadeiras, deixando a mostra o seu belo par de rabos. Colhão, bebericando vai as nuvens. – Dá-lhe Colhão!- grita o fulero do poeta em pé na porta da oficina.
Começo da tarde
Inicio do pânico na Pensão Vince, nada de água e tudo seco. Antes do meio-dia digitou “Quarta-feira...” O sr. Vince um pouco chapado trouxe seu bandeco do Cibagoga, o mesmo que abastece o Comandante Lasierra com os dois ovos cozidos por dia. O poeta extrapolou a sua média alcoólica, umas doses a mais e ainda quarteto caseiro que emborcou num gole só e deitou-se. Cochilou um pouco, no começo do Jornal Hoje acordou e foi preparar o seu prato – arroz, feijão, caldo de galinha e o mexido de linguiça e camarão seco, sobras de ontem.
Noite – Para felicidade geral de todos a agua chegou no finalzinho da tarde, quando todos estavam sem esperança. Foi Ornildo, o vizinho e neto de Seu Eriberto que veio avisar:
- A água chegou – gritou do terraço. Todos na pensão deram urras e agradeceram a ele.
Existe um trato não escrito que um avisa o outro. A boa e velha politica da boa vizinhança.
Ler o poeta Nauro Machado é como uma viagem intestina ao espelho da existencia poetica. E o poeta renasce em seus versos e o incentiva a assumi o seu lado bardo.
 
Quinta-feira, 27 e Sexta, 28/11/2025