quinta-feira.
queria construir uma balança onde equilibrar o afecto. estou terrível, não sei onde parar a solidão, deixar morrer. falo para o vento, espero que te encontre hoje sentado em frente ao mar, talvez te leve as gaivotas um pouco para mais longe ou um pouco para mais perto, não sei já o peso do coração. tenho nos olhos a crescer sargaço, na pele das mãos urtigas. não sei como dar as mãos ao corpo, não sei como dar o corpo ao mar. hoje queria despedir-me de ti com um beijo, trago nos dentes um feriado por dizer, é quinta-feira e estou ainda em pânico. se me deixares talvez te constrúa um lugar novo, que não caiba no destino, onde acordar seja como abrir os braços ao vento e voar alto, sobre os penhascos, na copa das árvores em círculos, passar pelo tempo sem ele passar por mim. o resto, que não te disse hoje por não saber o que fazer, é esta vontade de te trazer para mais perto.
quinta-feira (continuação)
julgo ter sido feliz, agarrei na cabeça ao destino e espetei-a contra uma rocha, dessas tantas rochas por que passei hoje, enquanto tu escrevias uma carta ao teu ex amigo. as rochas falam de água e correm com ela rio abaixo, há uma ponte a cruzar o espaço, dois rostos conhecidos dentro dele. julgo ter sido feliz quando já dentro de água arrefeci a pele e a dor com ela. imaginei que estarias fechado num quarto, uma janela minúscula em frente a uma secretária onde ias agrafando palavras. gostava que estivesses dentro de água, esta doce, que visses como eu a cor das rochas, lá onde os pés não conseguiam chegar mesmo que impulsionasses o corpo. seria muito menos dolorosa esta passagem, do que essa onde ficas à espera das tuas gaivotas. tudo isto é breve como o vento e tu sabes que ventos me levam, mas tudo isto voltará como uma memória de um tempo onde julgo ter sido feliz.
QUINTA-FEIRA
QUINTA-FEIRA 21/05/2015
Hoje ainda é quinta,
cresce a ansiedade
na perspectiva
de uma certa liberdade.
Ainda é quinta-feira,
mas o amanhã virá
Amanhã terá,
eu já vejo.
Passeio de carro
um dia de sol
e muita cerveja.
E se esse amanhã
não vier.
Se chover.
Se o carro quebrar.
Se a cerveja esquentar.
Ai mesmo assim
não vou ser pessimista veja.
Vou a pé ao açougue
Comprar uma costelinha
Se não tiver dinheiro
Uma barriga
Coloca-la na cerveja,
para outro amanhã.
Não me esqueço
se houver esperança.
Amanhã é só um
adjunto adverbial
no tempo.
É só o tempo.
Sempre haverá
um outro amanhã.
Depois e depois
do amanhã.
Dante Locateli
http://naquelesegundo.blogspot.com.br/2015/05/quinta-feira.html
Quinta-feira, 06/11/25
Quinta-feira, 06/11/25
As três e meia da madruga acordou para urinar e ver as horas no relógio da sala de visita. A cadelinha preta dormia chumbada, convalescia de uma cirurgia feita por um veterinário a domicilio na sala do computador.
Dois sonhos encabulosos que lhe deixara atônito. Um foi com o filho, que embarca hoje para o interior do Pará trabalhar num frigorifico e outro foi com seu agente cultural que lhe falou algo incompreensível e lhe deu uma cédula de cinquenta reais.
Perdera o segundo 314 das cinco e meia e as seis horas apanhava o terceiro. As sete chegou na Clinica dos idosos na Cohab, pegando a senha 9 e agendou o exame de sangue e urina para o dia 24 próximo. Beleza. Na volta, aproveitando o embalo passou na Receita Federal e minutos depois saiu todo contente e satisfeito, resolvera o imbróglio – corrigira o nome da mãe. Agora correr atrás da segunda via da Certidão de Nascimento e depois o RG digital e assim esperar os 65 anos completos para dar entrada no BPC, se Deus assim quiser.
Meio-dia – Seu Pietro lava suas roupas, o cheiro infantil de terra molhada que emana do canteiro improvisado rente ao muro do fundo, aguado ainda pouco pela a Sra. Vince, que respira aliviada depois de encher tudo. Sr. Com ingeriu a última dipirona para combater a maldita ciática e lendo o Almanaque Abril 2012 deu uma boa aliviada nos intestinos. Louvado, quatro dias sem evacuar. Ontem comprou uma cartela de quatro pilhas no Comandante de La Sierra que voltou todo serelepe e promete seguir uma dieta rigorosa sem açúcar – diabético, amputaram o dedão de seu pé direito. O Sr. Vince com a pupila do olho esquerdo esbranquiçado como daquele personagem cego de Kung Fu – mestre Po. Pobre Sr. Vince. O poeta segue lendo Baudolino, mas levou Dashiel Hammett para ler na viagem. E ouve o velho Bob Dilan – No meio da tarde foi comprar os pães na padaria e preparou um sanduba com uns fígados da semana passada– mas receoso teme uma diarreia como da outra vez.
Quinta-feira, 27 e Sexta, 28/11/2025
Quinta-feira, 27
Meia-noite e uns quebrados – merendei um bom cachorro frio com café e ouvindo os clássicos do rock-pop dos anos 80 na Jovem Pan e lendo na penumbra “Todos os homens do presidente”.
Manhã
A mulher do vestido preto com um rabão de tanajura saúda o poeta. Apolos e Seu Jojó teimando e divergindo – o segundo acha somente o seu ponto de vista é valido.
- Seu Apolos só fala besteira. Não sabe nada – e todas as manhãs bem cedo estão juntos na porta de seu Apolos.
A conta de energia da oficina veio zerada, mas tem as atrasadas dos anos anteriores. Pai Cardin sentou-se no seu lugar de sempre, na cadeira plástica ao lado de sua quitanda.
- É hora do cufé – disse o poeta para si, colocando o livro didático de português sobre o de filosofia e este encima do calhamaço de inglês. Apanhou a caneca ao lado e levantou-se – É hora do cufé – e saiu.
Depois do café, Juvan Senior apareceu e colocaram as conversas em dia. Um papo sobre os primórdios da vila Embratel e seus personagens. Ele e sua família, liderada pelo mestre Dudu migraram da baixada para tentar uma vida melhor na cidade. Combinaram que ele vai dar uma força na mudança talvez do poeta para o centro, para seu quarto.
Friday, 28
A casa e a quitanda de pai Cardin fechada. – O poeta estranhou, mas logo dissipou os maus pensamentos – Devem terem ido a consulta – pensou. Mas a verdade veio a tona através do pedreiro Marcio Pedra – Pai Cardin sentiu-se mal ontem a tarde e o levaram a UPA no carro de Nemnem, o dono do lava jato em frente.
Seu Bastos sentado a beira da calçada de costas para rua observando atentamente o pedreiro rebocando a marquise na fachada do seu comercio.
- Seu Costa! Seu Costa! – grita alguém na porta semi fechada da barbearia ao lado.
O pedreiro paraense MIlson passa apressado, mas saúda o poeta que lia embevecido “Momentos Culturais – uma misto de religiosidade e prazer na Vila de Icatu, Maranhão” – a segunda cidade do estado, dois anos depois da fundação de São Luís pelos franceses em 1612 .
- Agora sim, sim senhor, assim quer gosto – disse a Sra. Caraolho, que entristece ao vê-lo encharcando-se de vinho no Pai Cardin.
Dona Graça, a viúva e vizinha do lado limpa a lixeira com cara de poucos amigos.
- Bom dia! – Cumprimenta a Sra. Cinzay em companhia do emagrecido Jamanta, velho de guerra, de copos e garrafas.
- Bom dia! – disse sorridente a Sra. Raimundo Sanchez, mãe da grandona Jaíná do Alto do São Benedito.
- Oh! Barba branca! – cantarola o carroceiro Rafé debaixo de seu chapelão de palha sentado no varal da carroça carregada de tralhas, puxada pela sua égua branca.
Little Paul, filho do finado João Preto e suas sacolas vindo do serviço num dos condomínios da família Sarney na Península da Ponta D’areia.
Bruna e o marido saem e fecham a porta da casa de Pai Cardin. Ela é sua caçulinha.
O tempo encoberto. Quarta-feira passada não deu agua, as esperanças voltam-se para hoje. Segundo o jovem Ornildo, neto do pioneiro e finado seu Eriberto, foi um cano estourado na avenida.
Little Fat chegou da UPA, o pai ficou internado em observação, presume-se que foi começo de derrame. Um bom filho. O poeta aproveita e pega um refrigerante fiado e vai bebê-lo com os pães.
- Onde é o teu banheiro? Pergunta o pedreiro Seu Paulo, o factótum do mercado ao poeta.
- Vai no beco. – Indica
- Eu quero cagar – desabafa batendo na barriga com rosto aflito e escandindo as palavras.
- Então corra até o mercado – aconselhou o fulero do poeta que continuava impassível lendo “Todos os homens do Presidente”
A gostosa da Glaus, sobrinha de Pai Cardin destilava sua sensualidade e seu charme sedutor lavando as cadeiras, deixando a mostra o seu belo par de rabos. Colhão, bebericando vai as nuvens. – Dá-lhe Colhão!- grita o fulero do poeta em pé na porta da oficina.
Começo da tarde
Inicio do pânico na Pensão Vince, nada de água e tudo seco. Antes do meio-dia digitou “Quarta-feira...” O sr. Vince um pouco chapado trouxe seu bandeco do Cibagoga, o mesmo que abastece o Comandante Lasierra com os dois ovos cozidos por dia. O poeta extrapolou a sua média alcoólica, umas doses a mais e ainda quarteto caseiro que emborcou num gole só e deitou-se. Cochilou um pouco, no começo do Jornal Hoje acordou e foi preparar o seu prato – arroz, feijão, caldo de galinha e o mexido de linguiça e camarão seco, sobras de ontem.
Noite – Para felicidade geral de todos a agua chegou no finalzinho da tarde, quando todos estavam sem esperança. Foi Ornildo, o vizinho e neto de Seu Eriberto que veio avisar:
- A água chegou – gritou do terraço. Todos na pensão deram urras e agradeceram a ele.
Existe um trato não escrito que um avisa o outro. A boa e velha politica da boa vizinhança.
Ler o poeta Nauro Machado é como uma viagem intestina ao espelho da existencia poetica. E o poeta renasce em seus versos e o incentiva a assumi o seu lado bardo.