Invernia
Badaladas do sino
Ecoam pela aldeia deserta
Porta-voz do destino
Recordam aos velhos a morte certa
Quando será nunca mais Primavera
Pelo menos um dia radioso
Que enfeite a atmosfera
Neste tempo tão chuvoso?
Ah, rapazes do meu tempo
Ah, mocidade da minha geração
Uma fogueira no peito
Uma laranja em cada mão
Esqueçamos o tempo já passado
Vamos apanhar gelo
Vamos colorir o coração
(Nasçam malmequeres
Cresça a couve
que se sache e se monde
que se colha e se coma)
Lá, onde corre a fresca regueira
onde cresce o agrião
Enchamos o cinzento de laranjas
uma no céu, uma em cada mão
O sino dobra novamente a finados...
"Poema" meu que fecha o romance Entre Cós e Alpedriz
Pátria
Destroçado pela derrota derramo minha amargura
Pelos caminhos deste país que já foi de vinho e mel
E a ela perdura, amarela e viscosa como fel,
Tingindo cada rosto, cada figura,
De lívida brancura
Já nada é como era dantes
e o cabelo que me vai faltando é apenas
breve indício do Inverno que se vem aproximando.
Mas o que me dói e não tem cura
neste entardecer azedo
é ver o país a adormecer cinzento
de indiferença e pasmo bafiento
Ninguém faz nada sem proveito.
Pelas auto-estradas que conduzem aos centros comerciais
telemóveis saúdam as novas catedrais
(Por aí fora, o abandono
Matas queimadas, hortas perdidas
peixes lançados ao mar
fábricas fechadas, reformas antecipadas
país de alheio dono
Desespero do desemprego, aldeias abandonadas
oh subsídio-servo-dependência!)
Não, nem orgulho ferido nem sonhos perdidos
agora já só o meu olhar camponês me magoa
como o mato à minha terra onde já nada é como era dantes...
Chove no Verão, o Inverno aquece
E o nevoeiro não tece mistérios bastantes
outros que a miséria deste Portugal que esmorece
Só sei que de lado nenhum sairá a luz que rompe as trevas
porque já nem a noite é de breu
nem os dias resplandecem
e os amanhãs não cantam,
silenciosos como a nossa triste terra.
Desculpem a ousadia - não sou poeta, com muita pena minha.