A CORUJA LEVANTA GAVIÃO
Sexo degolado
do cavalo alado
esparrama avenidas criminais
na esquina da alma a traição
saudade é hóspede
segue estrada afora
a caravana dos abandonados
o rei é vivo
embriagado
no sangue da plebe
eu encho
de lágrimas
o teu ventre
eu visto o traje real
p'ra te amar, sêmem
e suor - coroado pelo sol
Na entrada da cidade
a bruxa-sexy recebe
o santo, a igreja é para o amor
o corpo é aonde/
pé-ante-pé
arranco da sombra
o leopardo
arrastando o sexo
no jardim do teu cio
O cavalo branco espalha
da crina o fogo na rua
- selvageria e doação
Teu corpo é a égua
de uma divindade em fúria,
teu íntimo um lago fumegando céus
Nu - encharco as areias
pelo cajado, certo da suculência
que no oásis te umedece o fruto
Tenho nas botas solidão
e desdèm, nas esporas
caravelas levam povos espirituais
Assassino, o gueto é meu,
se a sirene é o anjo denunciando
o invasor, a culpa é longe do ateu
Seja como for, o príncipe
nasceu do mendigo quando eu
te amei, das cinzas a coruja levanta gavião
Estatuto do Canalha
longos anos de exílio e nenhuma resposta
a noite rasgada pelas intempestividades da máquina
é o riso do facínora espalhando os olhos do arrependimento
no solo fenecido das alucinações virais
esquecido do abominável mundo dos contratos,
brinco com as meninas primitivas
da Galápagos do sexo
licenciosidade impera aonde o Parlamento é desconhecido
e a Orgia decide vida e morte
sou o rei fantasma
e só a imperícia interessa
o ofício marginal é condecorado
aonde a aura é a sombra do urubu
quando a sociedade nada mais é
do que o subterrâneo da maldade
só aos gênios é permitido sonhar
deixei nome e carreira nos chifres da vaca presencial da atrocidade
descomum como o lado concreto do mito
quando ambíguo é o princípio racional
quando as botas envernizadas que me distinguem da ralé
fazem o réptil chorar de saudade e fé
e tudo o que resta é o estatuto do canalha
pois a moto funerária da ambição espera na estrada
e embarco no passeio feroz da impetuosidade
que há em romper modelos e conveniências
inventando quem o destino coroa
no trono selvagem da liberdade
pois conhecer o sangue é da misericórdia desdenhar
Erico y Alvim
Paixão Animal
como se te amasse loucamente
o tacape rodopiando pelo tempo
desde as caravelas
abre o Carnaval
como se pudesse tanto lamento
a fúria a farra a febre quem mais santo
indecente como era quando acesa na alma a vela
o corpo vertia sumos a todo ser da paixão animal
aonde os violões e batuques vagabundamente malandros
choram pelos sentidos adentro celebrações libertinas
índia nua é a pintura da saudade na tela ardente
quando os espíritos festejaram a carne em púbis e luz
esta terra precisa do Carnaval nada mais que sempre
esbórnia é a carta de princípios da raça
que sobe mais que a superfície
- ela sai da aquarela vestida das flores do caos
aberrantemente deusa como é da divindade trocar o equilíbrio de lugar
Bocarras linguarudas mordem o verbo da esbórnia/
rollingstoneando o carnaval
decimal desse mal eu morro
esse mal faz Bem
bem te vendo
a face pintada é guerra
o teu rosto pintado ferra
o olho vazado sem noção
do embuste enruste a demência
do espantalho que restou das armas
portentosamente fêmea
tua dança ignora hierarquias verborrágicas,
porque o desejo convida a tocar teu corpo
quando os sinais de trânsito perdem
o controle das estrelas
o céu ganha outro sentido
e as ruas dispensam os minotauros da insensatez
Rock Horror Sertanejo
Vejo os ventos estufando bandeiras execráveis
a rebelião é doce na tomada das ruas
nos devaneios,
a causa da desordem é que o novo verbo celeste
sai do sonho e caminha na poeira,
sei disso porque ouço os viajantes da noite
relatando as quedas
Conquistada a manhã
a cama tornou-se irreal,
e os poucos anjos preservados impunes
recolhem confissões dos amores imperdoáveis
despidos na aflitiva chegada
das manchas sonoras na lua
quando tudo enfim é uma gota gigante
do transparente mel escorrendo da colher marinha
quando tudo enfim é um trago antes da hora
antes de você antes de revelado o segredo
O vandalismo das viúvas
putri'vulvas
é um rock horror sertanejo
estátuas guerrilheiras de sobejo
sangram agruras heavy-esdrúxulas
aonde a revanche perdura
para que a nova elite surja da face lavada das rebeldias válidas
Eu sigo matuto sem regras
sonhando pântanos
aonde elementais dominam a noite
sei dos presságios
porque o crime vem do porão de Babel,
sei de mim porque só é definitivo o esculacho
AURORA DO SEMÁFORO
O Sol derreteu
escorrendo pelas frestas do céu
onde os encanadores do estômago
vêm praias,
não pensem estes redentores do auto-perdão
que vou mergulhar na piscina dentro de mim (não!)
como querem os que passaram pela vida
com olhos-turistas,
não vou apagar meu fogo
com o dinheiro que transborda o sangue dos desenterrados,
sangue drenado nas represas da desumanização
p'ra passagem do navio de intestinos penteados
na escadaria da igreja estufada pelo arroz
dos noivos do vício deixado aos filhos bastardos
enquanto aos órfãos da pátria drogada e prostituída
disputam a carniça aos urubus.
O corpo de bombeiros arde em chamas
e o mercúrio transborda das represas,
o exército guarda almoços importados
e a multidão bêbada por mártires
crucificando rebeldes
nos matadouros,
para deleite dos esqueletos abandonados.
Da vagina da avenida brota uma espiga de ferro
parindo um semáforo vermelho
como um olho do inferno
flertando com olho solar
dos cabisbaixos,
engolindo a escuridão
num ronco de cemitério.
E quanto mais se anoitecem
como polvos pelo avesso
mais o mundo é um atoleiro
formado das almas
dos que despiram o espírito
e deixaram apodrecendo no chão
Nossas vidas sepultadas sob as letras nos papéis,
e caminhamos por uma cidade cujos edifícios são as leis,
das páginas dos jornais escorre o sangue do filho e do pai
escorrendo belos bueiros como uma aurora marginal
nascendo nas calçadas,
o céu sórdido
dos que brotaram no túmulo carnavalesco
da civilização
e que não passa de um curral de bois atolados na baba do delírio
(1.979)
KÁTIA
(REFRÃO)
Kátia,
os pássaros desfilam no teu rosto numa algazarra de cores
dentro dos olhos. e a oração levanta mulher
Os cabelos teus palácios de vento cheios de trombetas soando em
direção aos mares.
Às vezes quando o silêncio dá lugar à imagem ninguém vê
o que transparece no caminho que leva às profundezas do coração.
Feras feitas de música dormem no aconchego das cordilheiras mudas
do teu corpo cru como uma linguagem intraduzível.
Teu andar puxa o oceano que ondula embalado ao ritmo dos quadris
de pérolas macias
sob núpcias de cometas que esvoaçam refletidos na carne-marinha.
Posso me enganar a quanto a mim quando não sonho
mas não posso conter a mente que rasga paredes
a vai-se espalhar no deserto sussurrado das estátuas inquietas.
Sei que teu colo cristalino guarda o vulto de beijos que ecoam no rosto
feito caverna recebendo o mar.
Não vou definir o amor
mesmo porque a distância é
um sinal
proibindo o trânsito do desejo e o céu foi tomado caem pedaços do céu
quente
queimando a calçada,
anjos com língua de raio anjos com
dentes-de-sabre
empunhando metralhadoras retalham a espinha do céu e desabotoam estrelas
submersas no sangue
escorrendo entre o cósmico e a parede.
É uma pena eu não poder dedilhar um violão ao teu ouvido
mas é que a poesia é uma clave do íntimo
Garanhões velhos manquitolam na estrada do erotismo absoluto
mas acabam nas cercas pendurados nas dúvidas
(Kátia, vem cá te avisei, amor e diferença só combinam, --------
Kátia, vem cá te avisei, amar-se é fazer o destino ------------------ refrão)