Palavras
Elas podem arder como feridas,
Joelhos que beijam o chão.
Fatiar as horas, prolongar a dor.
Descascar feito fruta, expor a polpa, transbordar o sumo, manchar os dedos.
Podem ser flechas de longo alcance, ou uma isca no rio.
Calor que nutre e machuca, frio que sustenta e golpeia.
Suficiência e solidão,
Trato,
Retrato,
Maus tratos do coração.
Meu coração
Deslizou,
Se encolheu num canto,
Aprendeu a bater numa outra intensidade.
Seus saltos foram felizes, mas não iguais.
O tempo passou...
Se apequenou orgulhoso,
Quando expandiu foi falho, suspirou aliviado mas não estava.
A noite, escalou a minha garganta, esteve na minha boca, deixou o amargor.
Nos meus ouvidos trouxe zumbidos, tonturas, pequenos colapsos.
Na tentativa de chegar na minha razão, pressionou meu peito, acelerou meu pulso, me entregou à insônia.
Convenceu a minha saudade a regressar,
Acessou meus sonhos, acenou e deu cor as minhas memórias, que por muito estavam cinzas.
Inconformado tomou as rédeas dos meus dedos, que tomados pela emoção se pousam por aqui.
Domingos
Sinto saudades
E as vezes ela me pega no colo e trata o corpo. Fecha-me como baú.
As vezes corta e oferece o chão, nada na minha pupila.
Apresenta melodias,
E as vezes a sua voz.
Me acalenta com estrofes
E aos domingos dispara.
Dispara e aperta,
É sútil e maestra.
Professora toma-me a lição,
Sentir você é tê-la.
Ter você é senti-la.
Digite um título
Acordei.
Recorro ao nosso compromisso silencioso, onde vibramos entre nós sempre o melhor.
Esboço um riso, e quase consigo ouvir a P!nk embalando essa cena.
Breve, salto um riso, e seus pequenos e atentos olhos me vêem.
Em meio ao grande verde me espreito, curiosa não avanço à sua presença, incomum te ter a vista.
Circula os cabelos numa impaciência emergente de travessia, mas aos seus pés a corrente água te assenta, então suspira.
Ando entre as árvores, e num sobressalto te vejo na outra margem, o sol te beija e sua leveza sobrepõe o peso da cesta que traz nas mãos.
Leia-me do fim ao começo
Se você pudesse...
Se você pudesse me ouvir por dentro, saberia que a sua voz é o meu som favorito,
Que a minha memória mais tátil é a maciez da sua pele nos meus dedos, é seu nariz tocando meu rosto, e o encontro dos nossos lábios nos dois hemisférios,
Você notaria que meus olhos vibram quando te veem, e que com você e por você eu já experimentei todo o tipo de inundação e êxtase.
Se você pudesse me sentir por dentro, ia vivenciar as temperaturas mais oscilantes, desde a brisa do começo de primavera, quando te tenho pela manhã morno,
A geada que perpassa meu dorso a qualquer sinal de silêncio e desencontro,
A erupção quando ultrapassamos a física tradicional,
Se você pudesse viver em mim, notaria que foi meu amor primeiro, a dor mais densa, a lembrança da fuga, o novelo mais macio, a linha mais tênue, a composição mais rebuscada, a inspiração mais constante, o desejo mais selvagem, e a saudade eterna.
Se você pudesse me sentir por dentro, iria entender que o meu querer ultrapassa o agora, é para sempre.
Encontro
Quero na sua boca circular, explorar na sua geografia todos os solos,
Dos seus olhos quero o mar, lançar sem velas e a dentro navegar,
Desnuda provar que a minha boca é fonte, frutificar em cada canto seu, e uma rosa desabrochar.
Assim em corpo, provocar todo o riso e dor, a aceleração de um coração dividido em dois corpos.
Quero me ater em estar em você, sentir minha alma pulsar para fora e pular no seu colo, para você ninar.
E a sua, na minha mão, dar-me a chance de trança-la no peito, para nunca mais sair.
Poesia perpétua
Na tua forma o poderio,
Força incessante e amável que me vela a noite,
No peito que acolhe e me aninha, o ávido aconchego que chega com sussurros.
Na contemplação da sua companhia, o brilho que encandece meu rosto, embebido do seu açucarado olhar.
Você, minhas súplicas românticas respondidas num único frasco, a selvagem força que me faz sonhar;
Poesia atravessada em meu peito, pronta para saltar.
Sinais da sua presença: o meu gargalhar, suspirar e pensar, a vulnerabilidade que se achega confortável, pousa sem poeira levantar, sútil.
Nas suas mãos várias vidas, envolvidas em meus dedos, um encontro.
O gesto eterno de nossas manhãs, seguimos performando o paraíso e o pecado;
O êxtase de sermos uma poesia perpétua.
Dente de leão
Beija o sol ao amanhecer, sua palidez não desfaz a leveza que traz.
Se posiciona livre e selvagem. As inúmeras espécies são apanhadas na mão, enquanto ela ao menor sinal de aprisionamento se desfaz com o vento ou por inteira.
Olha o campo e não teme, agrupada ou não, traz da terra sua força.
Manifesto ao tempo
O que te fizemos para penalizar-nos?
Foi inexistência de Bach ou Chopin em nossos domingos?
A ausência de citar Drumont nos bilhetes?
Foi o Merlot Português que não chegou as nossas taças?
Ou a nossa negligência quanto a Eros e Psiquê e O Beijo de Klimt?
Quem sabe Cronos se zangou pela forma que utilizávamos nossos dias?
Não há beleza nessa aliança com o destino e as escolhas, para nos deixar em suspensão por tanto...
Os nossos domingos se resumiam em poucas horas,
Nossos ouvidos se preenchiam com sussurros,
Meus bilhetes eram autorais,
Nos bastava água e suor,
E a obra se via materializava sob o colchão, em exposição quase como cerâmica nua,
O tempo em nós nunca dilatou, somente pupilas.
Sentimentos
São amarras,
Nó no coração.
As horas avançam nos dias,
Mas não apagam lembranças.
O tempo coroe construções, dar-nos tempo para nos reerguer, mas é incapaz de lidar com memórias.
A profundidade do que eu sinto é um voto,
Uma devoção já percebida.
Minha mente preenchida do cotidiano pode até esquecer, mas meu coração lembra...
Nó no coração.