Ciúmes... eu?
Eu não me queimo em queixumes
Talvez nem tenha ciúmes
Só não devo te ver
Amor dos meus sonhos
Queimar a beira do curtume
Pois é lá meu rapaz
Que porei
As tuas entranhas
Espatifadas ...
E a queimar no lume
Assento 18D
- Passageiro do assento 18D, favor identificar-se.Levantei a mão e olhei para meus acompanhantes ao lado. O passageiro à minha esquerda logo me avisou do prêmio, “livro de receitas”, disse ele.
Sorri e disse para minha irmã que era uma dos passageiros da minha fileira:
- Seria maravilhoso se fosse uma viagem.Creio ter dito isso, porém em meus pensamentos mais íntimos soltei um suspiro de pura gratidão pela “sorte” que está sempre a meu favor.
Qualquer lampejo, por menor que seja em minha vida sinto o sopro suave da sempre bem vinda “sorte”.
Na medida em que passam os minutos daquele sorteio fico pensando e dialogando com o livro que estou lendo sobre o real significado dessa palavra.
Peguei o marcador de texto e escrevi no verso “falar sobre a sorte”.
Há anos venho lutando contra essa palavra, pode parecer bobagem para muitos e até motivo de muita busca para outros.
Num milésimo de segundo e diante de tão simples acontecimento assumo enfim, que tenho sorte e que ela não mais é um fardo a carregar com vergonha, mas uma companheira inseparável.
Recolho no meu baú de lembranças a presença marcante dessa companheira que prefiro chamar de benção. Às vezes me avista num simples encontro casual com alguém, que me traz um conhecimento, na hora em que chego em casa e logo depois desaba a chuva, numa fila que demora e enquanto lá estou obtenho informações preciosas, nas pessoas que estão à minha volta, na sua saúde e na minha é claro, por tantas coisas que poderia gastar o dia sem chance de vê-las enumeradas na sua totalidade.
Lembro sempre de escutar e com muito desagrado:
-“ Ela tem muita sorte”. Aquela altura soava como uma maneira de me desqualificar , de diminuir meu valor como ser humano. E quanto mais assim falava, mais ela de mim se aproximava.
A cada episódio, por mínimo que fosse um agradecimento sincero pela condução das coisas. Se algo não sai a contento costumo me aborrecer muito, mas logo a vozinha íntima me alerta:
_ “Pare, olhe toda a situação, mais uma vez estou aqui, observe à sua volta e espere a resposta que logo virá”. Então obedeço , muitas vezes sinto até grande alívio por supostas perdas, logo, logo elas se revelam em ganhos.
Tantos anos lutando com o estigma da sortuda, com muita vergonha até, e num lance de sorte finalmente assumo. Sou realmente muito abençoada pela sorte.
Falando de amor
Se é pra falar de amor, vamos lá
Se é normal morrer de dor, por que não?
Se é por vergonha ou distração, aí não
Prefiro falar da emoção
Que tantos anos engessou
As entranhas do meu coração
As molas do meu peito doído
Que enferrujaram e partiram
Caídas sem vida no chão
Almas companheiras
Assim duas almas velhinhas um dia resolveram se reencontrar.
Ambas impregnadas de tecnologia, resolveram enfim uma pela outra procurar
E uma, olhando a página nova e boa ferramenta,se encanta com uma foto e resolve arriscar
- Bom dia , olá como vai , diz a mais novinha e mais assanhada.
Recebeu de volta caloroso cumprimento e a conversa começarama a entabular
- Quem é você, quais são seus gostos e, foi assim a aproximação pra lá e pra cá
Sentindo-se seguras foram logo se reconhecendo e mais uma foto foram logo trocando.
Um dia uma imagem( sempre elas!) fez o olho de uma lacrimejar
Naquela bendita imagem que via, sentiu no coração forte palpitar
Seus sonhos mais loucos, estranha melancolia aos poucos, foi dando lugar
A alma velhinha um modo singelo, de por benção divina um dia voltar
Seguiram-se os sonhos e as fotografias
Cada um no seu tempo a fizeram chorar
Chorar de alegria pela moça que via, com lenço na cabeça no campo a cantar
Do seu vestido, logo pendia avental bem branquinho, fazendo com lenço bonito par
E longe a fumaça daquela cozinha um cheiro gostoso de pão a assar
Crianças brincavam ao redor da mocinha, não sei quantos eram,
Mas barulho sim, sei que faziam
Tudo isso conto e com alegria e sei que bem mais veria dia após dia
Trocando impressões seguem as duas almazinhas
E cada dia a certeza crescia, de que foram elas tão próximas um dia.
Hoje distantes e bem separadas, por mares e linguas e de novo encontradas
E que alegria um dia em pessoa por fim a espera de tantas jornadas.
Pressentimento
Uma dor incômoda
Uma nuvem , um pesar
Não sei o que dizer
Sinto angústia, uma vaga recordação
Não sei se de tempos que foram
Ou ainda estão por vir
Um forte aperto no peito
Uma marca de alguma tristeza
Um amor, uma dor, um sentir
Lapso Temporal
Se vier a dor, se ela não me aceitar
Como farei para suportar
Terei consolo dos astros?
Conselhos dos amigos falsos?
Farei sessões de saudade?
Me verei em qualquer situação?
Talvez a resposta não chegue
Talvez o amanhã também não
E torno a girar no meu mundo
No meu desespero profundo
De quem não se encontrou ainda não
São tardes e noites a pensar
Que lá em qualquer lugar
Estará a paz a me esperar
São ondas que por aqui já passaram
São lembranças de amores largados
Amores de terra, suor e pão!
Foram dias no mar a vagar
Aonde iremos chegar?
Em que porto iremos atracar?
Que brisa quente é essa?
Inunda meus olhos a claridade
Que brilho! Que luminosidade!
Que jeito estranho de ser
Que forma de se comportar
E segue a leva de famintos
Com sonhos em seus labirintos
Retorno assim que puder, penso eu
Pensam alguns: talvez aqui me dê bem
Isso é morte, é além
E cá no meu canto assustada
Com ecos da vida deixada
Sonho um dia voltar
Prendo as lágrimas de dor
Pra lá em vida não mais vou
E o cheiro do pão bem quentinho
Laços de tantos carinhos
Perco os últimos raios de luar
Dentro do grande mar
Que me recebe a navegar
Um dia desperto
E cá estou
Tempo passou
Tempo levou
Levou o cheiro
A temperatura da terra
Os ecos dos sonhos
Dentro do mar
A esperança, essa não me largará
E mistura de tantas vidas
Dessa jovem, senhora ,velha sofrida
Me diz baixinho: tenha calma
Sua hora chegará, não se apresse
O tempo ele é caprichoso
Inunda seus olhos de tudo
Imaginas o absurdo
Jovem,senhora, velha perdida
Um dia sei que voltarás
Talvez te acolha o mesmo campo
As mesmas flores que te viram partir
O mesmo mar tão grande e nem sempre sereno
Te dará boas vindas enfim
Nesse dia me dirás do teus medos
Das vidas que já vivestes
Da tua fome de terra
De amor, de pão e perdão
E serás enfim feliz
De olhos abertos ou fechados
Receberás meu abraço
Enfim, te tirarei o cansaço
PORTUGAL
Por mais que ande e veja o mundo
Ora , jamais esquecerei a emoção do tempo tardio
Resto de sonhos , fragmentos de vida
Talvez esperança que tudo se aqueça
Uma vez mais dentro do peito sem vida
Galhos secos no meio da estrada
Areia quente ,boca seca , cantil vazio
Lufadas de vento no rosto sombrio
Nada Sei
Sei muito da tarde quando noite cai
Sei muito da noite, quando o dia vai
Sei muito de mim quando me olho em você
Sei muito do corpo quando o peso cai
Sei muito do nada de tanto que sei
E vou sempre em busca de tanto que quero
E tudo que espero me deixa em brasa
É tudo uma farsa
O tempo não passa
Não deixa de graça
A louca trapaça
Que é viver