Fúnebre
é o canto da sereia
amordaçado
encurralado
Já todos os mares
se calaram
e todos os ventos
tardaram
tal como as águas
nos abandonaram
Fúnebres
são os gestos
contorcidos
empobrecidos
enrijecidos
a esmigalharem
côdeas de pão
Já todos os relógios
caíram da torre
da Igreja
e todos os tempos
migraram
tal como arribam
as primeiras chuvas
pelos campos
Fúnebres
são as vestes negras
a varrer o cemitério
dos vivos
delambidos no alcatrão
Já todos os caminhos
se fecharam
e todos os passos
se calaram
tal como se abatem
os anos
sobre os ombros
dos caminhantes
Fúnebres
são as vozes caladas
nos confessionários
a contar os actos
de contrição
Já todos os altares
se desmoronaram
e todos os santos
se desventraram
tal como se esventra
à noite
a intimidade
com a solidão
Fúnebres
são todos os olhos
à espera de um nome
sonante no caminho
do vento
Já todos sucumbem
da culpa
que carregam
com a fome de terra
com a falta de ar
e a sede de água
que apague o fogo
que os consome
Inflama-se-lhes
o ventre
obstruindo o canal
que atravessa
a maior tempestade
que já se viu
no términus
do céu
Dakini
Maria Al-Mar
Enquanto Mulher
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