Poemas : 

De volta para casa

 
(Caros amigos, poetas e leitores, fiz novas modificações no que pensava ser definitivo. De fato, tudo é provisório. Penso que esta versão agradou-me mais que as outras. Obrigado a todos pela leitura.)


I

Bocas desmaiadas,
De sono escancaradas,
Viajam de volta para casa
Avenida afora,

Enquanto
Cabeças pendidas,
Em sonolência contrita,
Dormem o sono dos justos,

Nessa hora
Que se prolonga
E devora
O resto do dia
E das horas.

II

Vogam,
Em meio a lixos
E detritos,
Antigos destroços
De outrora;

De viagens,
Tratados, ilhas
E tordesilhas,
De tantas linhas,
Faixas, buzinas e sirenes
Dos que voltam para casa
Infrenes e sem leme.

Vogam
Tiros,
Gritos e vozes
Em meio ao martírio
De quem morre anônimo
Sem nunca ter lutado
Contra mouros ou assírios.

Vogam
Santas cruzes
E arcabuzes
A perpetrarem
O vilipêndio
De missas
Estandartes,
E incêndios,
Dos massacres
Que catalogam
A cidade.

III

Tudo que é perene
É só mais uma forma
Do provisório
Neste empório
Que é a história.

Por isto este mar,
Há muito seco,
Embora infindo,
Que guarda seus ecos
E os endereços
Marítimos ou citadinos
De tantos vascos,
Marcos, pólos e gamas,
Zhengs, vicentes,
Pessanhas, janszs,
Mendonças, lischontens,
Nunes, nunos e homens,
Sem glória e sucesso
Que voltam para casa
De mares, bares e azares.

Por isto este mar,
De quem
Não conseguiu regressar
E que hoje,
Sem canto ou narrativa,
Retorna para casa,
À deriva,
Em meio a vagas
Que aportam,
Em chamas,
As frotas soçobradas,

Lâmina
Que aflige e inflige
A chaga escusa,
Ibero-americana,
De toda uma raça chacinada,

Os becos e logradouros
De ocaso,
Esquecimento e atraso
Que não encontram
Escoadouro.


 
Autor
Felipe Mendonça
 
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Enviado por Tópico
Transversal
Publicado: 11/04/2012 20:27  Atualizado: 11/04/2012 20:27
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Usuário desde: 02/01/2011
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Mensagens: 3755
 Re: De volta para casa
"bocas desmaiadas viajam
(no) ocaso
(de) tantas linhas,
viagens, gritos e vozes,
(que) vogam em chamas,
à deriva, sem glória e sucesso,
esquecimento e atraso"

Posso não concordar com "a chaga escusa", mas digo-lhe Poeta que este texto é soberbo. Obrigado.

Abraço-te


quanto à versão, jamais estaremos satisfeitos com o que escrevemos, jamais.