Poemas : 

BRASIL - AME-O OU DEIXE-O

 
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Quadro de Eduardo Arguelles





Quando eu era garota,
meu pai levava O Pasquim para casa.
Líamos escondidos
como se fossemos cúmplices
de um crime perfeito,
o coração na boca,
o sistema entalado na garganta,
a penumbra do desassossego,
coisas que as pessoas esqueceram.

Penso naqueles momentos
com gratidão,
penso no meu pai - esse sujeito
que me ensinou a transgredir com fé-
dando-me as mãos
para que eu fosse maior
e muito mais eu enquanto
o Big Brother de George Orwell
denunciava mais um vizinho.

Foi ele
quem me deu
o primeiro par de asas
quando só nos restava rastejar.
Olho para trás,
sentindo o gosto do passado na boca,
sabendo o quanto custou
ter as nossas línguas de volta
para saborearmos a nossa liberdade.

E amo meu pai muito mais
por ter me ensinado
a resistir até o fim.


Karla Bardanza






Este poema é dedicado ao meu pai. Saudades do meu primeiro e único herói.

O Pasquim foi um semanário brasileiro editado entre 26 de junho de 1969 e 11 de novembro de 1991, reconhecido por seu papel de oposição ao regime militar.
 
Autor
Karla Bardanza
 
Texto
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Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
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Enviado por Tópico
miriade
Publicado: 09/07/2012 01:28  Atualizado: 09/07/2012 01:28
Colaborador
Usuário desde: 28/01/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 2171
 Re: BRASIL - AME-O OU DEIXE-O
karla, belíssima e merecida homenagem ao seu pai,que certamente lhe deixou a semente da conscientização bem plantada e que agora brota em poesia.Parabéns,

Carinho, Lu

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 09/07/2012 01:35  Atualizado: 09/07/2012 01:36
 Re: BRASIL - AME-O OU DEIXE-O
já fiz-lhe este comentário, mas, em homenagem ao seu pai e ao meu, heróis que nos deram possibilidades de estruturamo-nos no saber. o poema destaca-se pelo intrínseco.
bjo em ti Karla. e aquele abração bem caRIOca.


"gosto de ti pois hora ou outra seus textos nos faz voltar ao tempo, aos bons tempos de nós, jovens apaixonados... lá pros idos de sessenta e tal, quando a vida e felicidade fazia sermos o que éramos; um bando com as cabeças cheias de ideias e ensaios filosóficos. as canções marcavam nossos passos e abafavam os nossos choros no escuro do quarto, o rcck apontava a direção de horizontes inimagináveis..."