Contos : 

De la noche

 
Adolfo caminhava pela Duque de Caxias . Sozinho , em mais uma noite de domingo .Uma rua diferente , sem o caos fedendo á gasolina, sem a sujeira dos camelôs ,sem aquela gritaria tão estúpida e real.Queria mais esquecer de si mesmo, no meio da noite quente e apática. Ponto de prostitutas ,último reduto noturno de travestis, similares e muitos simpatizantes.
As formas de solidão mudaram, ao longo dos anos . Lembrou do tempo em que encostava num balcão e logo alguém vinha ter consigo . Hoje , sem balcão ,apenas caminhar em direção á noite suja e sem atrativos , arriscando um marinheiro perdido ou um rosto desgarrado da fauna noturna do cais, no espasmo munganguento de crak , a quem pediria o cigarro de sempre , prenúncio de papo , olhar de nojo piedoso ou de puro e simples nada consta .
Percebeu um cara de jaqueta jeans , encostado ao poste ,do outro lado da rua; tipo magro musculoso , calças justas e um olhar vazio em forma e direção , de quem via tudo sem nada observar .Recostou–se na banca de revistas fechada ,sob uma marquise .Olhou os bancos de camelô desmontados ao longo da rua.
As putas desciam dos velhos sobrados, á frente dos homens da ocasião , um olhar orgulhoso , senso de dever cumprido . Sou puta e daí ? Cada um segura a sua ôia , dizia Zefinha Pé de Garfo , um corpo escultural sobre um pedestal deformado, um kama sutra ambulante ,agora,arremessando um beijo para Adolfo , sobraçando o presente da neta , no retorno para casa . Mais uma bateu o ponto e fechou o escritório , pensou Adolfo , cigarro apagado nos lábios de pomada de cacau . Mãos inquietas procurando um isqueiro . Acendeu , acalmou as longas mãos manicuradas , dedos luzidios . Fumou pela metade , jogou fora, apreciando a pirueta da brasa , até cair no chão. Recomeçou a caminhada , percebendo-se seguido á distancia pelo homem de jaqueta jeans . Um discreto olhar para trás .
Chegou á porta da hospedaria Novo Horizonte . Subiu o primeiro lance de escadas e puxou do bolso a chave do quarto , dando tempo ao cara de subir .Era um homem bonito, olhar sombrio e braços musculosos .A mão esquerda tatuada ,brinco na orelha direita, idade indefinida, como tantas outras coisas da vida. Trocaram um sorriso meio envergonhado, adentrando o quarto. O estranho preferiu penetrá-lo de pé. Adolfo excitava-se e rangia os dentes de prazer . Ao perceber a corda de náilon no pescoço , o mundo estava cada vez mais cinzento e silencioso.


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andrealbuquerque
 
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Enviado por Tópico
Vania Lopez
Publicado: 09/11/2013 04:53  Atualizado: 09/11/2013 04:53
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 Re: De la noche
arrepiante esse final como realidade
que cerca e rodopia a vida. perfeito
e muito bem escrito, talvez gritante.
bjs da fã