Textos : 

O serralheiro e o cliente italiano

 
Depois de ter encerrado o meu expediente no Mercado do Peixe na praia do Desterro, fui tomar um bom café com leite e um beiju com manteiga na banca de uma velha amiga situada atrás do Posto de Gasolina. Uma branca baixa e roliça chamada Maria. Todas as sextas-feiras e sábados trabalho lá, carregando os peixes no carro de mão até a parada do coletivo ou até mais longe como na feira da Praia Grande, Mercado Central e Macaúba.

Eram oito horas de uma bela manhã sem sol, caminhava alegremente pela rua da Manga,ia vender os peixes que ganho como pagamento aos clientes fieis, quando de repente para minha tristeza e desagradável surpresa o braço direito do carro de mão quebrou, tomei um susto e se eu não fosse mais ágil os peixes se espalhariam pelo asfalto sujo. Praguejei baixinho entre os cacos de dentes. Ainda bem que estava próximo de uma oficina do meu amigo serralheiro. Com cuidado levei o carro de mão até a oficina, em madeira situada num beco da rua da manga no Portinho em sobre a calçada da Fabrica de Gelo de Seu Enéas ao lado da barraca de Dona Lucia O serralheiro, um homem jovem de pele escura trajando um calçãozinho vermelho batia concentradamente um ferro de ponta vermelho sobre a bigorna. Em frente, outro rapaz sentado num banco improvisado soldava uma cruz. Assim que o serralheiro me vê, para seus afazeres e caminha sorridente em minha direção, depois de jogar o malho e peça pontiaguda para um lado.

- Bom dia meu amigo José! – disse ele sorrindo deixando de fora os seus dois dentinhos saliente.- Como vai?

- Não muito bem, mas vou levando conforme os desígnios do Senhor – respondi arreando com cuidado o carro no chão.

O soldador de tez morena para também o seu trabalho e me saúda:

- Salve, Seu José!

- Salve, meu amigo soldador.

O Serralheiro olhou para o braço quebrado sobre a calçada e me perguntou:

- O senhor quer para soldar o braço?

- Sim, meu bom amigo...

O soldador se levantou de sua banqueta improvisada, tirei os peixes de cima da caçamba e coloquei-os sobre a calçada. Ele apanhou-os o carro e o braço com cuidado e os levou para sua banqueta em frente a porta da oficina. Dona Lucia atendia uns clientes funcionários da Fabrica de Gelo do “barão” Paulo Choco.

Um homem branco e louro com olhos verdes vestido todo de branco e um chapéu entrou no canto aproximou-se do Serralheiro que estava no meio do beco acompanhando as molecagens dos clientes de Dona Lucia

- Buongiorno, mi chiamo Alfredo io voglio fare due portone de ferro” – disse-ele olhando para o Serralheiro atônito que não entendia nada. E o homem repetiu novamente e meu amigo Serralheiro virava a cabeça para os lados. Me aproximei deles, olhei para o Homem de branco com o chapéu:

- Buogiorno signore! Scusi mio amico, lei no parla la língua italiana.

O Homem de branco lançou um olhar de surpresa em minha direção.

- I tu parles italiano? – me perguntou como desdém e um sorriso irônico no canto do lábio esuqerdo.

- Si, io parlo um pó.

- Come ti chiame?

- Mi chiamo José, io sono amico de lei, le fabbro – disse apontando o dedo para o meio amigo Serralheiro que continuava impassível e incrédulo – Lei no parla niente. E voi come ti chiamate?

- Mi chiamo Alfredo, io sono italiano, io ho comprato uma casa nella Via Jacinto Maia e io voglio fare due portone – disse –me olhando nos meus olhos.

Virei para o meu amigo Serralheiro e traduzi o que ouvira:

- Ele se chama Alfredo, é italiano, comprou uma casa na descida da Rua jacinto Maia e ele quer mandar fazer dois portões.

Meu amigo sorriu um pouco, o italiano me olhou agradecido. Ele entrou na diminuta oficina apanhou sua suja caderneta e um toco de lápis que estava sobre a bancada e acompanhou o italiano para medir os portões. Os “peões” da Fabrica de gelo ficaram espantados com nosso diálogo e cochichava baixinho:

- Esse velho é sabido pra desgraça, ele fala até essa língua de gringo.

- Quem diria que um esse pobre velho sabia alguma coisa.

O Soldador chama a minha atenção.

- Esta pronto, já soldei o braço, Seu José – completou coçando a cabeça. Aproximo-me dele para verificar melhor a solda e trago-o para perto da calçada onde estão os peixes. Dois caminhões carregavam gelo nas caixas de isopor cheias de peixes de água doce, o odor característico deles empestava o beco com a salmoura que escorria de suas carrocerias.

O soldador voltou para a sua banqueta improvisada voltando a saldar a sua cruz. Coloco os peixes sobre o carro, ele se levanta e vem até a mim com olhos nos peixes.

- Quanto é meu amigo?

Seus olhos continuam fixo nos peixes.

- Você quer uns peixes? Perguntou-lhe casualmente.

Ele sorri e aquiesceu com a cabeça.

- Sim, quero que sim.

- Então pode escolher, meu amigo.

Depois de tirar três peixes bonitos..

- Obrigado seu José. Disse-me alegre e os levou em direção da fabrica de Gelo para guardá-los numa câmara frigorífica e no final do expediente leva-los para a casa janta-los.

Agradeci também e dirigi-me para o Mercado Grande para vender o restante.

O odor da sopa me chama para a realidade, meu amigo fiel Fome late lá do alto. Bebo um copo de cachaça de uma garrafa que comprei com o dinheiro dos peixes que vendi para uns barraqueiros no Mercado Central. Faz um pouco de calor, é hora do jantar.

 
Autor
r.n.rodrigues
 
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