Contos : 

ARTE

 


Arte, essa palavra tão simples e ao mesmo tempo tão complexa que nos custa descrever, mas que ao mesmo tempo nos faz acelerar o bater do coração! A quem a aprecia, claro está! Ali, no entanto, naquela exposição de mais uma jovem promessa da pintura, todos sentimos o sangue a percorrer as veias sempre m excesso de velocidade! Os contrastes, branco/preto, as personagens desfocadas e sempre sem boca com que gritar, faziam com que nos identificássemos com elas no nosso constante corrupio do dia a dia! Cruzei-me com o autor das telas e percebi num só olhar que também ele era um homem de contrastes, incertezas, excessos e que a sua boca fechada de timidez, continha dentro um grito trancado. Esse imenso e intenso grito, no entanto, era passado para cada uma das telas daquela galeria. Um arrepio percorreu-me o corpo ao perceber que também ele olhava para mim de soslaio e por me sentir envergonhada fixei a tela à minha frente
Lembrei-me dos tempos da minha faculdade em que frequentara um curso de pintura e de como as técnicas estavam alteradas… Pensando bem, também eu estava muito alterada: as rugas, já não havia creme ou base que disfarçasse, e os brancos cabelos que noutro tempo eram sedosos e louros, hoje para além da cor tinham perdido esse toque a seda! Mesmo assim continuava a tentar esconder a idade que tinha, saindo de casa sempre sem um cabelo fora do sítio! Naquela tarde não era uma excepção. Quando olhei de novo o criador daquelas telas, com as quais tanto me identificava, percebi que o seu olhar estava também fixo em mim sem que percebesse bem o porquê, no meio de tanta gente jovem e bonita, porquê que aqueles olhos cor de canela se haviam fixado em mim! Ficamos breves instantes a olhar, no meio da multidão até através dela, um para o outro e num repente sem saber quem deu o primeiro passo estávamos juntos a conversar, como se nos conhecêssemos desde sempre!
Perguntam vocês o que queria um jovem com alguém já com uma certa idade? (Velha nunca, porque para além de ser uma palavra cruel não espelha a beleza que a antiguidade pode dar a uma pessoa que saiba dar o valor a isso mesmo!) Falamos de tudo e de nada, numa troca de palavras sem sentido para quem nos ouvia, mas fazendo todo o sentido para nós que as trocávamos! Perdemos a noção temporal e espacial e era como se estivéssemos só nos dois degustando as palavras um do outro trocando sentidos e experiências que não se contavam a ninguém, mas que sentíamos necessidade de trocar entre nós!
Não farei aqui a descrição desse diálogo que foi muito longo, porque julgo que não iriam perceber o sentido dele, digo-vos só que quando nos afastamos estávamos ambos de bem com a vida e mais importante connosco mesmos. Fui para casa de alma rejuvenescida e sentido de plenitude que não consigo descrever, quase como se tivesse aberto as asas e me encontrasse naquele momento a planar sobre o mundo com todos os seus problemas e sofrimentos. Aquela conversa dera-me as asas que eu sempre tivera, mas que nunca conseguira usar. Tinha sido um jovem a despertar essa asas de corvo que ele tinha na camisola e que eu tinha tido escondidas anos a fim! Naquela conversa de tudo e nada ele tinha-me dado forças para lutar pelo meu futuro, restituindo-me novamente a vida!
Infelizmente a vida dele eu não consegui restituir e soube que dias mais tarde morrera devido aos seus excessos de álcool e heroína deixando sobre o espelho que vira o último raio de luz no seu olhar de canela, uma frase que ninguém conseguia entender:”Se eu tivesse os cabelos branco, não conseguiria dar mais nada, assim dei asas a todos os que cruzaram o meu caminho!”
Percebi ser uma mensagem para mim e para todos os que haviam descoberto como era bom voar. Ainda hoje voo e descobri que também consigo ensinar a voara quem se cruza no meu caminho, mesmo tendo cabelos brancos!

 
Autor
carola
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