Poemas, frases e mensagens de Sophie Wilde

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Sophie Wilde

O Pássaro e a Raposa

 
-Mas você nunca quis sair daí? – Questionou a Raposa, fitando a gaiola na qual o pobre pássaro estava encarcerado, no alto de um poste com uma placa de informações lotadas de nomes em latim e dessas línguas de difícil compreensão.
-Por que eu deveria querer? Veja só, Raposa, aqui tenho meu alpiste, minha água e minha sombra. Não preciso trabalhar, como alguns pássaros de realejo que ficam bicando a sorte dos outros, e sequer preciso caçar como as aves de rapina. Tudo que tenho que fazer é ficar aqui, para que olhem e fotografem para os mais requisitados álbuns, arquivos e revistas nacionais. Depois para que digam o quanto sou belo e raro por ser um pássaro de corpo branco e asas escuras, e que sou o único de minha espécie.
Minha vida é essa, Raposinha. E não preciso de mais nada.
O olhar curioso da canídea de pelos fouveiros e o focinho negro como a asa do pequeno pássaro a fez refletir: “Será que sou rara também?”, porém logo respondeu para sua mente “Talvez eu fosse se soubesse voar.”.
-E voar? Você não sente vontade voar? Se eu tivesse um par de asas, jamais tocaria o solo. Não gastaria meu tempo em correr. Apenas em flutuar.
-Eu voo, tolinha. Veja só isto!
Então o pássaro bicolor abriu suas extremidades
num espetáculo circense e decolou 40 centímetros, e pousou como um anjo bíblico na trave dourada de onde partiu.
-Vê? Sou como qualquer outro ser alado. A diferença é que sou muito mais sortudo. Vivo bem com todas as regalias que podem ser oferecidas.
A Raposa caiu em gargalhadas. Risos de desdém e de ridículo. Retratou-se envergonhada, mas não arrependida de ter achada aquela situação cômica. Se aquela ave fosse sua caça, ela já teria conseguido engoli-la, sem muito esforço.
-Acha que isto é um voo? Acha que isto é liberdade?
O Pássaro se revoltou com aquela reação. Oras como um animalzinho terrestre poderia ousar fazer um comentário daquele? Desde quando um animal sem experiência alguma em levantar do chão poderia crer que era um especialista?
-E o que você entende sobre liberdade? Nem asas você tem! E acha que vive tão solta só porque não mora numa jaula? Suas barras de ferro são decididas por você mesma e pelo ambiente que vive. Você acha que pode fazer tudo o que quer? Se fugir da linha, também não terá comida ou água. Se não caçar, não come. Se invadir alguma fazenda, morre. Você é tão presa e limitada quanto eu.
A Raposa admirou-o com os olhos arregalados. Era verdade, ela era presa e limitada por correntes próprias. Seus limites também a seguravam.
Entretanto ela abriu um sorriso esperto na boca. Ela havia julgado a si própria. Não era novidade o que o passarinho comentara.
-Posso até ser limitada como você, Pássaro, mas ao menos eu tento me soltar e me expandir. Eu caço para mim, dependo apenas de mim. Não preciso de uma dona, que pode esquecer que tenho fome. Sou responsável pela minha própria vida. Já pensou se sua proprietária tem um acesso de loucura? Ela simplesmente pode acabar com você.
Cuido primeiro de quem sou. Mantenho-me independente como posso, e já que estou estabilizada, posso ajudar também; como retirar-te dessa jaula.
Porém você sequer quer sair dessa prisão. Você tem asas saudáveis e não quer voar. Não tenho asas, apenas minhas quatro patas, nem mesmo tenho uma total liberdade. Contudo, eu posso correr atrás disso todos os dias, porque esse é o sentido da vida: ir à busca de superar o que já foi delimitado por quem já trilhou por esse mundo.
Então a Raposa virou-se e correu pelas campinas verdes, as quais o Pássaro jamais tornaria ver de novo: sua dona falecera, e ele fora esquecido na gaiola até que a morte o tomou; em resposta a sua falta de ambição de ter sua liberdade em troca de um comodismo inútil.
Mas, como já é de se imaginar, os passarinhos sentem apenas uma coisa de cada vez, afinal, são pequenos demais (de coração e mente) para tratarem de vários assuntos ao mesmo tempo, e se ocupados, continuaram ocupados até que a negligência os ataquem.
E esquecem completamente de suas asas...
 
O Pássaro e a Raposa

A Balada do Incorrigível

 
Eu já não me importo, creio que nem mais percebo
As punições que recebo
A primeira vez é assustadora
A segunda, um desafio
Os outros números são apenas mais alguns escárnios e risos

Se já virou hábito ou tradição
É algo encoberto de razão
Razão um tanto diferenciada
Da qual você está acostumada

Eu já sei o que me aguarda
No final de alguma jornada
E sempre valerá a pena
Mesmo que isto arda
(Quase uma nova alvorada)

São seus atos constantes que fazem valer a pena essa pequena dose
De dor e satisfação numa entrose
Que injetada na alma, se revela valorosa como pode

Quando, por fim, entenderá
Que não há (quase) nada que me atrele ao seu mundo
Que posso fazer tudo que anseio e me jogar até o fundo
(Por que você irá me buscar apenas para me dizer alguns sussurros
E então, involuntariamente, me deixará navegar até o mais distante mar ?)

Quiçá logo compreenda
Que não consegue cobrir detalhes com qualquer emenda
Que há alguém capaz de transformar em ruinas o que já foi lenda

Mas, como já dito, eu não me importo, não mais implico
(Eu sou livre como a ventania)
Sou indomável de um modo que você jamais imaginaria
Sou insubordinável de um modo que jamais seguraria
Foi erro seu acreditar que me iria me ter
Foi ilusão minha acreditar que iria me render
 
A Balada do Incorrigível

Bolero de Bordel

 
Eu só desejo ter-te por alguns momentos sob minha custódia
E algumas fantasias para mesclar com paródias
Ainda mais que isto, prefiro
Que você seja uma deusa dos cabelos de menina nórdica
[E que nossa cama de lençóis brancos seja seu altar

Você é secreta, você é um mistério
Esse vinho amargo que (es)corre nos cantos de seus lábios
Não condiz com seu gosto embaunilhado
Você não é (só) minha, receio
Seria egoísmo possuir o que é alheio

Ah, o que se esconde por baixo de um vestido negro
Um invólucro escuro como os becos na noite sem estrelas e luar
Com os quais já não mais temo, já que tenho seu olhar âmbar
Talvez eu possa desvendar...
Que por trás de seu coração há vil metal
Que por trás de sua perfomance é tudo teatral
Que por trás de uma noite eterna, há hora marcada
Que por trás do final há outro alguém esperando na porta de entrada

Porém, agora, isso não difere, isso não importa
Apenas se entrelace em mim
Vamos, que ainda temos tempo (que o ponteiro do relógio aos poucos corta)
Venha, Meretriz
Imperatriz
Ama-me!
Que ainda não há ninguém a espera da senhora.
 
Bolero de Bordel