Poemas, frases e mensagens de FredericoSalvo

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de FredericoSalvo

No meu sonho mais puro e sincero
Quis ser, inocentemente, eterno.
Forte eu era. Inabalável sempre.
Ao acordar, optei por ser apenas um homem.

Meu Luso do mês de novembro é...

 
Meu Luso do mês de novembro é...
 
É com grande prazer que trago ao sítio a entrevista abaixo. A princípio a poeta homenageada seria nossa amiga Betha M. Costa, que por motivos pessoais não pode aceitar a indicação..
Tanto eu quanto a Betha, tentamos encontrar um outro colega que pudesse preencher esse espaço, mas, todos hão de convir, que não é tarefa fácil ocupar o lugar de uma pessoa previamente escolhida para ser homenageada. Diante da situação e das muitas tentativas frustradas, recorri a minha grande amiga Márcia Oliveira que, como eu, afim de não deixar morrer a ótima iniciativa proposta por nosso colega de Luso, Alentagus, concordou em ser a entrevistada do mês de novembro. A única ressalva colocada por Márcia, foi que a entrevista a focasse como leitora e não como poeta, já que não se considera como tal. Eu, apesar de não concordar com ela, respeitei essa colocação e deixo agora com vocês um pouquinho das palavras dessa amiga querida.

Querido amigo Fred,
Quero agradecer a você a oportunidade de colaborar contigo nessa situação difícil que se apresentou. Sinto-me lisonjeada, porém, já nos conhecemos há muito tempo e você sabe que sou uma pessoa muito comum. Sabe que tenho muita dificuldade em me expressar; sabe também que não sou poeta e que os textos que tenho aqui no Luso, são resultado de um demorado exercício de atrevimento ao descrever algumas das suas telas. Não tenho a sensibilidade de vocês poetas, nem o conhecimento necessário da língua portuguesa, nem mesmo experiência de vida suficiente para dar brilho à criatividade e sentimentos que vocês tão elegantemente expressam na poesia. Mas...vamos lá....

Pessoalmente tenho pouco a dizer. Sou brasileira e paulistana extremamente miscigenada. Minha infância, foi extremamente pobre, mas muito feliz porque ainda pude brincar na rua e com pés descalços. Sou formada em Publicidade e Ciências Sociais e bacharel em Geografia. Lecionei durante 17 anos no ensino público e particular daqui de São Paulo e, por motivos pessoais e de princípios, magoada e frustradíssima, deixei. Militei em alguns partidos políticos quando ainda acreditava em possibilidades... Viajei muito e convivi com diferentes culturas, isso me ajudou a formar uma consciência mais humana que procuro aplicar no meu dia-a-dia. Aprendi a arranhar alguns idiomas, o que me ajuda muito na relação com pessoas de outros países. Divirto-me estudando Esperanto.
Hoje, devido às circunstâncias, me dedico à massagem estética que aprendi a apreciar e a me sentir muito feliz com os benefícios que posso levar às pessoas, contribuindo com a saúde corporal e aumentando a auto-estima de quem tanto precisa. Sou leitora compulsiva e, seguindo você, vim parar no Luso. Aqui encontrei e fiz excelentes amigos. Presenciei vários momentos de superação tanto na poesia quanto na vida pessoal de vários Luso-Poetas.
Não tenho nenhuma autoridade para fazer qualquer avaliação literária, mas posso como leitora assídua, afirmar que aqui há inúmeros poetas que não deixam nada a desejar aos grandes e consagrados escritores. Evidentemente não poderia cometer a deselegância de citar nomes, até porquê são muitos, de qualidade inquestionável. Cada qual a seu modo, demonstra suas emoções e sentimentos mais íntimos, e com prazer, compartilha com todos. Obviamente, por ser uma comunidade democrática, vez ou outra há algumas intempéries; diferenças de opinião; vaidades exacerbadas... Isso incomoda um pouco, mas não lhes tira o brilho.

Não quero falar de Neruda, Pessoa, Saramago, Clarisse, Camões, Florbela e tantos outros. Gostaria sim, de reafirmar o valor de cada um daqui deste sítio, que procura com suas poesias, nos brindar a cada momento com sensações inúmeras; que através da sua simplicidade ou complexidade nos fazem pensar e refletir sobre a vida e que conosco dividem suas doçuras e amarguras.

Finalizando, agradeço infinitamente a todos que se dispuseram a ler meus “poemas” e até a comentá-los tão gentil, educada e generosamente. A você Fred por sua amizade tão singular, honesta e leal; pelos tão diversos momentos em que estivemos juntos, ora colo, ora ouvido, ora tristeza, ora alegria, receba todo meu afeto através desse ato. Peço desculpas a todos por ocupar um espaço que originariamente não era meu, mas ao mesmo tempo faço saber que o fiz com muito prazer e felicidade por me sentir um pouquinho mais perto de todos. Com muito carinho....

Má.

A miscigenção é uma característica marcante do nosso país. Você mesma é um exemplo vivo disso. Como você vê a influência desse fator na construção da sociedade brasileira?

Realmente não dá pra falar em formação do povo brasileiro sem tocar diretamente na palavra miscigenação. Índios, portugueses, africanos e imigrantes de muitos outros países são responsáveis pela formação do nosso povo. Vejo isso, hoje, de maneira mais positiva embora em muitos períodos de nossa história tenha sido um fato muito traumático, mas resultou numa cultura muito rica; sem igual. Devemos a essa miscigenação, nossa língua, nossas religiões, usos e costumes dos mais diversos. As diferenças sociais são terríveis mas, em contrapartida, é muito comum vermos nos grandes centros comerciais daqui a convivência pacífica entre povos que mantém relacionamentos muito difíceis em seus países de origem. Penso que se tornou uma característica muito importante para o nosso país.. Há problemas seríssimos relacionados ao preconceito racial, porém estamos percebendo que muitas coisas estão mudando por aqui; lentamente, mas estão acontecendo. Penso que nossa sociedade ainda esteja em desenvolvimento e que estejamos construindo uma identidade muito forte, reconhecida e respeitada no mundo inteiro. É preciso sermos otimistas.

Você nos diz em seu texto que, numa visão política, “...acreditava em possibilidades”. Considera-se hoje uma pessoa cética a esse respeito? Quais seriam , na sua opinião, as diretrizes que nos conduziriam para um futuro melhor no mundo globalizado?

Participei sim, num passado muito próximo, de vários projetos sociais patrocinados por alguns partidos políticos ainda como professora, o que me levou à militância política. Com o passar do tempo, como não conseguia identificar nada de concreto e de verdadeiramente a favor da população em geral, fui abandonando e me decepcionando de tal forma, até deixar definitivamente qualquer orientação política. O que acontece no Brasil é conhecido por todos. Está muito claro e estampado nos jornais do mundo todo e na grande maioria das vezes envergonhando nosso povo. Em relação à política que se apresenta, me dou sim o direito de ser cética. Quanto às diretrizes que nos conduziriam para um futuro melhor no mundo globalizado, na minha simplória opinião, penso que antes deveríamos nos deter internamente em reavivar alguns princípios básicos, dos quais posso citar a vergonha, justiça, verdade, honestidade e igualdade. Penso também que aqui cabe citar a importância (esquecida) da educação no desenvolvimento do exercício pleno da cidadania. É preciso sermos otimistas, mas a globalização pode ser muito cruel para os países mais pobres ou emergentes.

Assim como eu, você optou pelo caminho da massoterapia. O que a levou a abraçar essa profissão e que mudanças a respeito de si e do ser humano de uma forma geral aconteceram depois desse advento?

Como todo cidadão comum de um país capitalista, também tenho a necessidade do trabalho e do dinheiro para a sobrevivência. Após deixar 17 anos de magistério, procurei fazer alguma coisa que me proporcionasse satisfação pessoal e que me garantisse o mínimo de condições possíveis de manutenção da minha vida. Tudo o que procurava acabava encaminhando-se para o ramo da estética. Confesso que nunca foi do meu interesse. Sempre julguei que a estética, num país pobre como o nosso, devesse ficar em outro plano, não no das prioridades. Gostaria de ter conseguido ser mais forte e continuado minha carreira no magistério. Infelizmente houve um momento em que a decepção e a sensação de solidão e impotência diante do descaso e da indiferença com que são tratados os assuntos relacionados à educação foram muito mais fortes do que eu. Frustração e angústia tomaram lugar ante a possibilidade de fazer um bom trabalho. Mas o tempo passou e hoje estou satisfeitíssima com a escolha que fiz. Proporciona-me prazer e ao mesmo tempo é suficiente para minha manutenção. Consigo realização profissional, pessoal e ainda proporciono conforto às pessoas que me procuram. Foi um ato político...rsrs..

Poeta você diz não ser. Fato que eu sinceramente não concordo, mas respeito. Sendo assim,na sua visão de leitora, como acha que os visitantes do Luso, que sempre estão por aqui em grande número a lerem nossos trabalhos, percebem o sítio?

Fiz aqueles textos, como você sabe, a seu pedido. Você não faz idéia do quanto me custou a escrevê-los, mas jamais me negaria a um pedido seu dado o tamanho e a força dos laços de amizade que temos. Realmente não sou poeta. Sou muito atrevida, isso sim!
Gosto muito do Luso a ponto de ser suspeita de falar sobre ele. Penso que quem o visita, encontra leitura de qualidade, do popular ao mais erudito. Afora alguns excessos cometidos por conta da vaidade, aqui o leitor encontra bons amigos, leitura para todos os gostos, além de ser um lugar que proporciona momentos de muita emoção, viagens fantásticas pelos sentimentos mais íntimos de quem deseja nos brindar com a sua imaginação, com as suas idéias, com o seu conhecimento, experiência de vida e inclusive incentivo. Através das poesias, das prosas, dos textos enfim, o leitor pode viver o que quiser, amar, odiar, elogiar, criticar... Aqui se é quase livre. Daí o sucesso.

No texto em que nos presenteia, você cita autores consagrados. Quais seriam os seus preferidos? E quais as obras que até então mais lhe marcaram?

Esta é uma boa pergunta, porém dificílima de ser respondida. Vou citar alguns apenas para não deixar de respondê-la, mas certamente poderia passar aqui horas a enumerar obras de que gosto.
-A História da Riqueza do Homem, Leo Hubbermann; O Príncipe, Maquiavel; Não Verás País Nenhum, Ignácio de Loyola Brandão; e tudo o que eu pude ler de Camões, Cervantes, Pessoa, Lispector, Cora Coralina, Graciliano Ramos, Machado de Assis, José de Alencar, Poe, Neruda, ahhh.....e muitos, muitos outros.....

Para finalizar, antes de nos dizer sobre a sua escolha do poeta/Luso do mês de dezembro, peço que deixe para todos que por aqui vierem compartilhar dessa leitura, algum texto ou poema que seja marcante para você e que possa acrescentar a todos nós. Obrigado pela delicadeza e simpatia.

Fred querido, apesar da situação inusitada, adorei participar. Suas perguntas são excelentes e mereceriam um cuidado bem maior na elaboração das respostas. Peço desculpas pela forma simplória como as respondi. Gostaria de ter tido mais tempo....
Outra boa pergunta difícil de responder, mas vou fazer da forma mais simples que me ocorreu nesse momento. É um poema de Cora Coralina, que gosto muito e que me parece apropriado para inúmeras ocasiões. Esta, em especial.

NÃO SEI...

Não sei... se a vida é curta... Não sei...
Não sei... se a vida é curta ou longa demais para nós.
Mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe,
braço que envolve,
palavra que conforta,
silêncio que respeita,
alegria que contagia,
lágrima que corre,
olhar que sacia,
amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo,é o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira e pura... enquanto durar.

A você Fred pelos motivos que bem conhece, toda minha gratidão, afeto e sentimentos verdadeiros de amizade profunda. Muito obrigada por tudo.
Aos leitores que tão gentilmente estiveram aqui, meu respeito, carinho e agradecimento sincero pela bondade, paciência e compreensão.

Finalizando, gostaria de homenagear os amigos portugueses indicando para poeta do mês de dezembro, meu amigo Fernando Jorge Matias Saiote, o Alentagus, por sua sensibilidade, amabilidade, companheirismo e capacidade de nos brindar sempre com excelentes textos que além de emocionantes, são inteligentíssimos.

Carinhosamente,
Má.
 
Meu Luso do mês de novembro é...

Sesta

 
A tardinha descamba mole...
E meu corpo a balançar na rede amarela
Pelo esforço do meu pé direito
Sobre a cerâmica áspera.
Faz-se o vento que não havia.

Andorinhas cortam o ar
Com seus mergulhos desconcertantes
E vêm adentrar os vãos das telhas
Onde os filhotes iniciam grande rebuliço
E rompem ruidosa sinfonia.

Ontem não havia essa casa,
Nem essa varanda.
Não havia sequer uma sesta,
Nem essas mãos envelhecidas.
Vive o homem que não vivia.

Ontem não eram os amigos, distantes,
Nem tão ruins as notícias diárias.
Ventos eram comuns, sem balanço;
Redes...só nos ombros dos ambulantes.
Se eram amarelas...eu não sabia.

Frederico Salvo
 
Sesta

PEIXE

 
A pena estanca, para, titubeia;
Nenhuma idéia clara se apresenta.
Meu pensamento voa, devaneia
E sobre a beira d`água se assenta.

Sou pescador, agora, e para a ceia
Quero pirão de peixe com pimenta.
Cevo o remanso, acendo a candeia
E lanço o anzol com isca suculenta.

Esse exercício é pura paciência,
Pois tenho fome e fé em evidência.
(E a segunda, trago como lema).

Sinto um tremor mexer o molinete,
Aguço o olhar, respiro em falsete
E num rompante fisgo o poema.

Frederico Salvo
 
PEIXE

São Paulo (canção)

 
Letra e Música: Frederico Salvo


Depois que o sol
que imaginei se escondeu.
Por trás do arranha-céu
por fim se debateu.
Abri um furo no chumbo do céu
e imaginei estrelas a brilhar
sem véu.

Mas mesmo assim te curto
e mais,és sensação.
Viraste assim
um monstro bom pro coração.
Bar em bar eu respiro canção.

E é bom ficar perdido,
sem ter rumo,
nos braços teus.

São Paulo.
São Paulo.

1984

Direitos efetivos sobre a obra.
 
São Paulo (canção)

- TREM -

 
Vou . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
saindo . . . . . . . . . . . . . de mansinho . .
. . . . . . . . . . . . da estação . . . . . . . . . . .
. . . . . devagarzinho . . . . . . . . . . . . . . .
deslizando . . . . . . . . . . . . . pelos trilhos
. . . . . . . . . .num chiado . . . . . . . . . . . .
vou partindo . . . . . . . .vou rasgando a
ventania. . . .pelas curvas do caminho
. . . .disparando . . .num rompante. . .
vou seguindo. .
paro, não paro, paro, não paro, paro ,não paro
Passa boi, passa boiada,
Passa galho de ingazeiro,
Passa campo, passa estrada,
Passa um buritizeiro,
Passa rio, passa ponte,
Bambuzal passa pertinho,
Passa um belo horizonte,
Passa breve um passarinho,
E vou. . . . . . . . .
Sigo contente, sigo contente, sigo contente, sigo contente,
Sopro forte a fumaça,
Sopro grosso, sopro fino,
Passa mato, mato passa,
Passa burro com menino,
Vai passando cachoeira,
Fazenda, cerca, lagoa,
Passa tanta bananeira,
Passa brejo com taboa. . .
Paro, não paro, paro, não paro, paro, não paro
Passa casa, passa fio,
Passa moça na janela,
Passa cadela no cio,
Co’uma fila por trás dela,
Passa túnel, passa poço,
Pescador com seu caniço,
Passa velho, passa moço,
Passa porco bem roliço...
E vou. . . . . . . . . . . . .
Sigo contente, sigo contente, sigo contente, sigo contente,
De repente passa carro . . .passa prédio
. . . . . . passa gente. . . . . . . .propaganda
. . . . . . . . . . . de cigarro . . . . . . . . . . . . . .
Numa placa. . . . . . . . . . . . .bem à frente
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . passa moça que
passeia . . . . . . . . . . . . . . tanta graça . . .
em sua forma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
meu apito . . . . . . . . . . . . . . . . . alardeia . .
. . . . . . . . . . . . . . . vem chegando . . . . . . .
. . . . . . . . . . a plataforma . . . . . . . . . . . . . .
paro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .não paro . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . paro . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . não paro . . . . . . . . . . .
. . . . . paro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . não paro . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .paro.

Frederico Salvo.

PS.: Inspirado na poesia "Trem de ferro" do poeta brasileiro Manuel Bandeira.

(republicação)
 
- TREM -

Soneto ferido

 
Queria dizer-te do amor, dos enganos
E das armadilhas que há nos caminhos.
Do que eu colhi ao longo dos anos,
Do cheiro da flor, da dor dos espinhos.
Queria dizer-te do quanto fiz planos,
Do quanto quis ter de novo teus carinhos.
E mesmo afirmar que, apesar de insanos,
Meus versos são aves que voltam p’ros ninhos
A procura de abrigo pela noite escura,
Em busca de pouso pela vida dura,
Que arrulham sozinhas pela madrugada
Soluços do nosso convívio perdido. . .
Assim como esse soneto ferido
Somente é saudade feroz. . . e mais nada.

Frederico Salvo
 
Soneto ferido

FALSO APRISCO

 
Se todos caminhassem além da ponte
Que cruza imaginária esse oceano,
Veriam que não passa de engano
A água "cristalina" dessa fonte.

Veriam que a beleza do horizonte
Abriga o pé da fruta envenenada,
Veriam a falsidade mascarada
Que visita a terra de Trás-os-montes.

Se a todos eu contasse um vão que fosse
Da dor que me causou o amargo doce
Da fruta de que falo em meu poema,

Teriam a dimensão do grande risco,
Do mal que enfim repousa em falso aprisco,
Que diz matar a fome e envenena.

Frederico Salvo
 
FALSO APRISCO

A FLOR DA TUA LOUCURA

 
Anteparo;
Paro
Diante desse absurdo;
Surdo,
Perdido nesse abandono;
Dono
Da flor dessa tua loucura;
Cura;
Passa de mim tão distante;
Ante
Ao rosto do cruel destino;
Tino;
Julguei-te tão apaixonada;
Nada;
Só essa dor nauseabunda.
...

Frederico Salvo.
 
A FLOR DA TUA LOUCURA

Incompatibilidade

 
Quando eu partir, solidão (parceira minha),
Talvez em noite alta ou tarde desmaiada,
Numa manhã de sol ou fria madrugada,
Entrego ao teu cuidado os frutos desta vinha.

Apago estes passos tortos da estrada,
Devolvo esta surrada ilusão qu’eu tinha,
Entrego esta esperança que sempre foi minha
De mão beijada a ti no fim desta jornada.

Deixo aqui neste mundo um grito de saudade,
Desemaranho o espírito, livro-o desta rede
Na última parada, salto desta linha.

No fim desta eterna incompatibilidade,
Eu vou de encontro à água que mata minha sede.
Enfim desato os nós e deixo-te sozinha.

Frederico Salvo
 
Incompatibilidade

Línguas

 
“Uma pessoa ocupada em servir nunca dispõe de tempo para comentar injúria ou ingratidão”.

Enquanto línguas cortantes, ferinas,
Só dão notícias das vidas alheias.
Enquanto arestas, farpas pequeninas
Se enroscam em ardilosas teias,

Outras entoam constantes, divinas,
Em outros pontos, em outras aldeias
A poesia de sensatas rimas,
A melodia de maviosas colcheias.

E nessa arte, desprendidas servem,
Enquanto as lavas desse mundo fervem
Num vulcanismo de intensa fúria.

São como botes contra a correnteza
Desafiando a humana natureza,
Num oceano de ingratidão e injúria.

Frederico Salvo
 
Línguas

Noturno

 
Lá fora há cobras, lagartos,
Homens e abutres.
Há Neros ateando fogo
Nas Romas despercebidas.
Eu, cá do meu chuveiro,
Aspiro a brisa leve da noite,
Que me chega pelo basculante
Desse quarto de banho.
Daqui maquino um poema bruto
De arestas rijas e cortantes.
Degluto esse sumo amargo
Como fosse seiva doce.
Só o que me salva
É saber que daqui a minutos
Meu corpo enxuto
Estará sob os lençóis macios
Adormecido (por ser justo?)
Em grata serenidade...
Apesar de tudo.

Frederico Salvo
 
Noturno

Pelas colinas da minha aldeia

 
Será que em ti ainda evapora
O humor bendito daquela bruma?
Será que quebram, a fazer espuma,
Algumas ondas como houve outrora?
Ainda acordas de madrugada
Com um verso meu a tirar-te o sono?
Tens a presença do abandono
Mesmo que estejas acompanhada?
Pois eu confesso que aqui campeia
Pelas colinas da minha aldeia
Essa lembrança que a mim consome.
Bem no recôndito d’alma mora
A acompanhar-me p’la vida afora
Essa saudade a gritar teu nome.

Frederico Salvo
 
Pelas colinas da minha aldeia

-Flor de lótus-

 
Bebo a água que me deste, cântaro.
Sinto a sede minha debelada.
Linda flor nasceu-me assim do pântano,
Feito lótus. A alma desabrochada

Sorve e farta-se da tua dádiva,
Refrigera o fogo bem no íntimo
Nessa bem aventurada prática
De tornar-me a dor um caso ínfimo.

Bem no chumbo da manhã chuvosa
Ganha a lótus dimensões de rosa
E de amor enfeita-se cativa.

Se sedento fui na longa estrada,
Da tristeza vil não há mais nada.
Vinga a flor, bem-vinda e compassiva.

Frederico Salvo
 
-Flor de lótus-

-Seus olhos são os olhos do mundo-

 
Seus olhos são os olhos desse mundo,
Perdidos nos meandros dos meus versos.
E sabem como ir bem mais profundo,
Nas comas dos meus sonhos submersos.

Seus olhos são os olhos desse mundo
E podem enxergar, mesmo dispersos,
Na ínfima passagem d’um segundo,
A sede dos meus ditos controversos.

Seus olhos são janelas que convidam
À brisa do que sou a ir mais fundo,
Lutando contra o vento adverso.

E além das nuvens claras que navegam
No azul do céu (abóbada do mundo),
Seus olhos são os olhos d’universo.

Frederico Salvo
 
-Seus olhos são os olhos do mundo-

De que cor era teus olhos?

 
E de que cor era teus olhos?
Verde? Talvez.
Azul? Já não me lembro.
Olhos, quem sabe, negros...
Como a noite que há agora.

Sei que neles, pela primeira vez,
Mergulhei nu de pele e alma.
Da retina, deslizei ao canto
E rolei como uma lágrima...
Um oceano de vida condensado numa gota.

Tua boca sorveu-me salobro
E adentrei para além do teu físico,
Transcendendo tuas mucosas quentes
Na vaporização dos teus humores...
E então sussurraste-me ao ouvido: _Amor.

Mas a vida escorreu num declive,
Apossando-se o tempo, das horas.

E eu, aqui,
Já nem me lembro mais
Qual era a cor dos teus olhos.

Frederico Salvo
 
De que cor era teus olhos?

Pela fresta da janela

 
Houve mais que um sussurro ontem. Houve
Mais que um perdido cão latindo ao longe.
Houve cruel razão qu'eu nunca soube,
Rasgando meu silêncio cru de monge.

Coube no peito meu o tudo. Coube,
Ambiguamente assim, o som do nada.
Ninguém p'ra perguntar baixinho: Ouve
A canção que se fez na madrugada?

Amanheci mais tarde nu e trouxe
Na boca um gosto amargo. A beberagem
Tornou todo o meu ser embriagado.

Um feixe-luz de sol aproximou-se,
Da fresta da janela fez passagem.

Liberto está meu peito estagnado.

Frederico Salvo
 
Pela fresta da janela

-Dilema-

 
Porque foste presente e castigo,
Cravados em cruel dicotomia.
Porque foste relento e foste abrigo,
Exata reta em vasta assimetria.

Porque foste o antídoto e o veneno
Servidos nessa taça; homogêneos.
Porque foste o pudico e o obsceno
No oco desse peito; heterogêneos,

Foi que perdi o rumo, o caminho
E trouxe a razão em desalinho,
Valsando entre a euforia e o tédio.

Ergui um patamar, desfiz os planos.
Plantei certezas e colhi enganos,
Porque foste a doença e o remédio.

Frederico Salvo
 
-Dilema-

PENSANDO EM TI

 
Às vezes paro a pensar em ti. Sereia
Do mar constante que habita meu regaço.
Há sangue quente a transportar em minha veia
Amor maior que a serra grande do espinhaço.

Há poesia que inunda afluente
O evidente sentimento de que falo
Num mar maior onde navego calmamente
E que por ter-te tão em mim, onde me calo.

Eu simplesmente sinto forte e me rebelo
Contra o que o mundo insiste em dar-me a firme trago
E despedaço em versos mil, completamente...

As coisas brutas que implodem meu castelo,
As beberagens que infundem gosto amargo.
Eu tudo apago ao desfrutar-te em minha mente.

Frederico Salvo
 
PENSANDO EM TI

Seus olhos são os olhos do mundo

 
Seus olhos são os olhos desse mundo,
Perdidos nos meandros dos meus versos.
E sabem como ir bem mais profundo,
Nas comas dos meus sonhos submersos.

Seus olhos são os olhos desse mundo
E podem enxergar, mesmo dispersos,
Na ínfima passagem d’um segundo,
A sede dos meus ditos controversos.

Seus olhos são janelas que convidam
À brisa do que sou a ir mais fundo,
Lutando contra o vento adverso.

E além das nuvens claras que navegam
No azul do céu (abóbada do mundo),
Seus olhos são os olhos d’universo.

Frederico Salvo
 
Seus olhos são os olhos do mundo

Exílio

 
Estendo a mão à vida por resgate.
Há tanto tempo aguardo por auxílio,
Mas ela insiste em dar-me por exílio
A solidão, e a dor por estandarte.

Há muito venho caminhando a esmo.
Perdidos passos na estrada rude
Que vai ao nada, cansa, fere, ilude,
E faz voltar à terra de mim mesmo.

Alguém me disse que eu nunca soube
Valorizar a sorte que a mim coube
E nunca, mais serei do que vontade.

Em meu silêncio, lanço o meu destino
Nessa oração que entrego ao Divino,
Eu peço a Ele paz, por piedade.

Frederico Salvo
 
Exílio

Direitos efetivos sobre a obra.
http://pistasdemimmesmo.blogspot.com/