Quero tanto ser tua
Quero tanto ser tua, meu amor,
Que me reinvento em cores de borboleta
E ondas de luar para, de sobressalto,
Roubar-te um beijo,
Nem que seja um beijo do olhar.
Quero levar-te do teu morno mundo
Para o rubro do meu desejo,
Em abraços e carícias,
E abismar-te com a minha nudez de alma
Que ondula no meu corpo.
Quero acolher a tua pele
E torná-la minha,
Trémula ao toque do meu sopro desconexo,
Que se perde em suspiros de entrega.
Quero tanto ser tua
Que nua me quero vestir de ti
E assim ficar envolvida,
Cúmplice desse eflúvio de amor sem fim.
Não sei quando se apagou o sol
Não sei quando se apagou o sol
E se calou o vento
Na ombreira da estrada celeste,
Mas o palco não dançou mais
A canção alada,
Vibrante de constelações.
Silêncio. Só. Sem espaço. Vazio.
E tu que outrora seguraste
O cometa dourado
E o amaste...
Brilhaste infinitos,
Guardiões universais
Da aurora boreal
Encantada e doce.
Partiste-te por fim
Em quebrantos de tempo
Na galáxia escura
E caíste num buraco negro
Sem fundo.
Adeus, meu amor imenso,
Estrela distante
Do meu extinto céu!
A multidão
Na multidão,
Por vezes parece maior a nossa solidão.
Cruzamo-nos sem nos ver,
Tocamo-nos sem sentir,
E se um de nós desaparecer,
Ninguém se preocupará em conferir.
Na multidão,
Por vezes parece maior a nossa exaltação.
Atropelamo-nos sem parar,
Ofendemo-nos sem perceber,
E se um de nós começar a gritar,
Todos, o mais forte, quererão ser.
Na multidão,
Deveria ser maior a nossa união.
Respeitarmo-nos sem julgar,
Conhecermo-nos sem esconder,
E se um de nós tropeçar,
Todos, em solidariedade, ajudá-lo a se erguer.
Dor crónica
Taciturnas nevralgias
Irrompem desenfreadamente
Como sanguinolentas barreiras
Desconexas e alienadas.
E essa tortura, dor crónica,
Agrilhoa todas as vontades,
Os suspiros e gritos
Nos ventos e nas águas.
O fogo afoga-se nessas penumbras,
Mórbidas e devoradoras,
Sanguessugas venenosas
Que paralisam e estancam
A fonte da liberdade.
A mente, assim, sucumbe lentamente.
O eu perde-se.
Inânime, ganha-se a mediocridade.
Jeito de amar
Amo como sei amar,
Nem melhor, nem pior do que outra mulher.
Amo com paixão.
Amo com desdém.
Amo com dedicação.
Amo como convém.
E se entre palavras e actos me contradisser,
Responderei com o meu jeito de amar,
Aquele que eu quero dar,
Nem sempre aquele que quero experimentar.
O beijo
Quero dar-te um beijo
Sem pejo.
Um beijo solto,
Maroto.
Um beijo molhado,
Apaixonado.
Quero dar-te um beijo
Sobejo.
Quero e dou.
Enfeitiçou.
Teus lábios despudorou,
Queimou.
Dei-te o beijo
Sobejo, sem pejo.
Tua boca adorou.
Desejou
Outro beijo,
Outro beijo,
Outro beijo,
Que eu dou.
Minha boca decorou
Tua boca.
Desenhou
E quis,
Sem rodeios subtis,
Conhecer os ardis
Da tua língua
Sem míngua.
Língua na língua,
Lábios nos lábios,
O beijo aprofundou,
Saboreou,
Deliciou,
Excitou,
Apaixonou.
O beijo beijou-nos,
Aprisionou-nos.
O beijo partilhou,
Emocionou.
O beijo
Que te dei.
O beijo
Que amei.
A tua mão
Amor, perdoa os meus momentos de loucura!
Serena-me nos teus braços de brandura!
Preciso do teu colo para me sentir segura!
Preciso do teu calor para afastar a amargura!
Às vezes, deste mundo cruel desejo fugir.
Queria ter forças suficientes para conseguir
Dispersar esta nuvem negra e descobrir
De novo a luz que um dia fizeste eclodir.
As memórias e as culpas me atormentam.
A tristeza e o cansaço em mim pesam.
No chão caio. A esperança e o sonho não levantam
E, derrotada, entrego-me às lágrimas que não secam.
Amor, por isso mais uma vez te peço perdão.
Só tu tens a força para me chamares à razão.
Deixa abrigar-me no ardor da tua paixão.
Guia-me de novo para a vida com a tua mão!
Ao lado do teu corpo
Quando ontem ao lado do teu corpo me deitei,
Senti o teu calor na minha pele e me deleitei.
Depois levantei-me levemente para te observar
E mergulhei com a minha alma no teu olhar.
Os teus contornos, na minha praia, se transformaram;
Os teus olhos, o meu mar, se tornaram.
E assim como num transe mergulhei em ti
Querendo encontrar os tesouros guardados ali
No meio dos teus corais coloridos de desejo de amar.
Do tempo esquecida, não me cansei de procurar,
Mesmo sabendo que tenho a vida inteira para descobrir,
Todas as arcas escondidas que fazem a paixão ressurgir.
Como que hipnotisada, sobre a tua areia me estendi
E me entreguei. Foi um raio de sol que senti
Dentro de mim. Raio de sol cheio de calor,
Raio de sol como ouro, raio de sol anunciando a aurora do amor.
Foi tudo isso que eu senti e adorei
Quando ontem ao lado do teu corpo me deitei.
A poesia
Ela chegou devagar
Como uma frágil gota de orvalho,
Perdida no meio do nevoeiro
E que se aconchega
No seio da flor
Para não ser levada pelo vento.
Ela ficou no olhar
Como um terno sorriso de criança,
Puro reflexo da alma
E que livremente se solta
Num instante de eternidade
Para jamais ser levada da memória.
Ela deitou-se ao luar
Como uma mãe que vai dar à luz,
Dividida entre a dor e a alegria
E que só tem amor
No seu emocionado peito
Para receber a vida.
Em tudo existe poesia
Em tudo existe poesia!
No coração que palpita com amor;
No coração que sangra com dor.
Na lágrima que se solta com emoção;
Na lágrima que rola com desolação.
No beijo que unifica a paixão;
No beijo que anuncia a separação.
Na mão que afaga o cabelo;
Na mão que desespera em apelo.
No sorriso que revela a alegria;
No sorriso que oculta a melancolia.
Na palavra que ilumina o mundo;
Na palavra que empurra para o fundo.
Em tudo existe poesia,
E tu poeta não o podes negar!
É essa a tua afrodisia!
Deixa a tua alma rebentar!