Poemas, frases e mensagens de Massari

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Massari

Livros publicados: Não acordem os pássaros - contos (1994), Achados e guardados (2002). Beirais (2007), Arabescos (2008), Portos, olhares e ausências...(2009) , Espelhos do Tempo (2010) e Borboletas no aquário (2011).

Mandaria flores...

 
Mandaria flores
Para Adalgisa -

“Fosse ela a mulher
Da minha vida".

Recitaria para Lina,
Pessoa -

“Apreciasse ela quem voa”.

Faria uma canção
Para Cristina,
Singela -

“Qual Chico para Florbela”.

Mas envio
Flores para Anelise
Funcionária da loja de
Discos
Com poemas de
Quintana -

“Ah, aqueles olhos
Doidivanas...”
 
Mandaria flores...

Vida simples

 
A alegria almejada
Sempre esteve à minha volta
Meu pai descansava a enxada
E mãe descascava abóboras
Doce à espera sobre a mesa
Para nós algo tão nobre
Café passado na hora
No alvo coador de pano
Exalava o fino aroma
Da paz guardando oceanos
A noite vigiava estrelas
Dormir cedo sobre o manto
Da simplicidade, ah
Esse arrabalde do encanto!
 
Vida simples

As ausências geram sons

 
As ausências geram
Sons
Que atravessam a linha
Do tempo.

As ausências geram
Sons
Acordes involuntários
Alheios ao diapasão.

As ausências geram
Sons
E perpetuam suas presenças
Sem alarde.

Oh, aromas da saudade
Visitando remota canção!
 
As ausências geram sons

Noturna paisagem

 
Na ânsia louca de
se banhar
a lua arrebenta no
penhasco
e num ponto distante
e insondável
o suicídio coletivo e
silencioso
de estrelas bebendo
o mar.
 
Noturna paisagem

Perdas

 
Perdi algumas coisas
na vida: encontros, ônibus, vaidade...

(os ausentes não,
visito-os sempre
nas esquinas da saudade).

Perdi o desejo
numa relação do passado
resgatei-o nos beijos
da brisa varrendo
os meus lábios.

O que perdi é quase nada
caberia no bolso da camisa
(sem bolsos por acaso)
mas a experiência adquirida
preencheria átrios.

Perdi algumas coisas
na vida
mas é tão pouco
que acredito tê-las ganhado.
 
Perdas

Beirais 1

 
De onde essa dor
que não se mostra

recôndita detrás
de invisíveis portas?

De onde esse voo
alçado sobre destroços

a ausência de beirais
ao pássaro acaso importa?
 
Beirais 1

No lixo, o luxo

 
A franzina menina interrompeu,
bruscamente, a tarefa a qual,
atenciosamente executava, ao
deparar-se com um belo par de
brincos.
Demasiadamente grandes para o seu
tamanho, mas belos.
Colocou-os e verificou, num pedaço
de espelho, o resultado.
Sorriu satisfeita e por instantes foi
diva na fétida madrugada já que, subitamente.
como se lhe espetassem agulhas na consciência,
voltou à realidade.
O lixo, com seus restos de víveres e objetos
que vendidos permitiam a sobrevivência da
família era mais importante do que seu estúpido arroubo de vaidade.
 
No lixo, o luxo

Telhados de vidro 1

 
I

Em terrível bombardeio
inquiriu-se o soldado:
- que valia tem o meio
se a dor já é prévio saldo?

II

Jovens: pueris sois vós
(retruca o “experiente”)
não é prudente “ter voz”
(nem se apercebe que mente).

III

A velhice é coisa bela
que dever ser respeitada
pois revela sapiência
na calmaria da estrada.
 
Telhados de vidro 1

Poeminho indiferente

 
O menino esforça-se nos
malabares
e o vermelho fogo do semáforo
que, momentaneamente,
a sua arte evidencia

queima, indiferente aos olhares
da tarde
manuscritos de olvidada poesia.
 
Poeminho indiferente

Curtida ao tempo

 
Levo na minha matula
De couro, curtida ao tempo
Saudades de lavra pura
E um coração feito o vento:

- Geralmente é regozijo
Às vezes, dor e lamento!
 
Curtida ao tempo

Poderia fazer um poema sórdido

 
Poderia fazer um poema sórdido
Desfilando palavrões à vontade
Mas para que se o poema pede
A leveza e não supostas verdades?

Poderia fazer um poema sórdido
E embalá-lo com a mesma roupagem
De quem se acha, com tal artifício,
Revolucionário! Quanta bobagem!

Poderia fazer um poema sórdido
Certamente ganharia notoriedade
Cartão de ouro, abraço efusivo
Admiração de alguns, vaidade.

Mas meu poema não terá o gosto
Da anarquia à palavra emprestada
Pois se na lida diária e serena
Cunho poesias, com a alma lavada.
 
Poderia fazer um poema sórdido

Último poema

 
O meu último poema
será breve
derradeiro suspiro do suicida...

ou alguém altercará o fato
de que o poeta se mata
e renasce em cada esquina...
 
Último poema

Amizade

 
Amizade é feito
manhã
que nos resgata da
escuridão.

Amizade cheira
à hortelã
hálito límpido e bom.

Amizade é compartilhar
momentos
felizes ou não.

Amizade é ser suporte
na queda
na subida oportuno empurrão.

E se, um dia,
sofrer qualquer dano
amizade também é perdão.
 
Amizade

Taça - Final

 
E neste mundo
Que é um vasto circo,
Que à saída se paga a entrada

Talvez seja o destino, de fato,
Um livro
Com a última página arrancada!
 
Taça - Final

libertas quae sera tamen

 
Deformo o teu olhar
E na moldura
Já não vejo o abismo
Da infértil procura
Mas a liberdade voo
Deserto que cura.
 
libertas quae sera tamen

Das cicatrizes

 
A cicatriz que hoje ostento
não traduz derrotas
perseguições ou flagelos
tampouco árduo trajeto.

Somos o que pensamos ser
mundanos e pequenos
glorificando nossos feitos

grandiosos anônimos
com vertigens, derrotas, medos...

A cicatriz que hoje ostento
eu a fabriquei
com a minha imaturidade
(às vezes arrogância e vaidade)
inconsciente ou não
impregnou minha pele
ratifica o meu passado.

Quereis agora que num átimo
do trem descarrilado recolha
originais intactos?

A cicatriz que hoje ostento
é poema que tornei público
repousando em calmas águas.
 
Das cicatrizes

Já não faço poemas acerca do amor

 
Já não faço poemas
acerca do amor
pois se o poeta deveras
mente
retiro as armaduras da
alma
e inundo os teus lábios
mornos
com essa fragrância de dor.
 
Já não faço poemas acerca do amor

Antes que cheguem as cigarras

 
Antes que cheguem as cigarras, haverei de partir...
Não ouvirei o canto de acasalamento a ressoar pelo ar. Nem verei as crianças a caçá-las, nas mangueiras, no pomar. Pois antes disso, haverei de partir, como, um dia, você. Sem aviso, feito a neblina que, repentinamente, se desfaz. Nenhum indício de que pudesse voltar apenas o som das cigarras naquela tarde, como regessem já a sinfonia da saudade.
Sentado no canto da sala, a espiar pela janela, nem percebi o tempo a fugir das minhas mãos.
Vezes muitas, vi-a, caminhando pelo jardim, mas desaparecia por entre as folhagens, antes que pudesse segui-la, diluída em espaço e fumaça.

****************************************** *

Conheci-a, no mesmo dia em que ti perdi. Chegou de repente, adentrou meu peito, agigantou-se, tornou-se parte integrante do meu dia-a-dia.
Lascivamente controla os meus gestos, orienta os meus atos. Sei que nunca estarei só. E essa certeza provoca prazer e agonia. O que fazer? Não há fugas, pois sempre me encontrará com os seus olhos ardentes, o largo sorriso estampado a me envolver.
No início, aparecia vez ou outra, quando estava só, nas indagações de uma vida confusa e vazia. A intimidade se fez, sua presença é constante.
Ontem mesmo, na quietude de um feriado de Finados, chegou bem cedo. Pra dizer a verdade, acho que passou a noite comigo. Não notei a sua presença, pois, embriagado, adormeci no sofá e apenas pela manhã abri os olhos.
Estava ao meu lado. Sorriu-me, os lábios úmidos e atraentes.
O difícil é admitir que, de uns tempos para cá, um sentimento novo de mim se apossou e que atribuo a um ciúme terrível e desenfreado. Quero-a só para mim, embora impossível. Outros esperam-na, talvez, assim como eu, remoendo-se em ciúme.
Sempre será assim: transparente, vulgar e irresistível.
Partiu, deixando um “até breve”.

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Chove torrencialmente e a enxurrada, mais parecendo rio, arrasta dispersos sonhos que a cidade não recolheu.
Virá, certamente, com o odor da terra úmida e, feito ininterrupta goteira, há de martelar, horas a fio, a angústia escondida no vão de uma saudade incontrolável.
Nada a fazer, senão esperar. A rotineira espera da minha amiga solidão.

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Na cozinha, os talheres se amontoam, na evidência clara do abandono. Pelos corredores, sapatos, roupas, propositadamente espalhados à espera de antigos arranjos.
Cheguei, um dia, a imaginar que você estivesse concluíndo um ciclo, que sairías do solo, subirias pelo tronco de qualquer árvore e anunciarias, com suave canto, a tua volta.
Mas que esta insânia não deforme a realidade.
À minha frente, à mesa, os comprimidos se espalham a me desafiarem, perdidos em meio a fotos, fatos e cartas...
O que busco, nessas tardes, em que, debruçado sobre o passado, reviro os meus guardados...?
Pelas frestas das horas, réstias de luminosidade a se dispersarem pela escura sala. Reminiscências, saudades... do que vivem os meus guardados?
Habito outras tardes, sou parte de metades.
O que busco em meus guardados, senão a luz de outras tardes?
Senão o canto de outras cigarras?
Há tempos, por aqui o carteiro não tem passado.
Nenhuma notícia, novidades.
Talvez no céu carteiros não haja...

do livro "Não acordem os pássaros"
 
Antes que cheguem as cigarras

Poema mal (dito)

 
Já que o poema foi mal
Interpretado
Que fique o dito
Pelo não dito
E assim selamos um acordo
Sem máculas:

Bem dito, pois, fica desde já
Tudo o que outrora foi mal dito.
 
Poema mal (dito)

Poesia

 
No dia Mundial da Poesia, uma pequena homenagem a essa ilustre dama que, há tempos, descobri nos compartimentos do meu ser e desde então, com a sua beleza, me acompanha.



Poesia

No dia-a-dia procuro aportar
Na poesia o “eu” mais profundo
Por isso sou na imensidão do mar
O navegante mais feliz do mundo.

Parabéns à poesia
 
Poesia