Senta-te na beirada da tarde... Aqui ou ali.
Pega uma agulha de brisa e linha d' ouro gasto.
Vamos bordar as margens do que vejo;
as folhas correm apressadas
no vilarejo.
Aquela figueira esquecida no
canto esquerdo da rua,
dizem que ela nasceu para sombrear
um desejo.
Nela a meninada sobe como quem
escala o tempo
e o tempo colhe os figos para
ficar com mãos sujas de infância.
Lá adiante, a pequena vendinha vende balas
que já não existem nas grandes cidades.
O dono é seu Avelino, sabes que ele sabe
o nome de cada comprador de pão e conversa
fiada? E ainda fala com os retratos dos que
já se foram como se ainda comprassem fiado.
Sei que olhas reto, mas na rua mais escondida,
há uma casa de madeira azul descascada.
Lá vive uma senhora que fala com os gatos
e estrelas; dizem que ela costura sonhos
nos panos de prato e quem ganha um,
sonha melhor.
Na última ladeira, aquela que leva ao
campo onde o céu se deita,
há um banco de madeira sob um poste
que ilumina sem eletricidade.
Ali os namorados do vilarejo deixam
promessas amarradas nos galhos baixos:
fitas, bilhetes, pedaços de roupa...
Como se o amor precisasse ser balançado
pelo vento...
Agora, um suspiro e um ponto
de saudade...
que o tempo nunca arremata.