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Quem matou Salomas Salinas - IV

 
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Dobramos e entramos na Rua do Norte e depois de passamos alguns quarteirões, no melancólico do meio na tarde cinzenta alcançamos finalmente a Praça da Saudade com os muros e as grades do Cemitério do Gavião ao fundo. A indolência monótona dos vendedores de flores e velas alheios aos sofrimentos daqueles que perderam seus entes queridos. Aposentados tranquilos jogando dominó, outros damas e uns pés peruavam em volta dos bancos. Do outro lado os taxis encostados em frente ao abrigo, seus motoristas em grupos conversando, alguns dentro deles lendo jornal com a porta aberta. Jovens casais de adolescentes fardados abraçavam-se debaixo das frondosas arvores, onde os passarinhos alegres pipilavam sem parar nos seus galhos. Pela monotonia do momento concluímos que o féretro ainda não havia chegado e em passos mais tranquilos fomos nos aproximamos do portão da necrópole, O clima abafado e um céu cinzento marcavam o tempo. Uns fregueses bebiam num bar da esquina da rua do Passeio e de lá vinha múrmuros e risos e clientes saiam de um sacolão em frente.

Num começo da noite, bebíamos umas doses esparsas de uma cachaça da terra na garagem, transformada num restaurante que ele orgulhosamente gerenciava. Estávamos em pé rente ao balcão cada um de um lado, sacudiu o litro e pediu-me para prestar atenção no colar de pequeninas bolhas que formaram-se ao redor do gargalo.
- Essa é da boa, mestre - - Disse-me olhando como um profundo connaisseuer de vinhos finos e depois serviu as doses nuns copinhos de plásticos e a moda russa entornamos num gole só, a bicha desceu rasgando, adormecendo os nosso estômagos. Abriu o congelador e apanhou uma garrafa de cerveja cinzenta e elegantemente colocou sobre a mesa juntamente com dois copos de vidro e os encheu. Sentamo-nos e brindamos a nossa boa amizade.
- Peixe, agora estou mais tranquilo, aluguel o andar de cima para um bacana, dono de uma dedetizadora. O cara é foda, conhece quase todos os bacanas e é estribado, tem um sitio na Maioba que é uma beleza.
Nesse momento ouvimos e vimos um vistoso Santana Azul de quatro portas subindo a rampa do terraço e parando de frente para nós. O motor desligado.
- É esse ai, o cara que te falei. É cabeça, gosta de uma diamba que chora.
A porta do motorista se abriu e dela desceu uma figura forte e a fechou bruscamente e veio em nossa direção.
- Cadê o pintor fido de égua? Gritou para Salomas que levantou-se de imediato e a figura deu meia volta e foi até o porta mala, abriu e pegou uns galões de tintas e as deixou sobre o piso perto dos pés de Salomas e ordenou severamente – Presta atenção, nesse sacana. Já comprei bastante tinta e e esse mocinho não termina o serviço. Me dá uma cerveja – Salomas servilmente deu a volta pelo balcão até o congelador.
Essa figura tão autoritário e desconfiado como todo bom enrolão como era, conhecido como Mister Boquinha ou Pequeno Defeito um grande sacana, suspeitei logo pela sua empáfia ao olhar-me de esguelha apreensivo e sussurrar no ouvido de Salomas:
- Quem é esse?
- Esse é meu amigo, ele é ferreiro, tem uma oficina lá no Desterro.
- Ah! Tá – E sorveu seu copo de cerveja. Olhou dessa vez mais complacente – Serralheiro? E acenou com cabeça para mim num sorriso falso de gerente de banco.
Retribui.

 
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efemero25
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