Poemas, frases e mensagens de jorgejansen

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de jorgejansen

CLAUSURA

 
Não sublimo aos mares que
nenúfares trazem
nem ao ímpeto do desejo
esta coisa algoz

meu berço é sereno e
lúcida minha voz

quando detenho-me em clausuras
proscrevo os demônios aflitos
o que fazer então do amor desfeito
senão enterrá-lo à gritos?
 
CLAUSURA

NÓDOAS

 
Desse amor
eu juntei o pó
e espalhei pela casa;

sujei as louças
quebrei os vidros
derramei o óleo
sobre os espelhos da casa
pra minha visão ficar
eternamente
embaçada de ti;

à tardinha
juntei os cacos
amornados de sol
e cortei os pulsos
que se mantinham atados a ti;

corri pra varanda
sangrando restos de luz
pois não me restavam teus versos
nem tão pouco teu silêncio
apenas dei-me a contar estrelas
enquanto pude vê-las

e depois veio a chuva
escura
que lavou este chão imundo
de nódoas
tuas.
 
NÓDOAS

MORDIDA

 
Hoje senti na carne o sabor de tua primeira mordida
E dei-me a lembrar uma lembrança esquecida
Do que se tira da carne além do sabor da mordida;

Dei-me a sentir sem perceber o rubor das dentadas
Dos dentes na carne morna extasiada
Dei-me a senti-los afiados
Os quantos beijos sórdidos e roubados
Que permiti destes lábios encarnados;

Senti na carne os dentes ainda dormentes
Irrompendo a pele guardada
Fartamente inundada
Dos cheiros teus;

E dei-me a sentir sobre a pele latente
O golpe voraz de tua boca faminta
Exaurindo inocente
O rubor que me restava
De um amor agonizante
E os restos de minha carne indecente
Que somente a ti desamparava
Fortemente
 
MORDIDA

AGLUTINAÇÃO

 
De um violento espasmo
fez-se o absurdo
o surdo momento
entorpecido de gases
daí fundiram-se todos os metais
possíveis reais
sólidos
e os bólidos em chamas
perturbaram a natureza
e a impudência dos vegetais.
Quando foi tempo
todos os seres humanos nucleares
ativaram ogivais elementares
e fatais
quais serem humanos mentais
todos envoltos em pânico
desabaram sobre si próprios
e daquela cena no espaço
de um violento espasmo
houve o princípio de Criação.
 
AGLUTINAÇÃO

VERBO

 
onde
conjugar meu verbo
receber teu hálito
abrandar meu desejo
de macho
senão
nestes
cabelos fartos
nesta boca que é seda
neste corpo
onde agora me
encaixo?
 
VERBO

ORÁCULOS DE SOL

 
É quando o sol com seus oráculos
ateia fogo à tarde que multiplica-se
nas horas de silêncio e mormaço

enquanto nas frutas adormece o açúcar
amadurecido – na carne – através do dia

O dia é esse: estas manhãs e tardes
acesas num relâmpago que se propaga
em convulsão; esta combustão de luzes
súbitas arrancadas das entranhas do céu
esta flor em fogo que nos incinera em silêncio;

Dia – objeto
do tempo – elemento
necessário à sublimação vegetal. Sob seu árduo
trabalho
a arquitetura do sol
a alimentar algebricamente as articulações da terra.
Presa ao chão, a raiz submete-se à necessária
escuridão.
O dia findo previsto na conjuração carnal
previsto no calendário obtuso
nas hordas televisivas
e um sol freqüente a questionar-me
( e eu a ele ) o desgastar das nossa vidas;

indagar a si mesmo é como prever
a própria morte. A morte dissecada
nos relógios
na amputação das horas.

Sol. Fúria de anjos sobre a pedra e o mar inadiável
sobre a pedra e o sal incendiando-se sobre
a pedra sempre pedra acesa ao sol

crepúsculos de incêndios purpúreos apagados
pelo mar aflito a rebentar irrequieto
sobre as constelações das praias

sol sol que espero sob tua agonizante vigília?

eu – verbo presente a conjugar-me –
aceso o amor das horas escaldantes
sepulcro de vozes inabitadas nas gargantas:
a piedade dos anjos não nos libertará
dos verões diurnos

O sol é cúmplice da pedra no silêncio
e no soluço onde te abraço e confesso:

onde se alimenta o fogo destas horas?
 
ORÁCULOS DE SOL

DESAPEGO

 
Esqueço a derradeira solidão
abandonada em mim
como o meandro de um rio
desde a última estiagem.

Deixo-me possuir por uma nova
vontade e dela retiro a pele
até transformá-la em desejo.

Do teu nome não guardarei
nem o vestígio. Um dia logo
soterrará o outro e mais outro

e por repetidas vezes
logo não haverá sequer a luz
da tarde na flores

emanando teu perfume.
 
DESAPEGO

POEMA DO FIM DE MAIO

 
No momento preciso
impulsionado pelo vício trágico do âmago
e da dor
neste ofício de sofrer
sem ser possível conter o drama:
o amor se esvai.

Feito brisa: intocável
feito chama: inflamável
feito pedra rio mata virgem: uma solidão inexplorável.
 
POEMA DO FIM DE MAIO

DESPEDIDA

 
Enquanto ris
a hora desaparece
esvai-se o tempo do desejo
e na minha boca
esboça-se o beijo
que não te darei jamais.

Acendes um cigarro
no meu cigarro
que a solidão é cinza

prepara-se assim um adeus:
meus olhos na tua face
guardam-se em silêncio
para nunca mais.
 
DESPEDIDA

PÊNDULO

 
O morto
oscila no pêndulo
sem fim! A carne nobre
resiste aprisionada
nos ossos.

Um sol que orbita
vomita a luz
do dia
nos lábios do morto
que não anunciará
sua morte.

A sebe podre
o ar
trescalado de podre
e podridão incontida
testemunharão em juízo
a falência da vida.

O chão sódico
acolherá o sal
das lágrimas medidas
em gotas de onde
nunca brotarão
flores
 
PÊNDULO

SEPARAÇÃO

 
Semeávamos sonhos pueris
até onde nossa necessidade permitia.
Tão imprudente a juventude:
levou-nos a crer no amparo do beijo
e suas virtudes.
Quando tuas mãos me acenaram
percebi o descaso dos abraços mal dados,
das conversas interrompidas,
da solidão a dois incompreensível
até então.

E essa exatidão me persegue:
quando escavo o sepulcro das lembranças
(em sacrilégio) e dou-me a peregrinar
por imagens que o tempo já apagou.
 
SEPARAÇÃO