ainda é meu tempo de viver...
parti por não ter chão onde semear sonhos, cerro as palavras na boca, deixo-as na terra adormecida do meu âmago, talvez que as sementes germinem mais tarde em horas de saudade e, docilmente se entreguem em versos chorosos que embaciem os olhos, ou suspendam a tristeza e o vazio do tempo, e venham dourar o verde onde a minha esperança cresce... é verão, mas, estranhamente o dia é de penumbra a memória apaga-se lentamente e eu fico de morte ferida, mas ainda vivo, ainda é meu tempo de viver...exausta parti de mãos vazias, levo os desencantos, vou palmilhando o chão e levo por companhia a solidão, voltarei quando fôr lua cheia, se ainda fôr capaz de aprender a primavera, e as folhas em mim caídas voltem a reverdecer em meus sonhos, eu possa moldar de novo as palavras a meu jeito, e nada impeça que me tragam a promessa de ser gaivota na planície...com olhos de madrugada.
natalianuno
grão a grão
como água em debandada
foi-se a minha alegria
lágrimas à beira do vazio
nos confins sem tempo
vai a minha estrada...
e eu tão só na nostalgia,
simples o resumo da vida
que voou entre meus dedos
intensa, dizem as linhas da mão
ora oásis, ora deserto
- grão a grão, sem medos.
ouvindo o sangue à distância
na janela de par em par aberta
do coração de criança, sempre
alerta...
como água em debandada
agora mais negra, mais cansada
-vida é só já, chapinhar!
com desolada luz me alucina o olhar
já não sou a menina, trago dedos
de solidão e a saudade
que floresce feita obstinação.
natalia nuno
era preciso este vazio
era preciso este vazio
eu tive que morrer
para voltar a viver
voltei por outra porta
ainda não me reconheço
ainda não sei quem sou
apenas sei que aqui estou
mesmo que não exista
já na outra vida
e aqui estou
à espera de morrer de novo…
vá, chamem por mim….
- mas com cuidado para vir devagar
eu não sei se vim pelo mal
tempestade...
a minha mão escreve pedaços de nada
já a espreita a morte poeirenta
a sua sombra ao redor de mim calada,
e um frio invisível ocupa meu ser.
a tarde pardacenta, o mundo é de tristeza
doem-me os sonhos angustiados,
na certeza que ficam sós, a envelhecer,
vislumbro o que sobra
de meus passos cansados, escuto a alma
que deixa antever o clamor da pena
é tudo isto que a vida nos cobra.
resignada, fico longe da dor, serena
algo sobra confuso na mente
até nos deixar cair no vazio,
por entre as memórias roídas,
quase esquecidas, como sombras
que se vão apagando,
num remoto esquecimento
ficando em alucinada escuridão,
ainda que sobreviva o coração
com a nostalgia mal curada
e a sombra ao redor de mim calada.
ameaçadores são os ruídos das horas
com rumores delirantes e
com cheiro a saudade,
assegurando-me que estou só,
num tempo estagnado em amargura
tempestade, onde já assenta o pó.
n.nuno
POEMA EM HOMENAGEM A NINGUÉM
EM HOMENAGEM A NINGUÉM
Pois que ninguém me agradeça
Ninguém mesmo se alimente
Dessa estacada melancolia
Das minhas palavras baldias
Sinceras, elas não brotam mais
Deste vazio erradio e transbordante
Que nada errante o mar de nada
Que, em correntes de mágoas,
Deságua, inclemente, em mim
Vazio
Sinto-me vazio, vazio...
Entendes?
Assim...
Também sentes?
Quando tudo é tão maior,
Quando tudo é tão a mais?
A mais sim!
A luz que brilha lá fora
A luz que nem na nudez me atinge
A vida que me corre por dentro
Que me escorre de dentro
Que o soalho de vermelho tinge.
Não sentes?!
A paz do desassossego,
O frenesim dos segundos lentos?!
Não entendes?!
É somente o vazio...
O vazio...
O silêncio...
Assim...
Coberta de negro
Cobre-se de negro a face pálida…
Perdem-se as palavras
No vazio do silêncio,
E escondem-se as mãos
Em bolsos sem fundo,
Algemadas pela dor da saudade.
Acorrentam-se sentimentos
A sombras tenebrosas,
Omitem-se palavras e gestos
E esvazia-se a alma em chamas
Num vácuo obscuro
Onde nem a luz penetra.
Vem a morte deitar-se na cama
Tomando o ensejo da cobiça.
Deixo-me estar, invadida e resoluta,
Até que me sorva integralmente,
Sem contestar,
Embriagada pela condolência
E navego no instante da futilidade
Intoxicada pelo teu veneno.
Sou perversidade sem palavras
Exigindo a morte silenciosamente.
NO VAZIO DE MIM
NO VAZIO DE MIM
Hoje o sonho me foge
Já não lhe apanho o passo
No vazio de mim
Me faço e desfaço.
O sonho me foge hoje
E eu me volto a rasgar!
Perco da vida a cor
Sem esperança pra queimar.
Meu coração sem calor.
Não há cheio, nem vazio
Só uma saudade presente
Que corre em mim como um rio
Numa incontida torrente.
Não há nada nem ninguém
Este sonho passa voando
Tempo meu ficou aquém!?
Já nem dele estou lembrando.
Nesta estação já sem folhas
Sou àrvore de algum dia
Tão quase nada... poeira
Sou um livro que desfolhas
Minha vida e companheira.
Pássaro saido do ninho
Seduzido p'lo chilreio
Deixo-me à beira do caminho
Meu sonho a mais de meio.
Já há muito estou de pé
Já o tempo me faz medo
Mas não gastei minha fé
Coração a Deus concedo.
rosafogo
ASSUMO
Assumo que quando sem norte peregrinava
E nos tantos descaminhos era mero viajante
A porta originária da ilusão me abraçava
Foi no teu olhar, que aportei contingente...
Assumo que meus pés feridos nos percalços
Desta terra alheia, quando ainda peregrina
Tuas mãos firmes e afáveis aliviaram o cansaço
E teu colo o berço que me fez outra vez menina...
Assumo, ofereceu-me no teu peito a paz almejada
Foi na cumplicidade do olhar que achei meu cais
E não sei calcular o calibre da emoção saboreada
Quando mãos atrevidas foram balsamo aos meus ais
Assumo ainda, que no aconchego do teu abraço
Abandonei meus medos, segura, no teu compasso
Glória Salles
No meu cantinho...
Desespero existencial
Hoje, sento-me à beira do abismo
Olho a rocha escarpada
Perpendicular ao mar
Esse mar revolto que me atrai
Hipnotizada sinto o anjo negro
Num abraço de morte
O negrume penetra minhas entranhas
Meus olhos raiados de breu não te vêem
Raízes seculares sugam a água da encosta
Meus pés desnudos estáticos
Pisam os espinhos das rosas mortas
No céu as nuvens pardacentas
Cobrem-me de saudade
Na minha mente imagens pintadas de sonhos
Rasgam-me a alma como garras felinas
O meu corpo alado ergue-se
Pronto a arrojar-se
No escarpado negro da morte
Minha mente hesita
Meu corpo estremece de desejo
É tão fácil voar até ao mar
Permanecer voando no infinito
Não sofrer, não pensar
Apenas voar, sem passado
Sem presente, sem futuro
Sentindo a alma navegar
Ao sabor da brisa divina
Ah! como é tão fácil
Morrer e não pensar.
Atiro-me feliz
Nos braços negros do vácuo
Sucumbo mais e mais
Sem gritos, sem dor
Seduzida pela pulcritude do limbo
No limite do teu desespero existencial, é isso que sentes, tu que queres morrer? Interrogo-me perplexa, sem respostas e tu amigo que lês este poema sabes responder?
Porque desiste de viver aqueles que se suicidem?
Que desespero tão profundo os levam a querer morrer, será mais fácil desistir ou lutar pela vida? Reflecte, analisa e conclui ….