Problema Bicudo
Na verdade da tangencia
Toco nos bicos dos peitos,
Dois hemisférios perfeitos
De vibrátil saliência
E nessa quente circunferência
A que os dedos estão sujeitos
há excepcionais direitos
nas questões de ciência.
O calor os corpos dilata,
É do conhecimento geral,
Mas p’ra saber a área exacta
De uma elipse sensual
Só a tecnologia de ponta
De conceito digital.
Verso Mau
quando
a voz muda
nos muda
o verso é bom
quando
a letra inerte
te diverte
o verso é bom
quando
sem finesse
e sem saber porquê
um certo não sei quê
acontece
o verso é bom
o verso é bom
não só
quando
tem som
em dó
menor
ou noutro
tom
de um astro
maior
Gigante delirante
parece impossível
que em certa ocasião,
no estrondoso nível
de um placo risível
o ofegante elefante
em grande sobressalto
tenha visto então
o seu sapato alto
de retórica eufórica
perder o tacão,
e no esguio salto
a frase heróica,
o poema pertinente
e o fonema eloquente
rebolarem no chão
Sem Rede
não quero seguir
uma página qualquer
de um astro blogger,
do face ou do tweeter
não quero pôr
um polegar like
sentindo que é fake
antes quero a bike
ou um bom cupcake
não quero supor
que o mundo real
sejam emoticons a rir
com flores e fones
ou outros tantos ícones
com ar anormal
não posso admitir
que apenas um clic
certifique
o valor
de um avatar
que sofre por desamor
sem saber amar
Parapeito
Debruçada
Numa certa janela
Floresce singela
Uma sílaba delicada
Que muito quer
Ser amada
Espera um complemento
Ou apenas um sinal,
um desenvolvimento
de caligrafia
gramatical
e ao amanhecer
do novo dia
será luminosa
palavra bela,
orgulhosa
por ser já mulher
do seu bem-me-quer
Caçada
veloz,
o mastim
sem nome
rompe a trela
atroz,
a noite cerra
os dentes em serra
e em lauto festim
consome
a presa dela
Inflamável
a pele viçosa
daquela flor vistosa
sente na pluma,
no toque da lira,
o calor da chama
impetuosa
e logo reclama
com acesa ira
desconhece o viver
feito saber
tangível
da pele rugosa,
menos afectada,
menos susceptível
ao impacto
do fogo fátuo
da palavra incendiada
mó
Ergue teus olhos doridos
apenas um pouco
caídos que estão
na água amarga
que em ti chove.
O mar não se comove
nem o sol se apaga
ante a comiseração.
Repara como és louco
remoendo ventos idos.
Douro
os fugazes instantes,
salpicos de ouro
que vestem o rio,
revelam cintilantes,
que o mar recebe a nascente
sob a luz límpida
que a foz guarda
e oferece
do eco vibrante
dessa tarde infinda
permanece,
no ancoradouro
dos nossos instantes,
o silêncio
mais puro,
aquele, que primeiro nos uniu
então, fomos amantes
sem o sermos ainda
Catavento
noite e dia
rodopia
procurando antever
a razão
da rajada,
da trovoada,
do turbilhão
dos ventos cruzados
e juízos calados
que se irão abater.
mas cada volta
dessa espiral
instável
e imprevisível,
não gera revolta
mas sim a certeza
de que cada natureza
tem um feitio
e um modo próprio
individual