TU NEM SABES
António Casado__________ 15 Maio 2009
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
Editora__________ WorldArtFriend
Trabalho__________
TU NEM SABES
-
Tu nem sabes
Do peso das longas noites a sós
Quando a insónia se deita comigo
E todas as dúvidas me doem…
Tu nem sabes
Do medo das sombras… da luz…
Quando não sei se durmo se acordo
E tudo me parece confuso e distante…
Tu nem sabes
Do tempo que pára a cada segundo
Quando a solidão se senta ao meu colo
Para falar de ti…
Numa estrela candente
Enviei uma mensagem aos céus
Em forma de segredo
Em forma de auxílio
Depois cruzei os dedos
E implorei que se realizasse.
Era amor… Amor somente
O que pedia na mensagem enviada
Àquela estrela que consigo guardava
Os nossos mais íntimos sonhos.
Fiquei à espera de um milagre…
Deus virou-me as costas!
Tu nem sabes
Quanto brilho puxo à paixão
Para esconder o embaciado
Dos meus anseios frustrados…
Tu nem sabes
Quantas ondas querem alegrar
As lágrimas derramadas
No lençol branco da solidão…
Meu amor
Ainda guardo a semente
De um sonho antigo
Tão velho como o tempo
Para plantar um dia num chão de confiança…
Com fé
Com esperança
Esperarei o brotar da flor da felicidade
Como um trevo de quatro folhas
Se abrirá à minha liberdade.
O NATAL DOS SILÊNCIOS
O poema não é novo, mas é actual
O NATAL DOS SILÊNCIOS
No Natal deixo a minha alma vogar com o frio e um arrepio
Estremece de penas e martírios a piedade
Que come a meu lado sentada numa mesa vazia
Que dorme numa cama de plumas e relento
Que vagueia pelas ruas à procura da família fantasma
Que guardou numa caderneta de autocolantes coleccionáveis.
Neste Natal
Um entre os demais natais que já se cruzaram comigo
Nas esquinas do tempo, nos tectos de vento
Nas sombras dos desejos infantis, nas crenças adultas
Aguardo que um sorriso traga no sapatinho a prenda esquecida
Da minha inocente infância pobre e nublada
Como a inocente espera pela meia vazia das outras crianças…
Não sinto mais penas delas que de mim!
Como todos os poetas que já escreveram sobre o Natal
E falaram das largas montras vistosas e iluminadas
Poemas condoídos de um condoimento arrasador e tépido
Também as fito, iluminadas, vivas, consumistas…
Também sigo com o olhar esgazeado de cores
As mãos dadas das crianças que impetuosamente correm para os brinquedos
Convencidas de que o pai natal que as agracia com sorrisos
Descerá pela chaminé dos sonhos e lhes preencherá as fantasias…
Meto minha alma ao rubro num clamor de gritos e digo:
- Deus, ajuda estes pobrezinhos com fome….
Não pode! Também se diverte no natal!
Depois sorrio para mim mesmo ufano de ter revelado ao mundo
O cerne dos meus mais que urgentes anseios e preocupações…
Todos se levantam da bancada da distracção
Viram o rosto para o flash das máquinas remissivas do tempo
E sorriem… aplaudem… aplaudem… sorriem…
Porque aprenderem a viver as minhas dores porque são dores gerais
E lambuzam-se na minha piedade pela generalidade superficial
Enquanto pedem ao pai natal em quem já não acreditam
Paz no mundo para a qual não contribuem…
Idiotas!
Assumo o papel de ficar bem na fotografia…
Faz-me bem ao ego.
“Olhem para as montras! Olhem com olhos de ver!
Ver-me-ão especado por detrás do vidro fitando-os com severidade
Como quem tem o direito de julgar as vossa atitudes
- Para não se julgar a si próprio –
Porque está por detrás da montra e tem um status diferente
E só por isso ganhou o direito de julgar os que o fitam
Com os olhos estáticos e assombrados de quem está do lado de lá do vidro!
Vejam-me! Não choro nem rio. Estou somente ali
Impávido como impávida está a vossa vida paralítica
Arrumada na poeira das estantes vazias dos salões em ruínas
À espera que uma aragem entre pelas frestas das janelas
E sopre o pó da inércia sobre o chão inerte da vontade inerte
De todos os desejos recalcados nos sapatos sem sola
Que puseram na chaminé do desassossego ao longo da vida!
Olhem para mim! Olhem-me!
Esqueçam o mundo que passa por vós que dele já estais mais que esquecidos!
Não calquem os meus pés descalços de tanto caminharem por nada!
Não fardem a minha nudez de obrigações e delírios
Convencidos de que ela representa um delito e eu o compulsivo anónimo
Que dolosamente pica as veias com as agulhas viciadas
De uma droga posta ao dispor da minha alucinação de esquecer o mundo
Que atrofia de razões a paranóia de uma crença em algo melhor
E exige de mim o espalhafato de um comício em forma de poema
- Censurado pela “Opus Dei” como delito gravoso para a alma -~
Onde possa vomitar as minhas penas sobre as vossas penas
Para assim se mostrarem solidários com o que nem se lembram!
Nem quando a miséria lhes bate no casaco e pede uma moeda
Para amealhar no fundo roto do saco que nunca dá para tudo
E há sempre uma história de enriquecimento ilícito nos olhos dos mendicantes
Que dão esmola aos mendigadores porque são profissionais
E como tal têm direito em Dezembro ao décimo terceiro mês.
Nem quando lhes puxo pelas magas do casaco de abafar
Conseguem olhar-me nos olhos com alguma modéstia
Ou descer do périplo da arrogância e da altivez…
Não sou suficientemente romântico nem cristão para acreditar
Que a riqueza condescenderá um dia e ajudará os desvalidos
Porque ainda não determinei o limite da riqueza
Nem sei ao certo quanto preciso não ter para ser pobre!
Inventam então paraísos de mesas fartas e céus azuis quanto bastem
Para que a morte lívida dos miseráveis seja menos penosa
Porque qualquer que seja é sempre melhor que a frustração
De nunca saberem ao certo como será o dia de amanhã
Em que banco de jardim comerão ou em que árvore dormirão
Preocupados com a precipitação e as baixas temperaturas
Como fanáticos doutorados em ciências atmosféricas…
Nem quando estendo a mão à espera da moeda que enriquecerá
A minha farta conta bancária
Consigo transmitir-lhes o mosto de alguma sensibilidade sensitiva
Ou mostrar-lhes a razão da cognição das vontades
Quando elas próprias deviam encrostar-se a mim e eu ser delas
Para que ao pedir-lhe uma estúpida moeda os faça chorar
De tanta piedade por mim que a extrema-unção do natal
Seja mais proveitosa que todos os dízimos assaltados aos crentes
E consumam nas toalhas enfeitadas da ceia de doces bacalhau e peru
A beleza da pureza da virgindade de uma Maria lésbica!
Não quero o filho da puta do vosso Peru na minha boca!
Não quero a merda da vossa moeda na minha mão!
Aliás, pensando bem, de vós não quero nada!
Quero apenas que me vejam na montra onde me plantei
Para vos julgar e sentir dentro de mim o auspício de alguma autoridade
Que ainda não compreendi para que serve nem que farei com ela!
No fundo continuo com pena dos pais que não sabem como sustentar os filhos
Porque os patrões não pagaram os míseros centavos de uma troca desigual
E se esqueceram de compor a mesa daqueles que a suar compuseram as suas.
Ridículo! Tantas montras por assaltar…
Existe excessiva demasia de tudo quanto é demais.
Se é demais porque falta? Quem quer saber do que falta?
Ninguém se interessa pelo que falta!
Eu não quero saber da falta dos que no ano inteiro vivem de faltas
E pedem compulsivamente pelas ruas sem se lembrarem que já estão ricos!
Preciso enriquecer a minha pobreza nas mesmas ruas
Onde outros pedintes enriqueceram as suas!
Está bem… Estamos na porra do natal! Pronto… é um dia…
Ainda bem. Já viram o que era termos essa merda o ano todo?
Quantas Marias não teriam de morrer analmente virgens
Para que pudesse degustar o meu peru assado?
Quantos poemas de natal teria de escrever
Para vos convencer de que escrevo sobre o natal
Que sou mais nataleiro que os cristãos
E que me preocupo com os pedintes friorentos e esfomeados
Que só desejam algum familiar por companhia
Para poderem banquetear-se com a sobra da perna de peru!?
Ainda bem que o natal tem de vida vinte e quatro horas!
Os relógios do mundo deviam adiantar doze horas!
O mundo devia ser obrigado a dormir o restante!
Embrulhem a porcaria do natal e estrangulem o Jesus
Que não chegou a nascer nem se crê tenha morrido!
Enfiem-no na sacola do tipo de vermelho e barrete que nunca dá prendas
Porque nunca recebeu prenda nenhuma nem se confirma que tenha renas!
Porque nunca houve um rei mago que me trouxesse no natal
Um pote, mesmo pequenino, de ouro, pedrarias e mirra?
Mirra não! Mirrar é diminuir! Acrescento! Eu quero Acrescento!
Tragam-me um pote de Acrescento!
Que lindo será o meu natal com acrescento…
Quem, perante tanta alegria, se lembraria de um José cornudo
A rebocar um burro e a caminhar a pé por falta de carta de condução
Carpinteiro nas horas vagas, fugido de Herodes sem saber porquê
Quando posso ir no meu carro à procura do poder que ninguém me dá
Ou do protagonismo que exijo para mim porque ninguém se interessa?
Lanço-me pela auto-estrada da consolação e badalo a toda a gente
Um natal feliz de paz e amor ou de amor e paz ou de ambas as coisas
Quando sei que qualquer delas é a porcaria de uma utopia
E que os meus votos destinam-se apenas a cumprir uma obrigação
Como quem dá as condolências à viúva e vai para casa masturbar-se a pensar nela.
Assim cumpro solenemente o meu Natal.
Ah! Quero os reis magos na minha algibeira!
Quero o condão dos sonhos das montras nas minhas veias!
Quero a sede dos ladrões… As pilhagens…
A gula dos invejosos… A revolta dos brinquedos…
Os camelos em viagem pelo deserto
E que depois do natal passado ainda não descobriram a minha casa…
Cumpra-se em mim a bossa desse camelo errante
Perdido ao longo dos anos no meu deserto incumprido!
Silêncio… Ouço passos…
Já sei. É meia-noite.
Posso sentar-me num cadeirão e embebedar-me
Para amanhã contar como foi lindo o meu natal…
HÁ FOME NO MEU PAÍS
António Casado__________ 22 Fevereiro 1985
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
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Trabalho__________
HÁ FOME NO MEU PAÍS
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Há fome no meu país!
No meu país
Governantes apátridas
Governam-se.
No meu país silencia-se a miséria
Com balas
Com bastões
Com polícias
Com prisões!
A fome no meu país tem o preço da morte!
No meu país
A alegria habita nas casas em ruínas
A fortuna exulta-se nas terras abandonadas
O trabalho escasseia nas embarcações violadas…
No meu país
Homens e cães comem na mesma gamela!
As árvores secam
As flores murcham
No meu país de tristeza…
As crianças famintas
Aprendem a ler
Com fotocópias de pobreza!
No meu país a justiça é um circo!
Há corrupção no meu país
Violado
Ultrajado
De tanto silêncio imposto!
Quem governa
Insulta-o!
Vivem os ricos da miséria
Alheia.
Fazem leis
Fazem-se reis
Tecem à volta do povo do meu país
Uma teia de descrença
Um futuro sem esperança
A agonia de uma partida
Forçada
Há fome no meu país
Cuja alma
Foi penhorada!
cLAMOR DO VENTO VI
António Casado__________ 05 Junho 2009
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
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ESSÊNCIA DE UMA FLOR
-
Apenas isto:
Um pouco do olhar arremessado contra um muro de pedra
Mortifica-me a vontade.
Sinceramente
Já deixei de olhar o sol
Com medo de cegar.
O meu corpo pulula numa ansiedade
Tremenda
Nesta casa pequenina repleta de sombras
E de mim
Onde me perco do sofá à cama
Onde encharco de limos
Os passos que foram nossos
Os beijos que trocámos
Os sorrisos com que nos brindámos…
Perco-me neste estreito labirinto
De desenhos a carvão
Silhuetas, sombras… E não.
O amor solta-se do peito
Para rir de mim a cada passada…
Faz ecoar pelas paredes
Um “dejá vu”:
- Agora já foi.
Chegou a hora de cruzar o Hades
Como aquele vigoroso náufrago
Que se absteve de nadar.
Como um cavalo ávido de ternura fixo o teu olhar
Frio e insensível como nunca soube ser
De cabeça erguida…
Arrojo-me na lama
Para te segredar que atingi o limite da dor…
Por favor… Não me digas mais nada!
Sem querer
Podes ter na voz a lâmina
Duma espada
E quebrares
Mesmo sem querer
O cristal embaciado deste orgulho mesquinho!
Por favor não digas mais nada…
Persegue a miragem desse rio de flores
Deixa-te levar na essência mística
Desse desejo alucinado
Desse barco velho, podre, quebrado!
E se puderes…
Sê feliz.
Quanto a mim
Reservo-me o direito de escolher um caminho
De gargalhar a cada passada
Convencido de que em cada esquina
Alguém me espera
Nessa difusa estrada abandonada.
Se ficar só… Deixa
Valeu a pena ter lutado.
Para Pedro Sousa
DENTRO DE MIM NÃO HÁ ESPAÇO
António Casado__________ 07 Março 2001
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
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Trabalho__________
DENTRO DE MIM NÃO HÁ ESPAÇO
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Dentro de mim não há espaço
Que o teu corpo não tenha preenchido
Nem célula
Nem átomo
Que a tua fascinante presença
Não tenha absorvido
Puseste em mim o calor do desejo:
Esse desejo reina
Porque estás comigo.
Nele eu embalo
Um carrossel de carícias…
Só porque te amo
És mais que o meu melhor amigo.
Maior que o sonho
É o sol que se estende
Sobre o horizonte da nossa vontade
A certeza de sabermos
Que por bem
Podemos viver na imaginação o anseio
Que nossos corpos desejam também!
UMA PALAVRA SEM SENTIDO
António Casado__________ 15 Maio 2009
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
Editora__________ WorldArtFriend
Trabalho__________
UMA PALAVRA… SEM SENTIDO
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O dia amanhece porque todos os dias amanhecem. Traz com ele uma alcofa de interrogações e medos. Desdobro os papéis enrolados das rifas do amanhecer e aguardo que alguma coisa mude. Cada uma delas acrescenta um alfinete ao rol dos lamentos. São os prémios obtidos num jogo que não escolhi, nunca entendi, nem quis. Alguns até me fazem rir de tão desonestos… rir é bom. É como nos despirmos do que provoca a sede de ficar e irmos livres e soltos de tudo o que nos rodeia. Nasce nas pontas das unhas um fio de luz transparente que nos trespassa e dentro de nós algo se agita e agiganta como se um infinito véu branco nos apontasse as portas abertas das cadeias de nós. Sinto-me livre. Sou livre! Que o digam as eternas horas às voltas com os lençóis na desesperada tentativa de sentir o teu calor quando ainda neles te rebolavas comigo numa insónia muito perto da loucura; ou a frescura húmida do suor fruto do amor que fazíamos; a roupa amarrotada quando te revolvias num sono agitado e eu beijava a tua testa e segredava-te contos tranquilos e belos. Que o digam elas quando sigo os fios de luz dispersos pela gaiola e tento desvendar as portas que sonhei escancaradas…
É bem possível que nem te apercebas da amargura que se enrola à minha voz e aperta a garganta para que não chore. Sabes porquê? Porque quando estás todo eu sou um sorriso latente na palavra no gesto e no olhar. Entrego ao desígnio das almas desesperadas as angústias que desabam sobre mim, a chuva de choros que afasto como se fossem insectos, a lenha encharcada da fogueira da paixão. Mas tu não vês. Porque tu não vês. Nem quando fico para segundo plano porque sou sempre o depois na tua vida e ainda assim aceito com um sorriso complacente o lugar que me reservas. Abraças-me e repetes como um papagaio que a vida é mesmo assim e as prioridades devem ser levadas em conta. Claro que sim meu bem… As prioridades! As tuas prioridades! Imagina meu querido que quando precisas de mim és a minha única prioridade! Quando te vejo feliz continuas gravado a fogo na minha mente como um único pensamento. Curioso… Reparo agora que ambos temos prioridades diferentes…!? As sombras nunca foram prioridade, são consequência. Talvez por isso passe pela tua vida como o contraste da luz. Como podes ver-me?
Sabes que nada exijo. Exigir o quê? Se o meu amor não fosse o bastante que terrível noite assombraria a nossa relação! Também de mim nada exiges. Dou-te tudo. Porque na minha mente caótica e perversa penso que sou teu e te pertenço como as árvores são parte integrante da floresta. Ao dar algo de mim sinto que preencho algo de nós como se um gesto de carinho fosse a fragrância necessária ao nosso bem-estar. Pedes-me um sorriso e abro-te as mãos, estendo os dedos, arranho as sombras e quando sorrio o coração abre as asas e poisa sobre o teu peito. Esse esvoaçar eleva-me acima das colinas do amor e em mim, no lugar da nascente da água cristalina que sempre brotou das veias, fica um espaço vazio que aguarda a presença do teu coração ardente para se sentar no trono da loucura e inventar o tempo de nós. Talvez apenas e só na minha mente…
Falar de ti excita-me como se estivesses agora a meu lado… Penso no pássaro de fogo que entra pelas frestas da sensibilidade e aquece dentro do meu coração todos os motivos para sonhar contigo. Olho para o lado e o teu corpo franzino dança com a chuva e o vento diante do palco que criei para nós. Acalenta o vazio que ainda não foi preenchido, partido que está meu coração, a labareda de um desejo por incendiar, uma estrela por iluminar, um sol por nascer… A esperança! Agarro a esperança e coloco-a no vazio. Logo o fermento da ilusão vem atrapalhar a saudade do que não tenho e o perfume do pão cosido sacia-me temporariamente a fome provocada pela distância. Aquele braço que não se estende, a ponta daquele dedo que não me toca… Sobra-me o pão.
Digo aos nossos amigos com um sorriso que sou feliz. Feliz por te ter… Infeliz por saber que não és meu. Para já basta a verdade… a minha verdade. Ela é o bastante para me proporcionar todas as fantasias possíveis e reviver todos os delírios da nossa vida em comum… a que não temos. Ainda creio nela quando estás junto de mim e chamo-lhe todos os nomes bonitos que existem no dicionário. Numa folha de farinha escrevo o futuro como um par ou um duelo. Sou um Sancho que acredita nas tuas promessas e uma Alice convencida de que todos os finais são felizes. “Preciso da tua força” – Dizes-me e colhes da subnutrição o alento de quem está moribundo. Eu preciso do quê? Não sei… Talvez de ti.
Se me perguntam por ti digo que virás… porque tu vens sempre! Nunca estás, nunca ficas, nunca vais… Sabem que te amo. Já me confidenciaram que não devo guardar grandes expectativas pois todos os indicadores apontam para um fim. Indicadores? Sim, as prioridades. De novo as eternas prioridades. A minha sombra calcina na demografia da transparência mais um sonho e responde que estão errados. É nesse erro que quero viver. Soubesses tu como têm razão… Nunca sei quando vens despido na pressa habitual de partir ou vestido no ócio de ficar. Irás sim, meu amor… Um dia dir-me-ás: “Gostei muito mas não posso voltar. Não sofras… Espera por mim… Talvez um dia…” Claro que não sofrerei… Já o faço. Que fósforo queimado puseste entre os dedos durante o tempo que estive apaixonado por ti, consumido na imoralidade de acreditar que desta vez estava certo? Acertei sim… no alvo errado.
Estranhas a facilidade com que digo que te amo? Só estranho a dificuldade que tens em repetir-me. Sei que me desejas… nunca duvidei. Já pensaste que por uma estranha leviandade eu até posso querer um pouco mais que o que me dás? Meu amor, modestamente eu quero tudo. O teu sopro, o teu sorriso, a tua voz, a tua lágrima… São pedaços da grande pomba fulminante que voa de um peito para outro. O desejo que disseminas pelos lençóis é insuficiente para preencher o oco de um coração partido. Depois de satisfeito a alegria que exultas traduz-se na imediata frieza da ausência e no lugar que te destinei apenas encontro uma colmeia abandonada a aguardar o regresso da rainha. Entre uma coisa e outra suicido a presença e arremesso contra mim todas as culpas que o querer pode conter. Ainda que a palavra amor se lançasse do abismo da estante da ternura seria impossível acreditar na espontaneidade. Desejares-me não é amares-me. Amando-te, desejo-te. Amor é só trocar a ordem das palavras e tudo parece um relógio suíço. Tão fácil… E tão dolorosamente impossível!
Sei… Conheço as regras do jogo. Não posso queixar-me. No início éramos a perpétua aventura imergida dos sentidos como outra qualquer. Inconsequente e ousada. De livre vontade ocupaste o espaço que te dei e quiseste mais até de mim nada restar que não fosse tua pertença. Acreditei em ti e fui cedendo a minha vida até me perder no nada que restou. Quando olhei para trás só a tua sombra era visível. Tomaste a minha vida nas tuas mãos, dominaste a dignidade, usurpaste a auto-estima, deixaste-me entregue a todas as promessas que segredavas ao ouvido. Em torno de mim criaste uma cerca cor-de-rosa da qual não queria sair. Cada palavra tua representava uma sensação de bem-estar e sorria para mim convencido de que o mundo lá fora sorria comigo. O enigmático fio invisível que me ligava ao gueto era toda a felicidade. Ficava feliz com o que me davas. Pensava que partilhávamos as mesmas células, os mesmos anseios, os mesmos sonhos, o mesmo sexo…Quanta ingenuidade! Pouco a pouco descoloriram-se as cores do gueto. Depois… Tudo serviu de desculpa para te isolares no teu quintal sombrio onde nunca permitiste que entrasse e mentires. Argumentavas que estavas confuso… Que tinha sido o teu primeiro homem… Como podia eu saber? Abriste os braços para que me deixasse abraçar; sorriste para que me deixasse beijar; tocaste-me para que me desse… Sabias quem eu era. Nunca marquei um encontro… deixei que viesses. Vinhas… ficavas… amavas… Ainda me lembro de teres dito que fui a única pessoa com a qual foste sincero e que mantínhamos uma relação de tal forma aberta que não precisavas fingir ou mentir como sempre o fizeste com todos. Acreditei, porque quando se ama em tudo se acredita.
Hoje sou eu quem telefona quando vê o sol raiar. Digo: “Bom dia, amor.” És tu quem anseia pelo meu telefonema. Dizes que precisas ouvir a minha voz. Também sei que te esforças para encontrar tempo para mim. Também sei tanta coisa pequenina, insignificante, banal… Ai amor, que culpa tenho eu se te amo cada vez mais?! Não me acuses de te pedir mais e mais migalhas. Só quero ter uma vida normal como todas as pessoas normais que vivem a mesma loucura em comunhão e regozijam-se da felicidade de serem livres e estarem disponíveis para amar. Estou disponível para amar! Quando a minha imagem se reflecte no espelho transparece uma auréola de paixão fruto de me aceitar como sou. Orgulho-me de te amar e ter a graça enorme de estar apaixonado. Sei que esse caminho me conduzirá à felicidade e é nele que travo as minhas batalhas diárias. Sim, sei, sou gay. Sou-o porque busco o amor em todos os horizontes consciente de que o irei encontrar. Quando terás coragem de fitar os teus olhos no espelho? Amor, tu és igual a mim. Não temo gritar pelas ruas que te amo porque te amo; não me escondo dos teus públicos beijos, porque os desejo; não recuso os teus braços porque suspiro por eles. Orgulho-me de ti. Por isso não entendo esta distância de um passo que me mata, me trucida e que aos poucos me vai fazendo descrer de mim.
Amor, eu estou exausto. Afinal tanta coisa por uma palavra… Uma só que me fizesse sorrir… apenas uma palavra que alegrasse a minha existência. Compreende que não sou a acha que se atira ao lume… sou o fogo que a queima! Uma palavra… Talvez o nosso futuro dependa disso. Uma palavra… ainda que nem faça sentido! Se tu a dissesses e eu a ouvisse…
RECADO PARA UMAV
Olá
Ainda bem que pouco entendeu da "Inércia". Vou explicar-lhe porquê. Esperava uma definição estrutural política da sua parte e consegui-o. Para além do abstracto vazio que o caracteriza, ainda encontro laivos de desinformação. Acredite, isso é normal, infelizmente. O não sabermos é natural, o não querermos saber é ignorância.
Pois bem, num texto propositadamente grande apegou-se a uma das quatro drogas sociais actuais - a religião. Já estou a ler o argumento de que a minha opinião influi na liberdade religiosa e que o deus dos muçulmanos é diferente do deu dos cristãos e dos judeus e sei lá que mais, patiti patata... pense. Você parece-me inteligente. A cultura africana, donde a raça humana é oriunda, ainda na pré-história, não tinha deus. Adoravam o sol e a lua porque sem eles não existiam nem conseguiam contar o tempo para as colheitas, sementeiras e pescas. A religião surge quando a acumulação de riqueza obriga a que a sociedade vivesse debaixo do medo para que supostos iluminados, reis, imperadores, faraós e o raio que os parta, pudessem exercer sobre os mesmos o domínio e a escravatura. Pesquise o resto que não tenho muito tempo para um tratado histórico-filosófico. Daí a religião - TODAS ELAS - andarem sempre de mãos dadas com o poder caótico instalado.
Vamos então para a parte mais pertinente e menos inteligente do seu comentário: Caro olho-de-gato, que o senhor se curve à complacência geneticamente introduzida nas mentes tacanhas por ferrenhos anticomunistas convencionais que desabaram barbáries a partir dos EUA com a cumplicidade alemã hitleriana, é problema seu. A questão é: Saberá eventualmente do que fala? Sabe por acaso o que é o comunismo? Já ouviu falar de Marx? Sabe o que é socialismo? Tem alguma ideia do que é a democracia ou a liberdade? Sabe o que significa a divisão social? Classes sociais? Sabe como apareceram? Não temo o comunismo. Temo mentes como a sua que por ignorância vivem no medo e por ignorância querem impor o medo. A sua teoria é abjecta e faz parte de um rol malquisto de mentiras que nem você sabe de onde vêm e quer vender-me a banha da cobra que comprou às migalhas num templo qualquer.
Eu falo da religião porque todas são iguais, todas seguem os mesmos princípios, todas são oriundas da mesma flatulência filosófica e todas manifestam o seu papel ridículo, ordinário, prostituído, perante a sociedade. Tanto se me dá se são xiitas, cristãos, maometanos, judeus. Todos iguais na linhagem do medo. Para si que parece-me cristão de meia tigela, já leu a bíblia? Quer que eu a explique para si a partir do génesis até ao armagedão? Nada temo porque sei que a força da palavra irá ser a causa de uma revolução democrática social que nunca contará com mentes como a sua.
Obrigado pelo comentário.
Estamos em lados contrários da barricada. Sou comunista, ideologicamente falando. A publicidade do nazi-fascismo, do capitalismo, da religião barata e da mentira fabricada por necessidade não me assustam porque estou habituado ao anti-comunismo mais reaccionário e evidente na demagogia das suas palavras. Por isso, e como comunista que sou, sem lhe retirar qualquer liberdade de expressão para o que quer que seja, cabe-me apenas informá-lo que:
1º Qualquer comentário nazi, fascista, opressor, ofensivo da luta dos povos de qualquer país do mundo será tomado por mim como um insulto.
2º Qualquer comentário discriminatório, preconceituoso, revestidos de tabus e fobias, serão tomados por mim como ignorância e deleitá-los-ei.
3º Como o seu anti-comunismo não passa de retórica barata porque a nenhuma feita respondeu, ou seja disse o que ouviu alguém dizer, não vejo como continuar um debate interessante sobre a matéria quando você não tem matéria.
4º Sobre as religiões Islâmicas, a soldo dos EUA, Inglaterra e demais países europeus, continuam a ser religiões. Assim como os cristãos matam milhares de pessoas todos os dias, essas religiões matam milhares de pessoas todos os dias. Veja Israel - Faixa de Gaza. O mais pequeno dos meus problemas é o Islamismo. Justificação dos EUA para mais uma guerra. O maior dos meus problemas é o capitalismo. É isto que não entende - o porquê das coisas.
Quando diz que é apolítico…. Deixa-me rir! Um apolítico não escreve. Qualquer texto é político. Volte para a escola.
Cultive-se.
O POETA DA LUA - romance e poesia
O POETA DA LUA
AGRADECIMENTOS
Apenas uma pessoa me permitiu terminar
este livro com serenidade.
A ele o devo: José Penim.
AMO-TE MUITO, MEU AMOR.
António Casado
DIÁLOGO
A verdade.
O que é a homofobia? Como se manifesta? O que é a homossexualidade? A homoafectividade? É possível dois seres do mesmo sexo amarem-se da mesma forma que duas pessoas de sexos diferentes? São questões pertinentes que estes livros pretendem responder.
Luís e Alex são os personagens principais de uma história de amor. O caminho que ambos traçaram foi longo e doloroso. Tudo começa com um encontro banal numa Avenida da cidade de Setúbal. Por detrás dos sentimentos que os unirão estão todos os conflitos pessoais, diferentes em ambos os casos mas que culminaram com o assumir das suas orientações sexuais. As questões culturais, religiosas, sociais, pedagógicas e familiares, são questionadas pelo seu peso retrógrado, pela dificuldade que a sociedade tem em aceitar a diferença. A ignorância social é representada na sua verdade mais latente. De formas diferentes o medo está representado em ambos os personagens.
Luís vem de um casamento falhado. Um dos problemas é o filho. Como dizer-lhe que é outra pessoa. Ele que sempre o viu como um heterossexual… Como aceitará Mário a homossexualidade do pai?
Alex apesar de se ter assumido desde o início da juventude não quer perder a amizade de Luís que pensa ser heterossexual. Como dizer-lhe quem é? Como esquecer Eduardo, o homem que amou ao longo de vinte anos e que morre de uma forma dramática? Como desejava desculpar Joaquim e Clarisse, os pais do namorado…! Como esquecer tantos anos de um ódio e de uma indiferença presentes no dia-a-dia na vida dos dois?
Tem medo de voltar a amar e desconfia das boas intenções de Luís.
Valter é o grande amigo de Alex. A ele deve a vida por duas razões. A gratidão está presente assim como uma amizade nascida de um encontro casual, quando era explorado sexualmente pelo chefe da empresa onde trabalhava.
“Poeta da Lua” foi o cognome encontrado por Luís para o definir. Não o entende e tem dificuldade em aceitá-lo. Porquê “Poeta da Lua”? A poesia é somente uma forma de desabafo, nunca a tomou muito a sério. Afinal, à vida, pede pouco… Apenas uma oportunidade para ser feliz.
Fica feliz por Paulo se ter desvinculado de uma relação vazia de conteúdo onde Abílio assumiu uma posição homofóbica. Interroga-se sobre a razão por que Abílio recusa assumir a sua orientação sexual já que manteve com Paulo uma longa relação. Será porque é casado? Será porque tem filhos? Felizmente Zé trouxe-lhe num sorriso o que a sua alma dorida tanto procurou.
Sofia apenas precipitou os acontecimentos com a sua maldade. A vingança revelou-se infrutífera apesar dos danos causados. Todos sabem que não desistirá. Dispara ódio por todos os lados. Está convicta de que Alex lhe roubou Luís e não quer entender nem aceitar a orientação sexual do homem que sempre amou.
Uma história recheada de tantas outras histórias, de outras tantas vidas que apesar de fictícias assumem aspectos de uma realidade presente. As questões religiosas, os tabus, os preconceitos, marcam pela negativa vidas que apenas procuravam uma réstia de luz. Criaram a necessidade de um Deus, apresentaram-lhes um Deus e não serve. Descrevem-no como uma concepção paterna de amor e escondem a discriminação; falam da tolerância e Ele manifesta-se pela intolerância como se os homossexuais fossem filhos de uma categoria qualquer merecedores de um eterno castigo apenas e só porque amam pessoas do mesmo sexo; como se em alguma altura tivessem escolhido ser o sempre foram.
A luta pelo amor é uma constante assim como a tentativa da sua preservação. Como eliminar os ciúmes? Como impedi-los de criar barreiras nas vidas comuns? Talvez acreditando… Mas como controlar o desejo?
- Sou homossexual!
Ao invés do estigma da compaixão social (que ainda toma como doentes ou portadores de um defeito estes homens e mulheres) todos procuram ver reconhecida a sua individualidade e especificidade. Orgulham-se de ser homossexuais porque nunca poderão ser outra coisa!
António Casado
O POETA DA LUA 10 A 12
O POETA DA LUA
Romance de António Casado
Capítulo primeiro – pág 10 - 12
CAPÍTULO PRIMEIRO
Determinou prioridades temendo uma atitude da mãe. Os antigos amigos assediavam-no, mas recusava-os. Fez novas amizades com as quais partilhava os estudos. O restante tempo dedicava-o a si. Desta vez escutar as matérias nas aulas não era suficiente. Alguns momentos traziam-lhe o desencanto da tristeza como se o fracasso do presente o dominasse e impedisse de ir mais longe impondo barreiras invisíveis e intransponíveis. A vontade de fazer melhor, a certeza de não se sentir motivado, exasperava-o. A luta entre querer e não querer era desgastante!
Leonardo era um aluno mediano e assíduo. Tal como ele tinha poucos amigos. Via-o quase sempre só a deambular pelos corredores. Apesar de os colegas comentarem que era uma pessoa afável, de sorriso nos lábios, terno e sincero, parecia-lhe um árido deserto. Lembrava-lhe uma linda flor plantada no cimo de um prédio de cimento. Ignorava o que o levou a aproximar-se mas sentia-se aconchegado por aquele temperamento vulcânico e delicioso. Era um moço alto, forte, um ano mais velho, de curtos cabelos negros e olhos da mesma cor. As mãos sapudas davam-lhe a impressão de tenazes macias e quentes. Quando havia intervalos entre as aulas saíam da escola e passavam pelo jardim municipal, o Bonfim, o antigo campo do “Anjo da Guarda” como o denominavam; o “ex librís” da cidade de Setúbal assim determinado em 1939. Ao fundo daquele arborizado espaço a Ermida do Senhor Jesus do Bonfim, chamada inicialmente “Ermida do Anjo da Guarda” fundada pelo padre Diogo Mendes em 1669. Passavam depois pelo estádio do Vitória de Setúbal inaugurado a 16 de Setembro de 1962 com a colaboração dos moradores e comerciantes – sempre foi um sonho da população ter um Clube Desportivo representativo da cidade. Dos desentendimentos do primeiro grande clube de futebol “Bonfim Foot-Ball Club” fundado em 1908 e da aliança com o primeiro grupo de destaque o “Setubalense Sporting Club”, que envergava a camisola às riscas verdes e brancas, fundado em 1910, nasceu a 5 de Maio de 1911 o clube “Vitória Foot-Ball Club” que passou a funcionar no Palácio Salema na Rua do Bocage. O estádio estava situado inicialmente no “Campo dos Arcos”. Só em Junho de 1912 é que “Vitória” apresentou ao público pela primeira vez as camisolas que ainda hoje mantém.
Subiram até ao Liceu Nacional de Setúbal e cortavam pelas traseiras. Uma extensa propriedade inculta, recheada de matos e canaviais estendia-se até à Estrada da Baixa de Palmela. Conheciam bem aquele sítio. Esgueiravam-se por uma brecha aberta no canavial e sentavam-se junto ao ribeiro de água doce e transparente que corria por entre as pedras. Era o esconderijo do resto do mundo onde se sentiam libertos de tudo e todos. Viviam a proximidade com a natureza e uma liberdade sem limites. Falavam de tudo o que lhes vinha à cabeça. Riam, choravam, preocupavam-se… tudo ali, junto à serenidade mansa da água. Naquela tarde quente de Abril também. Ainda se fazia sentir um pouco a aragem fria de Março que abandonara o poleiro há três dias. Deitaram-se num pedaço de areia branca junto ao riacho. Alexandre deitou a cabeça sobre os braços cruzados e olhou a pequena nesga de céu por entre as folhas compridas, verdes e viçosas das canas. Leonardo ficou ao lado, virado para ele, apreciando a sua viagem pelo sonho. Um silêncio tranquilo envolveu-os. O mistério daquele recanto transmitia-lhes sensações de placidez e repouso. Leonardo com a mão alisava a areia enquanto Alexandre galopava nas asas de um poema por escrever.
Alexandre despiu o casaco e colocou-o sob a cabeça fazendo de travesseiro. O corpo envolvido pela camisa era atraente. Os traços firmes despertavam em Leonardo sensações de bem-estar.
- Gosto de estar aqui. – Confidenciou Leonardo que continuava a apanhar grãos de areia com a ponta dos dedos e, erguendo o braço, deixava-os cair no chão.
Alexandre não respondeu, nem quando o braço esticou um pouco e alguns grãos secos e frescos lhe agraciaram o peito. Leonardo continuou com os desenhos, agora sobre o ventre do amigo como se de uma mensagem se tratasse.
- Posso chamar-te Alex? – Perguntou-lhe.
Sorriu. Porque não? Era muito mais prático.
- Podes.
A mão sapuda repousou sobre o peito e delicadamente afastou a areia com movimentos tranquilos e suaves. Alex anuía com um sorriso às brincadeiras. Fechava os olhos e lia os movimentos das pontas dos dedos sobre a camisa. Leonardo dobrou-se sobre ele e beijou-o no pescoço. Não se moveu. Soube o que o amigo procurava com aquele gesto quente e gracioso que o deliciou; estava disposto a deixá-lo caminhar, ir até onde quisesse. A inexperiência de qualquer acto sexual impedia-o de tomar uma postura. Sabia que estava prestes a ter uma experiência e isso não o desagradava. A curiosidade de sentir outra pessoa tocá-lo superava qualquer medo ou repulsa. Até aí o único prazer que conhecia era a masturbação que praticava na banheira mergulhado na água quente, ou na cama enrolado nos cobertores. Já se surpreendera nalgumas manhãs quando ao acordar notava que estava molhado. À pressa tentava limpar-se com vergonha que a mãe reparasse nalguma coisa e se enfurecesse. Incomodava-o as erecções matinais principalmente quando Maria dos Anjos o destapava depois de ter inventado mil argumentos para não sair da cama.
Neste momento era a mão de Leonardo que desabotoava a camisa e como esponja a rolava devagarinho sobre a pele palpando os mamilos erectos. Os olhos mantinham-se cerrados à vida que os rodeava e como alguém que passa uma fronteira virtual visualizava as ondas de prazer que cresciam e o estimulavam. Os lábios quentes e rosados do amigo sorviam o calor da pele enquanto a língua acariciava o peito e o externo, de cima para baixo, até se perder no pescoço, subir pelo queixo e deter-se entre os lábios secos de excitação. Era a primeira que o beijavam nos lábios. Estranho, mas não repulsivo.
CLAMOR DO VENTO IV
António Casado__________ 07 Março 2009
Publicado__________ Clamor do Vento
Registado __________ Depósito legal 306321/10
Editora__________ WorldArtFriend
Trabalho__________
AQUI
-
Aqui
Neste cantinho que criei
Posso chorar por ti
Já não acredito nas tuas promessas
Nos teus beijos
No teu corpo
No teu amar…
Aqui
Posso entregar-me ao delírio
De uma lágrima
Sem ter que justificar ao mundo
A razão do meu penar.
Como te amo…
Porque permitiste que me entregasse?
Porque alimentaste este amor?
Acreditei que era teu…
Fui feliz
Até acordar
Agora
Que a realidade se desnuda
Nesta terça-feira de cinzas
Vejo
Que os nossos caminhos nem se cruzam…
O amor que nós fizemos foi meretriz
De quantos projectos comuns tínhamos.
- A minha casa é nossa.
- Não posso!
- A minha casa é nossa…
Adeus:
Se o propósito foi enfermar a realidade
Nessa enfermidade morri.
Adeus
Prefiro chorar com as ondas do mar
Que acreditar no teu amor
Que me fere e maltrata
Como se eu fosse uma concubina
Uma prostituta barata
Qualquer coisa que se joga fora
Depois de usada
Amarrotaste o meu amor
Adeus
Vou-me embora
Para Pedro Sousa