Poemas, frases e mensagens de Carla Ribeiro

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Carla Ribeiro

Pluralidade

 
Murmura no meu sangue a princesa de olhos de corvo,
Negra como a noite que adormece o sono eterno
E baila sobre as cinzas do túmulo de ninguém,
Mas também a terna rainha do amanhecer
Estende os meus braços à luz que atravessa o dia
E renasce aurora no orvalho de uma flor.
Tenho na voz a revolta da tempestade,
O murmúrio dos ventos que revolvem as areias do deserto
E a chuva que fustiga as velas das velhas naus,
Mas também o dócil calor de um sol adormecido
Na calma outonal dos dias que movem a procissão dos corpos.
Sou profetisa de todo um destino clarividente
E cega justiça derrubada num mundo de iniquidade,
E, sendo pó de estrelas na multiplicidade de mim,
Sou o nada oculto sob os excertos de um todo.
 
Pluralidade

Rosa Tardia

 
Minha flor solitária, abandonada
Ao frio deserto deste Inverno vão,
Recebe a minha esperança destroçada
Nas tuas pétalas de escuridão.

Pequena flor de dor e solidão,
Perdida num vazio de neve e nada,
Aceita a mágoa da minha ilusão
No olhar da tua desilusão magoada.

Breve flor de silêncio e de amargura,
Sê minha irmã na morte e na loucura
Das horas sempre eternas, sempre iguais.

Porque eu sou como tu, rosa vencida,
Imagem adormecida pela vida,
Para, sozinha, acordar tarde demais!
 
Rosa Tardia

Deixa-me Desistir de Ti

 
Deixa-me desistir de ti
Como num encontro repetido entre penas de mil eras
E traçado em véus de fumos mutilados,
Para esquecer que te dei a alma de todos os meus sonhos
E a força de toda a vontade
Na concretização de uma visão que mão me pertencia.

Será o silêncio a minha promessa,
O vazio como futuro
De quem deixou as asas rasgadas no chão,
E apenas a noite alcançará a minha voz amordaçada
Nos primórdios do poema.

Não sou ninguém…
Nada mais que o pálido reflexo de um espelho estilhaçado,
Um grito no amanhecer
E as lanças dos meus dedos estendem o sangue da derrota
Que estrangula o meu olhar.

Deixa-me, pois, morder as cinzas que ensombram os meus lábios
E morrer dentro da cruz,
Como um corvo em voo de hecatombe
Rasgando os céus da última alvorada,
Um sonho aberto à lâmina dos deserdados,
Um cântico na morte…

Para que vejas a renúncia que floresce nos meus olhos
E me deixes desistir
De mim.
 
Deixa-me Desistir de Ti

Chorai, Poetas...

 
Cantores de sonhos, vencidos da vida,
Almas de indefinida inspiração,
Chorai, porque, na mágoa da traição,
Morreu a vossa essência enternecida.

Chorai, poetas da esperança destruída,
Trovadores da infinita escuridão,
Porque morreu, na imensa solidão,
O olhar da vossa musa indefinida.

Filhos de uma distante fantasia,
Eis-vos ausentes de toda a magia,
Despidos do calor da vossa voz.

Chorai, pois, cantores de toda a agonia,
Pois, nesta noite sinistra e sombria,
Morreu a mais gentil de todos vós!
 
Chorai, Poetas...

Desculpa

 
Desculpa se não vivo à tua imagem,
Se não sigo o teu rumo de vaidade,
Se nem sempre cedo à tua vontade
E cumpro o que ordena a tua voragem.

Desculpa se o meu mundo é de miragem
E se acredito na fidelidade.
Desculpa se me guio pela verdade,
Ainda que despida de coragem.

Desculpa se não creio na loucura
Do teu mundo de dominância obscura
E de momentos inúteis e vãos.

Não sou igual a ti, alma indiferente.
Não quero o teu controlo permanente…
Desculpa se não estou nas tuas mãos!
 
Desculpa

Melodia de Lágrimas

 
Encontro-me no espelho deste corpo destroçado
Onde se reflectem todos os silêncios do universo,
Como fantasmas que oscilassem na dispersão dos sentidos
Que se afogaram nas lágrimas do meu corpo.
Prendo-me na dissolução dos silêncios que me envolvem
No embalo das chamas que me purificam a pele
E cada sussurro é um grito nos desertos do meu nada,
Onde a carne exposta desabrocha em flores de sangue.
Perco-me na exaltação das essências inflamadas
Que invadem a obscura luz do meu corpo suplicante,
No labirinto onde a memória sangra
E o meu destino pulsa no coração dilacerado
Que convulsiona nos recessos do meu peito,
Como memorial da minha humana condição
Cantando às musas os silêncios do meu norte.
Afasto-me em cinzas de castelo estilhaçado,
Esquecido em vagas dissertações de encanto obscurecido,
E as cordas da minha voz apagam-se na bruma
Para me plantar na alma o silêncio universal.
 
Melodia de Lágrimas

Mãos de Nada

 
Que asas se abriram nas mãos do meu nada
Que prende a sombra da minha razão?
Silêncios de inocência derrotada
No estilhaçar do abismo da traição…

Que corrente envolve o meu coração
No negro abraço da ilusão quebrada?
O eco de um sonho derrubado em vão
Entre noites de vida abandonada…

Que voz sangrou o grito dos meus dias?
Os fragmentos das débeis fantasias
Que me apagaram a noite do ser…

Ah, sono! Porque não desces, eterno,
Sobre o nada deste corpo de Inverno
Que morreu já, mas que insiste em viver?
 
Mãos de Nada

Se Eu Fosse...

 
Se eu fosse luz de um sonho esplendoroso
E fossem meus os dias desta vida,
Dava-te a minha alma reconstruída
E amava o teu sonhar silencioso.

Se eu fosse o azul eterno e majestoso
Do céu que cobre a terra indefinida,
Dava-te uma promessa renascida
De amor sublime, puro e poderoso.

Se eu fosse o sonho da tua miragem,
Criava um novo mundo à tua imagem
E os teus sonhos erguia ao alto céu.

Mas sou só eu, esta sombra quebrada
Que se arrasta entre as sombras e o nada,
E nada tenho para dar, senão eu…
 
Se Eu Fosse...

Foi Necessário

 
Foi necessário que o tempo sangrasse
Para que sentisses a canção da vida,
Na sombra de uma noite enlouquecida
Onde o teu coração se derramasse.

Quis o tempo que o teu corpo quebrasse
Numa cintilação obscurecida,
Para que o brilhar da lua enternecida
A voz do teu sentir iluminasse.

Foi necessário que os deuses eternos
Te arrastassem à sombra dos infernos
E ao fúnebre desalento da dor

Para que entendesses a voz da miragem
Que se embalava sobre a tua imagem
Num efémero sussurro de amor.
 
Foi Necessário

Alma de Inverno

 
Soturna como a sombra da loucura,
Sinistra como o espectro da traição,
Minha alma é tempestade de amargura,
Inverno de infinita escuridão.

Sou eco da eterna condenação,
Relâmpago que rasga a noite escura,
Fantasma de eterna desolação,
Gélido deserto de vida obscura.

Ausente como a sombra do passado,
Sou murmúrio de uma alma sem pecado,
Condenada a morrer sem ter abrigo.

Mas, mundo cruel que me condenaste,
Prometo que, pelo mal que me causaste,
Te hei-de levar aos Infernos comigo!
 
Alma de Inverno

Véu de Enigmas

 
Atordoar de um fenecer adormecido em vida,
Oculto em véu de estrelas,
Sussurro de um encanto que chama por mim…

Sobre o deserto mistificado das coisas
Que se entretecem na divagação da loucura,
Desvendo no meu corpo mistérios de chuva e sangue
Derramados sobre a pele dos meus sentidos.

Adormeço-me no embalo dos meus próprios braços,
Tecida em nó de sonho traçado sobre a corrente do ser,
E o espelho é portal de difusões em além-vida,
Moldado em lábios de areia ante o desértico toque
Do adeus…
 
Véu de Enigmas

Noites de Absurdo

 
Fugazes cintilações de luz
Que se deixam entrever entre o devaneio do obscuro
E o fúnebre labirinto da noite divinizada,
Como invasões de absoluto e de absurdo
Eternizados no enlevo das aspirações intemporais…
Breves divagações consumadas em totalidade
No silêncio dos séculos sacralizados por morte,
Brilhando em estrelas de funérea alvura
Rasgando as trevas com seu sudário de cintilação.
Efémeros sussurros de um sentido enlouquecido
No fenecer dos anos que aprisionaram a luz
E que invadem as sensações do corpo devastado
Em estilhaçar de espelhos tombados
Sobre o esquecido abraço de uma sepultura.
 
Noites de Absurdo

Tinta de Sentimento

 
Não sei quem te fez tão triste,
Poema de divagações e de venerações confusas,
Dispersas pela solidão
Como sopros sussurrados à loucura do tempo,
Cantados em lamentos de sentimento
Escritos na mística imortal da tua sanguínea tinta.
Não sei quem te ensinou
A ser grito que dispersa o estremecer
Entre as paredes dos labirintos da alma,
Mãe dolorosa chorando os filhos apodrecidos
Na dormência da eternidade,
Árvore descarnada de frutos ressequidos.
Não sei quem te criou,
Poema sepultado na pedra fria do meu corpo
Aberto em cruz à cólera celeste.
Sei que és um gemido estrangulado antes de nascer,
Na génese dos tempos deixados por viver,
E que és tormento de todos os dias
Vivente no mais absurdo dos confins de mim.
 
Tinta de Sentimento

A Mão Esquerda dos Deuses

 
Estendida sobre as asas ensanguentadas
Do marmóreo anjo estilhaçado nos abismos
Onde ardem os fogos de mil infernos pessoais,
Mão executora de todas as sombras ousadas,
Dos sonhos que se atreveram a voar,
Lançados às trevas da inviolável dispersão…
Tormento da vida em ossos e sangue erguida
Sobre a foice dos vencidos e a opressão dos inocentes,
Destino de além-vida e morte eterna,
Fatalidade…
 
A Mão Esquerda dos Deuses

Praia Perdida

 
Praia Perdida

Num mar distante de sonhos perdidos,
Voguei, por milénios de morte e dor,
Para naufragar, perdida e sem sentidos,
Numa praia sem luz e sem calor.

Tudo era escuridão em meu redor,
Sombra infinita entre sonhos vencidos.
Aquele era um destino sem amor,
Praia perdida dos anjos caídos.

Naquela praia, fria e sem sentido,
Vi o meu futuro morto, destruído,
E, em agonia, aceitei o meu fim.

Ainda caminho nas sendas sombrias
Dessa praia de esperanças vazias.
Por favor, vida... Esquece-te de mim!
 
Praia Perdida

Na Voz de um Dia

 
Naquela hora de sonho e fantasia,
Idílio de um encanto imaculado,
A minha alma era feita de magia
E o meu coração não estava quebrado.

Sentia o teu espírito a meu lado,
Mas, naquele instante, na voz de um dia,
O amor transformou-se em ressentimento
E a força de viver fez-se vazia.

E, então, fugiste… E, onde habitava amor,
Ficou apenas a sombra da dor
E a mágoa de uma infinita amargura.

Quis o destino que assim terminasse.
Ah! Não haver sombra que me tornasse
Mais que este vago vulto de loucura!
 
Na Voz de um Dia

Lágrima Prevista

 
Um breve pensamento, indefinido,
Passa pela mente distante, vazia.
Instala-se, então, a melancolia
E o negro sonho sente-se perdido.

Vem, depois, a procura de um sentido
Para uma vida sádica e sombria.
Seguem-se o desespero e a agonia
De nada ver senão o céu vencido.

Trava-se, então, a guerra da vontade
De viver contra a dor da eternidade.
Quer quebrar a alma… A voz não o fará.

E é só no fim, quando a dor é mais forte,
Que o silêncio que prenuncia a morte
Surge à luz da lágrima que virá.
 
Lágrima Prevista

Inferno Negro

 
Nem fogos de interminável tormento
Nem vermelhos do sangue da paixão…
O meu Inferno é só de desalento,
Negro como a mais negra escuridão.

Apenas o silêncio e a solidão
Atormentam meu débil sentimento,
Neste deserto desolado e vão,
Mais negro e vazio a cada momento.

Nem gritos de indefinida agonia
Nem reversos de ignóbil fantasia
Ou fantasmas de mórbido fulgor.

O meu Inferno é negro como o nada
E, nos confins da minha alma quebrada,
Não passa do silêncio a minha dor.
 
Inferno Negro

Transmutação de Sentidos

 
Algures entre o sussurro da agonia
E o delírio do êxtase
Onde um olhar arde em fogos suplicantes…

Dormência de instintos embalados na pele,
Subitamente despertos
Na sacralização de todos os sentidos,
Efémero instante de absoluta eternidade,
Quando as mãos agarram o ar,
Mas tocam Deus.

Transmutação de carne em fogo e sangue em luz,
Sobre a trémula espiral que encaminha o delírio
Para os olhos fechados da esfinge que repousa
Sobre o maior enigma do destino.
 
Transmutação de Sentidos

Rosa Selvagem

 
Perdida entre pântanos de amargura
E fantasmas de triste e negra dor,
Mancha de sangue o manto da loucura
Com seu pálido e gélido fulgor.

Abandonada entre sombras sem cor,
Floresce em tenebrosa noite, obscura
Como a voz de uma paixão sem ardor,
Relâmpago rasgando a noite escura.

Cega aos olhos dos homens e da vida,
Vive nas sombras da noite vencida,
Qual fantasma de um mundo mais além.

Silencioso sinal da eternidade,
Aberta em poderosa majestade,
Mas visível aos olhos de ninguém…
 
Rosa Selvagem

Semper Fidelis...

Carla Ribeiro