ABISMO
Eu sou um grito
Um grito seco
E surdo
Você é incerteza
Liberdade
Sempre presa
Somos conflito
Sem grito
Sem ponte para atravessar o abismo
Somos amanhã sem sorte
Vida que escapa
Feito sangue
Pelo corte
AQUARELA
Eu pinto sonhos que nem sempre têm asas
Sonhos vividos
Sonhos esquecidos
Sonhos que poderão viver na minha tela
Na minha triste aquarela
Minha tela pode estar pintada de vazio
Silêncio vazio
Cores incolores que mostram meu rosto
Tela vazia incolor que inspira minhas cores
Eu pinto meus temores na madrugada
Onde a tempestade é a verdadeira tela
Onde a solidão disfarçada
Invade o meu quarto pela janela
Eu pinto a solidão do meu corpo
Pinto as cores da minha voz nua
Pinto meus olhos perdidos no infinito
Minha tela é meu próprio grito
ROSAS E ESPINHOS
Tenho que tomar coragem e sair desse lugar
Tentar um novo encanto
Um novo canto
E voltar aprender a amar
Tenho que tentar iludir meus olhos
E ver rosas onde há espinhos
Miragens que apontam algum caminho
Para poder novamente sonhar
Tenho que parar para ler um livro
Abraçar as ondas que chegam de longe
Esquecer a dor que corta meu peito
Encontrar você além do seu horizonte
Tenho que esquecer algumas palavras
Esquecer de dizer frases que não vão com o vento
Encontrar um jeito para voltar a sorrir
Esquecer que a solução é sempre partir
BRINCAR DE ESQUECER
Vou tentar esquecer o que ficou pra trás
Todas as tardes vividas
As noites frias
As madrugadas esquecidas
Vou tentar saborear o vinho do porto
Lembrar que não estou morto
Ver se consigo sorrir no outro lado
Esquecer o espelho que foi quebrado
Vou tentar olhar através do vento
Esquecer as folhas secas
As poesias escritas
As frases de amor que não foram ditas
Vou tentar mergulhar nos arbustos
Olhar nos olhos que não são verdes
Vou tentar brincar de viver
Vou tentar brincar de esquecer
OLHOS COR DE MEL
Tenho um rio de sonhos
Sonhos que me levarão ao céu
Que estão tão perto
Estão nos olhos cor de mel
Tenho uma vida do outro lado do rio
Do outro lado da minha vida esquecida
Perto da estrela dos meus olhos
No fundo dos olhos cor de mel
Tenho um sonho que não embeleza palavras
Que não emoldura paisagens
Que não recolhe os quadros perfilados
Na praia da ilha dos seus olhos cor de mel
Tenho um sonho
Que é o pulsar da minha vida
Que é o sereno do meu céu
Um sonho da cor dos olhos de mel
QUERIA DIZER EU TE AMO
Eu queria dizer que te amo
Mas preferi esperar os dias
A ousadia
A ventania
Protegi seu corpo frágil
Da chuva
Do acaso
Do mormaço
Poderia dizer que te amo
Mas não disse enquanto você dobrava a esquina
Do horizonte
Da ponte
Eu queria dizer que te amo
Passaram-se os dias
A ousadia
A ventania
Não disse eu te amo
Ficarei estendido no sofá
Vivendo de fantasia
De melancolia
SANGRANDO ENQUANTO A FACA CORTA A CARNE
Não estou mais sorrindo
O regador já não serve para lavar a alma
Não sou mais a borboleta que luta pela vida
Sou apenas minha dor púrpura e infinita
Hoje a lua se escondeu onde não havia sol
A fruta que descasquei estava sem caldo
O suco não sairá pela manhã como deveria
E a noite não brilhará antes do nascer do dia
Minha ilusão sucumbiu antes de nascerem asas
Não sou uva passa
Não sou a nata
Que ficou esquecida depois que o leite foi requentado
Minha chuva vai derramar a sede dos seus olhos
Sentirei a faca cortar minha carne
Sangrarei meu amor até desfalecer
E assim poderei te esquecer
SOLIDÃO
Eu não queria estar aqui
Caminhando numa pequena rua de chão
Cercada por tapete de neve
Dos dois lados a me observar
Não me sinto tão isolado
Pois a neve que forma o horizonte
Que embranquece a folhagem
Ainda aquece meu olhar
Sinto apenas a solidão que chega com o frio
Que rasga a paisagem
E entoa uma canção triste, tão triste
Que talvez ninguém queira cantar
Meu passado é a sinfonia que rege meu futuro
Meu futuro é escuro
Escuro como a neve sem luz
Que nem fechando bem os olhos se pode enxergar
Meu coração foi atirado na neve
Afundou sem vida durante toda minha vida
Ficou sem pedaços para o sangue poder pulsar
Ficou sem estrelas para na noite se guiar
Ficou sem esperança de um dia poder amar