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«« Uma Traça que se chama Esperança ««

 
A Maria estava cabisbaixa sentada na velha cadeira de baloiço que pertencera à avó Rosa. Tantas vezes se sentou no colo da avó nesse mesmo lugar. Uma lagrimita corre atrevida pela sua face morena.
Fez hoje oito dias que a avó Rosa morreu, e a Maria ainda não consegue compreender o que se passou, de um dia para o outro a avó tinha morrido. Uma noite antes de morrer, recorda a Maria, a avó segredou-lhe, toma conta da minha cadeira, e da traça que lá habita, o seu nome é Esperança. De seguida deu-lhe um beijinho na bochecha e adormeceu.
Agora Maria passa os tempos livres sentada na cadeira ali mesmo no alpendre, o gato júnior e a gata Pipoca fazem-lhe companhia, parece que são os únicos que a entendem e que entendem a falta que a avó lhe faz. A mãe e o pai têm que trabalhar, quando chegam a casa lá pelas seis da tarde, vem tão cansados do corre-corre da cidade, que nem se apercebem da sua tristeza.
O que Maria não sabe, é que ainda ontem o pai e a mãe comentaram noite fora o seu estado de espírito.
- A nossa menina não está nada bem, disse a mãe.
- Tens razão, a voz do pai soou preocupada,- já falei com ela, já lhe expliquei que a morte faz parte da vida, as flores morrem, as árvores, os peixes, até os animais de estimação, e as pessoas também, é a lei da natureza. Tudo morre para mais tarde se renovar.
- Eu também lhe expliquei isso, querido. A mãe deixou fugir um soluço.- Gostava tanto da avó Rosa, sei que teve uma vida cheia e que morreu feliz, mas uma criança de sete anos não consegue entender estas coisas.
- Amanhã volto a falar com a nossa princesa, disse o pai,- boa noite querida.
- Boa noite. Segredou a mãe.
E agora Maria ali está pensativa, o Júnior de um lado a Pipoca do outro, estão os três à espera da traça, têm que tomar conta dela, Maria prometeu isso à avó Rosa, e as promessas são sempre para cumprir.
Mas o que será uma traça, a menina perguntou aos gatos, mas estes nem ligaram, que lhe haviam de responder, nunca viram nenhuma, ainda se fosse uma sardinha, ou um pardal de telhado, sabiam bem o que era, agora uma traça, que raio será isso.
Maria levantou os olhos ao ouvir o carro dos pais que chegavam de mais um dia de trabalho.
- Olha a minha princesa, gritou o pai,- hum está bem acompanhada.
- Olá minha querida, disse-lhe a mãe ao mesmo tempo que a beijava e lhe dava um abraço bem apertado.- Ficas aqui com o pai que eu vou fazer o jantar, até já.
O pai pegou na Maria ao colo e sentou-se na velha cadeira de baloiço. Ao baixar os olhos reparou numa pequena lagarta que saía de um orifício minúsculo existente no braço direito da cadeira.
- Olha filha, uma traça, o pai apontoava para a pequena lagarta.
A menina arregalou os olhos, os gatos quase caíram para o lado, tal foi o espanto, então aquela feia lagarta que mal se via a olho nu, de um amarelo tão baço, que fazia vertigens, aquilo é que era uma traça!
- Quem havia de dizer, é a Esperança, disse a Maria tremelicando.
- Dizer o quê filha, inquiriu o pai.
- Que esta lagarta é que é a traça da minha avó. E que se chama Esperança.
- Ó filha explica lá isso melhor, pediu o pai ao mesmo tempo que lhe passava a mão pela testa, para ver se ela estava com febre.
- A avó Rosa pediu para eu tomar conta da traça que habitava na cadeira de baloiço, pediu-me isso antes de morrer.
- Ah agora entendo, o pai agora já sabia porque é que a menina andava esquisita. – Anda, vamos metê-la dentro de uma caixa de fósforos, ao dizer isto pegou na pequena lagarta delicadamente e encaminharam-se para a cozinha, seguidos pelos gatos.
Há quatro dias que a Esperança habita a caixa de fósforos, e Maria todas as manhãs salta da cama e corre para a cozinha, abre sofregamente a caixa para ver se a lagarta já está dentro do casulo. O pai explicou-lhe que acontece o mesmo com todas as lagartas, todas elas tem muito pouco tempo de vida, todas elas se transformam em borboletas, para depois construírem um casulo com finos fios de seda que segregam e no qual se enroscam, Já dentro do casulo a lagarta transforma-se numa bela borboleta, para depois pôr os ovos, que por sua vez dão vida a novas lagartas.
É assim que acontece na natureza, tudo nasce, tudo morre e tudo faz nascer uma nova vida. Nada se desperdiça.
A Maria está de novo sentada no alpendre, balançado o corpo na velha cadeira da avó Rosa, está à espera que chegue a noite, é assim desde que descobriu o que era uma traça. O pai também lhe explicou que a avó Rosa tinha ido para o céu e que agora era uma das estrelas que habitava lá em cima, no firmamento, a menina até já sabia qual era, era aquela que aparece todas as noites e brilha com tal intensidade que sobressai no meio de todas as outras. Era assim o sorriso da avó, brilhava com tal intensidade que a Maria nunca mais o vai esquecer.
No outro dia enquanto dormia a Maria conversou com a estrela e disse-lhe.
- Fica descansada avozinha, que eu e os gatos vamos sempre tomar conta da tua traça e da sua família, sim porque tu não sabes, mas daquela lagarta feiosa, nasceram doze iguaizinhas a ela.
- Vês como o pai e a mãe tinham razão, aconteceu o mesmo com a avó, e daqui por algum tempo no lugar de uma estrela terás centenas a visitar-te todas as noites. Boa noite minha querida.
- Boa noite avozinha, balbuciou a menina, ao avistar a estrela Polar


Antónia Ruivo
(Conto infantil)

A minha casa de letras


Era tão fácil a poesia evoluir, era deixa-la solta pelas valetas onde os cantoneiros a pudessem podar, sachar, dilacerar, sem que o poeta ficasse susceptibilizado.

Duas caras da mesma moeda:

Poetamaldito e seu apêndice ´´Zulmira´´
Julia_Soares u...

 
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Antónia Ruivo
 
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Enviado por Tópico
Vania Lopez
Publicado: 20/05/2011 00:05  Atualizado: 20/05/2011 00:05
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 Re: «« Uma Traça que se chama Esperança ««
Gostei imenso do conto, tens mãos de fada. Obrigada. bjs

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 20/05/2011 01:47  Atualizado: 20/05/2011 01:47
 Re: «« Uma Traça que se chama Esperança ««
A esperaça é buscar um início de um novo algo, deixo meu abraço

Enviado por Tópico
Antónia Ruivo
Publicado: 16/06/2011 18:36  Atualizado: 16/06/2011 18:36
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Mensagens: 3855
 Re: «« Uma Traça que se chama Esperança ««
Vanea e Martins, obrigado tudo de bom para vocês.