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Os filhos do Corno de África

 
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A terra é a minha cama
e o corpo humilhado da minha mãe, a cabeceira.
Á noite os bichos
escoram-me do frio e comem outros bichos
que nutrem a minha carne podre.
não sei o que é um sorriso,
nunca conheci outra vida se não esta.

Somos tantos
deitados na mesma cama.
Já não me levanto,
a astenia das minhas pernas
já não seguram o meu corpo.
Às vezes a minha mãe
mete-me um punhado de farinha na boca
para que a fome não me coma.

Não sei se sou criança ou menino,
aqui somos todos iguais
não existem idades nem rostos,
as dores vão deformando
as formas do meu corpo
e o medo assombra-me a sombra
que se cala por baixo de mim.

Se pensam que nos matam, enganam-se…
…Mutilam-nos

Os ossos desfazem-se lentamente
os dentes cravam a terra,
tentam libar água das noites húmidas.

Todos os dias adormecem milhares
na boca do inferno

Por mais que os poetas destilem,
os cantores clamem,
os pintores nos esbocem,
jamais alguém conseguirá
abrir as portas da galeria horrenda
e expor o massacre da morte
que nos engole em jejum.


Conceição Bernardino
Poema - Editado e registado


A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.
Aristóteles

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Conceição Bernardino
 
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Enviado por Tópico
Migueljaco
Publicado: 12/04/2014 17:17  Atualizado: 12/04/2014 17:17
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 Re: Os filhos do Corno de África
Boa tarde Conceição, seus versos nos remetem a nossa real insignificância, nada somos além de um banquete de germos, toda esta nossa pompa é ilusória, fruto de um ego exacerbado que nos possui, a grosso modo somos mesmo uma fração dos entulhos que povoam a natureza, parabéns pelo contundente enredo poético, um forte abraço, MJ.